Página 1919 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 1 de Outubro de 2014

autoridade competente”. Como visto, não resta qualquer dúvida quanto à imediata exigibilidade em face do Poder Público da efetivação do direito à educação infantil, não havendo condicionamento ao prazo estipulado no artigo 6.º da Emenda Constitucional n.º 59. Ao contrário do alegado pela ré, a implementação progressiva ali mencionada refere-se às mudanças a serem efetivadas para ajuste do sistema educacional dos entes federativos, não consubstanciando autorização para descumprimento de obrigação de fornecimento de ensino estabelecida por dispositivos constitucionais e legais vigentes. Saliente-se, ainda, que a jurisprudência pátria atualmente encontra-se consolidada no sentido da obrigatoriedade do Poder Público em conceder educação infantil a todas as crianças que dela necessitem. Ademais, dispõe o artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente, que “na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige ... e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”, o que garante e justifica a obrigatoriedade do acesso das crianças de zero a seis anos de idade às creches, tal como pretendido na inicial. Diante dos firmes comandos legais, descabida a costumeira alegação do Poder Executivo de “impossibilidade material” quanto ao cumprimento de sua obrigação constitucional e legal. A argumentação referente às dificuldades para localização de terrenos e contratação de professores, bem como sobre os óbices impostos pelos órgãos de controle orçamentário, embora explique parcialmente o déficit de vagas no ensino infantil, não exime a Municipalidade de sua responsabilidade constitucionalmente estabelecida. Vale ressaltar que muitos desses entraves foram criados pela própria Municipalidade, ao possibilitar a ocupação de áreas irregulares, gerando demanda por creches em locais onde há impedimento técnico para construção delas, e ao não remunerar adequadamente os professores, ocasionando baixa procura pela carreira. Assim, a despeito dos entraves existentes, cabe ao Município continuar envidando esforços para atender o mandamento constitucional, tomando em consideração outros fatores estratégicos que poderão acarretar o déficit nas vagas. A falta de planejamento, a eleição de prioridades equivocadas e a desorganização do administrador de maneira alguma podem tornar aceitável o descumprimento da obrigação existente em face das crianças da cidade de São Paulo. Saliente-se, por oportuno, que há sólido entendimento jurisprudencial segundo a qual existe a possibilidade do Poder Judiciário, no cumprimento de sua função típica, compelir a ré a cumprir sua obrigação, acolhendo a legítima pretensão trazida pelos autores. Nesse sentido cabe destacar o teor das súmulas recentemente editadas pelo E. Tribunal de Justiça de São Paulo: Súmula 63: É indeclinável a obrigação do Município de providenciar imediata vaga em unidade educacional a criança ou adolescente que resida em seu território. Súmula 65: Não violam os princípios constitucionais da separação e independência dos poderes, da isonomia, da discricionariedade administrativa e da anualidade orçamentária as decisões judiciais que determinam às pessoas jurídicas da administração direta a disponibilização de vagas em unidades educacionais ou o fornecimento de medicamentos, insumos, suplementos e transporte a crianças ou adolescentes. Vale ressaltar, ainda, que a expansão da rede de ensino da ré referida em contestação, embora considerável, ainda é insuficiente para atender à demandas por vagas na cidade de São Paulo. De semelhante modo, o mecanismo de chamada pelo sistema EOL, também louvável, mas não pode ser invocado como argumento para a permanência das crianças por tempo longo e indefinido naquele cadastro. O sistema deve existir para organizar a convocação das crianças inscritas, que devem permanecer aguardando apenas pelo tento necessário à efetivação de providências burocráticas internas, e não indefinidamente, como vem ocorrendo no Município de São Paulo. Daí porque a concessão da vaga, pela via judicial, não fere o direito das demais crianças que se encontram na “fila”, eis que as medidas somente são concedidas quando a espera pela vaga se prolonga por prazo não razoável. Acrescente-se que a tal “fila de espera” não é direito previsto em lei, que deva ser assegurado com igualdade, mas sim expediente criado pelo órgão público.À evidência, o princípio da igualdade deve ser interpretado conforme o todo da Constituição, isto é, não podendo ser invocado para assegurar o descumprimento de determinação constitucional, afastando a garantia de direito constitucionalmente assegurado. De igual modo, inadmissível que se considere a imposição judicial como salvaguarda para que seja prestado ensino infantil de má-qualidade e que haja risco à segurança das crianças. Evidente que as vagas ora pleiteadas devem ser concedidas para prestação de ensino que atenda às exigências da LDB, de modo algum se admitindo que as crianças sejam submetidas a risco. A Municipalidade deve organizar-se para conceder ensino a todas as crianças que dele necessitem, sem prescindir da qualidade e da segurança, por ser essa sua obrigação legal e constitucional. Saliente-se, mais uma vez, que mesmo havendo nos autos indícios de que a ré não está inerte em face da demanda por educação infantil na região sul de São Paulo, certo é que as providências por ela tomadas são comprovadamente insuficientes para o atendimento integral das crianças, razão pela qual o pedido dos autores não pode ser afastado. Diante das considerações acima expendidas, não há dúvidas quanto à obrigação da ré em conceder vagas no ensino infantil para os autores. Assim, mister a procedência da ação, tornando definitiva a tutela concedida, para o fim de assegurar a proteção integral às crianças. Posto isso, JULGO PROCEDENTE A AÇÃO, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para tornar definitiva a tutela antecipada concedida em fls. 20/24 determinando à ré que proceda à matrícula das duas crianças arroladas na planilha que acompanha a inicial, em unidades de ensino infantil adequada à faixa etária de cada uma das crianças mencionadas, localizadas em distância não superior a dois quilômetros do domicílio ou do endereço de trabalho fornecido pelos responsáveis legais, comprovando o cumprimento das medidas, de forma eficaz, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinqüenta reais) por criança não atendida, até o máximo de R$ 10.000,00, em favor de cada criança, por ano de descumprimento. Em razão da sucumbência, condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios à autora, fixados em 20% sobre o valor da causa. Isento de custas, na forma do artigo 141, parágrafo segundo, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Oportunamente, arquivem-se. P.R.I.C. - ADV: FABIANA CARVALHO MACEDO (OAB 249194/SP)

Processo 102XXXX-63.2014.8.26.0002 - Procedimento ordinário - Medidas de proteção - M.S.P. - Ato Ordinatório - Ciência ao Ministério Público - ADV: FABIANA CARVALHO MACEDO (OAB 249194/SP)

Processo 102XXXX-84.2014.8.26.0002 - Procedimento ordinário - Medidas de proteção - M.S.P. - Ato Ordinatório - Ciência ao Ministério Público - ADV: ALEXANDRE PETRILLI GONÇALVES FERRAZ DE ARRUDA (OAB 252499/SP), FABIANA CARVALHO MACEDO (OAB 249194/SP)

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