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6 de Maio de 2024
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    Relatório do caso Via Varejo

    Por: Bárbara Caporali, Bruna Lemos Borges, Catharina Rocha Furtado, Leticia Araujo Malta e Núbia Santos Damasceno .

    há 4 anos

    A Via Varejo é a empresa responsável pela administração de importantes varejistas, como a Casas Bahia, Extra e a Ponto Frio. A empresa surgiu em 2010 após a compra das Casas Bahia pelo grupo Pão de Açúcar e logo em seguida o Ponto Frio também foi comprada pelo Grupo. Entretanto, apenas em 2012 é que passou a se chamar Via Varejo pois antes era Globex Utilidades. No ano seguinte, a família Klein vendeu 16% de suas ações através de IPO, que é um tipo de oferta pública que visa ofertar as ações na bolsa de valores pela primeira vez, sendo que parte do lucro foi para a família e a outra parte do Grupo Pão de Açúcar. Posteriormente em 2016, a Via Varejo comprou administração da Cnova Brasil, se tornando então dona da Casas Bahia, Ponto Frio e Extra.

    No ano de 2019, o Grupo Pão de Açúcar resolveu vender suas ações, então o empresário Michael Klein resolveu comprá-las, tornando-se o maior acionista da Via Varejo e posteriormente foi nomeado Presidente do Conselho de Administração. Além disso, o Via Varejo também é composto pela empresa Bartira, que é responsável por grande parte dos móveis vendidos pelas demais empresas e VVAtacados que orienta pequenos e médios varejistas através de soluções personalizadas.

    As ações da empresa podem ser negociadas na B3 (Brasil, Bolsa e Balcão) pelas plataformas digitais através das corretoras de valores sendo o pagamento realizado por transferência eletrônica, além disso, possuiu ações ordinárias que dão direito ao voto nas assembleias empresariais.

    Tudo estava aparentemente bem até a empresa receber via complice, no último ano, uma denúncia anônima de que poderia haver uma fraude contábil. São considerados fraude contábeis artifícios ilegais utilizados pelas empresas para melhorar as demonstrações fiscais, apresentando para o mercado um resultado mais benéfico do que o cenário real. A partir dessa denúncia foi aberto um processo de investigação dentro da empresa para apurar os fatos. Na primeira fase de investigação esses indícios de fraude foram confirmados, e a partir de então o conselho de administração contratou empresas especializadas para ajudarem no processo de investigação dos fatos (o escritório Pinheiro Neto e a KPMG de auditoria).

    A fraude consistia principalmente na transformação de despesas contábeis. Alguns executivos da empresa transformavam CAPEX (“capital expenditure” - a quantidade de recursos financeiros alocados para a compra de bens de capital de uma determinada companhia) - despesas pra investimento, em OPEX (despesas gerais, operacionais, como salário) - isso dá uma diferença na valorização da empresa, no caixa – influencia os resultados – no lugar de gastar o dinheiro nas operações que se transformaria em lucro pra empresa – investimento é contabilizado de uma outra forma e o mercado recepciona de outra forma.

    Segundo o site Suno Artigos, a fraude contábil são:

    “todas as estratégias de manipular intencionalmente a contabilidade de uma empresa. Seja para inflar os ganhos para investidores, omitir informações para reduzir a carga tributária ou beneficiar terceiros. Além disso, esse tipo de prática é considerado crime.” (Tiago Reis, 2019)

    As ações tiveram uma queda abrupta após a publicação de um fato relevante (conforme determina a CVM), que explicava a situação das investigações, na qual a fraude poderia ter um impacto de até 1,4 bilhão de reais nas contas da empresa. A Via Varejo afirmou que a conclusão das investigações não impactaria o seu fluxo de caixa ou sua condição financeira. No ano de 2019, a varejista acumulou perdas de R$ 479 milhões, diante perdas de R$ 291 milhões no ano anterior. No quarto trimestre de 2019, ela apurou lucro líquido de R$ 78 milhões, revertendo um prejuízo no período de 2018 de R$ 282 milhões. Registrando sua expansão, o Ebitda ajustado passou de 4,2% para 8% no comparativo em ambos trimestres, mas recuou de 7,6% para 6,8% em 2019. A varejista encerrou o trimestre com um caixa líquido ajustado de R$ 2,2 bilhões e um caixa total de R$ 4,4 bilhões, sendo incluído a carteira de recebíveis não descontados no valor de R$ 3 bilhões.

    O impacto da fraude contábil até o momento não foi julgado judicialmente, sendo o problema resolvido somente internamente dentro da S.A. A companhia, em um comunicado para o público, afirmou que teria um compromisso com a transparência em todas as fases da investigação e deixaria o mercado informado sobre as novas descobertas. Porém, as consequências desse caso vão contra as leis estabelecidas no sistema brasileiro.

