STF inova ao decidir sobre Fundo de Participação dos Estados
Muito se propõe, e há muito tempo, para alterar a tributação no País. No entanto, um dos aspectos mais relevante do sistema tributário e que raramente é objeto de qualquer proposição de mudança (na verdade, antes disso, nem mesmo é alvo de análises mais extensas e consistentes) é o Fundo de Participação dos Estados o FPE. Pode-se dizer que é tratado como se fosse um tabu. Muda o comando do governo federal e mudam as propostas de reformas, quase sempre concentradas no imposto estadual sobre circulação de mercadorias e alguns serviços, mas sempre se procura evitar a menor menção, quanto mais esboço de mudança no FPE. Esse quadro pouco muda no Congresso Nacional, considerado como um tema intrinsecamente vinculado à chamada questão regional, que pautou a maior parte dos debates e decisões da Assembleia Constituinte em torno do capítulo tributário.
O temor de mudar o FPE é que venha a desperta anseios e interesses tão díspares e conflitantes dos governos estaduais, afinal o Brasil ainda é um dos países do mundo de mais profunda desigualdade econômica e social, entre regiões e entre famílias. Paradoxalmente, é justamente para encurtar essa distância que o FPE existe. Assim, a Constituição Federal, no inciso II do artigo 161, remete à lei complementar regular o FPE (como o congênere para Municípios - FPM), ... especialmente sobre os critérios de rateio..., objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico . Em princípio, a matéria deveria ter sido revista depois de promulgada a nova Carta Magna visto que o parágrafo único do artigo 39 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determinava que o Congresso votasse tal lei em até um ano. Como não foram aprovados novos critérios de rateio naquele prazo, pouco depois foi editada uma Lei Complementar 62, de 28/12/1989,[1] com claro caráter transitório. O parágrafo 1º do artigo 12º estabeleceu que os coeficientes individuais de participação dos Estados e do Distrito Federal no ... FPE a serem aplicados até o exercício de 1991, inclusive, são os constantes do Anexo Único . Ou seja, o rateio do FPE foi congelado em 27 cotas por uma medida confessadamente excepcional, tanto que tinha prazo para sua vigência. O problema é que nunca mais foi aprovada a nova lei complementar para ditar o rateio a partir do exercício de 1992 e o que era provisório se tornou permanente.
Passados mais de 20 anos, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade,[2] que é inconstitucional a aplicação de uma tabela rígida de rateio do FPE e que a vigente só poderá ser aplicada até o exercício de 2012. O ineditismo da decisão também envolveu o reconhecimento de que a mera e imediata suspensão dos rateios significaria deixar os Estados sem receber os repasses do FPE, até que o Congresso conseguisse aprovar uma lei de quórum qualificado, e isso implicaria em óbvios e graves danos às finanças dessa esfera de governo. Na prática, aquela Corte não apenas julgou inconstitucional parte da lei, mas condenou a omissão do legislador em ignorar e deixar de regulamentar um comando tão fundamental para a Federação. Ao limitar a vigência do atual rateio até 2012, o órgão máximo do Poder Judiciário considerou que cerca de três anos seria tempo mais do que suficiente para que a sistemática de partilha do FPE seja revista pelo Poder Legislativo.
Antes de entrar no mérito da ação, é interessante comentar o processo de julgamento, recorrendo a juristas que acompanham de perto o STF. Reportaram que raramente a Corte acolheu pedido em ação direta de inconstitucionalidade por omissão (um caso recente envolveu os critérios para a criação de novos municípios, previstos no parágrafo 4º do artigo18 da Constituição).[3] O mais relevante respeita a inovação na técnica de decisão, como foi relatado por assistente qualificado da Corte. O Tribunal declara a inconstitucionalidade, mas mantém a vigência da Lei por dois exercícios financeiros. Foi preciso fazer isso porque, nesses casos de omissão parcial ou seja, há lei, mas ela é insuficiente para cumprir o comando constitucional a retirada da lei é mais prejudicial à ordem constitucional do que a sua manutenção. Imagine se, por exemplo, é apresentada uma ação por omissão parcial em relação ao salário mínimo, que claramente não cumpre os requisitos constitucionais. O Tribunal poderá dizer que há uma omissão inconstitucional, mas não poderá declarar a nulidade da lei e do valor do salário vigente, pois isso seria mais desastroso do que a manutenção do estado atual. Então, nesses casos, a única alternativa acaba sendo a manutenção da vigência da lei até que o legislador faça outra, cumprindo o mandamento constitucional.
O julgamento sobre o FPE também foi emblemático pela dimensão do objeto da ação: talo fundo é formado por 21,5% do produto da arrecadação da União dos impostos de renda e sobre produtos industrializados, o que significou, no último ano de 2009, um repasse de R$ 45,3 bilhões, equivalente a 1,4% do PIB brasileiro.[4] Mesmo descontados uns quintos vinculados para o ensino básico, o montante líquido equivale a 13% de toda a receita tributária disponível do conjunto dos Estados brasileiros, ou 22% da receita deles no ICMS e quase o dobro que arrecadam de IPVA. Esses índices nacionais, porém, escondem uma importância relativa muito maior do FPE em relação àqueles estados menos desenvolvidos: assim, tal repasse equivale a cerca de um quarto da receita corrente dos Estados do Nordeste e 30% do Norte, sendo que, por unidade federada, responde por quase metade da mesma receita de estados como Roraima, Amapá e Acre; em torno de 40%, no Tocantins e Piauí; e mais de 30% no Maranhão, Paraíba, Alagoas e Sergipe. [5]
A base da decisão do STF foi muito simples: o rateio do FPE vem sendo feito sem ...
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