O respeito às leis e sua "relativização" pelo Judiciário em nome do combate à impunidade: o início do fim do Estado Democrático de Direito
A Constituição da República de 1988, através do STF, não pode se dobrar ao anseio popular, seja o tempo que for, sob pena de grave precedente anunciar uma catástrofe no ordenamento jurídico.
O Supremo Tribunal Federal, por seis votos contra cinco, declarou na última semana a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que só autoriza a prisão após o trânsito em julgado, fato este alvo de crítica em massa sob o pretexto, em linhas gerais, à vista da posição contrária da Corte a execução antecipada da pena, ficar ao lado da impunidade.
Antecipo, pessoal e juridicamente, a posição favorável de minha parte acerca da prisão ocorrer após decisão condenatória proferida em 2º grau, sem aguardar o trânsito em julgado - esgotamento da “infindável” via recursal, fazendo com que a prescrição seja o fim do processo em diversos casos -, isto porque penso que a impunidade e a realidade de que o “crime compensa” em nosso País, por culpa da legislação vigente, será somente assim cessada, e de uma vez por todas.
Contudo, acertou o STF.
Vale lembrar que cumprir a Lei não é faculdade, mas dever obrigacional.
E a Lei maior - nossa Constituição da República de 1988 - não pode se dobrar ao anseio popular, seja o tempo que for, sob pena de grave precedente anunciar uma catástrofe no Estado democrático de Direito.
E se assim fosse, hoje derrubaríamos cláusula pétrea relacionada à prisão.
E amanhã?
Qual direito fundamental poderia ser “relativizado”?!
Evidente a tragédia anunciada tivesse o contrário ocorrido.
Assim, o caminho a ser perseguido é no sentido de criar, ou até mesmo reformar o que mostra injusto e indefensável nos dias atuais, todavia sempre com os respectivos meios e competências legais.
O Judiciário cumpre a Lei sob sua interpretação, cabendo de forma exclusiva ao Legislativo, através do Congresso Federal, assumir a responsabilidade que lhe é dever: legislar. E que assim o faça.
Não podemos fazer do Poder Judiciário a âncora do Estado, braço que sustenta as deficiências dos outros poderes, e não somente por sua perfeita teoria montesquiana de origem, mas também por suas próprias limitações à vista de um sistema judiciário ineficiente, improdutivo e que se vê dia a dia abarrotado pelas incontáveis demandas recebidas pelos tribunais, ou seja, o cidadão jurisdicionado é colocado à margem da Lei, em segundo plano, pelo mesmo Judiciário que se mostra “ativista” em questões que fogem de sua competência.
Finalmente, reiterando minha posição favorável à prisão após decisão de 2ª instância, cabe devolver a pergunta: recorda-se da posição do candidato escolhido à Câmara dos Deputados e Senado Federal na última eleição acerca do assunto? Aliás, lembra-se em quais congressistas votou no último pleito?
Legítimo e intrínseco na democracia apontarmos erros e falhas do famigerado “sistema” em nosso ordenamento jurídico; todavia, jamais esqueçamos a lógica de todo e qualquer problema: apontar a solução é a única maneira de cessar o problema.
E a solução tem início em cada cidadão e na sua responsabilidade ao escolher seus representantes e cobrar suas posições quando eleito.
A democracia é fascinante, eis que reflete nos representantes do povo, comprovadamente, a própria imagem dos representados.
Maldade de alguns, prejuízo de todos.
SOBRE O AUTOR
Por Luís Felipe Uffermann Cristovon, advogado graduado pela Faculdade de Direito de Sorocaba. Pós-graduando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Extensão em Compliance pela Fundação Getúlio Vargas - FGV Direito SP - Escola de Direito de São Paulo. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito de Sorocaba. Atualmente é sócio do escritório Delgado Advogados Associados. Relator da 1ª Câmara de Benefícios Pecuniários da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (CAASP-OAB). Assistente da Comissão Estadual de Direitos e Prerrogativas da OAB/SP.
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