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26 de Maio de 2024

A aposentadoria especial antes da reforma da previdência

Publicado por Gustavo Rodrigues
há 7 meses

A evolução histórica da aposentadoria especial no Brasil

O primeiro elemento legislador que tratava de aposentadoria no Brasil foi a Lei nº 4.682/1923 [1], que, em seu texto base, previa a criação de um fundo de aposentadoria e pensões para os trabalhadores das ferrovias, que era o principal meio de transporte da época.

Os dois primeiros artigos da Lei em questão previam o seguinte:

Art. 1º Fica creada em cada uma das emprezas de estradas de ferro existentes no paiz uma caixa de aposentadoria e pensões para os respectivos empregados.

Art. 2º São considerados empregados, para os fins da presente lei, não só os que prestarem os seus serviços mediante ordenado mensal, como os operarios diaristas, de qualquer natureza, que executem serviço de caracter permanente.

Paragrapho único. Consideram-se empregados ou operarios permanentes os que tenham mais de seis mezes de serviços continuos em uma mesma empreza.

Desta maneira, pode-se observar que o primeiro instituto legislativo previdenciário no Brasil foi esse, sendo um passo importantíssimo acerca do futuro desse tema no país, o qual passa por mudanças até os dias presentes.

Com o advento desta lei, foram instituídas as aposentadorias por invalidez e tempo de trabalho, além da pensão por morte. Com isso, as empresas ferroviárias foram obrigadas a criar o CAP (caixa de aposentadorias e pensões), assim sendo responsáveis pelo recolhimento formal das contribuições dos trabalhadores.

Esta Lei permaneceu sem quaisquer alterações durante aproximadamente 10 anos, quando foi promulgado o Decreto nº 20.465/1931, que serviu para reformar os CAPs.

No art. 25 deste Decreto houve o primeiro tipo de legislação acerca de aposentadoria especial, veja-se:

Art. 25. a aposentadoria ordinária, salvo nas hipóteses dos parágrafos 7º e 8º deste artigo, se concederá aos associados que o requererem, desde que tenham, no mínimo, 50 anos de idade e 30 anos de efetivo serviço, e corresponderá ao coeficiente de 70 a 100% da média dos vencimentos dos três últimos anos de serviço. Em casos especiais, de ofícios e profissões particularmente penosos ocupações em indústrias insalubres que prejudiquem o organismo, de apreciando-lhe notavelmente a resistência, o que será previsto e determinados nos regulamentos, o tempo de serviço prestado poderá ser reduzido até 25 anos e o limite da idade baixar até 45 anos [2]. (grifamos)

Portanto, nota-se que antes disso era necessário que o trabalhador atingisse 30 anos trabalhados e tivesse completado 50 anos de idade para que pudesse obter a aposentadoria por tempo de trabalho.

Após este decreto ficou firmado que os trabalhadores que exerciam suas atividades expostos à ambientes penosos e insalubres poderiam se aposentar com o tempo mínimo de trabalho de 25 anos e idade mínima de 45 anos.

Determinada legislação permaneceu em vigor por mais cerca de 20 anos, quando fora criado o Anteprojeto da Lei Orgânica da Previdência Social, onde era previsto o benefício de aposentadoria entre os citados.


Sendo publicada apenas em 1956, após diversas discussões acerca dos elementos contidos no Anteprojeto, ficou estabelecido o seguinte sobre a aposentadoria especial:

Art. 31. A aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, forem considerados penosos, insalubres, ou periculosos, por decreto do Poder Executivo [3].

Anos depois, com o advento da Lei nº 8.213/91 [4], foram designados dois artigos para tratarem única e exclusivamente da aposentadoria especial, quais sejam:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto na Seção III deste capítulo, especialmente no art. 33, consistirá numa renda mensal de 85% (oitenta e cinco por cento) do salário-de-benefício, mais 1% (um por cento) deste, por grupo de 12 (doze) contribuições, não podendo ultrapassar 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.

§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.

§ 3º O tempo de serviço exercido alternadamente em atividade comum e em atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, para efeito de qualquer benefício.

§ 4º O período em que o trabalhador integrante de categoria profissional enquadrada neste artigo permanecer licenciado do emprego, para exercer cargo de administração ou de representação sindical, será contado para aposentadoria especial.

