Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
2 de Maio de 2024

As características dos direitos fundamentais

Publicado por Flavia Araujo
há 8 anos

1. Fundamentalidade

Alguns direitos são considerados fundamentais sua relevância é tida como o primeiro aspecto em consideração, seja pelos valores neles integrados, ou por orientar no entendimento de normas jurídicas. À fundamentalidade dos direitos fundamentais são intrínsecos tanto o aspecto material quanto formal do direito e, portanto, encontram-se não só como o valor inserido na norma a partir de um consenso social, mas também como a norma em si. Sendo assim, os direitos fundamentais “tornam possível o processo democrático, sem o qual não poderiam, por sua vez, ser positivados e concretizados no espaço de um Estado constitucional constituído pelos direitos fundamentais” (JÜRGEN HABERMAS), ou seja, a norma deve exercer função social, e não pode ser tida como apenas palavras em uma folha de papel. É necessário que possua aplicabilidade e conteúdo.

A fundamentalidade deve basear-se na pessoa humana e em todos os seus aspectos, sejam eles físicos, psicológicos, emocionais, e outros, e permite que os direitos fundamentais possuam abstração quanto à sua definição e extensão, ou seja, os direitos fundamentais podem ser usados como fundamentação para a originar outros direitos na medida de cada caso concreto, independentes de estarem expressos na Constituição. "Se a fundamentalidade justifica a precedência dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico, por outro lado não há como sustentar a primazia abstrata de algum direito fundamental em relação a outro, ou seja, é inaceitável uma ordenação abstrata (hierarquia) entre os direitos fundamentais. Apenas a ponderação específica nos casos concretos indicará a preferência condicionada" (ROTHENBURG).

2. Universalidade e Internacionalização

Os direitos fundamentais, por estarem diretamente relacionados ao ser humano, sofrem constante alteração, pois o homem se transforma, e possui diferentes valores para diferentes períodos históricos, os direitos fundamentais devem acompanhar essa mudança, englobando cada nova necessidade que surge com cada modificação social. Por serem inerentes à condição humana, são universais, porém surgem de diferentes formas e em diferentes contextos. “A universalidade dos direitos faz referência a direitos universais, no sentido de racionais e válidos para todos os homens, porém situados em um contexto histórico ou geográfico...” (G. PECES-BARBA MARTINEZ).

O caráter universal dos direitos fundamentais não pode ser tido como uma forma de descaracterizar culturas ou minorias, mas como uma forma de zelar por essa diferentes identidades, conservando suas peculiaridades. É, então, uma forma de encontrar contrapontos nas diferenças sociais e estabelecendo o mínimo para que seja alcançada a dignidade humana.

A expansão dos direitos fundamentais, através da internacionalização, é cada vez mais frequente quanto à aplicação de sanções eficazes para o cumprimento do ordenamento jurídico, mas utilizando-se de diversas fontes, em uma "pluralidade de ordens jurídica", que estabelecem o aspecto contemporâneo do direito constitucional. "Forma-se uma plataforma partilhada, com o “estabelecimento de uma espécie de ‘gramática’ jurídico-constitucional comum”, a partir da “aproximação cada vez maior entre as diversas ordens constitucionais nacionais” (INGO WOLFGANG SARLET).

3. Autonomia

A autonomia permite que a pessoa tome decisões sobre o exercício, ou não, de seus direitos fundamentais."Fundamentada na “dignidade da pessoa humana”, a autonomia relaciona-se com os diversos direitos fundamentais, destacadamente liberdade, igualdade e privacidade, bem como os direitos à expressão, à educação, à segurança e a condições materiais. Sendo assim, a autonomia, ao mesmo tempo que é um aspecto dos direitos fundamentais, também é um objeto que se realiza por intermédio deles"(ROTHENBURG).

