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4 de Maio de 2024

Modulação dos efeitos da sentença

Em 2008, o Supremo Tribunal Federal (STF) completou um ciclo de reformas estruturais, este período foi denominado pelo Ministro Gilmar Mendes de “Processo de reengenharia institucional do Poder Judiciário” e também de “Revolução Silenciosa”.[2] Este ciclo foi marcado por uma série de inovações normativas, entre elas se encontra a lei n. 9.868/99 (lei da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI), que é apontada como marco inicial.

Assim considerando a importância desta lei, o presente trabalho tem como objetivo tratar especificamente da aplicação do art. 27, da lei n. 9.868/99 e do art. 11, da lei n. 9.882/99 que legitimam a modulação dos efeitos na ação direta de inconstitucionalidade, na ação declaratória de constitucionalidade e na arguição de descumprimento de preceito fundamental.

Contudo, alguns doutrinadores veem a possibilidade da aplicação da modulação dos efeitos em caso de ação direta de inconstitucionalidade por omissão, lacuna normativa e em caso de ações interventivas[3].

Dessa forma, com a introdução deste efeito, pode o STF por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, restringir os efeitos da decisão no controle concentrado de constitucionalidade, estabelecendo se a decisão terá eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou se será em outro momento.

E em caráter inovador, o STF tem aplicado este efeito no controle difuso de constitucionalidade, especialmente em Recursos Extraordinários, ou seja, em casos em que se faz necessário um juízo de ponderação e proporcionalidade, onde a declaração de inconstitucionalidade e seus efeitos ex tunc seriam prejudiciais à sociedade e ao próprio sistema jurídico, e a harmonia da ordem constitucional. Contudo, a restrição dos efeitos é controversa, sendo inclusive objeto de duas ações diretas de inconstitucionais, ADIs n. 2.154 e 2.258, pendentes de julgamento pela Suprema Corte.

REQUISITOS (OU PRESSUPOSTOS) DA MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA NO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Com a declaração da decisão a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo federal ou estadual terá efeito retroativo (ex tunc) e para todos (erga omnes), sendo desfeito, desde sua origem, o ato declarado inconstitucional, juntamente com todas as consequências dele derivadas[11], ou seja, a declaração de inconstitucionalidade e a retroatividade de sua nulidade alcançarão também sentenças judiciais transitadas em julgado, pois segundo o STF “a rescindibilidade do acórdão conflitante” decorre “do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais e da consequente prevalência da orientação fixada pelo STF”[12].

Com isso o Supremo afastou o argumento “de que a decisão proferida na ADI não poderia retrotrair para alcançar a decisão coberta pelo manto sagrado da coisa julgada tendo em conta a jurisprudência da Corte quanto à eficácia ex tunc, como regra, da decisão proferida em controle concentrado, a legitimar a ação rescisória de sentença que mesmo anterior, seja contrária”[13].

Isto ocorre porque, no controle concentrado de inconstitucionalidade não há aplicação do art. 52, X, da CF/88, isto é, o ao normativo ou a lei declarados inconstitucionais saem imediatamente do ordenamento jurídico, desde a decisão definitiva do STF, mas o mesmo não ocorre no caso do controle difuso, como ressalva o ex - Ministro Moreira Alves[14]:

“entre nós, como se adota o sistema misto do controle jurídico de inconstitucionalidade, se esta for declarada, no caso concreto, pelo STF, sua eficácia se limita às partes da lide, podendo o Senado Federal apenas suspender a execução no todo ou em parte, de ei declarada inconstitucional por decisão definitiva do STF (art. 52, X, da CF/88). Já e, se tratando de declaração de inconstitucionalidade, a eficácia dessa decisão é erga omnes e ocorre, refletindo-se sobre o passado, com o trânsito em julgado do aresto desta Corte”.

O advento da lei n. 9.868/99 permitiu ao Supremo modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Assim o art. 27, desta lei prevê in virbis:

“Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança ou de excepcional interesse social, poderá o STF, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado”.

Desta forma, para que o Supremo limite os efeitos da declaração, precisa que dois requisitos sejam cumpridos. Esses requisitos didaticamente se dividem em formal e material. O requisito formal compreende a decisão da maioria de dois terços dos membros do Tribunal e o requisito material compreende a presença de razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social.

Quanto aos limites temporais da declaração, tem-se que em regra o efeito seja ex tunc (retroativo), mas esta regra suporta exceções, sendo a primeira delas: decretação com efeito ex nunc (não retroativo) desde o trânsito em julgado (desde que seja esta declaração fixada pela maioria absoluta – 2/3 dos membros do STF). Já a segunda exceção é que a declaração também terá efeitos ex nunc e o momento fixado deverá compreender entre a edição da norma e a publicação oficial da decisão.

