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15 de Junho de 2024
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    Rio+20: oportunidade para benefícios fiscais

    A sustentabilidade ambiental na produção econômica de bens e serviços, apesar de não constar expressamente dos artigos 145 a 169 da Constituição de 1988, consubstancia parâmetro atual e requisito futuro à concessão de favores fiscais, de acordo com uma interpretação sistemática e teleológica da Lei Maior, a despeito de os formuladores da política tributária nacional não observarem esse vetor axiológico implícito primário.

    Parte da imprensa noticiou recentemente um exemplo concreto de inobservância a esse imperativo constitucional sistêmico, em matérias que ressaltaram que "o carro elétrico é o que recolhe a maior carga de impostos", ao contrário da maioria dos demais países onde o seu uso tem sido estimulado, razão pela qual o "incentivo a carro no Brasil anda na contramão".

    Sob o ponto de vista jurídico-constitucional é possível demonstrar que a sustentabilidade ambiental constitui parâmetro atual inobservado e requisito futuro necessário à concessão de benefícios fiscais a partir de três linhas de pensamentos.

    A primeira ressalta a direta interação entre o Título VI da Constituição de 1988 (Constituição tributária e orçamentária) e a disciplina da ordem econômica (Título VII da CR-88), sendo a última expressamente conformada pelo princípio da defesa do meio ambiente (inciso VI do art. 170). O Supremo Tribunal Federal (STF) já enfatizou a necessidade de harmonia entre o exercício da atividade econômica e a proteção ambiental (ADI 3.540), observando, ainda, que a sustentabilidade ambiental deve servir de diretriz para aplicação dos princípios da garantia do desenvolvimento e do pleno emprego. Por sua vez, a conexão entre os princípios que regem a ordem econômica e a disciplina da ordem tributária também já foi reconhecida no âmbito do STF (ADI 4033), em jurisprudência que versa sobre a aplicação, no campo tributário, do princípio do tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte. Nesse julgamento, o ministro Joaquim Barbosa vai além, e sustenta que, no caso, o sistema tributário se subordina ao disposto na ordem econômica. Assim, há situações em que a disciplina tributária submete-se ao disposto no sistema econômico e social. Analogamente, o constituinte, ao mesmo tempo em que conferiu competência aos entes políticos para tributar e desonerar a produção econômica de bens e serviços no bojo da política extrafiscal, estabeleceu a sustentabilidade ambiental da atividade empresária como princípio constitucional, razão pela qual a unidade da Constituição pressupõe a interdependência entre três imperativos: a prerrogativa estatal de tributar a atividade econômica objetivando financiar as despesas públicas; a possibilidade de utilização do tributo com intuito extrafiscal, visando à intervenção na Ordem Econômica e Social; e a defesa do Meio Ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado considerando o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.

    A segunda linha argumentativa objetiva demonstrar que a sustentabilidade ambiental consubstancia parâmetro atual e requisito futuro necessário à concessão de benefícios a partir da indissociável correlação existente entre a dignidade da pessoa e a defesa do meio ambiente. A dignidade humana foi alçada ao centro dos sistemas normativos contemporâneos e tem sido utilizada nas decisões das mais altas Cortes (ADI 4424), tendo parte da doutrina nacional a qualificado como vértice axiológico constitucional. No entanto, importante ressaltar que a Constituição é instrumento de disciplina jurídica não apenas para a atual geração, o que implica dizer que a dignidade será prospectivamente alcançada somente se realizado, no presente, um modo de vida, de produção econômica de bens e serviços e de consumo coletivos sustentáveis ao longo do tempo. Assim sendo, a sustentabilidade ambiental é pressuposto ínsito fundamental à eficácia jurídica e à efetividade concreta da própria dignidade das gerações futuras, motivo pelo qual constitui verdadeiro vetor axiológico constitucional implícito primário. É primário posto ser requisito da própria dignidade humana.

    Por fim, a terceira forma de se alcançar a mesma conclusão, que a sustentabilidade ambiental deve ser observada no campo tributário, fundamenta-se na tese de que a sustentabilidade é princípio constitucional sistêmico, não apenas vinculado ao direito ambiental, conforme destacam Saulo de Oliveira Pinto Coelho e André Fabiano Guimarães de Araújo. Nesses termos, a tributação, que se insere no contexto da sustentabilidade político-gerencial, deve ser norteada pelo critério da longevidade da própria política pública e não da permanência da representatividade parlamentar momentânea, voltada a interesses de curto prazo. Portanto, a política tributária deve ser orientada por parâmetros que estabeleçam uma racionalidade de longo prazo - de compromissos com as atuais e futuras gerações.

    Nesse passo, com o avanço das chamadas tecnologias verdes, a defesa do meio ambiente na produção econômica de bens e serviços deve passar da atual condição de parâmetro adicional - a ser ponderado com os demais valores e princípios, como a busca pelo pleno emprego e o desenvolvimento econômico com inclusão social - para o status de requisito indispensável à concessão de favores fiscais - o qual também deverá ser sopesado com as múltiplas finalidades prestigiadas pela Constituição.

    Portanto, deve-se aproveitar a oportunidade da Rio+20 para a formulação e apresentação de uma proposta legislativa que positive expressamente no sistema normativo infraconstitucional a eficácia progressiva da sustentabilidade ambiental como pressuposto à concessão de benefícios fiscais no Brasil.


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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/rio-20-oportunidade-para-beneficios-fiscais/3150552

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