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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Paraná
há 5 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

5ª Câmara Cível

Publicação

Julgamento

Relator

Desembargador Leonel Cunha
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Inteiro Teor


Íntegra do Acórdão
Ocultar Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ
5ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901
Autos nº. XXXXX-07.2015.8.16.0056

Apelação Cível nº XXXXX-07.2015.8.16.0056
1ª Vara da Fazenda Pública de Cambé
OSVALDO CANDIDO NETO, JOSE CARLOS CAMARGO,Apelante (s):
CARLOS RASTEIRO, ALMIRO DE VASCONCELOS UCHOA, OSIRES
CAVALETTI, Luiz Guizilini, Carlos Alberto Abudi, ALENCAR DINIZ DA
SILVA, ARMANDO JAIRO DA SILVA MARTINS e VALDEMIR FRANCISCO
DOS SANTOS
Município de Cambé/PRApelado (s):
Relator: Desembargador Leonel Cunha

EMENTA

1) DIREITO ADMINISTRATIVO. VEREADORES QUE
RECEBERAM INDENIZAÇÃO EM RAZÃO DE COMPARECIMENTO EM
SESSÕES EXTRAORDINÁRIAS NO ANO DE 2001. AUTORIZAÇÕES
LEGAIS E CONSTITUCIONAIS. DECISÃO DO TCE QUE AFASTOU LEI
QUE AMPARAVA TAL RECEBIMENTO E IMPÔS DEVOLUÇÃO DOS
VALORES RECEBIDOS. AUSÊNCIA DE ATO DE MÁ-FÉ QUE
CAUSASSE DANO AO ERÁRIO. DECISÃO DO ÓRGÃO ESPECIAL DO
TJPR QUE REPUTOU INDEVIDA A DEVOLUÇÃO DE VALORES, AINDA
QUE RECEBIDOS EM VIRTUDE DE LEI INCONSTITUCIONAL.

a) As decisões dos Tribunais de Contas podem ser objeto de
controle judicial não apenas quanto à formalidade de que se revestem, mas
inclusive e especialmente quanto sua legalidade, eis que tais decisões,
despidas de jurisdição, não fazem coisa julgada, predicado exclusivo das
decisões provindas dos Órgãos do Poder Judiciário, cabendo destacar que
a própria Constituição Federal impõe, como princípio, a inafastabilidade do
controle judicial de qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º,
XXXV).

b) Dentre os 10 Autores, 7 deles tiveram primeiro mandato na
legislatura em que receberam as indenizações, não tendo tido qualquer
participação na feitura da Lei que previu tal pagamento. Os outros 3 Autores
exerceram seu direito de voto em Projeto de Lei de iniciativa de terceiros
que iria, ainda, depender de ato futuro e incerto – convocação para sessão
extraordinária – de outra pessoa para, aí sim, redundar no pagamento da
verba, de modo que não se pode reputar tenham praticado, de má-fé, ato
que tenha diretamente redundado em prejuízo aos cofres públicos.

c) Sendo possível concluir que os Autores não foram os
responsáveis pelos pagamentos de que foram beneficiários, aplicável o
entendimento do STJ segundo o qual, “quando a Administração Pública
interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao
servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são
legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos,
ante a boa-fé do servidor público”.

d) Em julgamento de Mandado de Segurança, o Órgão Especial
deste Tribunal modulou os efeitos da decisão que reputava inconstitucional
Lei Municipal que reajustara subsídios de vereadores e, inobstante a
inconstitucionalidade, entendeu indevido impor aos Vereadores favorecidos
a devolução da verba naquilo que fora majorada. Tal compreensão é
adequada ao caso dos autos, pelo que, ainda que fosse reputada
inconstitucional a Lei Municipal de Cambé, não seria caso de se impor aos
Vereadores-Autores a obrigação de devolução dos valores ora em causa.
2) APELAÇÃO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.

