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8 de Maio de 2024

Terceira Turma autoriza desconstituição de paternidade mesmo após cinco anos de convívio

há 9 anos
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um homem para permitir a alteração do registro de nascimento de uma criança em que ele constava como pai. A desconstituição da paternidade registral foi autorizada diante da constatação de vício de consentimento: o homem, que vivia com a mãe da criança, só descobriu que não era o pai biológico após fazer exame de DNA.

Embora a relação paterno-filial tenha durado cinco anos, os ministros levaram em conta o fato de que o pai registral rompeu os laços de afetividade tão logo tomou conhecimento da inexistência de vínculo biológico com a criança.

O recorrente viveu em união estável com a mãe e acreditava ser mesmo o pai da criança, que nasceu nesse período. Assim, registrou o menor e conviveu durante cinco anos com ele. Ao saber de possível traição da companheira, fez o exame de DNA.

Em ação negatória de paternidade, ele pediu o reconhecimento judicial da inexistência de vínculo biológico e a retificação do registro de nascimento.

Paternidade socioafetiva

Após o exame de DNA, a mãe – que antes negava a traição – passou a alegar que o companheiro tinha pleno conhecimento de que não era o genitor, mas mesmo assim quis registrar o menor como seu filho, consolidando uma situação de adoção à brasileira.

A sentença concluiu que a paternidade socioafetiva estava consolidada e devia prevalecer sobre a verdade biológica. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJSC) confirmou a decisão de primeiro grau e julgou improcedente a ação negatória de paternidade, afirmando que a criança tem no pai registral “seu verdadeiro pai” e estruturou sua personalidade “na crença dessa paternidade”, conforme teria sido demonstrado no processo.

No recurso ao STJ, o autor da ação sustentou que foi induzido a erro pela mãe da criança, que teria atribuído a paternidade a ele.

De acordo com o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, ficou claro que, se o recorrente soubesse da verdade, não teria registrado a criança, “tanto é assim que, quando soube dos fatos, rompeu definitivamente qualquer relação anterior, de forma definitiva”.

O ministro considerou as conclusões do tribunal catarinense ao reconhecer a ocorrência efetiva do vício de consentimento do recorrente, que, ao registrar a criança, acreditou verdadeiramente que ela era fruto de seu relacionamento com a mãe.

Segundo o relator, se até o momento do exame de DNA a genitora alegava que o menor era filho do recorrente e que nunca houve ato de infidelidade, é “crível” que ele tenha sido induzido a erro para se declarar pai no registro de nascimento.

Disposição voluntária

Para Bellizze, a simples incompatibilidade entre a paternidade declarada no registro e a paternidade biológica, por si só, “não autoriza a invalidação do registro”.

Há casos, acrescentou o relator, em que o indivíduo, ciente de que não é o genitor da criança, “voluntária e expressamente” declara ser o pai no momento do registro, estabelecendo a partir daí vínculo de afetividade paterno-filial, como ocorre na chamada adoção à brasileira.

O ministro afirmou que a doutrina considera a existência de filiação socioafetiva apenas quando há clara disposição do apontado pai para dedicar afeto e ser reconhecido como tal. É necessário ainda que essa disposição seja voluntária. “Não se concebe, pois, a conformação dessa espécie de filiação quando o apontado pai incorre em qualquer dos vícios de consentimento”, concluiu.

Quando a adoção à brasileira se consolida, segundo o relator, mesmo sendo antijurídica, ela não pode ser modificada pelo pai registral e socioafetivo, pois nessas situações a verdade biológica se torna irrelevante.

Relação viciada

Bellizze destacou que no caso em julgamento não houve adoção à brasileira, mas uma relação de afeto estabelecida entre pai e filho registrais, baseada no vício de consentimento originário, e que foi rompida completamente diante da ciência da verdade dos fatos, há mais de oito anos – período superior à metade dos atuais 15 anos de vida do menor.

“Não se pode obrigar o pai registral, induzido a erro substancial, a manter uma relação de afeto igualmente calcada no vício de consentimento originário, impondo-lhe os deveres daí advindos, sem que voluntária e conscientemente o queira”, afirmou.

O relator disse que a filiação socioafetiva pressupõe “a vontade e a voluntariedade do apontado pai de ser assim reconhecido juridicamente”, circunstância ausente no caso.

