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4 de Maio de 2024

Reflexões acerca do movimento reivindicatório exercido pelos servidores da segurança pública do Estado de Minas Gerais à luz dos princípios constitucionais públicos.

Publicado por Jhonn Anthony Santos
há 2 anos

O destinatário das normas constitucionais, entre elas, às normas relativas à administração pública, deve ser observado para a devida configuração de legitimidade de ações iniciadas por agentes estatais.

Em análise da clássica obra O Príncipe, de Maquiavel, nota-se uma série do que podemos chamar de conselhos ao Príncipe. O conceito de príncipe aplicado pelo autor não traduz o que entendemos contemporaneamente, a ser o filho legítimo e herdeiro do trono do rei, mas sim o próprio represente Monárquico da nação. Nesse prisma, a obra é inteiramente direcionada a orientar o rei no que tange as decisões que lhe seriam viáveis a tomar para a melhor manutenção da paz a curto e a longo prazo. Seu compromisso não é com a moralidade nem com a ética convencionada, mas sim com o que ele – autor – considera necessário para a devida preservação do reino e da ordem.

Pode-se dizer que um clássico só assume essa condição por possuir a atemporalidade como caraterística. Ou seja, sua aplicação principiológica, frise-se, principiológica/mandamental, não perece no tempo, transcendendo gerações e mantendo suas bases fundamentais.

Qual a máxima que se extrai da ilustre obra? Seus conselhos não são para o príncipe. São para os súditos.

Na verdade, a finalidade de sua obra é desconhecida para aqueles que debruçam sobre as obras do autor. No entanto, a compreensão do seu texto e a sua aplicabilidade contemporânea é, indubitavelmente, essencial para compreender a relação entre Estado, sobretudo seus representantes, com os cidadãos. Por isso afirmo sua destinação aos “súditos” e não ao “príncipe”.

Feita as contextualizações iniciais, detenho-me ao cerne da questão.

A doutrina constitucionalista-Administrativista afirma que a administração pública está solidificada em dois princípios fundamentais, a saber: o princípio da indisponibilidade do interesse público e o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado. Vale ressaltar que ambos os institutos não estão presentes de forma expressa no texto constitucional. No entanto, sob uma análise necessariamente positivista, pode se extrair do modelo republicano brasileiro, adotado como forma de governo e expresso nas bases    da carta magna, o fundamento legitimador dos princípios da indisponibilidade do interesse público e do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

Em que se pese ser tais princípios de difícil definição, sobretudo pelo fato de ser uma tarefa, além de dispendiosa, incompatível com o propósito do texto e com o alcance intelectual do autor, o simples ato de conceituá-los cumpre a finalidade almejada. À Luz da doutrina difundida, a administração pública não está disponível ao bel prazer do administrador, estando ele vinculado a finalidade pretendida com seus atos que, de forma genérica, sempre serão voltados para a incolumidade da coisa pública. Nesse sentido, atos administrativos eivados de vícios finalísticos ferem o princípio da indisponibilidade do interesse público. Por conseguinte, a supremacia do interesse público sobre o privado é de simples compreensão literal, mas de aplicabilidade complexa. Estando a administração pública diante de um conflito aparente entre o interesse privado – coletivo ou individual- e o interesse público, esse prevalecerá. Logo, o que se pretende é uma ponderação entre os valores incutidos na norma constitucional, a fim de atingir um máximo grau de efetividade nas prestações que competem à administração realizar.

Em detida análise do caso concreto - o movimento reivindicador de melhorias da condições salariais para agentes de segurança pública do Estado de Minas Gerais - algumas considerações fáticas devem ser feitas. Todas as polícias, militar, civil e penal, respeitando as devidas adesões, estavam ativas nos movimentos. Por pressão de classe e, ao meu ver, acertadamente, fora alterado o status constitucional dos agentes de segurança penitenciário para policiais penais.

