Página 2613 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 29 de Janeiro de 2016

pior, como condição a que possa consumar a compra da unidade. Aí, justamente, a venda casada. Note-se que à sua configuração não é preciso que o serviço ou produto imposto como condição ao fornecimento seja do mesmo fornecedor, podendo ser de um seu parceiro, como no caso em tela e em outros, tal qual o do seguro habitacional em contrato de financiamento, somente contratável com determinada seguradora, a que faz alusão exemplificativa Cláudia Lima Marques (Contratos no CDC, RT, 6ª ed., p. 843-844), ou o da entrada no cinema só com produtos comprados de certo comerciante, agora na exemplificação de Bruno Miragem (Direito do consumidor, RT, 2008, p. 187). O que importa é a constatação de que ‘o fornecedor nega-se a fornecer o produto ou o serviço, a não ser que o consumidor concorde em adquirir também um outro produto ou serviço.’ (Antônio Herman Benjamin, CCD comentado pelos autores, Forense, 10ª, ed., v. I, p. 382). E não se há de negar que, ao menos ao consumidor comum, outro caminho não há para adquirir unidade lançada, como na espécie, senão por meio da imobiliária cujos prepostos o atendem e, na hipótese, no stand de vendas. Mas aí outro dado a realçar. Não há, propriamente, serviço de intermediação prestado, de aproximação útil que caracteriza a atividade do corretor. Antes, há a adesão a uma oferta pública a que o fornecedor procede por meio de sua parceira contratual, portanto a quem entrega esta incumbência. A bem dizer, a imobiliária e os corretores agem, aos olhos do consumidor, como se fosse realmente uma preposta ou representante da fornecedora (art. 34 do CDC). Aliás, tanto assim que, no caso, pago sinal, a corretagem e a taxa de assessoria técnica no mesmo ato, aparentemente firmados os recibos pela mesma pessoa. Dir-se-á que, de todo modo, sempre a fornecedora poderia repassar ao consumidor o custo havido com a imobiliária, inserido no preço da unidade. Mas que então assim se faça, e com todas as devidas consequências daí derivadas. Pense-se, por exemplo, no ônus de, em mercado concorrencial, oferecer unidade a preço maior, o que, inclusive, poderia levar a fornecedora a negociar condições menos onerosas com a imobiliária. Nem se olvide que, por vantagem fiscal que a prática possa representar à vendedora, isenta da entrada do valor da comissão, inserido no preço, como receita sua, não se há de impor ao consumidor contratação obrigatória com a imobiliária e, pior, contra a lei”. Assim, e na forma como concretizado o negócio, o repasse da cobrança da aludida comissão ao consumidor caracteriza prática comercial abusiva, especificamente, a venda casada, além do que exige do consumidor vantagem manifestamente excessiva. Trata-se, pois, de ilegalidade que caracteriza ilícito contratual, legitimando a devolução aos autores do valor cobrado indevidamente, isto é, a quantia de R$ 3.488,80 (três mil quatrocentos e oitenta e oito reais e oitenta centavos), devidamente comprovado pelos documentos acostado às fls. 52/63. II DA MORA Do que se extrai dos autos, o autor assinou, em 24 de maio de 2012, instrumento particular de compromisso de venda e compra de fração de ideal de terreno e aquisição de unidade autônoma, com financiamento (fls. 24/47). O quadro resumo, ao tratar do prazo previsto de conclusão da obra estipulou o termo inicial de 24 (vinte e quatro) meses contados da assinatura do contrato de financiamento junto à Caixa Econômica Federal ou outro agente financeiro (fl. 48). Contudo, e diversamente do quanto constou expressamente na referida cláusula, assevera o autor que, por ocasião da assinatura do contrato com a Caixa Econômica Federal que foi assinado em 09/08/2013 - foi consignado, nos termos do item C, cláusula 6.1., do contrato aludido, que o prazo de previsão de entrega das obras fora reduzido para 13 (treze) meses (fl. 65). Assim, o prazo de entrega de imóvel estaria fixado em 09/09/2013. Contudo, o imóvel foi efetivamente entregue em 11/05/2015 (fl. 130/131). E a requerida JRA, apesar de apresentar seus termos, lastreada na disposição inserta no quadro resumo, não justificou o atraso, de forma satisfatória. Desse modo, diante da aplicação do disposto no artigo , VIII, do CDC, deveria ter sido comprovado o justo motivo para a não entrega do imóvel adquirido, o que, de fato, não aconteceu. Anoto que a simples alegação da ocorrência do denominado motivo de fortuito interno não é suficiente à elisão da responsabilidade da requerida