A Aplicação do Dolo Eventual nos Crimes de Trânsito
A APLICAÇÃO DO DOLO EVENTUAL NOS CRIMES DE TRÂNSITO:
COM RESULTADO MORTE
Leonardo Laurindo Monteiro
RESUMO
Este artigo tem como objetivo geral a análise da aplicação do dolo eventual nos crimes de trânsito que resultem em morte, como também explorar o tipo do dolo eventual neste respectivo crime. Demonstra uma forma adequada de evitar que a parte frágil, no caso o pedestre possa ser prejudicado, e por isso, sugere a exigência de punições mais severas como resposta imediata.
O grande interesse do artigo deu-se pelo fato de que muitos dos crimes cometidos no trânsito, apesar do condutor estar embriagado ou praticando “rachas” em via pública, não são punidos com tanta severidade.
Na intenção de evitar esse o crescimento desse crime, a lei brasileira vem buscando aumentar a pena para aqueles que sob influência do álcool ou outro produto entorpecente venha causar lesão à terceiro. Apesar dessa iniciativa legislativa, é discutível a subjetividade da aplicação da pena, e não a pena imposta a esse crime.
Os tribunais brasileiros estão sendo mais rigorosos na questão do dolo eventual, entendendo que o condutor estando embriagado ou praticando rachas, terá agido com dolo eventual, pois nesse momento assume o risco que poderia matar alguém, e nesse caso serão submetidos à julgamento perante o tribunal do júri.
Palavras-chave: Dolo Eventual. Crime de Trânsito. CTB. Jurisprudência.
ABSTRACT
This article has the general objective of analyzing the application of eventual intent in traffic crimes that result in death, as well as exploring the type of eventual intent in this respective crime. It demonstrates an adequate way to avoid that the fragile part, in case the pedestrian can be harmed, and therefore, suggests the requirement of more severe punishments as an immediate response.
The great interest of the article was due to the fact that many of the crimes committed in traffic, despite the driver being drunk or practicing “cracks” on public roads, are not punished with such severity.
In order to prevent the growth of this crime, Brazilian law has sought to increase the penalty for those who, under the influence of alcohol or other narcotic products, cause injury to a third party. Despite this legislative initiative, the subjectivity of the application of the penalty, and not the penalty imposed for this crime, is debatable.
The Brazilian courts are being stricter on the issue of eventual intent, understanding that the driver, being drunk or practicing racing, will have acted with eventual intent, because at that moment he assumes the risk that could kill someone, and in that case they will be submitted to trial before the court of the jury.
Keywords: Possible deceit. Traffic Crime. CTB. Jurisprudence.
INTRODUÇÃO
O dolo eventual é tipificado quando a pessoa é capaz de prevê o resultado como provável ou, ao menos, como possível, mas apesar de prevê-lo age aceitando o risco de produzi-lo. Desse modo, para o sujeito infrator ser punido nesta modalidade de dolo é necessária uma investigação de seu estado de ânimo, de sua subjetividade, exige-se, nestes casos, que ele tenha assumido o risco de produzir os resultados lesivos.
Atualmente, a jurisprudência tem adotado a teoria do dolo eventual nos delitos provocados por indivíduo embriagado na condução de veículo automotor, já que entende que, ao ingerir bebida alcoólica, o agente assume o risco de produzir o resultado.
A respeito disso, além da embriaguez ao volante, deve ser analisado se está presente alguma outra circunstância hábil para demonstrar que o agente assumiu o risco de causar o resultado, como por exemplo, da direção em contramão e da alta velocidade.
Este artigo tem como objetivo geral a análise da aplicação do dolo eventual nos crimes de trânsito que resultem em morte.
A embriaguez na condução de veículo automotor, nos dias de hoje, é um dos maiores causadores de violência no trânsito e diariamente responsável por milhares de mortes. Por esta razão, existe um enorme debate na questão dos crimes de trânsito, particularmente na modalidade do dolo eventual é essencial para o raciocínio do assunto que alcança todos, indistintamente, enquanto sociedade.