Apesar de a autonomia atribuir direitos como a liberdade à pessoa, os titulares não podem renunciar completamente a todos os direitos fundamentais, pois a autonomia pode ser de menor relevância quando há necessidade de proteção da pessoa em situações sociais que possam lhe apresentar risco, como proteger a pessoa de si mesma.

4. Indivisibilidade

Os direitos fundamentais são apresentados em conjunto, pois estão diretamente ligados o que os torna indissociáveis, pois são gerados a partir de um direito prévio que sofreu modificação e foi compreendido com indispensável, como, por exemplo, o direito ao acesso à internet, que está associado ao direito à dignidade, que está associado ao direto à vida e assim sucessivamente. E, sendo assim, a indivisibilidade gera a necessidade de respeito ao conjunto que forma os direitos fundamentais, pois não são apenar relacionados, são interdependentes." Pode-se compreender essa característica sob o ângulo de cada direito fundamental, que constitui uma unidade incindível em seu conteúdo elementar, bem como sob o ângulo dos diversos direitos fundamentais, no sentido de que não se podem aplicar apenas alguns dos direitos fundamentais reconhecidos e ignorar outros. "(ROTHENBURG)

5. Historicidade

Os direitos fundamentais foram conquistados ao longo da história, sendo continuamente construídos em diferentes períodos históricos, para combater respectivas situações em que a pessoa humana era subjugada. Estabeleceram-se através das lutas e revoluções sociais, ao limitar o abuso indiscriminado de poder de uma maioria sobre uma população minoritária. A consequência desse caráter temporal é sua continuidade, em que um direito abre uma ampla gama para diversos outros conforme a evolução da humanidade e a transformação das lutas e, portanto, “não podem ser definidos de uma vez por todas... A revolução dos direitos humanos é, por definição, contínua” (LYNN HUNT).

6. Positividade

Os direitos fundamentais são concebidos nos valores de determinada sociedade, e assim são tidos como materiais, porém segundo o ponto de vista formal, devem ser inseridos numa Constituição positivada por um determinado regime jurídico, sendo tomados como parâmetros pra fins de controle de constitucionalidade."Ultrapassando as fronteiras dos países, a positividade dos direitos fundamentais conhece atualmente uma dimensão internacional (internacionalização), por intermédio de tratados, convenções, declarações e similares, com tendência a sobrepor-se às Constituições (supraconstitucionalidade)."(ROTHENBURG)

7. Sistematicidade, inter-relação e interdependência

Conforme os direitos fundamentais foram sendo reconhecidos, estabeleceu-se uma positivação de tais direitos, o que posteriormente originou uma construção de doutrina e a consequente positivação dos direitos fundamentais. Esses direitos se relacionam entre si, estabelecendo uma relação não apenas de interação, mas também de interdependência entre eles. Portanto, é impossível dissociar os direitos fundamentais, pois são complementos de outros para que se tornem um direito completo e concreto." Todas essas variações que caracterizam os direitos fundamentais demonstram os diversos âmbitos em que eles se projetam e cuja magnitude somente é perceptível em seu conjunto "(JAIRO SCHÄFER).

8. Abertura e inexaurabilidade

Os direitos fundamentais possuem caráter contínuo de renovação na medida em que pode um direito fundamental específico ser entendido em inúmeras concepções dependendo de sua aplicabilidade no caso concreto, podendo, a qualquer momento, ser acrescidos novos direitos fundamentais, pois “a afirmação positiva dos direitos fundamentais é progressiva” (P. J. LORA ALARCÓN). Os direitos fundamentais vão muito além do que está escrito em uma lista, pois seu alcance é amplo e estão indivisivelmente ligados. Existem preceitos fundamentais explícitos e implícitos decorrentes de outros e também aqueles que estão expressos na Constituição. Segundo Rothenburg, quanto a abertura externa de nosso sistema constitucional, o entendimento do Supremo Tribunal Federal tem evoluído quanto à estatura conferida às normas advindas de tratados e convenções internacionais, consideradas hoje acima das leis ordinárias (supralegalidade), porém abaixo das normas constitucionais (infraconstitucionalidade), à exceção justamente daqueles que versam sobre direitos fundamentais, desde que sejam aprovados de modo semelhante às emendas constitucionais e que, então, como tais valerão. A quantidade e diversidade de direitos fundamentais aumenta a possibilidade de conflito entre eles, 78 que deverá ser superado por meio de concordância prática (harmonização).

