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Novo Perfil de Atuação da Defensoria Pública - Ed. 2023

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Capítulo 7 - Intervenção da defensoria pública em processos com interesse de grupos vulneráveis: revisitação do tema, casos de atuação e inovações legislativas

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CAPITULO 7 INTERVENÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA EM PROCESSOS COM INTERESSE DE GRUPOS VULNERÁVEIS: REVISITAÇÃO DO TEMA, CASOS DE ATUAÇÃO E INOVAÇÕES LEGISLATIVAS

CAMILO ZUFELATO 1 , DOUGLAS SCHAUERHUBER NUNES 2 E DAVI QUINTANILHA FAILDE DE AZEVEDO 3

1 Introdução

O presente texto pretende revisitar a literatura que, nos últimos anos, se dedicou a analisar a forma de intervenção da Defensoria Pública nos processos em que haja interesse de grupo vulnerável. 4 Busca-se a identificação de suas características principais, de inovações legislativas ou projetadas que visam consagrar essa modalidade interventiva e, ainda, de alguns casos concretos nos quais a Defensoria Pública tem atuado, em cumprimento à missão constitucional, como interveniente para a defesa de grupos vulneráveis.

2. Defensoria Pública e tutela constitucional de grupos vulneráveis

A atual quadra histórica permite identificar a atuação da Defensoria Pública para além dos limites individuais comumente relacionados com a assistência jurídica. A conformação constitucional da instituição e recentes conquistas no Supremo Tribunal Federal (STF) acerca de sua posição no Estado Democrá tico de Direito demonstram que se trata de um ator essencial para a amplificação do debate e para a justiciabilidade dos interesses dos vulneráveis.

O acesso à justiça é distribuído de forma bastante desigual, de acordo com a classe social e com fatores econômicos e culturais. Há poucos estudos acerca de como esse direito é percebido entre as classes mais pobres e sobre a capilaridade das instituições responsáveis pela prestação desse serviço, dado que existem numerosos obstáculos a se considerar 5 . Disso decorre a necessidade do fortalecimento da Defensoria Pública como instituição para a salvaguarda não apenas de direitos individuais dessa população, mas, principalmente, de seus interesses coletivos em sentido lato.

O artigo 134 6 da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 ( CRFB/1988) prevê a instituição como responsável pela orientação jurídica, promoção e defesa dos direitos humanos individuais e coletivos dos necessitados.A previsão constitucional de defesa dos direitos coletivos dos necessitados indica a obrigatoriedade de tutelar os direitos dos grupos vulneráveis, eis que o conceito de necessitado tem direta relação com a situação de vulnerabilidade de grupos ou indivíduos.

A leitura conjunta do dispositivo constitucional acima mencionado com o artigo 3, incisos I – construir uma sociedade livre, justa e solidária – e III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais – da Constituição Federal são indicativos do papel central da Defensoria Pública na consecução dos objetivos do Estado Democrático de Direito, que foi fundado com a nova ordem constitucional.

No plano infraconstitucional, tem-se a inclusão da Defensoria Pública como legitimada ativa para a propositura de ação civil pública com a Lei nº 11.448/2005, que alterou o artigo da Lei nº 7347/1985 para prever, em seu inciso II, a instituição em estudo. O recorte na legitimidade ativa, definidor da atuação da Defensoria Pública, é a existência de vulneráveis que seriam beneficiados com a atuação da instituição.

Em 2009, com a Lei Complementar nº 132, a Lei Orgânica da Defensoria Pública (LC nº 80/1994)é alterada e, em seu artigo , passa a expor, mais especificamente no inciso VII, como função institucional, a promoção de ações capazes de tutelar direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, quando o resultado da demanda puder beneficiar grupos hipossuficientes.

Destaca-se, ainda, a previsão da Defensoria Pública para a promoção de mandado de injunção coletivo, conforme artigo 12, inciso IV, da Lei nº 13.300/2016, quando a tutela for relevante para a promoção e defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados.

O arcabouço normativo apontado indica a crescente importância da participação da Defensoria Pública na construção de decisões judiciais adequadas aos anseios do Estado Democrático de Direito.

3. Intervenção ad coadjuvandum da Defensoria Pública em processos com interesse de grupos vulneráveis

A caracterização de processos nos quais há interesse de grupos vulneráveis era vista, há pouco tempo, como direcionada àqueles em que, no polo ativo ou no polo passivo, havia, parcial ou totalmente, coletividades de vulneráveis, independentemente do direito discutido – direito do consumidor, direito à saúde, direito ambiental, direito urbanístico, direito à moradia etc. Para esses casos, a legislação processual coletiva foi reformada em 2007, contemplando expressamente a legitimidade ativa da Defensoria Pública para ajuizamento de demandas coletivas na defesa de grupos vulneráveis. Nesse caso, a Defensoria Pública será autora, e não interventora.

A intervenção, em direito processual, é figura destinada aos sujeitos que não atuam sob o manto do contraditório, ou seja, não são autores ou réus, mas possuem interesse jurídico na atuação, intervindo como terceiros segundo as formas pré-estabelecidas em lei. O terceiro interveniente, portanto, nas formas tradicionais do direito processual, só pode intervir segundo um modelo destinado para tanto.

