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2 de Maio de 2024

No Brasil, incêndio culposo é crime

Uma breve anotação

Publicado por Guilherme Schaun
há 5 anos

Ainda que seja episódio recente, se cogita o que - ou quem - poderia ter dado início ao incêndio em Notre-Dame. Se o fogo não tiver sido criado por uma falha elétrica (imprevisível) ou algo do tipo, muito provavelmente alguém, de alguma forma, foi responsável pelo incêndio, mesmo que culposamente.

Caso essa situação fosse no Brasil, o incêndio culposo seria tipificado no Art. 250, § 2º, do Código Penal.

Incêndio
Art. 250 - Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:
Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.
Aumento de pena
§ 1º - As penas aumentam-se de um terço:
I - se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio;
II - se o incêndio é:
a) em casa habitada ou destinada a habitação;
b) em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura;
c) em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;
d) em estação ferroviária ou aeródromo;
e) em estaleiro, fábrica ou oficina;
f) em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;

g) em poço petrolífico ou galeria de mineração;

h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta.

Incêndio culposo
§ 2º - Se culposo o incêndio, é pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Para ser imputado por este crime, é preciso que, voluntariamente, a partir da violação de um dever de cuidado objetivo, por imprudência (agir culposo), negligência (omissão culposa) ou imperícia (culpa profissional), alguém produza um resultado involuntário, com previsibilidade objetiva deste (em ponderação com o homo medius), mas com ausência de previsão subjetiva. O que a pessoa deve fazer, culposamente, preenchendo os requisitos supracitados, é, no caso, causar o incêndio, expondo a perigo o patrimônio ou a vida de outrem.

Inegável, portanto, que o patrimônio do proprietário da Catedral de Notre-Dame ficou agudamente ferido, bem como a vida das pessoas próximas ao local restou exposta a perigo.

Incêndio, nas palavras da doutrina de Cleber Masson, é:

fogo com labaredas de grandes proporções, originado pela combustão de qualquer matéria, cujo poder de destruição e o de causar prejuízos se revelam idôneos no caso concreto. Não é necessário que o perigo seja resultado do fogo em si, bastando que da ocorrência do próprio fato (incêndio) haja a efetiva comprovação do perigo à vida, à integridade física ou ao patrimônio de terceiros.

O crime de incêndio (culposo ou doloso), do que se percebe e anota, é delito de perigo concreto, não prescindindo de prova efetiva da situação perigosa, facilmente vislumbrada na circunstância. Além disso, a forma culposa é delito de menor potencial ofensivo, com pena de 6 meses a dois anos, abarcado pela Lei 9.099/95 e suas medidas despenalizadoras.

Por outro lado, se configurado o dolo eventual (agente foi indiferente quanto ao risco do resultado), que se situa em linha tênue com a culpa consciente (agente, sabendo do risco, achava que o resultado não aconteceria), incidirá o delito de incêndio doloso, que é crime de elevado potencial ofensivo, que, no caso, restaria atingido pela causa de aumento de pena do Art. 250, § 1º, inc. II, alínea b, já que o objeto material do suposto crime foi "edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura", conforme o texto legal. A pena do suposto criminoso restaria com o patamar mínimo em aproximadamente 4 anos, considerando a majorante recém trazida. O trazido vale para o dolo direto.

Ao cabo deste delito, necessário trazer que, caso não haja previsibilidade objetiva da ocorrência do resultado, ou seja, se na visão do homem médio o incêndio não era previsível, não será caso de incêndio culposo, nem doloso, já que se trataria de fato atípico.

Ao debate que recém se inicia, ainda se cogita na caracterização do acontecido como terrorismo, caso em que mudaria abruptamente a classificação legal e seus efeitos. Aguardemos.


Baseado no livro Direito penal esquematizado: parte especial – vol. 3, do professor Cleber Masson, e em outros estudos não determináveis.

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