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23 de Maio de 2024
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    A execução específica da obrigação de dar

    Publicado por Rogério Tadeu Romano
    há 3 anos

    A EXECUÇÃO ESPECÍFICA DA OBRIGAÇÃO DE DAR

    Rogério Tadeu Romano

    Tinha-se do artigo 461 – A do CPC de 1973 na redação que lhe foi dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002:

    Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao

    conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da

    obrigação.

    .....

    Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

    § 1o Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha; cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

    Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

    .......

    § 2o Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

    § 3o Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1o a 6o do art. 461.

    A matéria veio a ser objeto do CPC de 2015 com a seguinte redação:

    Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

    Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

    Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

    Art. 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação.

    Luiz Rodrigues Wambier (Curso avançado de processo civil: processo de execução. 5ª ed. v.2. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2002) afirmou que a regra em comento possui natureza de tutela mandamental.

    Disse Luiz Rodrigues Wambier que o provimento concessivo da tutela, mais do que autorizar o emprego de meios substitutivos da conduta do réu, há de ter força suficiente para mandar que ele mesmo adote o comportamento devido”.

    Há uma sentença que ordena e que determina a aplicação de meios de coerção em caso de desobediência quanto a aplicação dessa medida.

    Há a aplicação de astreintes.

    A principal função das astreintes é, portanto, compelir o devedor a adimplir a obrigação, forçando-o psicologicamente a entregar a prestação devida ao credor, sob pena de que referida multa seja revertida em favor deste, sem, contudo, que se caracterize como ressarcimento. Isso porque, para o Direito brasileiro, as astreintes não possuem caráter punitivo ou indenizatório e sim coercitivo, ao contrário de outras legislações, como a americana, em que medidas coercitivas como a multa tem caráter punitivo. No entanto, as astreintes possuem nitidamente caráter acessório, eis que tratam-se de medida de coerção para o cumprimento de uma obrigação de fazer, de não fazer ou de entrega de coisa, como disse Danilo Joaquim de Lima (Os atreintes e a boa-fé – uma releitura do artigo 461 e 461 – A do CPC, in Migalhas).

    É ainda de Danilo Joaquim de Lima a lição:

    “Assim, ao fixar as astreintes, o Poder Judiciário deve se atentar ao fato de que tal medida coercitiva deve conviver de forma harmônica no sistema com outros princípios, dentre eles o da economia e celeridade processual e da boa-fé. Ao ter esses princípios como elemento fundamental na aplicação do direito, certamente o Poder Judiciário adotará medidas sub-rogatórias para o cumprimento da obrigação, atingindo a finalidade da norma e, assim, evitando o enriquecimento injustificado do credor que pratica condutas contrárias a boa-fé a fim de enriquecer-se de forma injustificada.”

    Voltamos à ação mandamental.

    Ensinou Ovídio A. Baptista da Silva (Curso de Processo Civil, volume II, 1990, pág. 247) que a ação mandamental tem por fim obter, como eficácia preponderante da respectiva sentença de procedência, que o juiz emita uma ordem a ser observada pelo demandado, ao invés de limitar-se a condená-lo a fazer ou não fazer alguma coisa. É da essência da ação mandamental que a sentença que lhe reconheça a procedência, contenha uma ordem para que se expeça um mandado. O juiz ordena e não simplesmente condena.

    As ações mandamentais descendem diretamente dos interditos romanos. Ali o pretor não condenava, mas ao contrário ordenava que o demandado fizesse ou deixasse de fazer alguma coisa.

    Fica a lição de Pontes de Miranda (Tratado das ações, tomo I, § 37, 2) quando disse que:

    “Na ação mandamental, pede-se que o juiz mande, não só que declare, nem que condene; tampouco se espera que o juiz por tal maneira fusione o seu pensamento. Por isso mesmo não se pode impedir que dispense o mandado. Na ação executiva, quer-se mais; quer-se o ato do juiz fazendo, não o que deveria ser feito pelo juiz como juiz, sim o que a parte deveria ter feito. No mandato, o ato é ato que só o juiz pode praticar por sua estatalidade. Na execução, há mandados – no correr do processo; mas a solução final é ato da parte.”

