TJ/DF: instituição financeira responde objetivamente por saque indevido
A NOTÍCIA (fonte: http://www.tjdft.jus.br )
BANCO REAL É CONDENADO A DEVOLVER VALOR DE SAQUES INDEVIDOS
O Banco Real terá de devolver a uma cliente R$ 7.610,00 referentes a saques indevidos realizados de sua conta corrente, além de indenizá-la em R$ 2 mil por danos morais. A condenação foi confirmada pela 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, que em julgamento unânime manteve a sentença do 6º Juizado Especial Cível de Brasília. Para os julgadores, se o banco não tomou as cautelas necessárias para evitar a fraude, deve arcar com os riscos de sua conduta negligente.
A autora da ação de ressarcimento alega que no período de 24 a 31 de janeiro de 2007 foram realizados vários saques de sua conta corrente sem sua autorização. A cliente afirma não ter perdido seu cartão de operações bancárias e nem fornecido sua senha pessoal ou seu cartão a terceiros. Diz, ainda, que em razão da negativa do banco em devolver a quantia sacada indevidamente não conseguiu honrar com compromissos financeiros assumidos anteriormente e precisou renegociar suas dívidas.
Em contestação, o Banco Real argumenta não poder ser responsabilizado pelos danos sofridos pela cliente, uma vez não ter praticado qualquer ato ilícito e nem agido com culpa, não tendo sido constatada nenhuma irregularidade nos saques. Alega que o dano decorreu de ato de terceiro e atribui à cliente a culpa exclusiva pela ocorrência do dano, na medida em que se descuidou do uso de sua senha pessoal e intransferível. Além disso, sustenta que a correntista não comprovou os danos materiais e morais sofridos.
Segundo a juíza cuja sentença foi confirmada pela 1ª Turma Recursal, o ônus da prova da regularidade dos saques efetuados na conta corrente da autora da ação judicial recai sobre o banco, incumbindo a este a prova inequívoca da culpa exclusiva da correntista, a fim de se eximir da sua responsabilidade objetiva. Porém, conforme a juíza, o banco não trouxe nenhuma prova de que os saques foram, efetivamente, realizados pela cliente, restando evidenciado que ocorreram mediante fraude em nome da consumidora.
"Ressalte-se que o artigo 8º da Lei 8.078 /90 expressamente determina que os serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à segurança dos consumidores. Ao fazê-lo, ou seja, ao disponibilizar seus serviços no mercado, cumpre que proceda com cuidado, fornecendo a segurança que deles se pode esperar. E se pode esperar que as instituições financeiras se cerquem de todas as cautelas para evitar fraudes que culminem por violar a esfera patrimonial, moral e material dos consumidores" , diz a julgadora.
Para a juíza, ficou claro que a fraude decorreu de falha no serviço disponibilizado pelo banco. "A fraude, que vem se tornando corriqueira, era, portanto, previsível, e não foi evitada pela instituição financeira ré por absoluta negligência desta, nada havendo nos autos que demonstre haver se desincumbido de seu dever de cuidado. A manutenção da segurança no acesso regular das contas correntes é dos bancos, inclusive contra as fraudes que possam ser efetuadas pelos próprios correntistas e funcionários", completa.
NOTAS DA REDAÇÃO
Um tema bastante discutido: a responsabilidade da instituição financeira por saques indevidos ("phishing").
Depois de muita discussão, firmou-se entendimento pacífico no sentido de que a relação existente entre instituição financeira e cliente é de consumo, ou seja, regida pelo CDC (Código de Defesa do Consumidor).
Nesses termos, as regras aplicáveis à responsabilidade por saque indevido são as previstas na legislação consumerista.
O CDC , em seu artigo 14 determina que "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos ".
Trata-se da responsabilidade por vício do serviço, hipótese de responsabilidade civil objetiva.
A regra estabelecida no CDC , em relação ao ônus da prova, é a mesma prevista no CPC : cabe ao autor da demanda provar em juízo o vício do serviço prestado, no caso, a guarda do dinheiro pela instituição financeira.
No entanto, como se trata de hipótese de responsabilidade objetiva (que independe de culpa), basta que o consumidor, leia-se, o cliente do banco (autor da demanda) prove a ocorrência do fato (saques indevidos) e os danos dele oriundos, cabendo ao réu (instituição financeira) a prova dos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos, como estabelecido no artigo 14, § 3º do mesmo codex ("o fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro ").
Exatamente por esse motivo, a inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, VIII ("são direitos básicos do consumidor: a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências "), não se mostra necessária, competindo, assim, à instituição financeira comprovar que a responsabilidade pelos saques é da própria vítima ou de terceiro.
Os tribunais nacionais são firmes nesse sentido. Entende-se que é dever da instituição financeira comprovar que não falhou na prestação do serviço.
É essa a posição adotada, por exemplo, pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: "Se o réu propicia ao consumidor as vantagens do magnético, com senha pessoal, intransferível, e a decorrente rapidez e facilidade de sacarem-se em caixas eletrônicos, deve primar pela segurança dessas operações. É do banco o dever de garantir a segurança ao usuário dos seus serviços", considerou.
No caso em comento, foi esse o entendimento aplicado, em obediência ao artigo 8º do CDC :"os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeit o".
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