Vistos, RELATÓRIO

1) Em 16.04.2015, CARLOS ALBERTO ABUDI, ALENCAR DINIZ
DA SILVA, ALMIRO DE VASCONCELOS UCHOA, OSIRES CAVALETTI,
OSVALDO CANDIDO NETO, JOSÉ CARLOS CAMARGO, CARLOS
ALBERTO RASTEIRO, CARLOS ALBERTO RASTEIRO, LUIZ ALBERTO
GUIZILINI, VALDEMIR FRANCISCO DOS SANTOS e ARMANDO JAIRO
DA SILVA MARTINS ajuizaram ação que nominaram AÇÃO
DECLARATÓRIA E ANULATÓRIA DE LANÇAMENTO DE CRÉDITO NÃO
em face do MUNICÍPIO DE CAMBÉ, argumentando que: TRIBUTÁRIO a)
foram Vereadores do Município de Cambé durante a Legislatura 2001/2004;
a Lei Orgânica do Município, a Lei Municipal nº 1473/2000, assim comob)
as Constituições Federal e Estadual permitiram aos Autores que, no
primeiro ano de seus mandatos, recebessem indenização pecuniária pelo
comparecimento nas sessões extraordinárias de janeiro, fevereiro e julho de
2001, num total de R$ 7.200,00 cada um; o Tribunal de Contas do Estadoc)
(Acórdão 345/2014), inobstante aprovar as contas do período, determinou
aos Autores que devolvessem os valores recebidos, entendendo “o
colegiado do TCE/PR que a Lei Municipal nº 1.473/2000, votada e aprovada
em 21 de dezembro de 2000, seria nula em razão de ter sido publicada após
as eleições ocorridas naquele ano de 2000”; d) “há de se expressar a
contradição no julgamento, ou seja, como declarar nula a Lei Municipal
1.473/2000 se o próprio TCE/PR já havia aprovado as contas do órgão
legislativo municipal de Cambé em relação à fixação dos subsídios dos
vereadores para a legislatura seguinte (2001/2004) com fulcro e após
análise daquela mesma lei?; e) “em razão, pois, da violação ao que
constava na Constituição Federal e Estadual que, até então, não impedia o
pagamento pelo comparecimento em sessões extraordinárias, e,
decisiumpontualmente, pela declaração de nulidade da Lei 1.473/2000, cujo
violou o contido em norma superior, qual seja, expressamente o art. 11 da
Lei Orgânica do Município de Cambé, o qual dispunha apenas que a matéria
deveria ser votada em legislatura anterior, é que se insurgem os Autores
neste pleito, os quais pretendem anular a decisão do Acórdão 345/2014,
julgando a regularidade dos recebimentos pelo comparecimento nas
sessões extraordinárias dos meses de janeiro/2001, fevereiro/2001 e julho
Pediram procedência.daquele mesmo ano”.

2) O MUNICÍPIO DE CAMBÉ contestou (110.1), arguindo,
preliminarmente, ser caso de extinção do feito sem resolução do mérito, em
razão da existência de coisa julgada material do julgado do Tribunal de
Contas, que determinou o ressarcimento das verbas indenizatórias ao
Município. Acrescentou ser vedado ao Judiciário avaliar as decisões do
TCE. No mérito, argumentou que: não há amparo legal para oa)
recebimento das verbas indenizatórias decorrentes de comparecimento á
sessões extraordinárias por parte dos Vereadores, visto que o TCE declarou
inconstitucional a Lei Municipal nº 1.473/2000 que previa tal possibilidade;
os fatos alegados na petição inicial divergem da realidade visto que ob)
TCE não utilizou a Lei Municipal n.º 1473/2000 para aprovar as contas da
Câmara Municipal de Cambé no ano de 2001, tendo na verdade, baseado
sua decisão na antiga lei 1.273/1999; houve má-fé por parte dosc)
Vereadores, pois legislaram em causa própria, visto que 07 dos 12
vereadores que aprovaram a referida lei foram reeleitos na época e que o
procedimento legislativo ocorreu em 21 de dezembro de 2000, sendo este
período posterior à data da realização das eleições municipais. Pediu
improcedência.

3) Os Autores impugnaram a contestação (132.1).