    Uma empresa que está sendo acusada de fraude contábil deveria ter os órgãos fiscais abrindo uma auditoria e investigando o caso. Se confirmado a ilegalidade, a empresa deve ser condenada pela prática criminosa. De acordo com o Código Civil, os contadores são responsáveis civilmente pelos atos relativos à escrituração contábil e fiscal praticados e também respondem solidariamente quando praticam atos que causem danos a terceiros. O contador tem responsabilidade civil, tributária e penal sobre vários aspectos da empresa, e o empresário é solidário, também respondendo judicialmente.

    Sob o aspecto da responsabilidade civil, o contador deve obedecer aos termos legais e contratuais, cabendo a este reparar danos causados a terceiros, casa haja erros técnicos no balanço contábil. Já sob a responsabilidade penal, o contador responde sob falsificação ou alteração de documentos, sobre informações incorretas no balanço ou falta de lançamentos na escrituração contábil. E em termos tributários, ele responde por fraude em impostos.

    Cabe salientar que o contador não responde sozinho, pois é função da empresa fornecer informações verdadeiras e agir conforme a lei. Entretanto, se os próprios funcionários da empresa estão cometendo fraude contábil, cabe ao contador, alertar aos responsáveis, pois, caso colabore com tal fraude, responde solidariamente. Além do mais, a empresa acaba sendo vítima de pessoas que se usam seu nome para se protegerem e praticarem crimes, por isso, a empresa não possa ser criminalizada e prejudicada pois, ela é somente administrada, não sendo capaz de tomar decisões próprias. A melhor forma é a aplicação de sanções aos administradores, até porque, eles são os responsáveis pela empresa.

    No que tange aos mecanismos a serem utilizados para evitar fraudes fiscais, sabe-se que é importante a existência de controladoria e auditorias, internas e externas. Nesse caso da Via Varejo, por exemplo, só foi possível a detecção da fraude fiscal porque o sistema interno de denúncias era realmente efetivo. O conselho fiscal tem um papel central nessa fiscalização, e como ele é eleito pelos sócios, estes têm uma grande responsabilidade nas escolhas dos membros.

    A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) cumpre importante papel nesses casos, já que seu fito é o de disciplinar e fiscalizar o mercado. Quando as regras impostas são violadas, ela pode aplicar as sanções cabíveis.

    Após a divulgação do escândalo de fraudes contábeis na Via Varejo, as ações da S.A caíram e iniciou-se um grande movimento na bolsa chamado short selling ou, em sua forma traduzida, venda descoberta. Esse modelo consiste na venda de um ativo ou derivativo que não se possui (pega-se “emprestado”), esperando que seu preço caia para então comprá-lo de volta e lucrar na transação com a diferença. É uma operação para investidores experientes por que as perdas são ilimitadas, uma vez que não existe teto de quanto as ações podem valorizar-se.

    Esse tipo de pratica financeira é polêmica e gera um debate no mercado financeiro, que se divide entre proibir e incentivar essa transação. Dessarte, entendemos que, uma vez que associa-se o sucesso de uma empresa à sua direção, deve-se igualmente atribuir-lhe seu fracasso. Assim sendo, os chamados short sellers não participam dos conselhos administrativos, e, consequentemente, não possuem poderes de gerenciamento, e, por isso, não podem ser responsabilizados pelas falhas das S.A.

    Entretanto, short sellers são utilizados como bodes expiatórios para as más decisões tomadas pela má administração, sendo que possuem diversas vantagens, tais como a promoção de liquidez, que reflete em mais vendedores e compradores no mercado, além de ajudarem a evitar a valorização de ações ruins devido ao hype e ao excesso de otimismo. As evidências de tais benefícios podem ser verificadas nas chamadas bolhas especulativas que perturbam o mercado. Os ativos que resultam em bolhas, tais como os contratos garantidos por hipoteca antes da crise financeira de 2008, são frequentemente quase impossíveis de aplicar a short selling.

    Assim sendo, os contratos de venda a descoberto não devem ser proibidos, uma vez que são fontes legítimas de informações sobre o sentimento do mercado e a demanda por uma ação. Sem essas informações os investidores podem ser pegos de surpresa por tendências negativas ou notícias surpreendentes. Os shot sellers são possíveis apenas em sociedades anônimas de capital aberto.

    Os acionistas do bloco de controle (Golden Share) tem, assim como os sócios minoritários, responsabilidade limitada a sua participação. No entanto, como os acionistas controladores tem maior poder de voto dentro da companhia, se estes se utilizarem deles para satisfazer interesse próprio ou outros interesses que não seja o da companhia, eles podem responder pelo dano que causaram a sociedade, aos sócios e a terceiros. No art. 117 da lei 6404/76 está explícita essa responsabilidade e o seu § 1º traz o que pode se configurar o abuso de poder.



    REFERÊNCIAS

    ALVES, Onis. “Via Varejo (VVAR3): fraude contábil impactou em R$ 1,19 bi balanço.” Disponível em: https://www.euqueroinvestir.com/via-varejo-vvar11-encontra-evidencias-de-fraudes-com-impacto-der119-bi/. Acesso em 02 de novembro de 2020.