No campo das demandas coletivas, contudo, há enorme fluidez em relação à qualidade de partes e terceiros, em razão da transcendência dos interessados no resultado do processo, vez que envolvem conflitos com coletividades; portanto, os esquemas de legitimidade ad causamsão, na tutela coletiva, a escolha de porta-vozes para a adequada defesa desses interesses de grupos ou coletividades (arts. da Lei da Ação Civil Pública e 82 do Código de Defesa do Consumidor).

Logo, nesse contexto de grande fluidez entre os titulares do direito e os adequados porta-vozes desses direitos em juízo, as figuras de intervenção de terceiros no âmbito da tutela coletiva devem se afastar daquelas do processo individual, considerando a fundamental diferença entre a titularidade individual de direitos, como regra, e, por outro lado, a coletividade do direito ou do grupo de titulares de direitos – difusos e coletivos stricto sensu, ou individuais homogêneos, respectivamente, nos termos do artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor ( CDC).

As intervenções no processo coletivo, portanto, até podem se valer das figuras tradicionais do processo individual, mas não devem nelas se restringir, tendo em vista essa característica da pluralidade de interesses, bem como a relevância dos interesses em jogo, quase sempre multifacetados, a exigir uma ampliação no debate processual, no contraditório e na ampla defesa.

As peculiaridades das demandas de índole coletiva frente às de índole individual, nas quais as formas de intervenção – de terceiros, conceito também problemático quando se trata de conflitos coletivos – foram forjadas, tornam difícil transpor uma modalidade para a outra. Em outras palavras, não é possível, nem recomendável, transplantar as clássicas espécies de intervenção de terceiros do processo individual para o âmbito do processo coletivo.

Foi no intuito de favorecer o incremento à participação da Defensoria Pública nos processos que envolvem interesses de grupos vulneráveis em que ela não é autora que surgiram, a partir de 2013, e à míngua de qualquer previsão legal expressa nesse sentido, as primeiras manifestações doutrinárias favoráveis à ampliação dessa intervenção nos processos envolvendo interesses de grupos vulneráveis, por força da evidente atração constitucional que essa atuação guarda com a instituição.

Entre essas manifestações da doutrina nacional, destaca-se as que utilizaram os termos custos plebis, custos vulnerabilis, amicus communitas, amicus plebis, amicus democratiae, custos humanus, amicus dignitatis e custos libertatis para desig nar o fenômeno dessa intervenção para a defesa dos grupos vulneráveis, nos termos da missão constitucional da Defensoria Pública.

Não parece ser fundamental, para fins da correta compreensão dessa figura interventiva, eleger uma ou outra expressão como sendo a mais adequada, embora tudo indique que custos vulnerabilis corresponde àquela mais usual e conhecida. 7 É importante identificar algumas características que lhe são peculiares e que devem ser ressaltadas.

Para tanto, vale-se da primeira manifestação doutrinária que se tem notícia na qual foi defendida esse formato interventivo da Defensoria Pública, de um dos coautores do presente texto. 8 Parece que ela já continha, em sua essência, os elementos fundamentais dessa intervenção, que, desde então, tem ganhado significativo relevo na jurisprudência e na legislação brasileiras, como se verá a seguir.

Em decorrência da relativização entre o conceito de parte e terceiros no processo coletivo, a facilitação da intervenção se dá em prol de uma atuação partidária, ou seja, com o claro escopo de auxiliar uma das partes envolvida na demanda judicial. Não há, portanto, uma intervenção neutral, mas sim para coadjuvar, ou seja, para atuar em conjunto com a parte de um dos polos proces suais, qual seja, aquele em que esteja a coletividade de vulneráveis. Essa foi a característica que refletiu no termo intervenção ad coadjuvandum. 9

E mais: era preciso destacar, de forma enfática, que essa intervenção da Defensoria Pública não se confundiria com a intervenção ex lege do Ministério Público nas demandas coletivas (art. , § 1º, da Lei da Ação Civil Pública), cujo escopo central é averiguar a correta e regular tramitação da demanda coletiva, o respeito às exigências legais, a boa condução das partes na demanda coletiva etc.

Essa intervenção obrigatória no processo coletivo, muito semelhante àquela do processo individual na qual foi denominada de custos legis – no atual CPC, fiscal da ordem jurídica –, como expõe o artigo 178 da legislação processual cível, 10 não pode ser confundida com a intervenção ad coadjuvandum da Defensoria Pública em prol da coletividade de vulneráveis, motivo pelo qual essa última foi denominada, simplesmente para efeitos de revelar a essência da distinção interventiva, custos plebis. O jogo de palavras, portanto, não pretende evocar o latinismo vazio, mas, tão somente, contrapor custos legis x custos plebis como intervenções com escopos distintos. 11

Em um contexto comparativo, a intervenção ad …

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26 de Maio de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/capitulo-7-intervencao-da-defensoria-publica-em-processos-com-interesse-de-grupos-vulneraveis-revisitacao-do-tema-casos-de-atuacao-e-inovacoes-legislativas/1970550749