4) O Ministério Público opinou pela improcedência do pedido
inicial (255.1).
5) A sentença (293.1) julgou improcedente o pedido, entendendo
que o TCE julgou ilegal a Lei Municipal 1473/2000, o que retirou dos
pagamentos o verniz de legalidade que os revestia. Acrescentou que,
“mesmo sendo verificada que a referida Lei foi publicada para entrar em
vigor no ano seguinte, tem-se configurado a legislação em causa própria,
isso porque, os vereadores, reunidos e reeleitos, após uma eleição
municipal, no dia 21 de dezembro de 2000, criaram lei extremamente
benéfica em causa própria, não havendo legalidade nas condutas”.
Condenou os autores ao pagamento das custas processuais e de 15% de
honorários sucumbenciais sobre o valor atualizado da causa. Sentença
mantida em Embargos de Declaração (321.1).

6) Os Autores apelaram (344.1), noticiando o falecimento do
Autor CARLOS ALBERTO RASTEIRO e requerendo o sobrestamento do
feito até regularização da relação processual. Nas razões de mérito,
reiteraram os termos da inicial, destacando que: a) “estando ainda no
primeiro ano de seus mandatos, em 2001, os Autores, de completa BOA-FÉ,
receberam pelo comparecimento nas sessões extraordinárias durante o mês
a Lei Municipal emde janeiro, fevereiro e julho daquele ano de 2001”; b)
causa foi proposta pela Mesa Diretora da Casa Legislativa (legislatura
1997/2000), sendo que estes membros não foram reeleitos; o fato destac)
Lei, que previa a remuneração pelo comparecimento às sessões
extraordinárias, ter sido aprovada após as eleições é irrelevante, já que
apenas se exigia que fosse votada em legislatura anterior, não,
necessariamente, antes das eleições; anterior da Lei que fixasse subsídios,
o que não era o caso; o pagamento da verba por comparecimento àsd)
sessões extraordinárias era admitido pela CF, tornando-se vedado apenas
pela EC nº 50, em 2006; e) “havia autorização expressa constitucional, havia
autorização expressa na Constituição Estadual, havia autorização expressa
na Lei Orgânica do Município de Cambé e, por fim, havia uma lei votada e
promulgada na legislatura anterior (Lei 1.473/2000) a qual, para fins de
prestação de contas da Câmara Municipal de Cambé, foi considerada válida
e eficaz. Oras, se havia todo este arcabouço jurídico autorizativo, deduz-se
que não havia dúvida relevante por parte do Órgão Legislativo em proceder
com os pagamentos, tanto que jamais foram reprovadas as suas contas ou
realizadas ressalvas ou recomendações expressas a respeito”; e) “é
indiscutível que em 2001, em nova legislatura, os Autores/Apelantes,
estreando na vereança, agiram na mais completa boa-fé”; f) “Não estão
sujeitos à repetição os valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, em
decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da
Pediram provimento.Administração Pública”.

7) Contrarrazões no mov. 350.1.

É o relatório

FUNDAMENTAÇÃO

Julgo comportar provimento o recurso dos Autores.

Relembre-se que a sentença apelada julgou improcedente o
pedido inicial fundamentando-se, essencialmente, em duas premissas: 1) a
sentença deu prevalência ao que decidido pelo Tribunal de Contas do
Estado. E a Corte de Contas entendeu ilegais os recebimentos das
indenizações por comparecimento em sessões extraordinárias porque
reputou inválida a Lei Municipal nº 1473/2000, que previa tal pagamento.
Assim, ao desconsiderar mencionada Lei, não haveria previsão legal para o
pagamento, pelo que impôs aos Autores a obrigação de ressarcir os valores
percebidos a este título; 2) a sentença entendeu terem os Autores legislado
em causa própria, agindo com má-fé ao aprovarem o Projeto de Lei após
eleições nas quais vários Vereadores obtiveram reeleição.

1) Das decisões do TCE – Controle judicial e coisa julgada material

Pois bem, de início, consigne-se que as decisões dos Tribunais
de Contas podem ser objeto de controle judicial não apenas quanto à
formalidade de que se revestem, mas inclusive e especialmente quanto sua
legalidade, eis que tais decisões, despidas de jurisdição, não fazem coisa
julgada, predicado exclusivo das decisões provindas dos Órgãos do Poder
Judiciário.

Assim sendo, as decisões do TCE não são imunes à jurisdição,
sendo permitido ao Judiciário escrutinar tais atos, eis que a própria
Constituição Federal impõe, como princípio, a inafastabilidade do controle
judicial de qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV).

