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16 de Maio de 2024

O método Aba está no rol da ANS

Conheça a verdade sobre a decisão do STJ

Publicado por Lucas Simon
há 2 anos

O pânico tomou conta de todos os beneficiários de planos de saúde desde a decisão do STJ RESP Nº 1.886.929 - SP (2020/0191677-6) (08 jun. 2022). Muito terror psicológico foi propagado para as pessoas — até mesmo por aqueles que deveriam acalmar os aflitos — mas pouca informação correta foi passada. Há motivo para muita preocupação, mas nem tudo está perdido, continue lendo que eu te explico ponto a ponto.

Sim, a decisão do STJ é terrivelmente desrespeitosa e desumana, pois condiciona todos os pacientes a buscar o judiciário para conseguir o tratamento que for negado.

A decisão do STJ privilegia os planos de saúde, e coloca sobre o SUS o aumento de demanda de saúde, pois as pessoas que não puderem contratar um advogado (a) — e faço a ressalva que nesse momento é muito importante a contratação de um advogado especialista na área da saúde, não é mero “jabá”, é a garantia de que a vida do paciente vai ser tratada no processo com o maior zelo e com capacidade técnica e adequada —. O STJ também jogou nos braços do judiciário o aumento exponencial de demandas judiciais (e olha que muito se crítica sobre a judicialização da saúde, mas parece que essa questão foi ignorada por aqueles Ministros que votaram a favor do rol taxativo.)

Os planos de saúde vão negar tratamento com mais vontade a partir de agora, vão cassar liminar, vão tentar alterar decisões e cumprimentos de sentença. Mas há alguns pontos que devemos analisar aqui.

Podemos ficar desesperados? Sim, mas com calma e de forma racional, esse sentimento deve ser convertido em mobilização para quando o tema passar a ser julgado no Supremo Tribunal Federal (STF), pois, como eu disse n esse post sobre o rol taxativo mitigado da ASN e o que muda para as pacientes. O direito à saúde está previsto na Constituição Federal, e somente o STF tem competência para decidir sobre assuntos constitucionais — já sabemos que a OAB está movimentando essa questão.

Explico mais: De acordo com o RESP 1.886.929-SP, “As ações e serviços de saúde são pública, por determinação legal e ordem constitucional, balizando os limites materiais do poder normativo da ANS, que tem a função de regulamentar as exceções às exigências mínimas a serem observadas pelo plano de saúde, não cabe a ela ampliar ou agravar, de modo que restrinja ainda mais a cobertura determinada por lei, prejudicando o beneficiário”.

De acordo com a pirâmide de Kelsen (que nada mais é do que uma estrutura de “hierarquia” — apesar de leis ordinárias e complementares não comportarem hierarquias entre si —, onde compreendemos que algumas leis estão acima de outras, e por isso devem, naturalmente, prevalecer sobre aquelas). Nesse sentido, a lei que está no topo dessa pirâmide é a Constituição Federal, tudo dela decorre, veja um exemplo simplificado:

Explicando, com base nas palavras da Min. Nancy (Ministra do STJ que vota pelo rol exemplificativo da ANS), essa pirâmide em prol do consumidor funciona da seguinte forma:

A constituição Federal está acima de todas as normas, e ali encontramos o direito à saúde, que é de garantia máxima assegurada por ela. Aliás, o Tratado Internacional de Direitos Humano, ao qual o Brasil é signatário, está acima das Leis Complementares e Ordinárias, colocando o direito à saúde e a garantia dos Direitos Humanos em um patamar constitucional por si só.

Pois bem. Na parte das “Leis Ordinárias” está o Código de Defesa do Consumidor ( CDC), ainda que seja reconhecida como “lei complementar à Constituição Federal — lei que ampara as relações de consumo e protege o consumidor, garantindo-lhe proteções específicas nas relações com os fornecedores"— é uma das principais leis utilizadas na área da saúde complementar (planos de saúde). Nesse sentido, como o CDC coloca o beneficiário do plano (consumidor) como o elo mais fraco e VULNERÁVEL da relação com o fornecedor/prestador de serviços, o contrato (de plano de saúde) deve ser analisado em favor do consumidor.

Abaixo das Leis Complementares, estão as Leis Ordinárias (apesar de não existir hierarquia entre elas. O que muda é a forma como elas podem ser alteradas pelo poder legislativo, ou seja, com mais ou menos dificuldade), e é aí que se localiza a Lei de Planos de Saúde (Lei n. 9.656/98).

