Página 963 do Diário de Justiça do Estado de Pernambuco (DJPE) de 30 de Outubro de 2014

importância para a atribuição de responsabilidade civil do Estado (...) O Estado causa danos a particulares por ação ou por omissão. Quando o fato administrativo é comissivo, podem ser gerados por conduta culposa ou não. A responsabilidade objetiva do Estado se dará pela presença dos seus pressupostos - o fato administrativo, o dano e o nexo causal"(in Manual de Direito Administrativo, 14ª ed., Lúmen Júris Editora, 2005, p. 448 e p. 454). E continua:"O fato de ser o Estado sujeito à teoria da responsabilidade objetiva não vai ao extremo de lhe ser atribuído o dever de reparação de prejuízos em razão de tudo o que acontece no meio social. É essa a razão do repúdio à denominada teoria do risco integral, que, como já vimos, é injusta, absurda e inadmissível no direito moderno. Para que se configure a responsabilidade do Estado, é necessário que seja verificado o comportamento do lesado no episódio que lhe provocou o dano. Se o lesado em nada contribuiu para o dano que lhe causou a conduta estatal, é apenas o Estado que deve ser civilmente responsável e obrigado a reparar o dano. Entretanto, pode ocorrer que o lesado tenha sido o único causador de seu próprio dano, ou que ao menos tenha contribuído de alguma forma para que o dano tivesse surgido. No primeiro caso, a hipótese é de autolesão, não tendo o Estado qualquer responsabilidade civil, eis que faltantes os pressupostos do fato administrativo e da relação de causalidade. O efeito danoso, em tal situação, deve ser atribuído exclusivamente àquele que causou o dano a si mesmo"(ob. cit., pág. 449) Das lições doutrinárias transcritas, resta cristalino que para a configuração da responsabilidade do Estado, aí incluída as empresas de direito privado quando prestando serviços públicos contratados por licitação, necessário se faz a comprovação do dano, do fato administrativo e do nexo de causalidade. E essa responsabilidade será afastada nas hipóteses de: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior ou fato de terceiro, cuja incumbência de provar é da concessionária do serviço público (art. 333, II, do CPC). Destarte, a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova da culpa da Administração, quanto aos danos causados por seus agentes a terceiro, permite que o Poder Público demonstre a culpa da vítima, para excluir ou atenuar a indenização. Isto porque o risco administrativo não chega ao extremo do risco integral, não significando que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular. Significa apenas e tão-somente que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximirá integral ou parcialmente da indenização" (RT 677/138). No caso presente, está demonstrado o evento danoso atrelado à empresa de transporte. De fato, Luiz Rodrigues dos Santos morreu (vide certidão de óbito de fl. 23) e esta morte teve por causa politraumatismo decorrente de acidente de trânsito (perícia tanatoscópica de fl. 30), em que se envolveram a bicicleta da vítima e o ônibus da ré (fato incontroverso). A demandada, porém, sustenta em sua defesa a culpa exclusiva da vítima no evento. Sustenta que o pai dos autores, de forma imprudente, transitava em uma via movimentada pela contramão de direção. Realmente, resta demonstrado nos autos que a vítima conduzia a bicicleta na contramão. A própria inicial narra que os veículos vinham em sentido contrário. E as testemunhas corroboram essa tese. Sobre o trafego de ciclistas, estabelece o Código de Trânsito Brasileiro: "Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores. Parágrafo único. A autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via poderá autorizar a circulação de bicicletas no sentido contrário ao fluxo dos veículos automotores, desde que dotado o trecho com ciclofaixa." Arnaldo Rizzardo, comentando o indigitado artigo, afirma: "A circulação de bicicletas mereceu atenção particular no novo Código, pois correm grandes riscos ao transitarem nas vias públicas, em virtude de constituírem-se veículos de tração humana e de grande fragilidade, pouca perceptividade e a baixa velocidade que desenvolvem. São utilizados como meio de transporte, sendo muito comum o uso para passeios ou para diversão de crianças. O conveniente é que circulem em locais apropriados e que ofereçam segurança (...). No caso de não haver ciclovia, ciclofaixa ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes equipamentos, a circulação nas vias urbanas e rurais de pista dupla ocorrerá nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, onde advirá mais segurança devido ao pouco espaço ocupado na pista, sem obstruir exageradamente o trânsito do demais veículos. Como se trata de veículo transitando em via pública, também se sujeita a bicicleta à obediência do sentido de circulação regulamentado para a via. Nas hipóteses de locais ou situações que não possibilitem o trânsito conjunto, as bicicletas terão preferência de passagem sobre os veículos automotores, justamente por apresentarem-se mais frágeis e sujeitas a acidentes com maior gravidade." Dessa feita, poderia