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30 de Abril de 2024

“Excesso de proteção muitas vezes desprotege”

Para Barroso, lógica de que o empregado tem sempre razão estimula comportamento incorreto

há 7 anos

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso considera que a espinha dorsal da reforma trabalhista é a tese de que o Estado tem o dever de proteger o hipossuficiente, mas não de incentivar que ele seja incorreto e que “o excesso de proteção muitas vezes desprotege”.

A análise foi feita no segundo dia do Seminário Reforma Trabalhista: Impactos nas Relações de Trabalho, organizado pelo Espaço Intelectual e pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Belo Horizonte.

“A lógica de que o empregado tem sempre razão estimula o comportamento incorreto”, afirmou Barroso. O ministro contou o caso de uma funcionária do Banco do Estado de Santa Catarina que aderiu a um plano de demissão voluntária e, depois de receber 78 meses de salário, ingressou com uma reclamação trabalhista dizendo que havia verbas que não tinha recebido.

O Tribunal Superior do Trabalho entendeu que ela podia manter a ação, ou seja, tinha o direito de dar quitação geral em Programa de Demissão Voluntária e depois ingressar com uma reclamação.

Já o STF, em processo de relatoria do próprio Barroso, decidiu no sentido contrário, que a superproteção de dissídio individual não se aplica a negociação coletiva com adesão espontânea.

Para Barroso, o Brasil criou “uma sociedade viciada em Estado, viciada em paternalismo”. “É muito difícil mudar essa cultura de dependência. Ela traz certas comodidades, certos confortos ao mesmo tempo em que infantiliza as pessoas”.

Excesso de proteção

“Uma maior proteção do empregado em face do empregador é correta, mas há um limite”, afirmou o ministro. Para ele há um nível ótimo de proteção a partir do qual a vida fica pior para o empregado.

Barroso citou que alguns estudos demonstram que o excesso de proteção trabalhista produz desemprego e informalidade e, apesar de ele não conseguir atestar se a tese é verdadeira, ela parece plausível já que algo similar aconteceu com o mercado de locação de imóveis.

Quando era mais regulado, o mercado fazia com que proprietários deixassem as propriedades ociosas com receio de não conseguir retomá-las do locador para seu usufruto.

“Veio uma nova legislação, menos protetiva ao locatário, e a consequência prática foi que aumentou exponencialmente a oferta de imóveis para aluguéis e o preço para locação caiu”, afirmou.

Excesso de judicialização

Outro ponto que a reforma trabalhista tenta enfrentar, para Barroso, é o excesso de judicialização. Antes de citar dados, o ministro ressaltou que não foi ele que os produziu já que “outro dia alguém me enxovalhou num artigo porque eu usei uma pesquisa, que não fui eu que fiz”.

No Brasil, segundo dados do CNJ, foram ajuizados na Justiça do Trabalho em 2015 4 milhões de novos processos – número muito superior, segundo dados citados por Barroso, do que as 75 mil novas ações na França ou as 200 mil novas ações nos Estados Unidos. “Apenas um grande banco brasileiro tem mais ações trabalhistas do que todos os EUA”, afirmou.

Segundo o ministro, é preciso pensar se não é barato demais litigar no Brasil. Estudos demonstram, segundo Barroso, que o custo individual do litígio não pode ser menor do que o custo administrativo e social que ele gera, sob pena de incentivar o excesso de litigiosidade, “que traz a ficção de acesso à Justiça porque ela começa a levar 5, 8, 10, 12, 15 anos para resolver”.

*A reportagem viajou a convite dos organizadores do evento

Fonte: O Jota

Kalleo Coura - Belo Horizonte

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11 Comentários

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"O Brasil criou uma sociedade viciada em Estado, viciada em paternalismo”.

Perfeito resumo da sociedade brasileira. continuar lendo

Neste caso, só falou o óbvio. Aliás o óbvio já bem demonstrado por experiência do Brasil e de outros países. Mas parece que o óbvio no Brasil não é muito admitido. É engraçado que se ache que o Brasil é um país de alienígenas em relação ao qual observações de outros países não se aplicariam. Curioso também que o fluxo migratório NUNCA é dos países menos protecionistas para os mais. Lógica malvada... continuar lendo

Vou parafrasear as palavras do ex ministro Joaquim Barbosa, em discussão com o Gilmar "mala" Mendes: "Saia nas ruas, Min. Barroso... saia nas ruas".. continuar lendo

Concordo, Gustavo. continuar lendo

Tenho admiração pelo Ministro, entretanto, esse talvez nunca soube o que é ser demitido e esperar pelo Poder Judiciário, quando não existe acordo entre as partes, e a pessoa não tem de onde tirar dinheiro para comer. EXISTE UM DISTANCIAMENTO DE ALGUNS MAGISTRADOS DO POVO QUE É IMPERDOÁVEL. O concurso da magistratura deveria cair noções de humanidade e respeito com o próximo. continuar lendo

Engraçado que uma reforma trabalhista deve "desproteger" empregados, e acaba por proteger... Empresas. São as empresas que precisam desse afago por parte de nossos ministros? Num país com 14 milhões de desempregados, são os trabalhadores que precisam "aprender" a parar de reclamar e, alienados, trabalharem mudos como animais? As vezes tem-se a sensação de que tarifas telefônicas possuem mais atenção do judiciário do que as pessoas. As vezes eu sinto que os magistrados brasileiros são alienígenas que passaram num concurso público. continuar lendo

meu caro, uma boa parte dos 14 milhões se deve exatamente ao excesso de "proteção" da clt.

abra uma empresa e se mantenha funcionando por uns 3 anos e voltamos a conversar. continuar lendo

Oi, Norberto. Historicamente existem dados que não devemos deixar de considerar: 1) o (des) empregado é a figura mais frágil numa sociedade baseada na iniciativa privada; ou ele aceita os postos de emprego que são oferecidos, de acordo com a vontade do empresário/investidor, ou ele se sujeita ao subemprego, à fome, à falta de acesso à saúde, à mendicância, etc. 2) os empresários/investidores, na condição de "polo mais forte" das relações econômico-financeiras, são capaz de impor sua vontade e até mesmo minar direitos básicos dos (des) empregados. Lembremos da Inglaterra do século XIX, berço da Revolução Industrial, onde o Estado era "mínimo" em se tratando de legislações trabalhistas. Era naquele país que existiam as chamadas "work-houses", espécies de "senzalas" de iniciativa liberal. Era naquele país que mulheres gestantes pariam seus filhos entre as máquinas das grandes indústrias, filhos estes que aos três anos já estavam empregados, porque suas mãozinhas eram mais adequadas no trato de peças industriais diminutas.

Porque que nos momentos de crise sempre quem sofre as piores consequências são os trabalhadores? Porque não se faz auditoria da dívida pública? Porque que não se corre atrás de empresas sonegadoras de impostos? Eu não preciso abrir uma empresa pra constatar o quanto existem equívocos e dissimulações grosseiros na gestão do interesse público. Por mais flexível que seja a legislação quanto aos direitos trabalhistas, empresários e investidores, como a História tem demonstrado, desde o mais simples ponto comercial, até os maiores conglomerados empresariais, darão um jeito de minar direitos sociais e trabalhistas, já que isso representa aumento na sua margem de lucro. Num contexto de crise como este, não é menos que um ultraje a aprovação e defesa de "reformas" deste gênero. continuar lendo

E aproveitando que você propôs um exercício de empatia, aceite ser um empregado sem direito à previdência e daqui a 30 anos a gente volta a conversar... continuar lendo