    A execução é ato privado da parte que o juiz, através do correspondente processo – se a demanda fora condenatória ou desde logo por simples decreto, se a ação desde o início era executiva – realiza em substituição à parte que deveria tê-lo realizado. Na sentença mandamental, o juiz realiza o que somente ele como representante do Estado, em virtude de sua estatalidade, pode realizar. Isto interfere profundamente com o conceito de jurisdição que nos foi legado pela civilização europeia, como afirmou Ovídio B. Baptista da Silva (obra citada).

    Nessa linha de entendimento disse Merryman (citado por Ovídio Baptista da Silva) que o juiz do sistema europeu continental e da América Latina, é tratado como um mero aplicador da lei, sem qualquer poder criativo. Esse legado seria responsável, segundo os estudiosos, pelo emperramento da máquina judiciária. Sendo assim nossos magistrados foram orientados para exercer iuris mais dictio, não imperium. Já os ingleses conceberam o juiz à semelhança do pretor romano. Esse pensamento levou o processo nas chamadas obrigações de fazer, e ver o mesmo nas obrigações de dar, não contassem com execução específica, tendo o credor que contentar-se com o sucedâneo das perdas e danos sempre que o devedor, embora condenado a executar uma prestação desta espécie se recusasse a cumprir o julgado. Isso vem do direito medieval e foi transmitido aos franceses com forte ascendência sobre a cultura jurídica pátria, quando se inspira no Código Civil da França de 1804, particularmente no que ensinou Pothier, como ensinou Giuseppé Borré(Execuzione forzata degli obbighi di rare e di non fare, 1966, pág. 10), como nos noticiou Ovídio Baptista da Silva.

    No sistema do common law, como pode acontecer em certas situações na Alemanha, se a sentença determinar que o demandado pague uma certa quantia em dinheiro ou o condene a entregar coisa alheia, além naturalmente das condenações ao cumprimento de obrigações de fazer e não fazer, poderá o credor requerer que o tribunal imponha ao condenado uma injunção, determinando o cumprimento da sentença, sob pena de considerar-se a resistência como ato de desobediência e desacato ao tribunal (Contempt of Court), com a aplicação de sanções punitivas de natureza pessoal, como disse Molina Pasquel (Contempt of Court - Correciones disciplinarias y medios de apremio, México, 1954, n. 63).

    A sentença deixa de ser condenatória para revestir-se de um mandamento imperativo e cogente, cuja desobediência pode acarretar ao demandado a imposição de uma multa. Ao contrário, para Liebman, que teve forte influência na edição do CPC de 1973, Código Buzaid, não é função do juiz, na demanda condenatória, pronunciar ordens, mas apenas declarar o sistema aplicável.

    Com isso se quer dizer que a sentença para cumprimento dessas obrigações, no sistema do Common Law, descende dos interditos romanos. Ali pratica-se o imperium.

    Importa dizer que o nosso sistema processual, por conta de estudos na Itália, foi invadido nas obrigações por ações mandamentais, através das inibitórias.

    Assim foi a contribuição do direito coletivo, como nos revelou Mauro Cappelletti (Formazioni Sociali e interesse di gruppo davanti alla giutizia civile, 1975, Rivista di diritto processuale, pág. 372) e ainda do direito do trabalho, em especial, com as decisões de cunho inibitório com a de reintegração de empregado. Tal se tem em uma execução especifica da ordem. É o caso de uma decisão judicial que determine, mande, suspender a imissão de poluentes e manda realizar obras devidas em prol do meio ambiente, em face do princípio do poluidor-pagador.

    A sentença mandamental autoexecuta-se, dispensando o processo executivo para o cumprimento da obrigação.

    É o que se tem da sentença que, nos termos do artigo 498 do CPC de 2015, determina o cumprimento de uma obrigação de dar, fixando prazo para cumprimento de uma obrigação. Para tanto, será necessário liquidez e certeza da obrigação.

    Tem-se então: A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

    De outro modo tem-se a indenização por perdas e danos.Trata-se da velha concepção da execução especifica da obrigação e não da ordem.

    Art. 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação.

    Pelo artigo 500 do CPC de 2015 dar-se-á verdadeiro cumprimento de sentença, nos moldes do CPC de 2015, com todas as regras ali inerentes. Não paga a dívida, poderão ser tomadas medidas como adjudicação de bens (que tem prioridade em relação a outras); arrematação de bens ou ainda o gozo e fruição da coisa, visando ao adimplemento de obrigação.

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