Homologação de sentenças estrangeiras civis no Brasil
Atribuições do Supremo Tribunal Judiciário à luz da emenda constitucional 45/2004.
RESUMO
O presente artigo tem como tema a homologação de sentenças estrangeiras civis no Brasil, considerando as atribuições do Supremo Tribunal Judiciário e a emenda constitucional 45/2004 que tratou de inovar no órgão julgador da temática. O conteúdo a ser apresentado abordará conceitos introdutórios acerca das mudanças representadas pela emenda constitucional, bem como realizará análise da competência alçada ao STJ, substituindo assim o Supremo Tribunal Federal das decisões homologatórias de tais sentenças. Tem-se por objetivo a abordagem jurídica internacional da temática exposta. Pode-se ressaltar, que as considerações expostas serão de extrema importância para o entendimento dos atos civis internacionais internalizados pelo judiciário brasileiro, dessa maneira, é possível analisar as prerrogativas do direito internacional aplicadas de forma ordinária em país diverso.O método utilizado para a elaboração desse artigo é o indutivo, o procedimento monográfico e a técnica de pesquisa bibliográfica.
Palavras-chave: Sentenças estrangeiras. Emenda Constitucional 45/2004. Supremo Tribunal Judiciário.
1 INTRODUÇÃO
Na comunidade internacional, os Estados Soberanos encontram uma barreira de jurisdição no seu próprio limite territorial, ou seja, em regra a lei nacional aplica-se apenas dentro do território nacional, em se tratando de Estado estrangeiro, o que versa é a chamada lei estrangeira. Essa prerrogativa tão inerente do direito internacional possui exceções já consideradas na própria Constituição de 1988. Vale ressaltar, que a temática exposta já vem sendo tratada desde a Constituição dos Estados Unidos do Brasil em 1934 que dispunha a Suprema Corte como responsável direta.
É inevitável que o conflito de leis entre Estados Soberanos existam, entretanto, os princípios de cooperação internacional sugerem que as decisões prolatadas por sistemas jurídicos diversos devem ser recepcionadas pelos juízes nacionais [1]. Dessa maneira, pode-se estabelecer que a adoção de sentenças estrangeiras, colabora para a manutenção de uma sociedade internacional mais harmônica e respeitada, estreitando as relações comerciais e civis entre os membros de cada nação.
Considera-se por conceito de sentença, o ato pelo qual extingue-se a execução, entretanto, quando se trata de homologação de sentença estrangeira o conceito pode ser adaptado, surgindo assim uma ação judicial que permita a validade das sentenças já prolatadas por tribunais estrangeiros, dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma o judiciário Brasileiro não resolverá o mérito da questão, apenas estabelecerá a formalidade da decisão já proferida.
Nesse contexto, ressalta-se a importância de tal temática e a responsabilidade inerente ao STJ de julgar procedente tais demandas, considerando sempre a soberania do Estado brasileiro, os bons costumes e a ordem pública. Não pode o Brasil negar sua soberania ao proferir uma decisão homologatória de sentença estrangeira, tal sentença não poderá ferir a capacidade do ordenamento jurídico interno, para que seja possível dessa forma o desenvolvimento de um direito internalizado coerentemente.
2 SENTENÇAS ESTRANGEIRAS, UM VIÉS DE INTERNALIZAÇÃO
Em se tratando de homologação de sentença estrangeira é preciso analisar que a permissão para que uma sentença estrangeira produza efeitos típicos transcritos do foro de origem ao foro receptor é necessário um juízo de deliberação comparado com um processo de nacionalização da sentença. Dessa maneira, é possível que assuntos determinantes de interesse social sejam “adotados” pelo sistema jurídico nacional. Sobre a temática dispõe o artigo 483 do Código de Processo Civil: “ a sentença estrangeira proferida por terminal estrangeiro não terá eficácia no Brasil senão depois de homologada”. Ressalta-se assim, a importância da temática predisposta pelo CPC.