Em relação à segunda exceção, Alexandre de Moraes[15] afirma que:

“o Supremo Tribuna Federal, em sede de ação direta, declarou a inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade da lei impuganda, declarando o Congresso Nacional em mora e fixando prazo de manutenção de vigência e eficácia da lei declarada inconstitucional, ora de 18, ora de 24 meses, para que a situação legal pudesse ser regularizada. Conforme salientou o Ministro Gilmar Mendes, ‘o que importa assinalar é que, segundo a interpretação aqui preconizada, o princípio da nulidade somente poderá se afastado se puder demonstrar, com base numa ponderação concreta, que a declaração de inconstitucionalidade ortodoxa envolveria o sacrifício da segurança jurídica ou de outro valor constitucional materializável sob a forma de interesse social’, para concluir que ‘ a declaração de inconstitucionalidade e, portanto, da nulidade de lei instituidora de uma nova entidade federativa, o Município, constitui mais um dentre os casos – como os anteriormente citados, retirados de exemplos do direito comparado – em que as consequências da decisão tomada pela Corte podem gerar um verdadeiro caos jurídico’.”

Neste momento, deve-se ressaltar que a lei de ADI previu também expressamente a possibilidade de que a interpretação conforme a Constituição e da declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução do texto terem efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e Administração Pública Federal, Estadual e Municipal.

A alteração sofrida pela CF, com o advento da Emenda Constitucional (EC) n. 45/04, em seu art. 102, § 2º, ratifica essa previsão, ou seja, torna constitucional o efeito vinculante das decisões do Supremo, em outras palavras, a EC n. 45/04 “estabelece eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, pra as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo STF nas ações diretas de inconstitucionalidade. Assim, uma vez proferida a decisão pelo STF, haverá uma vinculação obrigatória em relação a todos os órgãos do Pode Executivo e do Poder Judiciário que deverão pautar o exercício de suas funções na interpretação constitucional dada pela Corte Suprema, afastando-se, inclusive, a possibilidade de controle difuso por parte dos demais órgãos do Poder Judiciário[16]”.

E continua, “que os efeitos vinculantes aplicam-se inclusive ao legislador, que não poderá editar nova norma com preceitos idênticos aos declarados inconstitucionais, oi, ainda, norma derrogatória da decisão do STF, ou mesmo, estará impedindo de editar normas que convalidem os atos nulos praticados com base na lei declarada inconstitucional[17]”. Contudo não é este o entendimento do Supremo, pois nos informativos n. 377 e 386[18], ele assevera que o efeito vinculante não abrange o Poder Legislativo, pois se isso acontecesse a relação de equilíbrio estaria afetada, uma vez que com este poder o Supremo reduziria o papel do Poder Legislativo, e modificou inclusive o entendimento de que o efeito vinculante condicionaria o próprio Supremo[19].

Pelo exposto, se verifica que a vinculação obrigatória ocorrerá quando ocorrer a procedência da ação (norma declarada constitucional), a improcedência da ação (norma declarada constitucional), a interpretação constitucional conforme a Constituição e por fim a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução do texto.

Por fim, já quanto à amplitude dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade se extrai que com a declaração de inconstitucionalidade como regra geral o fenômeno da repristinação, ou seja, “a lei anterior supostamente revogada por lei inconstitucional declarada nula com efeitos retroativos (ex tunc) jamais perdeu sua vigência, não sofrendo solução de continuidade[20]”. A exceção desta regra seria a modulação que enseja em afastar a incidência da decisão, neutralizando total ou parcialmente os efeitos represtinatórios da decisão.

5.2) No controle difuso

Em sede de controle difuso, a regra geral é de que a declaração tenha efeito inter partes (entre as partes) e ex tunc (retroativos). Contudo, em situações excepcionais que envolvem razões de segurança jurídica e relevante interesse social, o STF tem adotado também em sede de controle difuso, a modulação dos efeitos, em recursos extraordinários. “Trata-se de casos em que se torna necessário um juízo de ponderação e proporcionalidade, tendo em vista que a declaração de inconstitucionalidade e seus efeitos ex tunc seriam mais prejudiciais à sociedade do que a própria manutenção da inconstitucionalidade, ocasionando danos ao próprio sistema jurídico, prejudicando, inclusive, a própria harmonia da ordem constitucional[21]”.

Assim, com a modulação, os efeitos serão ajustados para que sejam levados em conta somente a partir da publicação do julgado ou de outro momento prospectivo da decisão.

Neste sentido, o Ministro Ricardo Lewandowski admitiu a possibilidade de efeitos modulados em dois recursos extraordinários, cujas justificativas foram:

“ao ordenamento (leia-se o art. 27 da lei n. 9.868/99 e art. 11 da lei n. 9.882/99), no controle concentrado, na medida em que simplesmente autoriza o STF a restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, sem qualquer outra limitação expressa, a rigor não exclui a modulação da própria eficácia subjetiva da decisão (...);

b) que o STF, ao exercer um múnus de matriz político (“guarda da constituição”), se lhe admite considerável margem de discricionariedade exatamente para que ele possa dar efetividade ao princípio da supremacia constitucional;

c) o STF, ao proceder a modulação realiza a ponderação de valores e de princípios abrigados na própria constituição;

d) por fim, ressaltou-se que embora esteja se tratando de processos subjetivos, quando a matéria é discutida pelo Plenário, a decisão resultante, na prática, surtirá efeitos erga omnes.[22] Isto, pois, na medida em que haja uma decisão do Plenário, várias outras surgirão sempre baseadas naquela.”

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