9. Projeção positiva

Os direitos fundamentais não surgem apenas como meio de remediar as ações negativas através de ações compensatórias, mas têm como finalidade a positivação de meios para a proteção de valores estipulados pela sociedade. O autor afirma que com a superação do modelo liberal de Estado pela concepção de Estado social e intervencionista, aparecem direitos fundamentais cuja violação não ocorre apenas a partir do cometimento de atos, senão que igualmente a partir de omissões que não os implementem

10. Perspectiva objetiva

Para Rothenburg, os os direitos fundamentais não são apenas suposições subjetivas, mas possuem aplicação objetiva. Sendo assim, os direitos fundamentais:

I – Servem como critério de interpretação/aplicação do direito em geral e desempenham o relevante papel de parâmetro de constitucionalidade

II – Funcionam como regras de limitação de competência, especialmente em relação ao Poder Público.

III – Atribuem deveres, especialmente ao Poder Público, de implementá-los, desenvolvê-los e protegê-los (“inclusive preventivamente” – INGO WOLFGANG SARLET80), independentemente de pretensões individuais.

IV – Reclamam a organização e orientação de institutos e instituições, por meio dos quais sejam concretizados: são as garantias institucionais. Ademais, esses institutos e instituições devem possibilitar a realização dos direitos fundamentais ao longo de seu próprio funcionamento.

V – autorizam pleitos (por via administrativa e judicial) em caráter metaindividual (“interesses coletivos e difusos”).

A atuação estatal deve não apenas remediar o descumprimento desses direitos, mas também realizar ações que previnam tal descumprimento.

11. Dimensão transindividual

É vinculada a uma concepção contemporânea de coletividade, ou seja, direitos voltados para o bem comum, baseados na solidariedade, como o direito ao desenvolvimento, o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado, o direito à paz e “teriam por característica essencial não poderem ser realizados ‘senão pela conjunção dos esforços de todos os atores do jogo social: o indivíduo, o Estado, as entidades públicas e privadas, a comunidade internacional’”.(JULIE RINGELHEIM)

12. Aplicabilidade imediata

As normas jurídicas em que são expressos os direitos fundamentais não devem necessitar de complemento, e assim sustenta-se a sua aplicabilidade imediata pois tendem a ser completas, podendo se pleiteadas diretamente pelos interessados e devendo ser compreendida como tentativa máxima, com esforço para extrair um conteúdo satisfatório da previsão normativa e sem tolerar pretextos impeditivos da plena eficácia.

13. Concordância prática ou harmonização

A concorrência de direitos fundamentais não pode acarretar a prevalência absoluta ou o sacrifício definitivo de algum deles, e são resolvidas, na prática, por meio do critério da proporcionalidade,

buscando-se o máximo de aplicação com um mínimo indispensável de prejuízo dos direitos fundamentais envolvidos, segundo a importância de cada qual no caso concreto.

14. Restringibilidade excepcional

A restringibilidade excepcional acentua que os direitos fundamentais não podem ser diminuídos pela interpretação, sobretudo pela atividade normativa infraconstitucional, a não ser que a possibilidade de restrição esteja expressamente prevista na própria Constituição ou decorra da interação com outros dispositivos constitucionais, mas a limitação nunca poderá atingir o núcleo (essência, conteúdo mínimo) do próprio direito fundamental. Enquanto a interpretação dos direitos fundamentais deve ser ampliativa, a interpretação das restrições deve ser limitativa.