em relação ao atraso verificado. Resta demonstrada, assim, a mora. E, diante desta, todas as demais consequências legais devem a ela também serem aplicadas. Trata-se da pura aplicação da legislação de consumo e de seus princípios, já que não se pode impor obrigação ao consumidor, sem que exista contrapartida em relação ao fornecedor. E não merece acatamento o exaustivo discurso no sentido de que o consumidor assinou o contrato por sua própria e espontânea vontade. Nem mesmo é preciso trazer aos autos todos os contratos celebrados pelas requeridas com os demais consumidores adquirentes de unidades no mesmo empreendimento para saber que todos eles são praticamente idênticos, posto que é notória a ausência de discussão das cláusulas nesse tipo de avença. Diante disso, tendo em vista que houve efetivo inadimplemento contratual por parte da requerida JRA, que não obedeceu ao prazo de entrega da unidade vendida, os direitos dele decorrentes devem ser analisados. III INCC e a Reversão da cláusula penal moratória em favor do consumidor. Ora, seguindo a cronologia dos acontecimentos na forma como narrados pelo autor, e a teor dos documentos mencionados, verifica-se que aquele, em nenhum momento, permaneceu em mora em relação ao pagamento. Diversamente, observou tudo quanto contratado. Contudo, a cobrança do valor decorrente da aplicação de índice de correção sobre o saldo devedor no período de atraso de entrega da obra pela ré máxime com confecção de instrumento particular de confissão de dívida - consiste em verdadeiro abuso e gera, como gerou, excessivo prejuízo ao autor, consumidor, trazendo a ré, de outra parte, um incentivo, senão até mesmo um prêmio por seu inadimplemento. Dispõe o artigo 395 do CC: “Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. Apesar de a correção monetária não ser consequência exclusiva da mora, certo é que sua aplicação beneficia o moroso, nos casos como o presente, em detrimento daquele que cumpria pontualmente com sua obrigação, sendo, pois, descabida. Veja-se o que decidiu, em casos análogos, o nosso Tribunal: “AÇÃO INDENIZATÓRIA - Promessa de compra e venda de imóvel -Decisão determinando a suspensão da correção monetária do saldo residual devedor pelo índice INCC-M/FGV - Inconformismo da ré - Desacolhimento Imóvel que não foi entregue no prazo fixado no contrato, mesmo depois de escoada a tolerância de 180 dias - Inadimplemento da agravante que autoriza a suspensão da correção até a expedição do “habite-se” - Decisão mantida -Recurso desprovido com observação. (Agravo de Instrumento n. 021XXXX-90.2012.8.26.0000, TJSP)”. “Agravo de Instrumento. Bem Imóvel. Compra e venda. Atraso na entrega da unidade autônoma. Aplicação do INCC/FGV sobre saldo residual indevida. Recurso desprovido. (Agravo de Instrumento n. 0207667-39.2012 São Paulo, TJSP)”. “AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. Decisão que deferiu parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela para suspender a cobrança de juros, porém indeferiu a suspensão da cobrança da correção monetária (INCC/FGV) - Atraso na entrega da unidade adquirida pelo agravado que justifica a suspensão da cobrança da correção monetária, a partir do término do prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias previsto no contrato firmado entre as partes, sob pena de dar causa à onerosidade excessiva do contrato para os adquirentes e privilegiar a construtora, inadimplente com as obrigações contratuais assumidas perante os agravantes. Agravo provido” (Agravo de Instrumento nº 0171362-56.2012, TJSP). Pelos motivos expostos, não resta dúvida de que a atualização dos valores devidos acarreta sim, no mais das vezes, efetivo prejuízo ao consumidor, adquirente, pois, está sendo penalizado por mora que não deu causa. No caso dos autos, é certo, a ré JRA não cumpriu com sua prestação, ensejando o atraso, de tal modo que, por ser a única responsável não poderia transferir o seu ônus ao autor, adquirente, valendo-se, abusivamente, de correção monetária e juros embutidos no preço. Portanto, e diante disso, o termo de confissão de dívida (fls. 117/120) será declarado nulo em relação ao autor, - porquanto abusivos e em manifesto confronto com a função social do contrato - de modo que declaro, por conseguinte, inexigível o débito no valor de R$ 3.817,12 (três mil oitocentos e dezessete reais e doze centavos), tornando definitiva a tutela antecipada. É certo ainda, que o autor fará jus à restituição da

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