Página 825 do Diário de Justiça do Estado de Rondônia (DJRO) de 6 de Outubro de 2015

Advogado:Edilson Stutz (RO 309-B)

SENTENÇA:

SENTENÇA Trata-se de ação proposta pela ASSOCIAÇÃO AGROPECUARISTA DE URUPÁ AAPU contra a COOPERATIVA DE CRÉDITO RURAL DO VALE DO URUPÁ. Narra a autora que em 10/01/2012 foi elaborada uma cédula de crédito bancário pela ré, no valor de R$ 135.000,00, onde aparece como emitente a autora, sendo o crédito destinado a limite do cheque especial e a operações de crédito. Afirma que o título de crédito é nulo, pois o então presidente da associação, José Roberto de Lima, não possuía capacidade para assinar a cédula porquanto seu mandato já havia terminado e porque a oneração de bens imóveis da Associação prescinde da aprovação a ser obtida em assembleia geral, especialmente convocada para este fim, por 2/3 dos presentes.Alegou que o negócio jurídico contém vício por dolo, tanto por parte do ex-presidente da Associação que não mais detinha a qualidade de presidente, ante o vencimento de seu mandato quanto por parte da requerida que sabia que José Roberto não era mais presidente e ainda assim celebrou o contrato. Alegou, ainda, que conforme disposto no artigo 18 de seu Estatuto, é necessário que as obrigações financeiras assumidas por uma diretoria sejam quitadas dentro da gestão desta, não sendo possível a aquisição de encargos a serem suportadas pela próxima diretoria. Ante as nulidades apontadas, pleiteou pela declaração de nulidade da cédula de crédito bancário, bem como pela condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios. Juntou documentos. Devidamente citada a requerida apresentou contestação às fls. 65/94 alegando, preliminarmente, que a requerente carece do direito de agir e de legitimidade para propor a ação, eis que o negócio jurídico celebrado entre as partes consiste em ato jurídico perfeito. Ainda em sede de preliminar afirmou que a autora carece de interesse de ação por perda do objeto, eis que o contrato foi devidamente consumado, tendo a requerente recebido os numerários objeto do contrato não podendo, a essa altura, pleitear pela anulação do negócio. No MÉRITO, alegou que a atitude da requerente configura má-fé e traduz-se na tentativa de enriquecimento ilícito, haja vista que apesar de invocar a nulidade do negócio jurídico, a autora não menciona em momento algum que irá devolver/pagar o valor tomado emprestado da requerida. Afirmou que a cédula objeto do contrato não foi o único negócio jurídico celebrado entre as partes, eis que a requerente, através de seu presidente José Roberto de Lima, já havia firmado diversos contratos consigo e honrado todos eles.Aduziu que a possibilidade de serem onerados bens, dando-os em garantia, é prevista no estatuto da requerente, não havendo ilegalidade nisso. Afirmou que quando da celebração da cédula de crédito vários documentos foram solicitados à requerente e que dentre estes documentos nenhum indicava que José Roberto não mais detinha poderes para representar a autora, tampouco outra ata nomeando e/ou elegendo outra pessoa como presidente, de modo que a ata que nomeou José Roberto como presidente ainda estava valendo.Alegou que ao caso em tela deve ser aplicada a teoria da aparência, haja vista que não existia documento nomeando outro presidente para a requerida e porque José Roberto era conhecido na cidade como sendo o presidente, já tendo, inclusive, realizado outros negócios com a ré nessa qualidade, havendo um comportamento de confiança e crença franca entre as partes, de modo que a praxe precedente e o costume de longa data fazem presumir a realidade do negócio.Afirmou que a requerente recebeu o dinheiro e o utilizou da maneira que melhor lhe aprouve, devendo ser aplicada a teoria do fato consumado, haja vista que a anulação do negócio jurídico lhe traria graves prejuízos. Alegou que não houve má-fé de sua parte quando da celebração do negócio e que, se esta existiu, foi por parte da requerente. Aduziu que caso seja anulado o negócio jurídico, a requerente deverá lhe devolver a quantia emprestada, devendo o bem imóvel dado em garantia continuar constrito a fim de garantir a execução.Por fim, afirmou que a requerente não logrou êxito em comprovar os fatos constitutivos de seu direito e que os documentos carreados na inicial não são válidos, eis que se tratam de fotocópias. Requereu que as preliminares sejam acolhidas, extinguindo-se o feito sem resolução de MÉRITO e que, em caso de entendimento diverso, que a ação seja julgada improcedente. Juntou documentos.Impugnação à contestação às fls. 121/124.O feito foi saneado às fls. 125/126.Devidamente intimadas para se manifestarem sobre o interesse na produção de novas provas, as partes pleitearam pela produção de prova testemunhal.Audiência de instrução realizada às fls. 135/137.A requerida apresentou alegações finais às fls. 166/189 e a requerente, por sua vez, o fez às fls. 190/193.