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23 de Maio de 2024

TJMS mantém alimentos compensatórios à idosa, em decisão que considerou Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero

O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul – TJMS manteve decisão da 2ª Vara Cível da Comarca de Bonito, que estabeleceu o pagamento de alimentos compensatórios a uma idosa de 63 anos por seu ex-marido, após o divórcio entre os dois.

Publicado por Thaisa Pellegrino
há 3 meses

A decisão levou em conta o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

De acordo com os autos, eles se casaram em 1980, pelo regime de comunhão parcial de bens. A separação de fato ocorreu em 2023, ano em que o ex-marido deixou o lar conjugal. Ao longo dos 43 anos de casamento, ela se dedicou aos cuidados do lar e da família, por isso não possui qualquer fonte de renda e depende do auxílio financeiro do ex-cônjuge para sobreviver.

Além de ser idosa e não ter aposentadoria, a mulher recebe um valor referente à locação de um imóvel, bastante inferior ao padrão de vida demonstrado pelo ex-casal.

"Ao que se deduz, o responsável principal por manter os gastos e administrar os bens do casal era o ora requerente/reconvindo [ex-marido], seja pelo suposto acordo noticiado, do qual sequer contou com a anuência da requerida/reconvinte, em que pese seus interesses patrimoniais estarem em debate, seja pela parceria rural existente entre o filho e o requerente/reconvindo, demonstrando que este tem meios para amparar a ex-esposa", diz um trecho da decisão de 1º grau.

Dessa forma, com o objetivo de assegurar à idosa recursos que lhe permitam manter o padrão de vida próximo do vivenciado ao longo dos 43 anos de casamento, foram fixados alimentos provisórios no valor de 6,5 salários mínimos.

Distribuição de tarefas

Ao analisar o caso, a desembargadora-relatora do caso observou que a estrutura familiar consistiu na seguinte distribuição de tarefas: enquanto a mulher cuidava dos afazeres domésticos e dava suporte ao marido e aos filhos, o homem, por sua vez, angariava os recursos para o sustento do lar.

"Tais atribuições são equivalentes e igualmente importantes, pois é possível atribuir o sucesso nos negócios também ao bem-estar dos parceiros, o que, de forma inequívoca, foi auxiliado pela requerida/agravada", afirma.

A desembargadora avalia que, diante da dinâmica familiar, percebe-se "um desequilíbrio no tocante à gerência em si dos bens, visto que aquele membro que se dedica aos cuidados domésticos, não raras vezes, encontra-se alijado da maior parte dos negócios e sequer

toma parte da gestão".

Na decisão, a magistrada observa que os alimentos arbitrados em primeiro grau têm caráter compensatório, ou seja, “uma prestação periódica em dinheiro, efetuada por um cônjuge em favor do outro na ocasião da separação ou do divórcio vincular, em que se produziu um desequilíbrio econômico em comparação com o estilo de vida experimentado durante a convivência matrimonial, compensando deste modo a disparidade social e econômica com a qual se depara o alimentando em função da separação, comprometendo suas obrigações materiais, seu estilo de vida e a sua subsistência pessoal”, conforme postulou o jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

Dessa forma, entendeu que a decisão proferida em primeiro grau estabeleceu alimentos de forma equitativa, garantindo o equilíbrio financeiro das partes e a manutenção da subsistência da mulher no mesmo padrão de quando era casada.

"Este julgamento se dá à luz do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, na medida em que se buscou estabelecer as garantias mínimas de proteção à incolumidade patrimonial e pessoal da agravada, mulher idosa, que dedicou toda uma vida à família em que a relação conjugal perdurou por 43 anos", diz um trecho da decisão.

Posse dos bens

A advogada Marla Diniz Brandão Dias, que atuou no caso, e é membro do IBDFAM, explica que a mulher se dedicou aos cuidados do ex-esposo, dos filhos e da casa da família e, com o fim do casamento, sofreu queda na condição financeira “por não estar na posse direta dos bens amealhados, ocultados pelo ex-esposo, que não os arrolou quando ajuizou processo de divórcio”.

“Os alimentos foram requeridos em sede de reconvenção, concedidos em liminar e mantidos pelo TJMS, que, em seu julgamento, além de reconhecer a natureza compensatória, aplicou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ”, afirma.

Ela avalia que a decisão do TJMS se atentou à realidade fática demonstrada nos autos, indo além da decisão de primeira instância.

“Com isso, a Corte demonstra uma tendência de maior consciência dos julgadores quanto ao desequilíbrio patrimonial decorrente dos papéis de gênero e quanto à existência da divisão sexual do trabalho em nossa sociedade”, observa.

Decisão pioneira

Segundo Marla Diniz, essa foi a primeira decisão do TJMS, em Direito das Famílias, que mencionou e aplicou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero desde a Resolução nº 492 do CNJ, de março de 2023.

Ela também destaca o fato de que foi aplicada a tese dos alimentos compensatórios.

“Recentemente, a Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que altera o Código Civil, para incluir a possibilidade de o juiz fixar alimentos compensatórios. O próximo passo é o projeto ser analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e, depois, seguir para o Plenário. Atualmente, essa tese é aplicada pelos tribunais a partir de uma construção doutrinária e jurisprudencial, e é uma ferramenta para proporcionar maior segurança e equidade para o cônjuge prejudicado com o fim da relação, quase sempre as mulheres”, defende.

Por isso, a advogada acredita que a decisão reflete uma nova abordagem da Justiça às questões submetidas por mulheres.

“O Judiciário vem adotando orientações emancipatórias para elas, as quais são costumeiramente desqualificadas em sua capacidade de gerir os frutos ou bens comuns do ex-casal, como se a figura masculina tivesse mais direitos de decidir, usufruir e ocupar posições de poder e liderança e também mais aptidão para administrar patrimônio. Sob a abordagem de gênero, a aplicação do Protocolo do CNJ traz esperança de que daqui em diante as mulheres serão menos prejudicadas com a ruptura de relacionamentos, ante a possibilidade de obter decisões mais justas, equânimes e não discriminatórias”, conclui.

Fonte: IBDFAM

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