2) Da conduta dos Autores

Quanto à má-fé que a sentença viu na conduta dos Autores, não
a reputo presente.

De início, consigne-se que, dos dez Autores desta ação, sete
estiveram em seu primeiro mandato de modo que, evidentemente, não se
pode afirmar terem legislado em causa própria, afinal, não detinham
mandato quando aprovada a Lei Municipal em questão.

Assim, em relação a estes sete, não há dúvida de que aplicável a
compreensão assentada pelo STJ que indica ser legítima a expectativa do
Servidor de boa-fé de que os valores percebidos assim o foram legal e
definitivamente.
Note-se que o entendimento, recolhendo larga aceitação na
jurisprudência, foi consolidado em tese submetida ao rito dos recursos
repetitivos, vindo o Superior Tribunal de Justiça, portanto, a conferir especial
relevância ao ânimo subjetivo do servidor público para a consideração
quanto ao dever de ressarcimento:

“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR
PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS
INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI.
.IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO
RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO
CPC.
1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução
ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando
pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de
interpretação equivocada de lei.
2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com
alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do
direito, como a boa-fé.
3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta
erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor,
cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e
definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante
.a boa-fé do servidor público
4. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de
controvérsia, e dasubmetido a regime do artigo 543-C do CPC
Resolução 8/STJ.
5. Recurso especial não provido.
( REsp XXXXX/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/10/2012, destaquei)”.

Oportuno esclarecer que não se desconhece, que os Vereadores,
por serem detentores de mandato eletivo, não são “equiparados” a
funcionários públicos municipais. Mas não há razão para não aplicar a
analogia, já que, se de um lado é inconcebível tratar o servidor público como
vereador, de outro lado não é desarrazoado considerar, neste ponto e para
estes efeitos, o vereador como servidor público .lato sensu

Em relação aos outros três Autores, que detinham mandato
quando aprovada a Lei Municipal nº 1473/2000, também não se pode
afirmar terem praticado ato de má-fé.

De início, sequer se sabe como votaram, se a favor ou
contrariamente ao projeto. De todo modo, ainda que tenham-no feito
favoravelmente, é de se observar que não compunham a Mesa Diretora da
Câmara Municipal e, como consta dos autos, não foi destes três Vereadores
a iniciativa do Projeto de Lei.

Ainda, de se mencionar que se tratava de Lei e não de ato
administrativo de efeitos concretos imediatos. Tratava-se de mera
autorização legislativa que, para ter efeitos, exigiria futura e incerta
convocação dos Vereadores para sessões extraordinárias, sendo, este ato
de convocação, incumbência do futuro Presidente da Câmara.

Ou seja, não vejo como reputar tendo agido de má-fé e
provocado dano ao erário o Vereador que exerceu seu direito de voto num
Projeto de Lei de iniciativa de terceiros que iria, ainda, depender de ato
futuro e incerto – convocação para sessão extraordinária – de outra pessoa
para, aí sim, redundar no pagamento da verba.

Oportuno citar que caso bastante semelhante já foi julgado por
esta Quinta Câmara cível, valendo transcrever a ementa da decisão que
julgou indevida a devolução de verbas indenizatórias como aquelas tratadas
nestes autos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO
ADMINISTRATIVO. ACÓRDÃOS DO TCE QUE REPROVARAM AS
CONTAS DOS AGRAVADOS, EM FUNÇÃO DO VERBAS
INDENIZATÓRIAS POR SESSÕES EXTRAORDINÁRIAS AOS
DO MUNICÍPIO DE ARAPONGAS. VEREADORES VERBA AUTORIZADA
VEDAÇÃO PELA EC 50/2006.PELA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL À ÉPOCA.
DÚVIDA QUANTO À EXTENSÃO DA PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL AOS
ESTADOS E MUNICÍPIOS. PRECEDENTES DO STF. INEXISTÊNCIA DO
REQUISITOS AUTORIZADORES PARA A TUTELA DE URGÊNCIA.DOLO.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO CONHECIDO E
DESPROVIDO.
(TJPR – AI nº 1592092-4 – Rel. Des. LUIZ MATEUS DE LIMA –
Publ. 03.03.2017 – Destaquei).