Para atender as necessidades sociais das sentenças proferidas por tribunais estrangeiros é de extrema importância o aspecto valorativo das temáticas existentes. Nesse sentido estabelece-se no Artigo 17 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro: “ as leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declaração de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes” . Considera-se assim, que o respeito a ordem internacional jamais poderá afetar a soberania do Brasil, o qual, deverá honrar as decisões já existentes internamente, desconsiderando aquelas estrangeiras, que versam sobre mesma problemática mas com soluções diversas. A solução nacional irá prevalecer.
Considerando os supramencionados artigos, pode-se ressalvar que o sistema utilizado pelo Brasil para homologar sentenças externas é o de delibação moderada. Por meio desse sistema, o julgador brasileiro não resolverá o mérito da situação, mais levará em conta as formalidades da sentença, formalidades essas, discutidas à luz dos princípios fundamentais, considerando sempre um processo justo, com respeito a ampla defesa, ao contraditório, aos direitos humanos e aos bons costumes. [2] É notável que tais disposições colaboram para a eficácia do processo, vez que não é necessário julgar o mérito novamente, como ocorre em sistemas de revisão do mérito e nem subordinar as decisões a tratados, como ocorre no sistema de reciprocidade diplomática.
Ao analisar as questões até então expostas, vale ressaltar que o processo de internalização de sentença estrangeira pode ocorrer tanto de forma direta, como indireta. A forma direta estabelece como pressuposto a lex fori, ou seja as regras processuais da lei nacional. O processo direto atribui ao juiz reconhecer qual a lei que será aplicada, a nacional ou a estrangeira, feito isso, caso reconhecida a lei estrangeira ocorre a verificação do conflito da lei com a ordem pública. Lei estrangeira conflitante é lei estrangeira não adaptada ao ordenamento jurídico interno. O processo indireto de internalização ocorre quando a sentença é proferida por juiz estrangeiro e apenas a execução é objetivada no país homologador. 5
Tendo em vista as disposições anteriores, pode-se definir que a homologação de sentenças estrangeiras civis no Brasil perpetuam acerca de conceitos básicos e inerentes ao processo de internalização, os quais são derivados de princípios internacionais de cooperação internacional, predominantes no direito externo. Ademais, considerar-se-á de suma importância para o desenvolvimento do processo de internalização a soberania do Estado receptor, pontuando assim, as prerrogativas necessárias.
3 ALTERAÇÕES RELACIONADAS A EMENDA CONSTITUCIONAL 45/2004
Com o advento da Emenda Constitucional 45/2004, algumas alterações importantes ocorreram no processo homologatório de sentenças estrangeiras. A alteração mais impactante diz respeito a troca do órgão julgador. Anteriormente era competência do Supremo Tribunal Federal, passando a constar o Supremo Tribunal Judiciário, como dispõe o Artigo 105 da Constituição Federal de 1988: “ Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I- Processar e julgar originariamente: [...] i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias [...].”
Tal alteração teve por objetivo amortizar as competências do STF, já sobrecarregado de processos e dar-lhe um aspecto mais próximo de uma Corte Constitucional, ou seja, de um órgão que não tenha apenas função jurisdicional, mas política também. Entretanto, algumas críticas podem ser alçadas a essa mudança, principalmente no tocante à imposição de recurso extrajudicial, tornando o processo mais lento[3]. O artigo 102 § 3º da referida emenda, busca amenizar o conteúdo dessa crítica, vez que dispõe: “[...] § 3º- No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”
Percebe-se, ao analisar os dispositivos anteriores, que apesar de possível a implementação de recurso, este deve ser minuciosamente discutido e contestado com preceitos constitucionais, a fim de tornar o procedimento mais eficaz. Em regra, o processo deve ser rápido e passível de resolução. Sobre a mesma temática constata-se a seguinte jurisprudência:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA. CONCEITO DE ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. 1. A Emenda Constitucional nº 45/2004 transferiu, do Supremo Tribunal Federal para o Superior Tribunal de Justiça, a competência para homologar sentenças estrangeiras. Considerando que um dos principais objetivos da Reforma do Judiciário foi promover a celeridade processual, seria um contrassenso imaginar que ela teria transformado esta Corte em uma nova instância nesta matéria, tornando ainda mais longo e complexo o processo. 2. Por isso, embora possível em tese, a interposição de recurso extraordinário contra esses acórdãos do STJ deve ser examinada com rigor e cautela. Somente se pode admitir o recurso quando demonstrada, clara e fundamentadamente, a existência de afronta à Constituição Federal. A ausência de questão constitucional impede o conhecimento do recurso. 3. Recurso não conhecido. (R [4] E 598.770, rel. min. Roberto Barroso, P, j. 12-2-2014, DJE 113 de 12-6-2014.)"