15. Eficácia horizontal ou privada

Ao lado de uma clássica eficácia vertical dos direitos fundamentais, nas relações dos particulares com o Poder Público (que está numa situação de superioridade), há a eficácia horizontal ou privada (erga omnes), que cobra cumprimento dos direitos fundamentais também nas relações entre particulares. Daí falar-se na eficácia irradiante dos direitos fundamentais.

O princípio básico da liberdade não tolera ingerências muito estritas no domínio privado. Onde haja uma disparidade de poder social, todavia, os direitos fundamentais apresentam-se como importante salvaguarda. A doutrina aponta que a eficácia privada dos direitos fundamentais pode ser considerada uma faceta da perspectiva objetiva destes, que valeriam em todos os âmbitos. Ao Poder Público incumbe cuidar para que os direitos fundamentais sejam respeitados na esfera privada (deveres de proteção).

Além de se exigir que os particulares não violem os direitos fundamentais, pode-se cobrar deles o concurso para a implementação desses direitos.

16. Proibição de retrocesso

Os direitos fundamentais, assim que reconhecidos, não podem sofrer retrocesso, ou seja, os princípios afirmados pelas normas de direito fundamental, ao representarem valores social e juridicamente positivados, garantem o controle de constitucionalidade, a afirmação de um direito ao desenvolvimento é vinculada à perspectiva da proibição de retrocesso, “não sendo admitidas violações, reduções ou retrocessos nos indicadores dos direitos humanos” (ROBÉRIO NUNES DOS ANJOS FILHO). O fato não se diminuírem os direitos fundamentais não significa que não podem substituídos por outros preceitos de equivalente ou superior benefício.

17. Maximização (otimização) ou efetividade

Deve-se sempre procurar extrair dos direitos fundamentais o máximo de conteúdo e realização que possam oferecer, de onde uma maximização ou otimização, não apenas em termos teóricos (que devem ultrapassar a linguagem genérica e adotar disposições específicas), mas igualmente de apelo prático, assim que se busque uma real implementação dos direitos fundamentais (efetividade dos direitos

fundamentais), a despeito das vicissitudes (como a ausência de regulamentação suficiente ou a não inclusão entre as prioridades políticas de governo).

O compromisso jurídico de qualquer declaração de direitos fundamentais é fazer-se cumprir, numa “aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social”, conforme a requintada dicção de L. R. BARROSO. Há de se ter em vista que a elaboração teórica dos direitos fundamentais encontra-se bastante apurada, mas, infelizmente, não se faz acompanhar de uma prática efetiva; como afirma NORBERTO BOBBIO: “O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los.”

A maximização inclui o princípio da proibição de proteção insuficiente dos direitos fundamentais, que é a versão positiva da proporcionalidade, quer dizer, é inadmissível deixar de implementar adequadamente os direitos fundamentais.

Outro princípio que se relaciona à maximização, em reforço dos direitos fundamentais, é o da proibição de retrocesso, embora ambos não se confundam.

O objetivo dos direitos fundamentais, portanto, é crítico, no sentido de interferir nas condições reais para transformá-las com vistas a realizá-los.

  • Publicações8
  • Seguidores2
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoArtigo
  • Visualizações4383
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/as-caracteristicas-dos-direitos-fundamentais/283343352

Informações relacionadas

Sérgio Zoghbi, Professor de Direito do Ensino Superior
Artigoshá 7 anos

Dimensões dos Direitos Fundamentais

Jessica Pequeno, Advogado
Artigoshá 3 anos

As características dos Direitos Fundamentais

Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
Notíciashá 13 anos

Quais são os direitos de primeira, segunda, terceira e quarta geração? - Denise Cristina Mantovani Cera

Stephanie Figueiredo, Advogado
Artigoshá 2 anos

Direitos Fundamentais

Caio Rivas, Advogado
Artigoshá 8 anos

Direitos Fundamentais Constitucionais e sua Eficácia Vertical e Horizontal

0 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)