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6 de Maio de 2024

Visita a presídios expõe mulheres e crianças a revistas vexatórias

Prática é condenada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que considera a revista da genitália feminina uma forma de violência contra a mulher. Projeto de lei tenta pôr fim à prática

Publicado por Fernanda Favorito
há 9 anos

Por Alessandra Mello

Elas chegam bem cedo. Algumas passam a noite na fila para garantir as cobiçadas primeiras senhas de entrada que dão direito a mais tempo ao lado do detento e também privacidade. Pouco antes do horário do início da visita nos presídios de Ribeirão da Neves, cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte que abriga seis unidades de privação de liberdade, começam os preparativos. Muitas se perfumam, passam batom, maquiagem e escovam o cabelo. Outras ajeitam a meninada, sempre presente nos dias de visita.

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Quem vê de longe o burburinho da fila e a ansiedade dessas mulheres e crianças, todas carregando sacolas lotadas de comida e utensílios de higiene pessoal, muitas vezes nem imagina o constrangimento a que todas são submetidas na hora de visitar um parente preso. Elas são revistadas nuas, algumas vezes conjuntamente, são submetidas a inspeções em cavidades corporais e obrigadas a fazer esforços físicos independentemente da idade e da saúde. Essa é a realidade de maioria absoluta das revistas vexatórias e humilhantes a que são submetidas as pessoas – na maioria absoluta, mulheres e crianças – que visitam detentos em todo o sistema prisional brasileiro. Prática condenada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que considera esse procedimento, principalmente em caso de revista da genitália feminina, uma forma de violência contra a mulher. Mesma posição adotada pela Organização dos Estados Americanos (OEA), que considera a revista uma violação aos direitos fundamentais e às garantias do homem.

Em setembro deste ano, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária editou uma resolução normatizando a revista para abolir procedimentos agressivos e humilhantes e determinando que ela preserve a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada. Ela também determina que a revista seja realizada por meio de aparelhos eletrônicos (detectores de metal, raio-x e scanner corporal) e veda todo procedimento degradante, como inspeções que exijam o desnudamento do visitante, parcial ou totalmente, introdução de objetos em cavidades corporais, uso de cães farejadores, agachamentos ou saltos.

O Congresso Nacional também trabalha para abolir essa prática. Um projeto de lei nesse sentido foi aprovado no Senado e está sendo analisado agora pela Câmara dos Deputados, onde recebeu parecer favorável da Comissão de Direitos Humanos. Em alguns estados, esse procedimento já foi proibido, mas as normas nunca saíram do papel. Parecer do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB) sobre os projetos de lei do Congresso que defendem o fim da revista vexatória afirma que, apesar de esse procedimento já ter sido proibido por meio de leis e resoluções em pelo menos 10 estados, ele continua em vigor.

É o caso de Minas Gerais, terceira maior população carcerária do Brasil, onde uma lei determina a preservação da dignidade do visitante na hora da revista. “A Lei Estadual 12.492, criada em 1997 em nosso estado para acabar com a revista íntima abusiva realizada nos visitantes de pessoas reclusas, nunca foi cumprida. Ao contrário, a prática dessa revista íntima conhecida como revista vexatória foi e é amplamente aplicada nos estabelecimentos prisionais de Minas, expondo pessoas, principalmente mulheres idosas e, muitas vezes, jovens e crianças a situações degradantes e humilhantes”, afirma Massimiliano Russo, advogado da Pastoral Carcerária. No Rio de Janeiro a revista vexatória também foi proibida, mas, de acordo com a Organização Rede Justiça Criminal, continua sendo praticada indiscriminadamente.

Regra

O defensor público Guilherme Rocha de Freitas, da Defensoria das Execuções Penais em Ribeirão das Neves, afirma que mesmo nos estados em que já há legislação desestimulando a realização de revistas íntimas, sempre vexatórias, ainda perdura a regra de exigir que os visitantes submetam-se a esses procedimentos. “Essa é a realidade em Minas Gerais, que ainda mantém as revistas íntimas como regra, ante a falta de condições materiais para aparelhar todas as unidades prisionais com os instrumentos adequados”. Segundo ele, não é raro receber na Defensoria Pública notícias de familiares que revelam ter deixado de visitar seus parentes porque não suportam a humilhação e o desconforto que envolve todo o processo de revista.

O defensor afirma que esse tipo de procedimento não é eficaz no combate à entrada de objetos ilegais e drogas nos presídios. Estudo realizado pelo Núcleo Especializado em Situação Carcerária e da Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública de São Paulo, estado com o maior número de pessoas privadas de liberdade, revelam que durante revistas íntimas realizadas no ano de 2012 em apenas 0,013% foram encontrados celulares e em 0,01% foram localizadas drogas. Em Minas Gerais os números também não são muitos diferentes de São Paulo. Ano passado, a média mensal de visitas nas maiores unidades prisionais do estado foi de 73.685 pessoas, sendo que ao longo de todo ano foram registradas 35 apreensões de celular e 68 de drogas.