Essa lei é clara, em seu artigo 10, que o rol (lista) da ANS deve garantir a prevenção, diagnóstico, recuperação e reabilitação de TODAS AS ENFERMIDADES que compõem a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) — essa é uma classificação que estabelece todas as doenças, condições de saúde, síndromes etc. que existem, explicando de forma bem simplória —. Assim sendo, a lei estabelece que as operadoras de planos de saúde devem cobrir todas essas condições em uma quantidade MÍNIMA de sessões/tratamentos/medicamentos estabelecida pela ANS.

Por fim, na base da pirâmide, estão as Resoluções Normativas (RN), ou seja, com"menos poder"que as leis federais. No tocante à saúde, de acordo com a pirâmide, veja como fica:

Antes do próximo parágrafo, ressalto que o termo “Lei Federal” compreende Lei ordinária; Lei complementar; Lei delegada; Decreto-Lei; Medida Provisória etc. Ou seja, os “andares” da pirâmide que estão abaixo da Constituição Federal e acima das resoluções.

Sendo assim, todos os direitos e garantias que constem na Constituição Federal só podem ser discutidas no Supremo Tribunal Federal (STF). Compete ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgar assuntos que dizem respeito às leis federais (aqui entra o Direito do Consumidor, porque é Lei Ordinária, bem como a Lei de Plano de Saúde).

Agora, sabendo de tudo isso, o que podemos entender é: Sim, o STJ julgou sobre o Rol da ANS, porque estamos falando da Lei Federal — tanto o CDC quanto a Lei de Planos de Saúde — isso quer dizer que a razão de existir da Lei de Planos de saúde e do CDC é unicamente para dar cumprimento a direitos e garantias previstos na Constituição Federal. A CF diz que esses direitos existem e as leis abaixo dela devem criar mecanismos para que esses direitos sejam assegurados.

Isso quer dizer que, como o tema Saúde está previsto na Constituição Federal, e o ÚNICO Tribunal que pode decidir sobre esses temas é o STF, fica claro o motivo por que a discussão ainda não acabou, não é?

O que é o rol taxativo mitigado?

Com o entendimento sobre rol exemplificativo, os planos de saúde eram obrigados a garantir a saúde de seu beneficiário, ainda que o tratamento não constasse na lista da ANS, ou em quantidade maior do que o mínimo previsto nessa lista.

Porém, com o entendimento de que é rol taxativo, essa lista se torna engessada. Ou seja, os planos são obrigados a cobrir somente aquilo que está EXCLUSIVAMENTE previsto na lista da ANS, e nas quantidades mínimas, nem mais nem menos, ainda que o paciente necessite de mais (indo de encontro ao artigo 10, da lei dos planos de saúde, como eu disse acima).

Mas está tudo acabado? Não! Pois o entendimento não é por um rol taxativo, mas sim por um ROL TAXATIVO MITIGADO, que é, em regra, conforme eu expliquei acima, mas tem um “PORÉM” nisso tudo, e o (a) advogado (a) especializado (a) nessa área vai saber como atuar nessas exceções que o STJ deixou. E “taxativo mitigado” é exatamente isso, um rol engessado, mas com fissuras, com exceções para atender o beneficiário consumidor do plano de saúde, tendo que ser analisado caso a caso.

Sabendo disso eu te pergunto:

Os planos de saúde não são obrigados a cobrir o método ABA? Os planos de saúde não cobrem tratamento autista?

Penso que esse foi o maior motivo de desespero entre as pessoas, principalmente entre aquelas que tem filhos (as) autistas que fazem tratamento. E, muitos — muitos mesmo — profissionais do Direito, assim como veículos de notícias, espalharam o caos com notícias sensacionalistas, incompletas e até mesmo equivocadas!

Você já leu ou ouviu em algum lugar que os planos não são mais obrigados a cobrir tratamento ABA, nem, de forma geral, o tratamento para pessoas autistas, não é? Me conta aqui nos comentários o que você já leu e o que sentiu.

Eu tenho uma coisa para te dizer: CALMA! A decisão do STJ prejudica muito as coisas, e força, sim, os beneficiários dos planos de saúde a procurar o judiciário, a contratar um (a) advogado (a) especialista na área da saúde. MAS quem é especialista na área da saúde já atuava, de forma geral, conforme as condições das exceções concedidas pelo STJ!

Sim, nós advogados já tínhamos essa prática, até porque sempre foram elementos essenciais para conseguir uma liminar, ou mesmo o resultado favorável no processo. E aqui estou falando de laudos médicos circunstanciados, relatórios de evolução, pesquisa científica, prontuário, contrato do plano de saúde etc.

Agora, com a mudança trazida pelo STJ, os processos dos casos que estiverem dentro das condições de exceção, poderão garantir, SIM, o tratamento do beneficiário, desde que bem instruído pelo advogado. Se você quer entender como funcionam essas exceções, entre em contato com uma (a) advogado (a) especializado (a) no Direito Médico e da Saúde para orientação correta.

