STJ autoriza farmácias a vender artigos de conveniência
As farmácias estão autorizadas a vender produtos que não possuem nenhuma relação com a saúde, os chamados artigos de conveniência. A decisão é do ministro Ari Pargendler, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que revogou parcialmente decisão anterior que havia determinado o cumprimento de normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre boas práticas farmacêuticas.
Permanece válida a parte da decisão que determina o cumprimento da Instrução Normativa n. 10/09, que lista os medicamentos isentos de prescrição que podem ficar ao alcance dos consumidores. Dessa forma, os medicamentos que precisam de receita médica devem permanecer em área de circulação restrita aos funcionários, não sendo permitida sua exposição direta aos usuários.
A restrição da venda de produtos de conveniência em farmácias consta da Instrução Normativa nº 09/09 , da Anvisa. No julgamento de agravo regimental em suspensão de liminar e de sentença formulado pela Associação Brasileira de Rede de Farmácias e Drograrias (Abrafarma) e pela Federação Brasileira das Redes Associativas de Farmácias (Febrafar), Pargendler decidiu suspender a vigência desse dispositivo.
Pargendler acatou o argumento da Febrafar de que faltava motivação para manter a restrição. O ministro reconheceu que, ao conceder o pedido de suspensão de liminar e de sentença formulado pela Anvisa contra decisões que suspenderam a eficácia das normas editadas pela agência, pretendia desestimular a automedicação. Percebe-se aí que a motivação da decisão (...) não tem nada a ver com a Instrução Normativa nº 09/09, cujo propósito é o de restringir o comércio, em farmácias e drogarias, de produtos que não possuem qualquer relação com a saúde e que não se enquadrem no conceito de produtos correlatos, explicou o ministro.
O vice-presidente do STJ ressaltou, ainda, que legislações estaduais permitem o comércio em farmácias de artigos de conveniência que não prejudicam a saúde. Para ele, a execução da política pública de reconhecer as farmácias e drogarias exclusivamente como unidades de saúde deve aguardar o julgamento dos recursos judiciais já em tramitação.
Processo nº AgRg na SLS 1200 (2010/0032653-8 - 05/05/2010)
Leia, abaixo, a íntegra da decisão:
"AgRg na SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 1.200 - DF
(2010/0032653-8)
AGRAVANTE : ABRAFARMA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE REDES DE
FARMÁCIAS E DROGARIAS
ADVOGADO : VICENTE NOGUEIRA E OUTRO (S)
AGRAVANTE : FEBRAFAR FEDERAÇÃO BRASILEIRA DAS REDES
ASSOCIATIVISTAS DE FARMÁCIAS
ADVOGADO : PAULA CRISTINA ACIRÓN LOUREIRO
AGRAVADO : AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA
PROCURADORA : INDIRA ERNESTO SILVA E OUTRO (S)
REQUERIDO : DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO AGRAVO DE
INSTRUMENTO NR 200901000720650 DO TRIBUNAL
REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO
REQUERIDO : DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO AGRAVO DE
INSTRUMENTO NR 200903000450110 DO TRIBUNAL
REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO
DECISÃO
A decisão de fl. 1.661/1.666 suspendeu os efeitos dos
atos judiciais que subtraíram a exequibilidade das Instruções
Normativas da Anvisa nºs 09/09 e 10/09 , bem assim de parte da
Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa - RDC nº 44/09.
Seguiram-se agravos regimentais, interpostos
respectivamente pela Febrafar - Federação Brasileira das Redes
Associativistas de Farmácias (fl. 1.743/1.754) e pela
Abrafarma Associação Brasileira de Redes de Farmácias e
Drogarias (fl. 1.791/1.828).
Ambos atacam o juízo político adotado na aludida decisão,
mas a impugnam também por vício de incompetência (o agravo
regimental interposto pela Abrafarma Associação Brasileira de
Redes de Farmácias e Drogarias) e por motivação deficiente (o
agravo regimental interposto pela Febrafar - Federação
Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias ).
A competência
A competência do Presidente do Superior Tribunal de
Justiça, ou de quem o substituir, para decidir os pedidos de
suspensão dos efeitos de medida liminar (= antecipação de
tutela) ou de sentença está vinculada aos fundamentos adotados
pelo ato judicial, nada importando as questões constitucionais
eventualmente articuladas na petição inicial da ação.
Na espécie, as decisões que tiveram a execução suspensa
foram tomadas com base em fundamentos infraconstitucionais;
numa e noutra a referência às normas constitucionais teve um
propósito retórico ou didático.
Lê-se na decisão proferida pelo MM. Juiz Federal
Substituto da 5ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal:
"Pois bem, a restrição não pode prevalecer.
A uma, porque não amparada em lei, já que a Lei nº 5.991,
de 17 de dezembro de 1973, que dispõe sobre o controle
sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos
farmacêuticos e correlatos não traz nenhuma previsão nesse
sentido, razão pela qual a ANVISA não pode estabelecer
restrição, diante da norma do artigo 5º, II, da Constituição Federal ('ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei')"- fl. 61/62.
A Lei nº 5.991, de 1973 - e essa é a motivação da decisão
- não autoriza os atos da ANVISA; o corolário daí extraído,
de que"ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei", não constitui
evidentemente o fundamento da decisão.
"A duas, porque a restrição mostra-se desprovida de
razoabilidade
...
Art. 55 - É vedado utilizar qualquer dependência da
farmácia ou da drogaria como consultório, ou outro fim diverso
do licenciamento.