Art. 58. A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica.

Então, 4 anos depois foi promulgada a Lei nº 9.032/95 [5], a qual trouxe significativas mudanças relacionadas à documentação necessária para que o trabalhador comprovasse sua exposição às condições especiais, excluindo o enquadramento por categoria profissional, alterando o modo de cálculo do salário, exigindo comprovação de exposição permanente ao agente nocivo etc.

Desta maneira, as mudanças implementadas pela Lei nº 9.032/95 permaneceram em vigor até a promulgação da EC 103/19 [6], a qual asseverou diversas mudanças na legislação previdenciária do país, com novos requisitos para a obtenção do benefício de aposentadoria especial.

O custeio deste tipo de benefício aos cofres públicos

Em primeiro momento, há que se explicar o que é o SAT e o motivo de ser tão pertinente ao assunto em pauta neste trabalho, já que o benefício de aposentadoria especial é pago aos trabalhadores através dele.

O SAT [7] é o Seguro de Acidente de Trabalho, previsto na CF/88 [8] em seu art. 7º, XXVIII, com o intuito de financiar os benefícios concedidos pelo INSS advindos de acidente de trabalho.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

No início, o SAT servia única e exclusivamente para o pagamento dos acidentes de trabalho, sendo modificado para incluir o custeio dos benefícios de aposentadoria especial apenas com o advento da Lei nº 9.528/97 [9], dando nova redação ao art. 22, II, da Lei nº 8.212/91 [10]:

Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:

[...]

II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos

Posteriormente, a Lei nº 9.732/98 [11] implementou o chamado “Adicional do SAT”, para que a aposentadoria especial pudesse ser financiada pelo próprio SAT, regulamentando assim tudo de maneira correta. Foram acrescentados ao art. 57 da Lei nº 8.213/91 os parágrafos 6º e 7º, contendo o mencionado acima:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.

[...]

§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput.

O destino dos recursos do adicional do SAT previstos no parágrafo 6º mencionado acima é dado pela redação do art. 22, II, da Lei 8.212/91, veja-se:

Art. 22. [...]

II – para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos

Em face do exposto, conclui-se que o custeio do benefício de aposentadoria especial é dado através do adicional do SAT, a ser pago pelas empresas que possuem trabalhadores expostos ao agente nocivo.


[1] WESTIN. Ricardo. Primeira lei da Previdência, de 1923, permitia aposentadoria aos 50 anos. Agência do Senado Federal. Arquivo S, Edição 57. 1ª Previdência. Publicado em 03/06/2019. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/arquivo-s/primeira-lei-da-previdencia-de-1923-permitiaaposentadoria-aos-50-anos. Acesso em: 16 nov. 2022.

[2] BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 20.465, de 1º de Outubro de 1931. Reforma a legislação das Caixas de Aposentadoria e Pensões. Diário Oficial da União, Seção 1, 03/10/1931, p. 15578 (Publicação Original). Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-20465-1-outubro1931-500674-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 16 nov. 2022.

[3] BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Diário do Congresso Nacional, Ano 12, n. 230, de 14 de dezembro de 1957, p. 11.003. Disponível em: http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD14DEZ1957.pdf#page=61. Acesso em: 16 nov. 2022.

[4] BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm. Acesso em: 16 nov. 2022

[5] BRASIL, Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995. Dispõe sobre o valor do salário-mínimo, altera dispositivos das Leis nº 8.212 e nº 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9032.htm. Acesso em: 16 nov. 2022

[6] BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Emenda Constitucional n. 103, de 12 de novembro de 2019. Altera o sistema de previdência social e estabelece regras de transição e disposições transitórias. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03 /constituição/emendas/emc/emc103.htm. Acesso em: 16 nov. 2022.

[7] O Seguro de Acidente do Trabalho foi estatizado pela Lei n. 5.316 6/67, quando o Estado assume o acidente do trabalho como risco social.

[8] BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03 /constituição/constituição.htm. Acesso em: 16 nov. 2022.

[9] BRASIL, Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997. Altera dispositivos das Leis nºs 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9528.htm. Acesso em: 16 nov. 2022.

[10] BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm. Acesso em: 16 nov. 2022

[11] BRASIL, Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Altera dispositivos das Leis nos 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, da Lei n o 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9732.htm. Acesso em: 16 nov. 2022.

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