STJ decide a respeito da legitimidade do Estado na cobrança de multa aplicadas pelos TCE
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.181.122 - RS (2010/0031858-6)
RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES AGRAVANTE : ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADOR : PAULO ROBERTO BASSO E OUTRO (S) AGRAVADO : LEONEL AMORETY GORNATTI
ADVOGADO : SYLVIO CADEMARTORI NETO E OUTRO (S)
EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PARA
EXECUTAR MULTA IMPOSTA A DIRETOR DE DEPARTAMENTOMUNICIPAL POR TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL. PESSOA
JURÍDICA QUE MANTÉM A CORTE DE CONTAS.
1. Em diversos precedentes esta Corte concluiu que a legitimidade para
executar multa imposta a gestor público municipal por Tribunal de Contas Estadual é
do próprio ente municipal fiscalizado, em razão do resultado do julgamento do
Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n. 223037-1/SE, de
relatoria do Min. Maurício Corrêa (AgRg no Ag 1215704/RS , Rel. Min. Benedito
Gonçalves, Primeira Turma, DJe 2.2.2010; AgRg no REsp 1065785/RS , Rel.
Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJe 29.10.2008; e REsp 898.471/AC ,
Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, DJ 31.5.2007).
2. Contudo, a mudança de entendimento ora preconizada decorre, com todas
as vênias dos que vinham entendendo em contrário, de interpretação equivocada
do mencionado julgamento, especificamente em razão da redação do item 2 de
sua ementa:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE
SERGIPE. COMPETÊNCIA PARA EXECUTAR SUAS PRÓPRIAS DECISÕES:
IMPOSSIBILIDADE. NORMA PERMISSIVA CONTIDA NA CARTA
ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE.
1'. As decisoes das Cortes de Contas que impõem condenação patrimonial aos
responsáveis por irregularidades no uso de bens públicos têm eficácia de
título executivo (CF, artigo 71, § 3º). Não podem, contudo, ser executadas por
iniciativa do próprio Tribunal de Contas, seja diretamente ou por meio do Ministério
Público que atua perante ele. Ausência de titularidade, legitimidade e interesse imediato e concreto.
2. A ação de cobrança somente pode ser proposta pelo ente público
beneficiário da condenação imposta pelo Tribunal de Contas, por intermédio
de seus procuradores que atuam junto ao órgão jurisdicional competente.
3. Norma inserida na Constituição do Estado de Sergipe, que permite ao
Tribunal de Contas local executar suas próprias decisões (CE, artigo 68, XI).
Competência não contemplada no modelo federal. Declaração de inconstitucionalidade,
incidenter tantum, por violação ao princípio da simetria (CF, artigo 75).
Recurso extraordinário não conhecido.
(RE 223037, Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, DJ 2.8.2002)
3. Com base no precedente da Corte Suprema, extraiu-se a exegese de que em
qualquer modalidade de condenação - seja por imputação de débito, seja por
multa - seria sempre o ente estatal sob o qual atuasse o gestor autuado o
legítimo para cobrar a reprimenda. Todavia, após nova análise, concluiu-se que o
voto de Sua Excelência jamais caminhou por tal senda, tanto assim que, no âmbito
do Tribunal de Contas da União tal tema é vencido e positivado por ato
administrativo daquela Corte de Contas.
4. Em nenhum momento a Suprema Corte atribuiu aos entes fiscalizados a
qualidade de credor das realidade, o julgamento assentou que nos casos de
erário/imputação de débito quem - com toda a razão - detém a titularidade do crédito consolidado no
acórdão da Corte de Contas.
5. Diversamente da imputação de débito/ressarcimento ao erário, em que se busca a recomposição do dano sofrido pelo ente público, nas multas há uma sanção
a um comportamento ilegal da pessoa fiscalizada, tais como,de contas julgadas irregulares sem resultar débito; descumprimento das
diligências ou decisões do Tribunal de Contas; embaraço ao exercício das
inspeções e auditorias; sonegação de processo, documento ou informação; ou
reincidência no descumprimento de determinação da Corte de Contas.
6. As multas têm por escopo fortalecer a fiscalização desincumbida pela
própria Corte de Contas, que certamente perderia em sua efetividade caso não
houvesse a previsão de tal instrumento sancionador. Em decorrência dessa distinção
essencial entre ambos - imputação de débito e multa - é que se merece conferir
tratamento distinto.
7. A solução adequada é proporcionar ao próprio ente estatal ao qual
esteja vinculada a Corte de Contas a titularidade do crédito decorrente da
cominação da multa por ela aplicada no exercício de seu mister.
8. "Diferentemente, porém, do que até aqui foi visto, em se tratando de
multa, a mesma não deve reverter para a pessoa jurídica cujas contas se cuida.
Nesse caso, deve reverter em favor da entidade que mantém o Tribunal de Contas."
(Jorge
Ulisses Jacoby Fernandes
Competência).
9. Não foi outra a solução preconizada pela próprio Tribunal de Contas da
União,
por meio da Portaria n. 209, de 26 de Junho de 2001 (BTCU n. 46/2001),
relativa
ao Manual para Formalização de Processos de Cobrança Executiva, no qual se
destacou que "a multa é sempre recolhida aos cofres da União ou Tesouro
Nacional". Em seguida, por meio da Portaria-SEGECEX n. 9, de 18.8.2006,
também relativa ao Manual de Cobrança Executiva (BTCU n. 8/2006), a Corte
de Contas da União dispôs:> multas cominadas pelos Tribunais de Contas. Na ressarcimento aoa pessoa
jurídica que teve seu patrimônio lesado é verbi gratia, nos casosin
Tribunais de Contas do Brasil ? Jurisdição e
A multa é sempre recolhida aos cofres da União ou Tesouro Nacional e sua
execução judicial está sob a responsabilidade da Procuradoria-Geral da
União/AGU.
10. Logo, mesmo nos casos em que a Corte de Contas da União fiscaliza
outros
entes que não a própria União, a multa eventualmente aplicada é revertida
sempre
à União - pessoa jurídica a qual está vinculada - e não à entidade objeto
da
fiscalização.
11. Este mesmo raciocínio deve ser aplicado em relação aos Tribunais de
Contas
Estaduais, de modo que as multas deverão ser revertidas ao ente público ao
qual a
Corte está vinculada, mesmo se aplicadas contra gestor Municipal.
12. Dessarte, a legitimidade para ajuizar a ação de cobrança relativa ao crédito
originado de multa aplicada a gestor municipal por Tribunal de Contas é do
ente
público que mantém a referida Corte -
que atuará por intermédio de sua Procuradoria.
in casu, o Estado do Rio Grande do Sul -,
13. Agravo regimental provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima
indicadas,
acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na
conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por maioria, dar
provimento ao agravo
regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques.
Vencido o Sr.
Ministro Humberto Martins.
Votaram com o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques os Srs. Ministros Herman
Benjamin e Castro Meira.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Eliana Calmon.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto Martins.
Brasília (DF), 06 de maio de 2010.
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES , Relator
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