Página 1751 do Diário de Justiça do Estado do Pará (DJPA) de 20 de Janeiro de 2021

que ¿a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial¿. No caso da inviolabilidade domiciliar, em geral, é necessário o controle judicial prévio. Para isso, o juiz analisa a existência de justa causa para a medida, na forma do art. 240, § 1º, do CPP, verifica se estão presentes as ¿fundadas razões¿ para a medida e, se for o caso, determina a expedição do mandado de busca e apreensão. No entanto, é a própria Constituição que elenca exceções, entre elas a existência do flagrante delito, nas quais dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em casa. Todavia, o modelo probatório é o mesmo da busca e apreensão domiciliar, devendo existir fundadas razões, nos termos do art. 240, § 1º, do Código de Processo Penal. Ou seja, antes de adotar tal procedimento, a autoridade policial deve certificar-se de que havia elementos suficientes para caracterizar a suspeita da existência de uma situação que autorize o ingresso forçado em domicílio. Assim, a proteção contra a busca arbitrária exige que a diligência seja avaliada com base no que se sabia antes de sua realização, não cabendo sua comprovação a posteriori, depois de já violado o domicílio, sob pena de enfraquecer o comando constitucional, que deve ser assegurado a todos os cidadãos. No caso dos autos, a ação policial foi baseada unicamente na intuição dos policiais, os quais decidiram entrar no domicílio do acusado por volta das 14:00 horas, existindo mera suspeita de que ali acontecia a prática de um crime, não restando caracterizadas as fundadas razões necessárias a autorizar a entrada no domicílio do réu. Assim, se os policiais tinham fundadas suspeitas de que haviam drogas ou produtos de crime naquela residência, deveriam monitorar o local e obter junto ao Poder Judiciário o competente mandado de busca e apreensão. Ou, no mínimo, deveriam fazer-se acompanhar de alguém do povo que acompanhasse as buscas. Porém, nenhuma providência foi tomada nesse sentido, o que compromete bastante a credibilidade da prova. A esse respeito, o Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário 603.616, resolvendo controvérsia, fixou tese com repercussão geral: ¿A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados¿ (RG RE 603616 RO, Publicação, DJe-190 08-10-2010, Julgamento, 27 de maio de 2010, Relator, Min. GILMAR MENDES) Ademais, analisando os relatos, verifica-se que há sérias dúvidas quanto à destinação das drogas supostamente apreendidas com o acusado. A análise das circunstâncias não permite concluir se as drogas seriam destinadas ao comércio ou a consumo próprio, tendo em vista não ter sido ele flagrado em ato de mercancia da substância e pelo fato de ser relativamente pequena a quantidade aprendida. Também milita em favor do acusado o fato de não ter sido encontrado em seu poder, após revista pessoal realizada pelos policiais, quantia ou importância pecuniária relevante, já que seria razoável presumir-se que, no caso de mercancia de substância ilícita, o acusado deveria ao menos ter em seu poder alguma soma em dinheiro referente ao lucro do negócio. No presente caso, não se pode formar um seguro juízo de convicção, essencial para a condenação do acusado, tão somente com base em indícios relatados em depoimentos em sede de inquérito policial, uma vez que em juízo os depoimentos colhidos, à luz do contraditório e ampla defesa, não apontaram de forma cabal a oro denunciado como autora do fato típico narrado. As provas colhidas, sob essas circunstâncias, apresentamse sem eficácia probatória, pois obtidas ilicitamente, já que resultantes de comportamento ilegal dos agentes estatais, violando o domicílio do acusado, não servindo de suporte a legitimar sua condenação. Destarte, a condenação ou absolvição, em casos como o da espécie, é decisão delicada, que deve ser analisada com muita cautela em cada caso concreto. Da leitura dos autos, depreendo que a autoria não foi devidamente comprovada. Os depoimentos prestados pelas testemunhas não são de todo esclarecedores. No presente caso, portanto, não vejo como deixar de aplicar o princípio do in dubio pro reo, uma vez que se trata de imputação gravíssima, que não pode ser atribuída a alguém sem que exista prova firme e convincente a ensejar um decreto condenatório. Sobre a absolvição do réu, dispõe o artigo 386 do Código de Processo Penal: Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (....) omissis VI - Existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena, ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (grifamos) Com efeito, tenho que o cotejo da prova testemunhal e documental com a negativa de autoria, levada a efeito pelo réu, permite aferir que não há elementos suficientes para embasar condenação contra ele, sendo a absolvição medida que se impõe, com fundamento no consagrado princípio in dubio pro reo. Desse modo, embora haja indícios, tenho que não há provas suficientes quanto à prática, pelo denunciado, dos crimes capitulados na denúncia, impondo-se a absolvição com base no inciso VI do art. 386 do Código de Processo Penal. III -DISPOSITIVO À vista do exposto e do mais que dos autos consta, julgo IMPROCEDENTE a denúncia, para ABSOLVER o réu MARCOS DE JESUS GOMES, qualificado nos autos; da prática do delito previsto no artigo 33 da Lei 11.343/2006, nos termos do art. 386, inciso VI do Código de Processo Penal.

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