    BRASIL. Lei nº 6404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre a sociedade por ações. Brasília, DF: Presidência da República, 1976. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm . Acesso em 04 de novembro de 2020.

    EQUIPE INFOMONEY, 26 março 2020. “Via Varejo conclui investigação de fraude contábil; prejuízo de R$ 9 bi da Oi em 2019 e mais destaques.” Disponível em: https://www.infomoney.com.br/mercados/via-varejo-conclui-investigacao-de-fraude-contabil-com-impacto-der119-bi-prejuizo-der9-bi-da-oi-em-2019emais/. Acesso em 02 de novembro de 2020.

    FURLANI, Bruna. “Via Varejo confirma fraude contábil, com impacto de até R$ 1,4 bilhão no resultado do 4º trimestre”. Disponível em: https://www.seudinheiro.com/2019/acoes/via-varejo-confirma-fraude-fiscal-em-seu-balanco/. Acesso em 30 de outubro de 2020.

    LEMOS, Arthur Dantas. VVAR3: vale a pena investir na Via Varejo?” Disponível em:

    https://empreenderdinheiro.com.br/blog/vvar3/#:~:text=A%20Via%20varejo%20surgiu%20no,pelo%20Grupo%20.... Acesso em 01 de novembro de 2020.

    MARTINS, THAIS. “Responsabilidade empresarial de capital aberto na divulgação de balanços contábeis.” Disponível em: https://thaismb186.jusbrasil.com.br/artigos/854037493/responsabilidade-empresarial-de-capital-aberto-na-divulgacao-de-balancos-contabeis. Acesso em 2 de novembro de 2020.

    NÓBREGA, Luiz Fernando. “Fraudes Contábeis e Compliance” Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=r6MmlFBE-wc. Acesso em 01 de novembro de 2020

    REIS, Thiago. “Fraudes contábeis: como funciona esse tipo de manipulação”. Disponível em: https://www.sunoresearch.com.br/artigos/fraudes-contabeis/#:~:text=S%C3%A3o%20consideradas%20fraudes%20cont%C3%A1beis%20todas,carga%20tribut%C3%A1ria%20ou%20beneficiar%20terceiros.. Acesso em 01 de novembro de 2020

    Site Contábeis. “Até onde vai a responsabilidade de um contador em uma empresa?” Disponível em: https://www.contabeis.com.br/noticias/35641/ate-onde-vaiaresponsabilidade-de-um-contador-em-uma-empresa/#:~:text=A%20responsabilidade%20penal%20do%20contador&text=A%20falsifica%C3%A7%C3%A3o%20ou%20a%20altera%C3%A7%C3%A3o,jamais%20ser%20solid%C3%A1rio%20a%20eles. Acesso em 03 de novembro de 2020.

    Suno Research. "Via Varejo (VVAR3) – Entenda o problema no balanço". Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=a4MB-JbNNdM. Acesso em 01 de novembro de 2020.

    Wall Street Survivor. “Understanding Short Selling | by Wall Street Survivor” Disponível em: Understanding Short Selling | by Wall Street Survivor. Acesso em 29 de outubro de 2020.

    Admiral Markets Portugal. “O Que é Short Selling (Venda a Descoberto) -GuiaCompleto 2020.” Admiral Markets (Australia), Admiral Markets, 20 Oct. 2020, admiralmarkets.com/pt/educacao/aprender-trading/bases-forex/vendaadescoberto. Accessed 1 Nov. 2020.

    Laurent Bernut. “How Does Short-Selling Affect Companies? - Laurent Bernut - Medium.” Medium, Medium, 18 Aug. 2018, medium.com/@laurentbernut/how-does-short-selling-affect-companies-cbb29fb2b38a. Accessed 1 Nov. 2020.

    “Short Selling.” Investopedia, 2020, www.investopedia.com/terms/s/shortselling.asp. Accessed 1 Nov. 2020.

    Tiago Reis. “Fraudes Contábeis: Como Funciona Esse Tipo de Manipulação.” Suno Research, 23 June 2019, www.sunoresearch.com.br/artigos/fraudes-contabeis/#:~:text=S%C3%A3o%20consideradas%20fraudes%20cont%C3%A1beis%20todas,carga%20tribut%C3%A1ria%20ou%20beneficiar%20terceiros. Accessed 1 Nov. 2020.

    “Via Varejo Conclui Investigação de Fraude Contábil; Prejuízo de R$ 9 Bi Da Oi Em 2019 e Mais Destaques.” InfoMoney, 26 Mar. 2020, www.infomoney.com.br/mercados/via-varejo-conclui-investigacao-de-fraude-contabil-com-impacto-der119-bi-prejuizo-der9-bi-da-oi-em-2019emais/. Accessed 1 Nov. 2020.

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