Senhor Presidente, o Ministro

Ontem fora um dia fatídico na história do Brasil. Como diria o personagem principal da trama, "nunca na história deste país" um ex-presidente ocupou um Ministério, após o seu mandato. As razões são funestas. Escapar do alcance da jurisdição da Justiça Federal, onde estaria sujeito ao inflexível juízo de Moro, é um dos motivos propagados, por aliados e opositores. À frente de um ministério, o STF o julgará, o mesmo STF que ontem reduzira a CF a pedacinhos em nome de um torpe intento político. Um STF, para utilizar uma expressão de um de seus ilustres membros, "bolivarianizado", no qual um julgamento neutro é duvidoso, no melhor dos casos.

Mas essa é uma leitura incompleta.

O dito cujo foi indicado não para uma pasta irrelevante, onde poderia ter seu foro privilegiado garantido e nenhum trabalho à vista. Ministérios inúteis e redundantes são numerosos, e não seria nenhuma dificuldade alocar um ao ex-presidente. Poderia, a título de exemplo, ir ao Ministério da Pesca, onde teria uma vida mansa, até que o inevitável fim viesse.

Mas não. O ex-presidente Lula foi indicado para a Casa Civil, o Ministério que chefia o gabinete. E mais - impôs condições para fazê-lo. Exigiu carta branca para agir como bem entendesse. Exigiu ter à disposição 1/3 das reservas internacionais para seus insanos projetos desenvolvimentistas, sem dúvida a maneira mais acertada de agravar a crise econômica, e sua mais básica gênese. E parece bastante óbvio que a teve, vez que aceitou.

Na coletiva da Presidente, após anunciar a indicação do ex-Presidente, emerge um personagem que não víamos há muito tempo: O Presidente Lula. Desconhecia o fato que o cidadão ainda exercia o cargo. Contudo, a referência a ele era como Presidente. Presidente Lula, Presidente Lula. Dito por ninguém menos que a Presidente eleita e em exercício do país.

Não deixou de falar dos descalabros que se intenta fazer com as reservas internacionais - a mesma que o Sr. Presidente, o Ministro, deseja dilapidar nossas reservas. Depois, se pôs a falar das virtudes fiscais "do Presidente", as quais arruinaram a estabilidade econômica do país.

Parece que ela não se enganou no discurso, uma obra de desmoralização institucional de raros precedentes. Quem está assumindo a chefia da Casa Civil é o Presidente Lula. O Presidente de facto, para aconselhar e dirigir o governo da Presidente de jure.

No zênite da crise política e econômica, a Presidente entrega sua faixa ao Ministro, por cima das instituições republicanas, do povo e da Constituição. É evidente que não se trata de uma mera manobra de fuga de jurisdição. É infinitamente pior. Um golpe branco. Uma abdicação sorrateira da monarca reinante. Em favor do "Sr. Presidente", o Ministro-Chefe da Casa Civil.