TJ-GO - XXXXX20168090123
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE MAUS TRATOS. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. SENTENÇA MANTIDA. 1. O Ministério Público ofereceu denúncia por ocasião da audiência preliminar (evento 8) imputando ao apelado a prática do crime previsto no art. 32 , § 1º da Lei de Crimes Ambientais . A sentença proferida no evento 8 deixou de receber a denúncia ofertada com fundamento na atipicidade da conduta, face ao princípio da taxatividade e falta de justa causa para o exercício da ação penal, ante a ausência de materialidade, pois a prova juntada nos autos foi obtida de forma ilícita. Irresignado com a decisão de rejeição da denúncia, o Ministério Público interpôs a presente apelação no evento 18 onde fala sobre os requisitos para a configuração do crime de maus tratos, aduz que a ausência de fornecimento de cuidados básicos é suficiente para caracterizar o crime e bate pela presença de justa causa para o exercício da ação penal. Contrarrazões no evento 23. Parecer Ministerial juntado aos autos no evento 30. 2. Conheço do recurso, pois cabível, adequado e tempestivo. Além disso, não há fato impeditivo ? renúncia ou preclusão ? ou extintivo ? desistência ou deserção ?, sendo formalmente regular. Presentes, também, os requisitos subjetivos de admissibilidade, quais sejam, a legitimidade e o interesse recursal. 3. Maus tratos significa dolosamente maltratar, infligir sofrimento deliberadamente. Não se enquadra na conduta, por certo, aquele que deixa de tratar animal ?bem?, ou de acordo com padrão ou social aceitável, como aquele que decorre da própria condição econômica e social do agente. Vale lembrar que a conduta imputada é omissiva e o delito só se configura por comissão, isto é, que a acusada tenha dolosamente, lhe sendo possível outra conduta, de subministrar alimentos suficientes aos cães, de forma consciente, obtendo daí o resultado de ?maus tratos?. Pedindo a devida vênia, adoto como razões de decidir a decisão de lavra do Juiz de Direito, Dr. Gabriel Consigliero Lessa , que bem a questão trazida aos autos, a qual agrego ao presente voto como razão de decidir: ?O simples porte físico dos animais não é bastante para desvelar os maus-tratos. Ao revés, o estado débil do cachorro não é, seguramente, fruto apenas do breve interstício em que estiveram com o denunciado, mas sim de situação que se perpetua em médio tempo, afora diversos outros fatores ? inclusive metabólicos ? que podem contribuir para esse episódio. Igualmente, apenas por força argumentativa, não é crível intuir que cachorros estejam muitos dias sem alimentação apenas por comerem a comida oferecida. Nada foi produzido acerca do estado de desnutrição dos animais. Decerto, é do conhecimento vulgar que, mesmo para animais bem tratados, o oferecimento de comida causa voracidade em qualquer canino, notadamente os que viveram/vivem na rua. Outra conclusão lógica, é que, pelas fotografias anexadas, apenas um animal estava amarrado. A experiência comum inclina-se pela conclusão óbvia de que a presença dos demais animais soltos decorria do fato de existir alimento no local, pois a espécie canina, acostumada na vida rural, não refugiam-se onde não exista alimento, somada a total lacuna probatória da propriedade dos demais animais soltos, que podem ingressar na propriedade rural por diversos motivos, inclusive é plausível que tenham ingressado para se alimentar das galinhas do denunciado, conforme narrou em seu interrogatório policial (acima sublinhado). Por derradeiro, não há vestígio algum de que o animal da fotografia coligida ao evento 7, arquivo 1, tenha falecido ? não foi apreendido o animal nem há qualquer linha probatória de sua morte ou de maus-tratos; se isso ocorreu, sequer há comprovação do motivo ou mesmo a materialidade.? 4. Assim, é possível verificar que não consta do caderno processual qualquer prova de sinalize a materialidade do crime, nem tampouco preocupou-se a acusação em trazer à juízo comprovação mínima das condições econômicas da acusada. 5. Como bem salientado pelo decisor singular, o fato de os cães estarem magros e/ou desnutridos, por si só, não revela a ocorrência de maus tratos, até mesmo porque tais condições podem decorrer de inúmeros fatores, dentre eles a própria situação econômica e social da acusada ? supondo que a ré não possua condições de propiciar adequada alimentação para si e seus familiares, vindo estes a apresentarem o estereótipo físico de indivíduos magros, muito provavelmente em idêntica condição estarão seus animais, sem que com isto se esteja a cogitar da incidência do tipo penal descrito no art. 32 da Lei 9.605 /98. 6. Daí que, não se vislumbrando nos autos indícios suficientes de autoria da omissão penalmente relevante na conduta imputada à acusada, penso ser o caso de negar provimento ao recurso ministerial, mantendo a decisão de primeiro grau por seus próprios fundamentos.