Segundo o ministro, “cabe ao marido (ou ao companheiro), e somente a ele, fundado em erro, contestar a paternidade de criança supostamente oriunda da relação estabelecida com a genitora, de modo a romper a relação paterno-filial então conformada, deixando-se assente, contudo, a possibilidade de o vínculo de afetividade vir a se sobrepor ao vício, caso, após o pleno conhecimento da verdade dos fatos, seja esta a vontade do consorte/companheiro (hipótese que não comportaria posterior alteração)”.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
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17 Comentários

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Infelizmente vivo na pelé uma situação como esta. Sendo que no meu caso convivi apenas seis meses com a criança.
No meu ponto de vista, pior que ser enganado é saber que o terceiro da relação (o verdadeiro pai) está por aí sem ter nenhum tipo de preocupação, pois a mãe da criança sustenta justamente a hipótese de adoção à brasileira.
Infelizmente trata-se de questão das mais complicadas no Direito de Família, tendo em vista a dificuldade de nossos tribunais em lidar com esses casos. É óbvio que os direitos da criança devem ser garantidos, mas nos casos de vício de consentimento entendo que deveria haver mais cautela dos juízos de primeira instância em fazer prevalecer a paternidade sócio afetiva. Hoje sou obrigado a pensionar uma criança que registrei acreditando ser minha e não é, e que tive o mínimo de contato.
Torço para que esta decisão sirva como parâmetro positivo na busca do equilíbrio desta relação. continuar lendo

Seis meses não podem caracterizar paternidade socio afetiva. Bebes não tem noção de convivio. Crianças de cinco anos, sim, reconhecem o pai que lhe é apresentado como tal. continuar lendo

Deveriam pensionar o pai biológico e ainda obrigá-lo a ressarcir o pai afetivo de todas as pensões que ele depositou em favor da criança. Afinal, se não houver pagamento de pensão, quem responderá até mesmo com prisão (e justa, se fosse para o pai biológico), será o pai designado a pagá-la. Atualmente, nesse país essa é a única lei que pune de verdade uma contravenção (se posso assim chamar a falta de pagamento de pensão). E graças a Deus, porque as outras, a gente vê os contraventores mais livres do que nós. E deveriam ter suas punições cumpridas ao invés de ficarem pedindo pizzas em casa e rindo por nos fazerem de trouxas. continuar lendo

Conheço um caso em que a mãe citou um indivíduo como pai da criança. Esse cidadão pagou pensão durante algum tempo, mas desconfiou e pediu exame de DNA. Não era dele. Ela citou outro. Que tb não era dele e numa terceira "vítima" (vou chamar assim), ficou comprovada a paternidade. Esse terceiro ficou na obrigação de pagar a pensão alimentícia. Porém os outros dois ficaram no prejuízo, porque o juiz, me parece, não o obrigou a devolver aos outros dois o que pagaram enganados. Fico imaginando... como uma mulher não sabe quem é o pai do filho dela? Mundo louco! Gente sem juízo. Tenho pena dos srs. advogados e juizes que precisam resolver problemas como esse. continuar lendo

Tem no escritório um caso senão igual, idêntico. Estamos na defesa do pai, que entrou com a negatória. Mas sei de uma coisa: o tema é delicado. Mas sei de uma coisa: da Traição não vem coisa boa. É péssimo para o pai, e pior para o filho! continuar lendo

É difícil objetivar os sentimentos e as razões do 'coração", pois nem sempre as decisões afetuosas são razoáveis e ponderadas. E em um momento pode-se ter a certeza de que é, enquanto em outro ter dúvidas e em certos ter a certeza de que não é.

E é simplesmente no meio deste fogo cruzado de sentimentos, dinheiro, responsabilidades e vidas que se encontra o advogado de família.

Minha dica é ser o mais técnico possível e sempre falar para o cliente que a decisão é dele ou dela e deixar claro os riscos do processo.

Mas de uma forma ou de outra busco conselho e opinião do colega da sala. Pois contra um casal em guerra nada melhor que duas orientações ou mais do mesmo escritório. continuar lendo

Boa noite!
Concordo com você. continuar lendo

Seria mais complicado se estivessem casados por causa desta criança. continuar lendo

É... esse "pai" não pensou em momento algum nessa criança. Sorte dela de ele não ser o pai verdadeiro. continuar lendo

Isso gera um precedente um tanto sombrio.

Sucessões litigiosas vão se tornar em verdadeiras novelas mexicanas!

Cena: "... pai, de 83 anos, solicita anulação de paternidade, filho atualmente com 61 anos, baseado em vício de consentimento originário..."

Cena alternativa "... filhos entram com processo de anulação de paternidade contra irmão gerado em relação extra-conjugal. Alegam vício originário, pois o pai, falecido, jamais teve conhecimento dos casos extra-conjugais de sua esposa..." continuar lendo

Vislumbra-se uma escuridão no final do túnel. continuar lendo

Não entendi porq seria ruim. continuar lendo