Parece-me que considerar vigente, em sua totalidade, o
artigo 55 implicaria em tornar letra morta as alterações
introduzidas na Lei nº 5.991/73 pela Lei nº 9.060/95 que, ao
incluir, dentre outras, as drugstores no artigo 4º da Lei nº 5.991/73 permitiu que essas comercializassem medicamentos, com
base no artigo 5º (sujeitas às restrições decorrentes do
artigo 6º, ou seja, sujeitas a, também, preencherem os
requisitos para serem farmácias ou drogarias).
Ora, considerando que a lei nova revoga a anterior no que
com ela for incompatível, a conclusão é a de que o artigo 55
teve a sua previsão parcialmente revogada, de forma que a
restrição que ele estabelece é para qualquer dependência da
farmácia ou da drogaria como consultório ou outro fim diverso
do licenciamento, que não o funcionamento simultâneo da
farmácia ou drogaria como drugstore.
E a interpretação que venho de expor compatibiliza a Lei
nº 5.991/73 com a Constituição que, em virtude do princípio da
proporcionalidade, cuja existência é pacificamente reconhecida
pelo Supremo Tribunal Federal, não admite a existência de leis
que não tenham um fundamento razoável"(fl. 62/66).
A lei, qualquer que seja, só pode ser aplicada se estiver
conforme com a Constituição; a declaração feita pelo juiz, de
que está interpretando a lei de acordo com a Constituição, não
dá à sua motivação caráter constitucional.
Já a decisão da eminente Juíza do Tribunal Regional
Federal da 3ª Região menciona uma só norma constitucional, in
verbis :
"A Lei nº 5.991/73 , ao disciplinar sobre o controle
sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos
farmacêuticos e correlatos, não contempla nenhuma proibição
como as estabelecidas nos atos administrativos questionados
nos autos, de modo que não pode a ANVISA impor tais
restrições, sob pena de ofensa à norma inserta no art. 5º, II,
da Carta Constitucional, o qual dispõe que 'ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei'"(fl. 1.654).
Se a lei não proíbe, está permitido - este o fundamento
da decisão. Nesse contexto, a citação do art. 5º, II, da Constituição Federal não constitui motivação autônoma.
A motivação
No recurso de agravo ... há o efeito regressivo. O juiz,
antes de remeter o recurso para a superior instância, poderá
rever e reformar sua decisão (Bruno de Mendonça Lima, citado
por Alcides de Mendonça Lima, in Introdução aos Recursos
Cíveis, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1976, p. 288).
O agravo regimental interposto pela Febrafar - Federação
Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias flagrou, com
acerto, o fato de que a parte dispositiva da decisão foi além
de sua motivação, assim redigidas:
"A Instrução Normativa nº 09, que relaciona os produtos
que podem ser comercializados em farmácias e drogarias, atende
os propósitos do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.
A RDC nº 44/09 e a Instrução nº 10 visam combater a
automedicação. Que não há remédio sem efeitos colaterais,
alguns graves, é sabido de todos. A automedicação, por isso, é
perigosa, sendo condenada pelos organismos internacionais de
saúde. Não há controvérsia a esse respeito. O medicamento é o
remédio mais o uso adequado. O remédio certo na dose errada
pode ser um veneno. Igualmente se um remédio for usado
cumulativamente com outro incompatível. O que pode ser, e está
sendo discutido nas ações ordinárias, é a legalidade das
restrições impostas pelo aludidos atos normativos. Aqui, no
entanto, forma-se um juízo político acerca dos danos que as
decisões que anteciparam a tutela podem trazer aos interesses
protegidos pelo art. 4º, da Lei nº 8.437, de 1992 , mais
especificamente àqueles indicados na petição inicial, a saber,
ordem administrativa e saúde pública. Salvo melhor juízo, a
saúde pública estará comprometida se o consumidor for
estimulado, mediante a exposição de remédios, à automedicação.
Se a medida adotada será eficaz, ou não, só o tempo poderá
dizer. O que hoje pode-se afirmar é que não arrepia o bom
senso.
Defiro, por isso, o pedido para suspender os efeitos das
decisões proferidas pelo MM. Juiz Federal Substituto da 5ª
Vara do Distrito Federal Paulo Ricardo de Souza Cruz e pela
Juíza do Tribunal Regional Federal da 3ª Região Alda Basto"
(fl. 1.665/1.666).
Percebe-se aí que a motivação da decisão, a saber, o
desestímulo à automedicação, diz respeito a Instrução
Normativa nº 10/09 e, na parte que lhe corresponde, à RDC nº 44/09; não tem a ver com a Instrução Normativa nº 09/09 , cujo
propósito é o de restringir o comércio, em farmácias e
drogarias, de"produtos que não possuem qualquer relação com a
saúde e que não se enquadrem no conceito de produtos
correlatos"(fl. 09).
Sabido que legislações estaduais permitem o comércio de
" artigos de conveniência "em farmácias, listando como tais
produtos que não prejudicam a saúde (v.g., filmes
fotográficos, isqueiros, água mineral, etc.), tudo recomenda
que a execução da política pública de reconhecer as farmácias
e drogarias como" unidades de saúde ", exclusivamente, aguarde
o desfecho dos recursos judiciais já interpostos.
Por isso, revogo, em parte, a decisão de fl. 1.661/1.666,
mantendo-a apenas para dar eficácia à Instrução Normativa nº 10/09 e, na parte que lhe corresponde, à RDC nº 44/09 .
Comunique-se, com urgência. Intimem-se.
Brasília, 03 de maio de 2010.
MINISTRO ARI PARGENDLER
Vice-Presidente"
Documento: 9761432 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJ: 05/05/2010
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