Fato é que no texto constitucional há previsão expressa quanto a vedação do direito de greve dos integrantes das forças militares, entendimento que fora ampliado a todas as forças de segurança pelo Supremo Tribunal Federal. De outro modo, é sabido que a constituição federal tutela o direito de greve dos servidores públicos, direito esse que deveria ter seu alcance limitado e regulamentado pelo legislador complementar que, por motivos desconhecidos, até o desfecho do texto, não o fez. Em tal omissão não incorreu o legislador infraconstitucional no que tange a regulamentação do direito de greve dos trabalhadores privados, o não sujeito a regime estatutário ou aquele que não possui relação com a administração pública, de acordo com cada caso. Num exercício de eufemismo desmedido localizado numa zona cinzenta com o sarcasmo, pode-se dizer que tal fato é, no mínimo, curioso.

Em face de ausência de regulamentação, qualquer direito constitucional fundamental possui eficácia plena, à luz dos preceitos da carta maior, o que garante o seu gozo. Nesse prisma, o que fica evidente é o descompasso entre o exercício do direito de greve destinado aos agentes públicos de um modo geral, previsto acertadamente pelo constituinte originário, com os princípios administrativos apresentados nesta obra.

As normas constitucionais, sobretudo seus princípios norteadores da coisa pública, são destinadas à administração pública e àqueles que a integram. Na condição de agentes da coisa pública, a função precípua que lhe fora incumbida é a materialização dos funções do Estado outrora legitimadas e convencionadas pelo exercício democrático. A despeito disso, a figura do agente público em muito se confunde com o próprio Estado e suas funções, a saber: negativa - preservação das liberdades individuais a partir da não ingerência na espera privada; positiva - prestações ativas para a promoção de direitos, a fim de torná-los eficazes.

Deste modo, o Estado, mesmo que na figura de seus agentes, sobretudo em suas funções essenciais ao pleno desenvolvimento social e individual – Segurança, Saúde e Educação, não pode abster-se de cumprir seu dever de permanência e continuidade da coisa pública. Não obstante isso, diligenciando o autor para discorrer com mínima rispidez, a missão que fora dada aos agentes públicos não é imposta, é disposta. Frise-se, é disposta! Em casos de eventual e total insatisfação, o vínculo jurídico que liga a administração pública ao seus respectivos agentes pode ser encerrado por parte desses, caso o interesse nas atividades não relacionadas as do Estado – iniciativa privada seja maior.

Destarte, não é forçoso depreender uma insatisfação comedida; uma insatisfação expressa até os limites do interesse; uma insatisfação que o ônus do seu exercício ainda não existe em face de omissão política já mencionada; uma insatisfação que tornar-se-ia inviável na iniciativa privada, pois a imprevisibilidade do amanhã é a realidade, diferentemente do que é oferecido pelo Estatuto, cuja a permanência é a regra.

Em exercício ousado e ambicioso de buscar replicar em meu texto às finalidades de Maquiavel em seu texto, como incialmente mencionado, dirijo-me ao príncipe, como o supracitado autor o fez, para orientá-lo acerca das prerrogativas lhe foram atribuídas. “Não cedeis a ingerência daqueles que apoiam-se na legalidade pura e conveniente em prol de seus interesses individuais ou coletivos, sobretudo quando a legalidade não retrata legitimidade à luz do interesse público. O compromisso não será rompido enquanto for satisfatório mantê-lo, ainda que em eventual desconforto. Sendo eventual, o custo do rompimento é maior ao da manutenção, por 3 (três) motivos: 1. A manutenção da condição ainda é a melhor escolha, pois a insegurança gerada pelo rompimento geraria uma realidade que a muito se evita. 2. A reinvindicação por condições diferentes, no caso em tela, só se dá pois a manutenção é certa e a insatisfação comedida, caso contrário a permanência estaria comprometida. 3. A certeza de condições melhores a partir do rompimento é incerta, quando não inalcançável, pois as competências prévias são incertas”.

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