TÍTULO VII

TÍTULO VII DO USO Art. 1.412. O usuário usará da coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as necessidades suas e de sua família. * V. art. 4º, § 1º, Dec. 98.897/1990 (Reservas extrativistas). * V. Dec. 980/1993 (Cessão de uso e administração de imóveis residenciais da União). § 1º Avaliar-se-ão as necessidades pessoais do usuário conforme a sua condição social e o lugar onde viver. § 2º As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico. V. Dec. 24.643/1934 (Código das Águas); arts. 7º e 8º, Dec.-lei 271/1967 (Loteamento urbano); art. 167, I- 7, Lei 6.015/1973 ( Lei de Registros Publicos); arts. 14 e 15, Lei 9.433/1997 (Política Nacional de Recursos Hídricos e Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos); art. 4º, § 1º, Dec. 98.897/1990 (Reservas extrativistas); Dec. 980/1993 (Cessão de uso e administração de imóveis residenciais da União); Lei 13.966/2019 (Dispõe sobre o sistema de franquia empresarial). Sumário: I. Uso e usufruto. Aproximações e distinções; II. Modo de constituição; III. Alcance do uso. Usuário e sua família; IV. Concessões de uso. Variações. Direito real de uso. Concessão de uso especial para fins de moradia; V. Concessão de uso e usucapião. I. Uso e usufruto. Aproximações e distinções. O uso corresponde a um direito real de gozo com restrição maior quando comparado com o usufruto. No direito romano o uso possuía uma conotação ainda mais restrita, pois se limitava literalmente ao uso, o que eliminava o direito de percepção aos frutos (non fruendi). No sistema atual, a diferença entre o uso e o usufruto está na intensidade de sua configuração. Como alertam Baudry-Lacantinerie (Trattato di diritto civile , p. 517), a diferença essencial reside em que no uso, a fruição está limitada às necessidades pessoais do usuário e de sua família, em outras palavras, o uso é nada mais do que um usufruto limitado (Il diritto dIuso è dunque um usufruto limitato). Esta noção é reforçada pela dicção do art. 1.413, pois o regime jurídico aplicável é o do usufruto. Deste modo, trata-se de um direito real inalienável , indivisível e temporário . II. Modo de constituição. O uso pode ser instituído por ato voluntário: por contrato ou testamento. Admite-se ainda a aquisição originária por usucapião, uma vez que a base do uso está na apropriação da res móvel ou imóvel para o sustento do usuário e de sua família. A publicidade como ato de formação do direito real de uso é essencial como demonstra o art. 167, I, 7, da LRP. III. Alcance do uso. Usuário e sua família. O direito de uso abarca a pessoa do usuário e de sua família, o que demonstra que o uso está limitado à satisfação pessoal das necessidades próprias e de sua família. A delimitação da extensão da família está delineada pelo próprio texto legal. O dispositivo fala em cônjuge, o que presume a posição jurídica da união estável que também merece proteção legal. Apesar da restrição quanto ao conceito de família, a interpretação extensiva e teleológica do dispositivo deve abarcar os ascendentes que dependam de cuidados, assim como os netos. Afinal, o que o texto expressa é a relação de dependência direta em relação ao usuário (Baudry-Lacantinerie, Tratatto teorico pratico di diritto civile-dei Beni , p. 520). IV. Concessões de uso. Variações. Direito real de uso. Concessão de uso especial para fins de moradia. O fato de o sistema ser refratário à propriedade privada sobre os bens públicos não exclui a possibilidade do reconhecimento da posse, ainda que pautada em relação uti singulis . A concessão de uso pela Administração pode exprimir-se de vários modos: “Pela concessão de uso, a Administração Pública outorga o uso privativo de determinado bem público ao particular, estabelecendo um liame mais estável com a vinculação de uma atividade de utilidade pública ou, direta ou indiretamente, com algum interesse coletivo, podendo se dar, no mínimo, de três formas: i) administrativa; ii) de direito real de uso (originária do Decreto-lei 271/67) e iii) especial, para fins de moradia (introduzida pelo Estatuto da Cidade e MP 2.220/01)” (STJ, REsp XXXXX/DF , rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 13.06.2017; trecho do voto do relator). Interessam-nos o direito real de uso e a concessão de uso especial para fins de moradia, institucionalizados no art. 1.225 do CC, com a adição dos incisos XI e XII pela Lei 11.481/2007. O direito real de uso é assim referido pelo Dec. 271/1967, em seu art. 7º, caput (na redação da Lei 11.481/2007): “É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas”. A concessão de uso especial para fins de moradia, por sua vez, é cuidada pela Medida Provisória 2.220/2001, cujo art. 1º, caput , na redação que lhe deu a Lei 13.465/2017, assim dispõe: “Aquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área com características e finalidade urbanas, e que o utilize para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural”. A respeito dessas figuras, assim se decidiu: “Os entes governamentais têm-se valido da concessão de uso como meio de concretização da política habitacional e de regularização fundiária, conferindo a posse de imóveis públicos para a moradia da população carente. A concessão de uso de bens para fins de moradia, apesar de, por ela, não se alterar a titularidade do imóvel e ser concedida, em regra, de forma graciosa, possui, de fato, expressão econômica, notadamente por conferir ao particular o direito ao desfrute do valor de uso em situação desigual em relação aos demais particulares. Somado a isso, verifica-se, nos normativos que regulam as referidas concessões, a possibilidade de sua transferência, tanto por ato inter vivos como causa mortis , o que também agrega a possibilidade de ganho patrimonial ao mencionado direito” (STJ, REsp XXXXX/DF , rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 13.06.2017). A Lei 11.481/2007, além de alterar o art. 1.225 do CC, ainda acrescentou, no art. 1.473, tais direitos reais entre aqueles que poderão ser gravados por hipoteca. A respeito, cf. comentário ao art. 1.473 do CC. O CPC/2015 disciplina o exercício do direito de preferência em relação a atos processuais que incidam sobre os fenômenos referidos nos incs. XI e XII do art. 1225 do CC (cf. arts. 791, § 2º, 799, V e VI, 804, §§ 4º e 5º, 889, III e IV; sobre esses dispositivos processuais, cf. José Miguel Garcia Medina, Código de Processo Civil comentado cit.). V. Concessão de uso e usucapião. Não há confusão entre a concessão e a usucapião, embora os tipos previstos para a concessão sejam semelhantes quanto aos requisitos elementares previstos pelo art. 183 da CF (Fabio Caldas de Araújo, Usucapião, p. 374). A concessão é uma forma de posse direta estável, mas sem a possibilidade de formação do direito de propriedade por parte do concessionário. A posse indireta permanece com a pessoa jurídica de direito público, que continuará com o título dominial do bem público. Nosso sistema não permite a usucapião sobre bens públicos, em vista da vedação constitucional (art. 183, § 3º), legal (art. 102 do CC) e jurisprudencial (Súmula 340 do STF). Somente o domínio útil pode ser usucapido nos imóveis que ainda permitem o aforamento, desde que o bem público permita este direito desmembrado. O preenchimento do suporte fático para o reconhecimento da concessão exige obediência a alguns requisitos, os quais estão delineados pelo texto da Medida Provisória 2.220/2001. Estes requisitos também se aplicam aos terrenos de marinha e outros bens da União, por força da previsão do art. 22-A da Lei 9.636/1998, incluído pela Lei 11.481/2007 e com as modificações operadas pela Lei 13.465/2017, como assinalado supra . Art. 1.413. São aplicáveis ao uso, no que não for contrário à sua natureza, as disposições relativas ao usufruto. V. arts. 1.390 a 1.412, CC. Aplicação das regras relacionadas ao usufruto. O uso corresponde ao usufruto limi-tado. Isso explica a regra prevista no art. 1.413 do CC. Cf. comentário ao art. 1.412 do CC.

Código Civil Comentado

Título VII. Do Uso

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