Concurso Público: Candidato com formação superior à exigida no Edital não pode ser preterido em tomar posse em concurso que alcançou aprovação
Um dos princípios basilares que regem os concursos públicos, sem dúvida, é o princípio da vinculação ao instrumento convocatório que possui regras que vinculam tanto os candidatos aos cargos, quanto à Administração Pública.
Entretanto, em que pese ser o edital, “a lei do concurso”, essa vinculação não é absoluta e as regras contidas no edital devem ser consideradas e interpretadas de acordo com as circunstâncias concretas, devendo prevalecer o seu maior objetivo, qual seja, a seleção dos profissionais mais qualificados para exercer a função na qual serão investidos.
Nessa linha de entendimento a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4a Região, decidiu que os requisitos formais de escolaridade não impedem o acesso ao serviço público, nos casos em que o candidato possua titulação acadêmica superior exigida no instrumento convocatório, desde que a mesma seja compatível com área de conhecimento.
Assim o direito de uma candidata bacharel em Ciências Sociais a tomar posse no cargo de professora de Ensino Básico, foi reconhecido pela referida Turma, após sua aprovação em concurso promovido pelo Instituto Federal Catarinense (IFC). A questão central era que a previsão do edital exigia como requisito para investidura no cargo, licenciatura em Ciências Sociais ou Sociologia e a autora é pós-doutora na disciplina.
O reitor do Instituto através de ato administrativo, excluiu a candidata do certame, mesmo após a sua aprovação, com a justificativa de considerá-la sem “qualificação mínima” necessária para investidura no cargo — justamente a licenciatura. Logo, como não preencheu este requisito, não poderia tomar posse no cargo. A candidata, então, impetrou Mandado de Segurança, alegando ter o grau de bacharel em Ciências Sociais, além de pós-doutorado, doutorado e mestrado na área, sendo estas qualificações suficientes para o exercício da função pública.
Em sede de primeiro grau, a juíza-substituta Lívia de Mesquita Mentz, da 2ª Vara Federal de Blumenau (SC), negou o pedido por entender que as titulações apresentadas pela autora são diferentes das solicitadas no edital. Não sendo possível deduzir que todas as competências desenvolvidas no curso de licenciatura estejam englobadas no currículo do curso superior de bacharelado em Ciências Sociais. Entendeu ainda que o fato de ter ministrado aulas não habilitaria a autora, pois o edital fora claro ao exigir diploma de licenciatura.
Diferenças de Titulação
A juíza para fundamentar a sua decisão citou parecer do representante do Ministério Público Federal: “Não há dúvidas de que a impetrante possui vasta qualificação e experiência. Entretanto, ainda que o bacharelado, mestrado, doutorado e pós-doutorado, todos cursados em instituições de ensino superior, que certamente figuram entre as melhores do país, possam ter lhe conferido conhecimentos na área de licenciatura, o fato é que a impetrante não demonstrou a habilitação específica exigida pelo edital, a qual, destaco, é voltada especificamente à área de licenciatura”.
O juízo a quo ressaltou que o estabelecimento da graduação e dos títulos exigidos para o preenchimento da vaga é questão de mérito administrativo e se justificava por razões técnicas e educacionais. “Na espécie, [a exigência contida no edital] não está eivada de qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, ao revés, é o candidato que deve adequar-se aos termos do edital, instrumento ao qual tem acesso e plena informação no momento em que se inscreve no certame”, aduziu em sede de sentença.
Qualificação Superior
Em sede recursal, a relatora da apelação, a desembargadora Vivian Josete Pantaleão Caminha, divergindo do entendimento da juíza de primeiro grau, determinou a reforma da sentença, pois em sua fundamentação do voto, a aplicação das normas do edital deve e guardar consonância com o caso concreto e com a finalidade precípua de selecionar o candidato mais qualificado para a função.
Destacou, ainda a relatora em seu voto, que a autora não só possui qualificação técnica superior à exigida no edital, como também desempenha atividades compatíveis com a sua formação intelectual, qual seja é professora substituta em uma graduação em Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social e pesquisadora em nível de pós-doutorado em Política Social.
Salientou, também a desembargadora que o edital estabelece como requisito, um nível mínimo de qualificação para o desempenho satisfatório das atribuições atinentes ao cargo. O que não impediria, no entanto, o acesso de candidato que, embora formalmente sem habilitação no campo da licenciatura, tenha atingido patamares mais elevados de formação acadêmica e profissional na área específica, visto que, para além da pura e simples dicção legal, a exigência visa a atender ao princípio da eficiência administrativa.
A desembargadora, também citou o parecer do representante do MPF no colegiado, que opinou pela procedência da apelação, e a jurisprudência da corte.
Há ainda precedentes em julgados no Superior Tribunal de Justiça.
A ementa do acórdão do Reexame Necessário, tombado sob o nº. 5005225-88.2015.404.7000: “A jurisprudência deste Tribunal assentou o entendimento de que não se afigura razoável excluir candidato com qualificação superior à exigida e dentro da mesma área de formação, uma vez que o objetivo da administração ao realizar um concurso público é o preenchimento dos cargos com os candidatos mais preparados”.
Link para acesso ao inteiro teor da decisão: https://trf-4.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/404276258/remessa-necessaria-civel-5001851282015404710...
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