TJ é competente para julgar homicídio cometido por deputado estadual em outro estado
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a competência do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) para julgar o deputado estadual licenciado João Beltrão Siqueira, pelo crime de homicídio doloso, ocorrido em 2001, no município de Taguatinga, em Tocantins. Para os ministros da Terceira Seção, no caso deve ser considerada a prerrogativa de foro garantida na Constituição Federal a parlamentares e estendida aos agentes políticos locais pela Constituição Estadual.
A questão foi definida num conflito de competência provocado pelo juiz de direito da comarca do local do crime, para quem haveria dúvidas na aplicação do foro por prerrogativa de função relativa a deputado estadual. A Constituição Federal estabeleceu que compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, mas, ao mesmo tempo, concedeu foro a algumas autoridades.
Os ministros da Terceira Seção debateram se o foro privilegiado para deputado federal era de reprodução obrigatória pela Constituição Estadual ou se prevaleceria o entendimento de que a competência é do Júri. As normas de reprodução tratam da mera transcrição de normas presentes na Constituição Federal para as constituições estaduais.
A decisão se deu por maioria. O ministro Napoleão Maia Filho, relator originário do conflito, entendeu que a competência seria do juiz de direito da 1ª Vara de Taguatinga (TO). Entretanto, a posição majoritária foi a da ministra Maria Thereza de Assis Moura, que votou pela competência do TJAL.
Entendimento
Um dos magistrados que aderiram a esta linha foi o ministro Jorge Mussi. Para ele, a utilidade prática das normas de reprodução é muito restrita, já que, pela própria natureza da matéria, mesmo se não constassem das constituições locais, as normas poderiam ser aplicadas diretamente pela Constituição Federal.
De acordo com o artigo 27, parágrafo 1º, da Constituição Federal, garante-se aos deputados estaduais o mesmo tratamento dispensado aos federais, no que se refere a sistema eleitoral, imunidades, inviolabilidades, remuneração, perda de mandato, licenças, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.
Assim, trata-se de norma que impõe uma atuação positiva do constituinte decorrente no sentido de dispor aos membros do legislativo estadual, especificamente a estes temas mencionados, a mesma disciplina conferida aos seus pares do legislativo federal, assinalou o ministro Mussi.
A Seção decidiu também que os demais réus do processo deverão ser julgados pelo Tribunal do Júri do local dos fatos.
6 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.
Não entendo porque não aplicaram a súmula Vinculante 45 STF
Súmula Vinculante 45
A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual. continuar lendo
Pois é também não entendi porque não aplicaram... continuar lendo
Olá Rogeria.
Posso estar enganado, mas vamos lá.
Como é cediço, o Art. 27, § 1º da Constituição Federal de 1988 estende aos Deputados Estaduais o estatuto dos congressistas. Vejamos:
Art. 27, § 1º - Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando- sê-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.
Segundo o atual entendimento do STF, a expressão "imunidades" abrange tanto as imunidades formais quanto o foro por prerrogativa de função dos parlamentares federais, enquanto a expressão "inviolabilidade" engloba as imunidades materiais destes congressistas.
Pois bem. Como disse acima, nossa Suprema Corte entende que, ao teor dos disposto no Art. 27, § 1º, aplicam-se aos parlamentares estaduais, de forma integral e imediata, as regras sobre as inviolabilidades e imunidades (mutatis mutandis) da Constituição Federal aos parlamentares federais (STF - ADIs 5.823 MC/RN; 5.824 MC/RJ e 5.825/MT (Julgamento: 8/5/2019).
Perceba que, em relação ao foro por prerrogativa de função, se o entendimento do Supremo Tribunal Federal se mantiver no sentido dele estar inserido no termo “imunidade formal”, tal prerrogativa estará expressamente prevista na Constituição Federal e por isso será extensível às Constituições Estaduais, possibilitando assim que o parlamentar estadual passe a usufruir de tal prerrogativa, de modo que a S.V 45 nao lhe seria aplicável. Entretanto, se a Suprema Corte mudar seu entendimento e passar a entender que a palavra “imunidade formal” não abrange o foro por prerrogativa de função, tal parlamentar estadual só teria aquela "foro" se a Constituição Estadual de seu Estado estabelecesse, vez que o Art. 27 da Constituição Federal em nenhum momento dispõe expressamente acerca dessa prerrogativa.
Todavia, o Supremo Tribunal Federal (ADI 2.553), entende que as Constituições Estaduais não podem, nem por simetria à Constituição Federal, prever foro por prerrogativa de função aos parlamentares estaduais, tendo visto tal prerrogativa ser exceção e não regra. Ou seja, nessa hipótese os parlamentares estaduais não teriam tais prerrogativas e estariam submetidos as instâncias ordinárias.
O cerne da questão é saber a abrangência do termo "imunidades" para então se concluir se tal prerrogativa está ou nao está disposta na CF. Caso esteja, nao há o pq aplicar a SV 45, pois o julgamento destes cidadãos ocorreria, por simetria, em juízo distinto, entendeu?
Ao meu ver o STJ adotou essa linha de raciocínio, porém caso tenha falado algo errado peço que alguém gentilmente me oriente.
Em todo caso, forte abraço. continuar lendo
Ora, não aplicou porque a súmula diz que "a competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido EXCLUSIVAMENTE pela Constituição Estadual". Como é de notar, o foro por prerrogativa neste caso é previsto tanto na Constituição estatual quanto na Constituição federal, razão por que não se aplica a súmula. Embora fosse possível adotar uma linha semelhante de raciocínio, há um 'distinguishing' que limita a aplicação do precedente. continuar lendo
Não colegas Gabriel e Bruno... A Constituição Federal está acima da Estadual e por isso mesmo se aplicaria a súmula vinculante 45. continuar lendo
Sim Rogéria, eu entendi sua alinha de raciocínio! O que quis explanar é que, NESSE CASO, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o termo "imunidades" previsto no § 1º do Art. 27 abrange a prerrogativa de função, e por consequência, a previsão para o Dep. Estaduais se daria em razão da própria Constituição em si, ou seja, a Constituição estaria prevendo essa prerrogativa, e em homenagem ao princípio da especialidade (assim como ocorre no caso do júri) prevaleceria a regra do Art. 27. Entendeu? Em suma, a previsão estaria contida na própria CF e não em Cartas Estaduais.
Lembro que o tema é polêmico, e o que expliquei acima é apenas um posicionamento, que por vezes vem sendo adotado por algumas bancas.
Para voce entender a motivação desse entendimento, vale a pena dar uma olhada no famoso caso "Daudt" (o julgamento do século).
Repiso, a grande maioria da doutrina entende no sentido que você vem sustentando, quanto a isso não há dúvidas! Inclusive trago a lição do Prof. PEDRO LENZA nesse sentido:
“A partir do silêncio eloquente sobre a prerrogativa de foro no Art. 27, § 1.º, CF/88 (que manda aplicar aos parlamentares estaduais as regras sobre imunidades previstas para os parlamentares federais, não falando nada sobre foro), tem razão ao afirmar que a competência para legislar sobre direito processual é da União e não dos Estados e do DF, sustentando, assim, a inconstitucionalidade dessas disposições.”
O que eu tentei explicar foi a "ratio" da decisão colacionada nesse texto e o pq de não ter sido adotada o enunciado mencionado por você!
Enfim, espero que tenha entendido os "porquês" e em caso de dúvida quanto ao que eu quis dizer, me contate. Forte abraço. continuar lendo