o autor trafegar pela via de rolamento desde que o fizesse no mesmo sentido da circulação, o que não ocorreu. A lei não contempla a utilização dessas bordos, em sentido contrário, por bicicletas, em confronto ao fluxo de veículos. É uma prática perigosa e de risco inevitável, ante a imprevisibilidade, haja vista que as velocidades permitidas vão de 60 a 80 km. Advirto que não há notícia de que no local existisse uma ciclofaixa, situação que poderia autorizar a circulação da bicicleta em sentido contrário ao fluxo dos veículos, sendo de se alertar para a diferença entre ciclofaixas, ciclovias e acostamento. A ciclofaixa consiste na parte da pista de rolamento destinada à circulação exclusiva de ciclos, delimitada por sinalização específica. A ciclovia é a pista própria destinada à circulação de ciclos, separada fisicamente do tráfego comum. E o acostamento é a parte da via diferenciada da pista de rolamento destinada à parada ou estacionamento de veículos, em caso de emergência, e à circulação de pedestres e bicicletas, quando não houver local apropriado para esse fim (in http://www.detran.pe.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=236&Itemid=8, em 15/10/2014). Assim, entendo que o pai dos autores foi quem deu causa ao acidente, estando configurada a sua culpa exclusiva, que afasta o dever de indenizar do suplicado. Conduzia sua bicicleta em local de grande movimentação de veículos e na contramão de direção, se sujeitando ao infortúnio. A testemunha Miriam Rosa da Silva, inclusive, que estava no coletivo, disse que "foi a bicicleta que atingiu o veículo" (fl. 157). Inexiste nos autos, ademais, qualquer elemento de prova que indique ter o motorista do ônibus desrespeitado qualquer regra de trânsito. A mera alegação de excesso de velocidade, sem prova a respeito, de nada serve. Também não há provas de que foi imprudente ou de que tenha desviado sua trajetória e avançado em direção à vítima, que, aparentemente, se distanciou indevidamente do meio-fio, tanto que colidiu com a frente do ônibus. Diante deste panorama, tem-se que a causa primária do evento fatídico foi a conduta da vítima, que conduzia a bicicleta inapropriadamente, na contramão de direção, impossibilitando o motorista do ônibus de desviar a tempo. Esta é a dinâmica do acidente demonstrada nos autos. Acrescente-se que, segundo as testemunhas, o motorista do coletivo ainda buzinou e tentou frear, o que revela ter ele agido com os cuidados que eram exigidos na sua profissão. Destarte, não obstante ser objetiva a responsabilidade da empresa concessionária de serviço público de transporte coletivo, não há que se obrigá-la a indenizar, quando inexistente o liame entre a conduta do seu preposto na condução do veículo automotor e o resultado danoso, como ocorre na hipotese presente, a revelar, na realidade, culpa exclusiva da vítima, não se devendo cogitar da responsabilidade da empresa ré tão-somente pelo porte dos veículos (§ 2º, do art. 29 do CTB). Colho alguns julgados sobre o tema:Civil. Responsabilidade civil subjetiva. Acidente de trânsito envolvendo caminhão e ciclista. Sentença de procedência da qual ambas as partes recorrem. Hipótese que retrata culpa exclusiva da vítima, que pedalava na contramão de direção e observou que o caminhão ingressava na pista de rolamento. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores. Artigo 58 do Código de Trânsito Brasileiro. Sentença reformada. Segundo recurso provido, prejudicado o primeiro apelo. (TJ-RJ - APL: 00103566720108190206 RJ 001XXXX-67.2010.8.19.0206, Relator: DES. MARCO ANTONIO IBRAHIM, Data de Julgamento: 01/08/2012, VIGÉSIMA CÂMARA CIVEL, Data de Publicação: 28/11/2012 14:37) Apelação Cível. Ação Indenizatória. Acidente envolvendo bicicleta e ônibus. Alegação de culpa exclusiva da vítima. A vítima confessou que transitava na contramão e, portanto, contrariando as regras de circulação previstas no Código Trânsito, afastando a regra de responsabilidade dos veículos maiores quanto à segurança dos menores. Inteligência dos artigos 29 e 96 do CNT. Exclusão do nexo causal. Desprovimento do recurso principal. Recurso adesivo a que se dá provimento. (TJ-RJ - APL: 200800159380 RJ 2XXX.001.5XX80, Relator: JDS. DES. CRISTINA SERRA FEIJO, Data de Julgamento: 04/02/2009, VIGESIMA CÂMARA CIVEL, Data de Publicação: 13/02/2009) EMENTA: ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - MANOBRA ABRUPTA DO CICLISTA - CAUSA DETERMINANTE DO ACIDENTE - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE - IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. Pela teoria da responsabilidade objetiva a obrigação de indenizar decorre da simples comprovação do dano ou prejuízo e do nexo de causalidade entre ele e a conduta do agente. A culpa deste é elemento subjetivo, não sendo essencial para a sua responsabilização. Em conseqüência, além do caso fortuito e da força maior, somente a culpa da vítima, parcial ou total, reduziria ou excluiria, conforme a hipótese, a responsabilidade da Administração Pública ou da prestadora de serviço público (cf. a propósito, Hely

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