Ressalta-se dessa maneira, a importância estipulada a homologação de sentenças estrangeiras. Prioriza-se o funcionamento eficaz do judiciário responsável, com o intuito de melhorar a resolução de conflitos e estabelecer a ordem eminentemente social que deriva do estrangeiro. A prestação do serviço legal, deve ser taxativamente adequado para atender as necessidades populacionais, quanto mais detalhes e regras a serem seguidas maior será o desempenho da justiça.
4 ATRIBUIÇÕES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Com a incorporação da emenda constitucional 45/2004, o Presidente do Supremo Tribunal Judiciário, no uso das suas atribuições dispõe a resolução Nº 9 de 04 de Maio de 2005. A citada resolução é necessária para o desenvolvimento coeso do processo de internalização da sentença estrangeira, vez que refere-se aos procedimentos cabíveis para tal demanda. Considera-se a homologação como uma ação nova, um pedido de tutela jurisdicional, e não uma mera continuação da ação pretendida no tribunal estrangeiro[5]. Compreende-se assim, que o Supremo Tribunal Judiciário concederá o pedido ou não, dependendo sempre dos pressupostos legais decorrentes da temática. Para a execução de uma sentença estrangeira no Brasil, se faz necessário o cumprimento de alguns requisitos dispostos na resolução Nº 9 do STJ:
“Art. 5. Será executada no Brasil a sentença proferida no estrangeiro, que reúna os seguintes requisitos:
- haver sido proferida por autoridade competente;
- terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia;
- ter transitado em julgado;
- estar autenticada pelo cônsul brasileiro e acompanhada de tradução por tradutor oficial ou juramentado no Brasil.[6]
As sentenças estrangeira precisam seguir uma série de formalidades para que possam requerer efeito em país diverso. As condições estabelecidas pelo país receptor, aquele que irá conceder ou não o pedido de homologação, devem ser seguidas estritamente, sob pena de indeferimento do processo de homologação. Para tal, é necessário que os incisos do supramencionado artigo produzam êxito legal.
Levando em consideração que a sentença estrangeira, para ser homologada no ordenamento jurídico brasileiro precisa ser proferida por autoridade competente, na análise desse requisito, o magistrado brasileiro deverá considerar para fins de autoridade competente as prerrogativas internacionais e não o sistema jurídico específico de cada Estado.10 Dessa maneira, não se faz necessário e nem seria conveniente que o julgador conheça as deliberações de cada país pedinte de homologação.
Na sequência, deve-se estabelecer a obrigatoriedade da citação das partes para que o procedimento seja validado, a exceção constante nessa regra aponta para o comparecimento espontâneo do réu nos atos processuais[7]. Compreende-se, para fins de citação de indivíduo residente no Brasil a emissão de carta rogatória[8]. Tendo em vista tal prerrogativa, que deve ser analisada estritamente pelo STJ, é possível considerar que apesar do Estado brasileiro, quando receptor, ter lei soberana para o processo, a citação das partes interessadas realizadas via procedimento estrangeiro não pode ser descartada, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Judiciário:
SENTENÇA ESTRANGEIRA. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE GUARDA. HOMOLOGAÇÃO. 1. A competência da autoridade sentenciante é aferida nos limites da competência internacional e não adentra a subdivisão interna do país. 2. O ato citatório praticado no exterior deve ser realizado de acordo com as leis do país onde ocorre a citação, sendo incabível a imposição da legislação brasileira. (SEC 7.139/EX, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, P, j. 02/10/2013, DJe 10/10/2013) . [9]
Nesse viés, deve-se estabelecer a importância das exceções em procedimentos de ampla escala como a homologação de sentenças estrangeiras, vez que a prevalência dos Estados Soberanos e das legislações vigentes em cada Estado repercutem como sendo ponto de partida para o reconhecimento nacional de tais atos processuais. Dito isso, o próximo critério a ser analisado diz respeito à necessidade do trânsito em julgado da sentença, o intuito é proteger os preceitos de ampla defesa e contraditório, garantindo que posteriormente não aconteça alterações inesperadas na decisão, guardando dessa maneira a segurança jurídica.[10]