Revistas sem sentido

» Em Minas, durante o ano de 2013, a média mensal de visitas nas maiores unidades prisionais do estado foi de 73.685 pessoas, sendo que ao longo do ano foram registradas 35 apreensões de celular e 68 de drogas.

» Em São Paulo, em 2012, em apenas 0,013% das visitas em unidades prisionais do estado, que tem o maior número de pessoas privadas de liberdade, foram encontrados celulares e em 0,01% foram localizadas drogas

Fonte: Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos de Minas Gerais/Suapi e Núcleo Especializado em Situação Carcerária e Defensoria Pública de São Paulo

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18 Comentários

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E como explicar os vários casos onde mulheres passam aos presos drogas e celulares? Inclusive advogados? Sou a favor da revista íntima sim, apesar do constrangimento. Mas pensem assim: se com a revista já está entrando drogas e objetos, imagina sem?? Tem preso que comanda boca e marginais de dentro da cadeia pessoal. A realidade é essa. continuar lendo

Tem coisas que só no Brasil!

O bandido é preso - finalmente - e o Estado tem que fazer de conta que ele é o mais sacrossanto dos indivíduos.

Perai pô. Já defendi aqui, esse é o ônus de quem se empreita na vida do crime. Tá achando ruim, simples, PARE DE COMETER CRIMES!!!

Pior é para a família vítima do increpado que, na maioria dos casos, tem que conviver, PARA SEMPRE, na dor da ausência do ente querido. Pergunta para a mãe de uma das vítimas desses vagabundos se ela se submeteria a uma revista íntima DIÁRIA para ter seu filho ou companheiro de volta. Te asseguro que todas, sem exceção, aceitariam imediatamente esse "desconforto".

Mas o pior é creditar o sucesso dessa revista íntima - tanto que a própria matéria já relata que são ínfimos os casos de pessoas que tentam entrar no presídio com algo - com a necessidade de extinguir o procedimento. Veja bem, os próprios dados da matéria são suficientes para EMBASAR a mantença do procedimento de revista íntima.

É dizer, se são ínfimos os casos de pessoas tentando entrar no presídio, É PORQUE O PROCEDIMENTO FUNCIONA!!! Entendeu ou quer que desenhe?

E vamos ser sincero, eu labuto da área penal e penitenciária e posso te assegurar, pelo menos na região em que atuo, que não existe um (a) só agente da SUAPI que ame esse procedimento. Ninguém queria passar por isso, mas É CONSEQUENCIA DO ATO DO VAGABUNDO! No máximo, vale a pena passar pelo expediente pelo que eles ganham do bolsa bandido.

Esses familiares que estão DESCONFORTADOS com a revista intima deveriam visitar a família da vítima desse mesmo parente para ver o que é desconforto.

Claro que substituir os métodos por meios eletrônicos seria louvável, mas o fato é que, tais instrumentos não garantem, como é a revista íntima, de 100% de confiabilidade. E mais! Alguns desses instrumentos são caríssimos e, ao menos, a revista íntima deveria permanecer até que o procedimento adequasse aos padrões financeiros brasileiros e que tivessem a confiabilidade similar da revista íntima.

Tá duvidando, faça o teste: pergunte para esses imaculados familiares dos presos se eles aceitariam trocar seu bolsa bandido para patrocinar a aquisição desses aparelhos? KKKK, já sabem a resposta né?

Porém, aqui é Brasil, um lugar onde o Che é herói, analfabeto funcional e terrorista são presidentes e democratizar a internet significa censura, evidente que a revista íntima será vetada. continuar lendo

Concordo em gênero, número e grau aqui no Brasil os valores são invertidos facilmente com meia duzia de palavras.

O cara é um criminoso, mata, rouba, estupra, trafica etc... mas seus advogados que ganham bem e muito bem para defendê-los fazem seu papel, até ai tudo bem, mas o cara é condenado e eles vem depois tentar convencer a todos de que os caras são vítimas, e abrandar a situação deles depois de presos. é por isso que os presídios estão lotados de droga, celulares e armas, é por isso que tem criminoso comandado suas quadrilhas de dentro da cadeia, até quando Brasil até quando? continuar lendo

O então Secretário de Segurança do RS, Desembargados aposentado José Paulo Bisol, no final dos anos 90 defendia essa bandeira. Foi duramente perseguido pela mídia burguesa gaúcha e criticado pelo senso comum. Teve a coragem de acabar com esse abuso cometido contra as mulheres. Em pleno século XXI, milhares de mulheres nesse Brasil afora ainda são submetidos a esses métodos medievais de busca pessoal. Mudanças já! continuar lendo

Fernanda,
Gostaria de saber se as Juizas, Promotoras de Justiça, Advogadas, também são submetidas a este tipo de averiguação ao ingressarem nos presídios brasileiros. continuar lendo