Por tais compreensões, já entendo indevida a imposição aos
Autores do dever de devolver os valores recebidos em razão das
convocações de que tratam os autos.

3) Da modulação de efeitos provinda do Órgão Especial em julgamento
de caso similar

Mas ainda reputo relevante mencionar que o Órgão Especial do
TJPR julgou Mandado de Segurança impetrado contra acórdão do TCE que
impunha a Vereadores de Umuarama a devolução de valores recebidos em
razão de Lei Municipal que, de forma inconstitucional, lhes reajustara o
subsídio.

Naquela decisão, o OETJPR reconheceu que a Lei
umuaramense, de fato, padecia de inconstitucionalidade porque editada já
na própria legislatura para a qual valeria o reajuste que ela estabelecia. E,
ante tal constatação, reconheceu que o acórdão do TCE – que reprovara as
contas da Câmara e determinara a devolução dos valores excedentes –
estava correto e merecia ser mantido.

Contudo, em relação à imposição da obrigação de devolver os
valores recebidos por aqueles Vereadores, optou o OETJPR por modular os
efeitos de sua decisão para, mantendo o acórdão do TCE, desobrigar os
Vereadores envolvidos de tal devolução, mesmo que os tivessem recebido
em decorrência de Lei reputada inconstitucional.

Cabe transcrever a ementa do MS citado:

“MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE
CONTAS QUE DESAPROVOU AS CONTAS DA CÂMARA MUNICIPAL DE
UMUARAMA NO EXERCÍCIO DE 2003 E RESPONSABILIZOU OS
VEREADORES, PESSOALMENTE, PELO AUMENTO DE SUBSÍDIOS
CONSIDERADO CONTRÁRIO AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E
IMPESSOALIDADE ADMINISTRATIVAS. LEI MUNICIPAL 2.238/2000 QUE
FIXOU OS SUBSÍDIOS PARA A LEGISLATURA 2001 A 2004, EDITADA
POSTERIORMENTE ÀS ELEIÇÕES DO ANO DE 2000.
INCONSTITUCIONALIDADE. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE QUE É DE
SER CONSIDERADO IMPLÍCITO NO ORDENAMENTO JURÍDICO.
COROLÁRIO DOS PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E MORALIDADE
ADMINISTRATIVA. IRRELEVÂNCIA DA VACATIO ENTRE A EMENDA
19/98 E A EMENDA 25/00. DISTINÇÃO DOS PRECEDENTES DESTA
CORTE. QUANDO O TRIBUNAL DE CONTAS AGE DENTRO DE SUA
COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL, O REEXAME PELO PODER
JUDICIÁRIO É CIRCUNSCRITO À ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE
E LEGALIDADE DO ATO IMPUGNADO. NO CASO, MUITO EMBORA O
ATO INQUINADO ESTEJA DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA
ANTERIORIDADE DA LEGISLATURA, AINDA QUE IMPLÍCITO NO CASO
ESTE ÚLTIMO, MODULAM-SE, EM PARTE, OS EFEITOS DESTA
DECISÃO, AFASTANDO OS IMPETRANTES DOS EFEITOS DA DECISÃO
ATACADA NO QUE CONCERNE À DEVOLUÇÃO DAS DIFERENÇAS
ENTRE OS SUBSÍDIOS FIXADOS ANTES E DEPOIS DA LEI MUNICIPAL
TODAVIA, MANTÉM- SE NA ÍNTEGRA OSNº 2.238, DE 26.12.2000.
DEMAIS EFEITOS DO ACÓRDÃO DO TCE EM RELAÇÃO AOS
IMPETRANTES, NOTADAMENTE NO QUE SE REFERE AO ATO 006/2003
DA MESA DA CÂMARA MUNICIPAL QUE REVISOU SUBSÍDIOS NO
EXERCÍCIO DE 2003, DURANTE A LEGISLATURA, POR OFENSA AO
REGIME JURÍDICO-ORÇAMENTÁRIO DO ART. 37, INCISO X, DA CF/88 E
DO ART. DA LEI FEDERAL 10.331/01. ORDEM PARCIALMENTE
CONCEDIDA”.
(TJPR - Órgão Especial - MS nº 1.117.154-7 - Curitiba - Rel.: Des.
CLAYTON DE ALBUQUERQUE MARANHÃO – Um. - Publ. 15.05.2015,
destaquei).