O último requisito a ser analisado pelo STJ perante uma homologação de sentença estrangeira é a tradução documental por tradutor juramentado brasileiro, bem como a apresentação autenticada perante o consulado brasileiro, conforme estabelece jurisprudência:
“SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. PEDIDO DE HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO SOBRE PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS FORMULADO POR INSTITUIÇÃO INTERMEDIÁRIA. AUTENTICAÇÃO CONSULAR E TRADUÇÃO JURAMENTADA. MITIGAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO DEMONSTRADO. REQUISITOS PREENCHIDOS. 1. Tramitando o pedido de homologação pelas vias diplomáticas, ficam mitigados os requisitos relativos à autenticação consular e à tradução juramentada. Além disso, tratando-se de sentença proferida em Portugal, cujo idioma oficial é o português, fica dispensada a tradução. (SEC 15733/EX, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORTE ESPECIAL, P, j. 14/04/2017, DJe 10/05/2018).[11]
A análise de tal jurisprudência permite a compreensão da eficaz norma estabelecida na resolução em questão, vez que é de extrema importância a comunicação consular bem como a tradução precisa da sentença e atos processuais. Compreende-se com a exposição dos requisitos necessários para a homologação de sentenças estrangeiras, que o Supremo Tribunal Judiciário conserva um amplo procedimento de estudo, com um grande acervo de jurisprudência que auxilia e estabelece os passos legais para a inclusão de procedimentos externos no ordenamento jurídico nacional.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando todas as prerrogativas até então expostas, pode-se ressaltar a importância da homologação de sentenças estrangeiras no Brasil para a troca de relações internacionais entre os países. Com a modernidade, é nítido o fato de milhares de indivíduos, estrangeiros e nacionais, trocarem de país, visitarem novos países, estudarem em universidades internacionais, com o intuito de aperfeiçoamento pessoal e profissional.
Esse grande fluxo de pessoas, requer atenção do ordenamento jurídico tanto brasileiro, quanto estrangeiro, vez que os interesses perpetuam de ambas as partes. Ressalta-se ainda, que tais relações podem resultar em um estreitamento de ordenamentos jurídicos, leis e requisitos cabíveis para que o procedimento de adaptação da sentença estrangeira ocorre com êxito. Ademais, é necessário frisar a possibilidade de lesão a Soberania Nacional devido aos amplos conteúdos e problemáticas sociais derivadas de tais sentenças. O legislador, tomou cuidado ao positivar o fato de que as sentenças estrangeiras não podem ferir a ordem, e os bons costumes.
É notável, no decorrer das explanações que o papel do Supremo Tribunal Judiciário é de extrema importância para o desenvolvimento das decisões que homologam as sentenças em questão. Com a resolução 45/2004 e a transferência de responsabilidade do STF, o STJ ganhou força, provas e jurisprudências perante a matéria, resolvendo assim questões inerentes de problemáticas sociais advindas de um plano estrangeiro. Nesse viés, o Supremo Tribunal Federal foi amenizado de tantas funções e passou a apresentar-se de forma mais política e constitucional.
Compreende-se ao final, que um ordenamento jurídico requer coerência e pressupostos essenciais para o bom funcionamento da legislação, dessa maneira será possível a realização de homologações de sentenças estrangeiras, visando um bom relacionamento no âmbito internacional, respeitando e tendo sempre respeitada a soberania dos Estados. Dessa maneira, pode-se concluir que está presente a desenvoltura ideal para as análises das decisões sentenciadas.
6 REFERÊNCIAS
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“Carta Rogatória é um instrumento jurídico internacional pelo qual um País requer o cumprimento de um ato judicial ao órgão jurisdicional de outro País, para que este coopere na prática de determinado ato processual.” Disponível em:
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