É o relatório. Fundamento e decido.A requerente afirma que o empréstimo firmado por seu expresidente é nulo, pleiteando pela anulação do negócio jurídico. A requerida, por sua vez, diz que o negócio é válido, requerendo a improcedência da ação.Inicialmente consigno que o fato de os documentos juntados aos autos pela requerente serem fotocópias não lhes retira a validade, especialmente porque eles estão autenticados e, mesmo que não estivessem, o advogado poderia declarar sua autenticidade, cabendo à ré comprova a falsidade dos mesmos, acaso ela existisse.Pois bem.Do cotejo dos autos verifico que de fato o negócio jurídico entabulado entre as partes, representado pela cédula de crédito bancário juntada às fls. 24/33, no valor de R$ 135.000,00, é nulo. A nulidade se baseia em três aspectos, quais sejam: a ilegitimidade do então presidente para firmar o negócio; a impossibilidade de onerar bem imóvel sem autorização dos associados e; a impossibilidade de contrair débitos a serem quitados pela próxima gestão.Adiante passo a me manifestar sobre cada causa de nulidade, em separado, para melhor compreensão.Da ilegitimidade do ex-presidente da Associação para firmar o negócio jurídicoO Estatuto é o documento que rege as associações, estabelecendo, dentre outros temas essenciais descritos no artigo 54 do Código Civil, os direitos e deveres dos associados, as fontes de recursos para sua manutenção, o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e a forma de gestão administrativa.O Estatuto da requerente disciplina no artigo 29 que os membros da diretoria serão eleitos pela Assembleia Geral Ordinária e terão mandatos de dois anos, permitida a reeleição por uma vez, não percebendo qualquer remuneração pelos serviços prestados. Conforme se verifica da ata de fls. 34/35 o ex-presidente da requerente, Sr. José Roberto de Lima, foi eleito e empossado em 25/10/2009, de modo que seu mandato se encerrou em 25/10/2011.A cédula de crédito bancário, por sua vez, foi emitida em 10/01/2012, ou seja, após o fim do mandato do então presidente, de modo que este não mais detinha poderes para representar a Associação. Nesse ponto, importante consignar que não há disposição no Estatuto no sentido de que o presidente anterior continuará gerindo a Associação até a posse da nova diretoria.O artigo 115 do Código Civil determina que os poderes de representação conferem-se por lei ou pelo interessado, sendo que no caso em tela a requerida não cumpriu o ônus que lhe é incumbindo, deixando de conferir se aquele que se apresentou como representante da Associação de fato o era, não tendo a alegação de boa-fé o condão de dar validade ao negócio jurídico.De acordo com o artigo 104, I, do Código Civil, a validade do negócio jurídico requer agente capaz. Logo, ante a incapacidade daquele que firmou o contrato como representante da requerente, é certo que o negócio é nulo, não sendo, portanto, exigível.Da impossibilidade de onerar bens da Associação sem a autorização dos sóciosMesmo que aquele que firmou o negócio jurídico com a requerida ainda detivesse poderes para representar a autora, é certo que ainda assim o negócio firmado entre as partes seria anulável. Isso porque foi dado bem imóvel como garantia da dívida, contudo, tal atitude somente seria permitida caso houvesse a aprovação dos sócios, conforme dispõe o artigo 33 do Estatuto, in verbis:Artigo 33º A diretoria tem os poderes que a lei e este estatuto lhe conferem para assegurar o regular funcionamento da associação e será representado em suas relações com terceiros pelo seu presidente, ou por outros diretores designados.Parágrafo único

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