Atualmente, um dos maiores causadores de violência é o trânsito, em todos os dias é responsável por milhares de mortes. De acordo com dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), o Brasil é o país com maior número de mortes de trânsito por habitantes da América do Sul, mesmo sendo o país que mais aplica leis de controle de risco. A aplicação do dolo eventual em acidentes de trânsito com resultado morte é um tema problemático na jurisdição brasileira, uma vez que não existe lei exclusiva sobre o tema.
Ocorre, porém que não são todos que compreendem essa lei e suas complexas formulações, e o direito vem buscando sanar esses detalhes para que se faça uma justiça com segurança e não apenas um demonstrativo de força para a sociedade, que, impaciente, exige aquilo que a lei não permite.
O dolo eventual é bastante complexo uma vez que a decisão sobre imputar ou não ao crime doloso depende de fatores psicológicos do praticante da infração.
O Brasil é 4º país do mundo com maior número de mortes no trânsito, perdendo em números tão somente para a China, a Índia e a Nigéria, e é sabido e consabido que, muito mais importante do que a aplicação mais rigorosa das penalidades que recaem sobre os condutores de veículos automotores, é necessário uma reformulação significativa no que toca a educação básica no trânsito, tal providência, que uma vez levada a sério pelos governantes, certamente irá reduzir substancialmente as tragédias que no dia a dia ocorrem nas avenidas e demais vias públicas da nação.
O DOLO EVENTUAL
Na figura do crime de trânsito na modalidade do dolo eventual, o agente assume o risco de cometer um crime que, embora não seja inicialmente desejado, é previsível e por ele, agente, aceito, por absoluta indiferença quanto à produção do resultado.
Neste caso, o agente não deseja, inicialmente, matar alguém. Porém, na condução de seu veículo, o agente apresenta ter plena consciência de que, agindo desse modo, poderá causar a morte de alguém (previsibilidade). E, quando opta por prosseguir com sua conduta, acaba demonstrando sua completa indiferença quanto à possibilidade de produzir o resultado morte, resumindo, ele age com dolo eventual.
DEFINIÇÃO CTB
O Código de Trânsito Brasileiro define em seu art. 302 sobre o homicídio causado pelo agente infrator:
Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veiculo automotor:
Penas: detenção, de dois a quatro anos, e suspenção ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veiculo automotor.
É o caso do motorista que conduz em velocidade incompatível com o local e realizando manobras arriscadas. Mesmo prevendo que pode perder o controle do veiculo, atropelar e matar alguém, não se importa, pois é melhor correr esse risco do que interromper o prazer de dirigir (“não quero, mas se acontecer, tanto faz”). É também o caso da pessoa que, em desabalada corrida para chegar a determinado ponto, aceita de antemão o resultado de atropelar uma pessoa.
Nelson Hungria lembra a formula de Frank para explicar o dolo eventual:
“Seja como for, dê no que der, em qualquer caso não deixo de agir”.
De fato, observa-se que age também com o dolo eventual o agente que, na dúvida a respeito de um dos elementos do tipo, arrisca-se em concretizá-lo.
São também casos de dolo eventual: praticar roleta russa, acionando o revólver por várias vezes carregando com um cartucho só e apontando-o sucessivamente contra outra pessoa, para testar sua sorte, e participar de inaceitável disputa automobilística realizada em via pública (racha), ocasionando morte.
No direito, existem certos tipos penais que não admitem o dolo eventual, pois a descrição da conduta impõe um conhecimento especial da circunstância, por exemplo, ser a coisa produto de crime, no delito de receptação.
JURISPRUDÊNCIA
Alguns tribunais já adotaram esse instituto. No caso abaixo, o agente dirigia um ônibus e havia ingerido bebida alcoólica, quando, na contramão, colidiu com um carro e matou quatro dos cinco ocupantes, sendo todos da mesma família. O TJMG entendeu pelo dolo eventual:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO NO TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. O dolo eventual caracteriza-se pela vontade do agente de realizar a conduta, pela consciência da conduta e do nexo causal. O agente não quer diretamente o resultado, mas aceita a possibilidade de produzi-lo ou não se importa em produzir este ou aquele resultado. O fato de não ter habilitação, estar sob efeito de álcool, dirigir em alta velocidade e na contramão de direção indicam que o agente assumiu o risco de produzir o resultado morte.