Entendo, pois, que é caso de trazer ao presente processo a
mesma compreensão do Órgão Especial. É dizer, ainda que,
eventualmente, se reconhecesse a ilegalidade da Lei Municipal de Cambé
nº 1473/2000, ainda assim não seria caso de se determinar a devolução dos
valores pelos Vereadores recebidos.
Diga-se, ainda, que a atual jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal tem reconhecido que o valor jurídico pode“ressarcimento ao erário”
sucumbir em determinadas circunstâncias, caso estejam presentes,
concomitantemente, a passagem do tempo (prescrição) e o caráter civil do
ilícito (exatamente como aqui):

“Ementa: CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO
ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, §
, DA CONSTITUIÇÃO. 1. É prescritível a ação de reparação de danos à
2. Recurso extraordinário aFazenda Pública decorrente de ilícito civil.
que se nega provimento. (RE XXXXX, Relator (a): Min. TEORI ZAVASCKI,
Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-082 DIVULG XXXXX-04-2016 PUBLIC
28-04-2016, destaquei).

Disso se pode concluir que o caráter do ressarcimento ao erário,
em se tratando de ilícito civil (que não seja decorrente de improbidade, por
exemplo), é relativo, podendo ceder a outros valores, tal como a segurança
jurídica (no caso do precedente do STF).

Assim sendo, não se podendo reputar tendo agido de má-fé os
Autores, nem mesmo os três que já eram Vereadores, e aplicando a
modulação de efeitos já referendada em caso similar pelo OETJPR, entendo
merecer guarida a pretensão recursal dos Autores para lhes desobrigar da
devolução dos valores recebidos em decorrência da convocação
extraordinária de que tratam os autos.

4) Do falecimento de um dos Autores

Necessário resolver, por fim, a questão do Autor cujo falecimento
foi noticiado na Apelação.

A rigor, seria caso de suspender o trâmite deste processo para
que fosse regularizada a relação processual, seja pela habilitação de seus
sucessores, seja pela substituição do por inventariante.de cujus

Tal providência, contudo, reputo-a desnecessária, vez que a
presente decisão, ao dar provimento ao pedido formulado pelo
Autor-Falecido, poderá, a teor do art. 506, do CPC/2015, aproveitar a
terceiros. No caso, aproveitará a seus sucessores, ou seja, àqueles que o
sucederiam no pólo ativo da demanda e, também, no pólo passivo de
eventual execução do acórdão do TCE.

É que o mencionado artigo do CPC atual, distintamente do
correspondente do CPC revogado (art. 472), permite, hoje, que a coisa
julgada favoreça terceiros – já que veda, apenas, que os prejudique –,
quando o Código anterior vedava também que os beneficiasse.

Útil transcrever, para comparação, os dispositivos citados, no que
pertinente:

Art. 506. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é
dada, terceiros.não prejudicando

Art. 472. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é
dada, terceiros. (...).não beneficiando, nem prejudicando
Deste modo, com efeito, a decisão que desobriga os Autores do
pagamento imposto pelo TCE aproveitará aos sucessores do
Autor-Falecido, sendo desnecessário, para que sejam beneficiados, que
componham a lide.

ANTE O EXPOSTO, voto por que seja julgada dado provimento
à Apelação dos Autores, para afastar a obrigação de devolução dos valores
percebidos em razão do comparecimento às Sessões Extraordinárias da
Câmara de Vereadores de Cambé no ano de 2001 Invertem-se, pois, as.
cominações sucumbenciais.

DECISÃO

ACORDAM os Desembargadores integrantes da 5ª Câmara Cível
deste TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por
de votos, em à Apelação.unanimidade dar provimento

O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Leonel Cunha
(relator), com voto, e dele participaram Desembargador Luiz Mateus De
Lima e Desembargador Renato Braga Bettega.

30 de julho de 2019
Desembargador LEONEL CUNHA
Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-pr/835007576/inteiro-teor-835007585

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