Você sabia que a responsabilidade civil do médico é sempre subjetiva, independente do tipo de obrigação prestada?
Anne Carolinne T. Pereira de Alencar e Christiano Cordeiro de Alencar - Pereira & Alencar Advocacia
A atividade médica advém de uma relação contratual mantida entre o médico e o paciente, com previsão contida no art. 14, § 4º, Código de Defesa do Consumidor (Brasil, 1990):
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
[...]
§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Porém, talvez em razão de encerrar uma relação consumerista, muitas dúvidas ainda pairam acerca da natureza da responsabilidade civil do médico e o tipo de obrigação do seu serviço prestado.
Há duas espécies de obrigação prestadas pelo médico: de meio e de resultado. As obrigações de meio – regra geral no ramo da medicina – ocorrem quando o prestador não se responsabiliza pelo resultado e se obriga apenas a empregar todos os meios ao seu alcance para consegui-lo. Nesses casos, o contratante deverá comprovar que o médico contratado falhou ao não lançar mão de todos os meios possíveis para conseguir atingir o objetivo pretendido. Já as obrigações de resultado são aquelas em que o médico contratado se responsabiliza pelo alcance do objetivo almejado pelo paciente, como ocorre nas cirurgias plásticas meramente estéticas. Nessas hipóteses, se o resultado prometido não for obtido, o prestador será considerado inadimplente. Ressalte-se que no caso de cirurgias plásticas reparadoras, entende-se que a obrigação do médico é de meio, e não de resultado.
Sabe-se que o exercício da medicina é naturalmente arriscado, o que, infelizmente, traz para a profissão uma pressão maior acerca da responsabilização civil pelos atos praticados. Ora, tratar da complexidade com que o corpo humano funciona não é nada fácil, o que torna o médico um profissional mais vulnerável a ser acionado por algum paciente insatisfeito. Nessas ocasiões, é que se faz extremamente importante ter em mente que a responsabilidade civil do médico, qualquer que seja a sua especialidade, é SEMPRE subjetiva, ou seja, depende da comprovação da sua culpa – essa a ser evidenciada nas modalidades da imprudência, negligência ou imperícia.
Não há que se condenar o médico, então, com fundamento em responsabilidade objetiva (vez que essa prescinde da verificação da culpa). Repita-se, sua responsabilidade sempre será subjetiva e dependerá da existência do dano, do nexo causal, do ato ilícito e da comprovação da culpa.
Há, contudo, tratamento diferenciado em relação às espécies de obrigações prestadas. É que nas obrigações de meio, em regra, o ônus da prova caberá a quem alega o prejuízo. Já nas obrigações de resultado, entende-se haver a responsabilidade subjetiva com culpa presumida, ou seja, permite-se que o juiz inverta o ônus da prova e, assim, caberá ao médico comprovar não ter agido com negligência, imprudência ou imperícia e que os danos suportados pelo paciente advieram de fatores externos e alheios à sua atuação profissional.
É importante, ainda, esclarecer que nas cirurgias de natureza mista, com objetivos estéticos e reparadores, a responsabilidade do médico deve ser analisada de forma fracionada, conforme cada finalidade da intervenção, atribuindo-se tratamento diferenciado em relação às obrigações de meio e às de resultado dentro do mesmo procedimento cirúrgico.
Por fim, vale acrescentar que as excludentes de responsabilidade civil – caso fortuito e força maior – são perfeitamente cabíveis nas relações contratuais entre médico e paciente.
Obra citada
Brasil. (1990). LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990. Acesso em 22 de outubro de 2017, disponível em Planalto: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm
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