Aline de Alencar Porto Carvalho defende o entendimento de que para ser aplicado o “dolo eventual” nos delitos de trânsito, é necessário um número maior de elementos comprobatórios, não se apegando apenas ao fato do motorista dirigir embriagado, onde oferece maior possibilidade argumentativa para esses casos.
Na opinião de Fernando Galvão, a existência de dolo eventual, quando comprovado que o motorista estava embriagado, deve ser rechaçada. Em sua concepção, a embriaguez juntamente com a alta velocidade apenas indica a inobservância e falta de cuidado. Esse autor acredita que, para ser caracterizado dolo eventual, é necessário comprovar uma postura psicológica, não podendo confundir o conhecimento do risco com a aceitação do mesmo. Neste mesmo sentido ele conclui:
Conhecer o risco não é a mesmo que aceitar o risco. Para responsabilização do motorista por dolo eventual é necessário comprovar não apenas que este conhecia o risco envolvido na condução do veículo como também que aceitou que o risco se transformasse em resultado materialmente lesivo (GALVÃO, 2013, p. 76).
O Supremo Tribunal Federal (STF) adota o seguinte posicionamento:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. MODALIDADE DE DOLO EVENTUAL. DESCLASSIFICAÇÃO DE CULPA CONSCIENTE. ANÁLISE PRÉVIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Havendo indícios mínimos que apontem para o elemento subjetivo descrito, tal qual a embriaguez ao volante, a alta velocidade e o acesso à via pela contramão, não há que se falar em imediata desclassificação para crime culposo antes da análise a ser perquirida pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. 2. O enfrentamento da questão acerca do elemento subjetivo do delito de homicídio demanda profunda análise fático-probatória, o que, nessa medida, é inalcançável em sede de Habeas Corpus. 3. Recurso desprovido. (STF – RHC: 178576 SP 0238268-24.2019.3.00.0000, Relator: MARCO AURÉLIO Data de Julgamento: 26/10/2020, Primeira Turma, Data de Publicação: 25/02/2021).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente concluiu uma análise na aplicabilidade nos crimes de trânsito na modalidade dolosa, o dolo eventual e em que casos são aplicados. Através do estudo confirma que também são dolosos os crimes cometidos na direção de veiculo automotor.
Os crimes de trânsito são uma das principais causas de mortes no Brasil. Muitos são os cidadãos que perdem a sua vida em decorrência de um acidente de trânsito. No caso de embriaguez, esses casos se tornam ainda mais frequentes.
O Brasil tem um grande número de veículos circulando em suas ruas, como também um grande número de pedestres que nesse convívio diário, acabam produzindo diversos acidentes, com constantes atropelamentos, acidentes graves envolvendo veículos, e destes acidentes, restam também vítimas com sérias sequelas.
O Direito Penal conhece o elemento que levou a conduta do agente, visto que o significado do elemento subjetivo reitor da conduta do sujeito incidirá na escolha da repreensão a ser adotada pelo Estado.
Não é somente através do Direito penal que os problemas que se encontram no trânsito brasileiro irão ser superados, pois não cabe exclusivamente ao Direito Penal, através de uma pena mais rigorosa conter a violência no trânsito. É necessária uma reeducação de forma geral no cidadão brasileiro, pois esse se mostra muitas vezes, inatingível, no sentido de não respeitar leis penais.
REFERÊNCIAS
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Geral. Vol. 1.16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal, Parte Geral. Editora Impetus. 15ª edição, 2011, p.47, 57, 72, 83 e 209.
https://www.migalhas.com.br/depeso/275525/o-dolo-eventual-nos-crimes-de-trânsito
PRADO, Luiz Regis, Curso de Direito Penal Brasileiro, editora Revista dos Tribunais, 12ª edição, 2012, p. 383.
OLIVEIRA, Frederico Abrahão de. Dolo e culpa nos delitos de trânsito. Porto Alegre: Sangra Luzzatto. 1997.
WUNDERLICH, Alexandre. O dolo eventual nos homicídios de trânsito: uma tentativa frustrada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
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