Perguntas mais frequentes sobre o rol da ANS

1) O plano de saúde é obrigado a cobrir o método ABA? Como fica o tratamento para criança autista?

R: SIM! O plano de saúde é obrigado a cobrir o tratamento ABA, porque SIM ele consta do rol da ANS, no campo de “psicoterapia”. Não só isso, os tratamentos que compõem o método ABA (como T.O, fonoaudiologia, psicoterapia etc.) também constam no rol. O plano de saúde NÃO pode limitar a quantidade de sessões para esse tratamento! Isso já é uma verdade que eu trabalho desde 2021, haja vista a Resolução Normativa 469, de julho de 2021, da ANS.

Outro ponto importante é que o próprio Min. Salomão, em seu voto, deixou claro que os tratamentos para o autismo já foram incluídos no rol de procedimentos da ANS, com consultas e terapias ilimitadas.

E é por isso que eu reforço a atuação do (a) advogado (a) especialista na área médica e da saúde, porque já fazíamos as petições dos processos com toda documentação e método adequado, porém, esse trabalho aumentou exponencialmente agora que precisamos — não especificamente para o tratamento autista, mas para todos que precisam de ação judicial — comprovar de forma incansável a necessidade e indispensabilidade do tratamento.

2) Posso perder a Liminar concedida para meu filho (a) autista?

R: A reposta é SIM, a liminar pode ser cassada a qualquer tempo, mas não por conta da decisão do STJ, isso sempre foi possível! A liminar é uma decisão que o/a juiz (a) concede no processo (geralmente no início), desde que verifique a viabilidade dessa, e no curso do processo, se verificar que a liminar não é mais necessária ou perdeu o direito de ser, pode revogá-la.

* Faço um adendo que o termo correto para essa “liminar” é, na verdade, “Tutela de Antecipada”. *

3) O meu processo está em curso, vou perder para o plano?

R: A resposta, a princípio, é “não necessariamente”, explico: A decisão do STJ não tem efeito vinculante. E isso quer dizer que:

Os Tribunais de Justiça Estaduais (a segunda instância) ainda podem decidir de forma diversa da decisão do STJ e aplicar ao caso o entendimento de rol exemplificativo. Inclusive, caso decida simplesmente com base na decisão do STJ, sem justificar sobre o caso concreto, essa decisão pode ser atacada pelo (a) advogado (a) qualificado (a) na área da saúde! Confie no (a) seu (sua) advogado (a)!

4) A T.O com interação sensorial está no rol da ANS?

R: Sim. A DUT (Diretrizes de Utilização) da ANS é clara quanto a cobertura desse procedimento.

5) Meu filho recebe" Home Care ", mas o plano já mandou tirar os equipamentos, ele pode fazer isso?

R: Não pode! Se tem decisão judicial que obriga o plano de saúde a cobrir o"Home Care", ele só pode deixar de fornecer o tratamento por ordem do judiciário! E, digo mais, as operadoras de planos de saúde devem observar as condições da própria decisão do STJ. Para que a Operadora do Plano de Saúde (OPS) retire o tratamento, deve garantir um tratamento alternativo à"Home Care", que é a internação hospitalar. Mas essa internação, além de ser muito mais caro para o plano, é também extremamente prejudicial para o paciente. Assim, se a internação no hospital não é mais benéfica do que a internação/tratamento domiciliar, não pode trocar a" Home Care ".

6) Qual foi o ponto “chave” para que o STJ justificasse o voto pelo rol taxativo mitigado?

R: A principal justificativa nos votos é que as Operadoras de Planos de Saúde não podem ficar à mercê de um sistema onde qualquer condição de saúde ou tratamento deve ser coberto pelo plano de saúde, pois isso impossibilitaria uma organização financeira, cálculos atuariais, reajustes, assim como ingresso de novos beneficiários aos planos (de forma resumida é isso).

De acordo com o voto: “Com efeito, a sustentabilidade é um dos princípios de qualquer sistema de saúde, sendo de rigor a previsibilidade e o controle de custos. A incerteza de rol exemplificativo, somada a precificações superdimensionadas para conter riscos imprevisíveis e a frustração de planejamento, constituem obstáculos tanto à inclusão de novos entrantes no setor quanto à oxigenização das carteiras de usuários.”

Aterrador esse voto, não é? Caso você tenha ficado com alguma dúvida, ou queira falar sobre esse assunto, estarei à disposição para te explicar, seja aqui nos comentários abaixo ou no WhatsApp, só escanear o código abaixo — ou no e-mail: lucassimon.adv@gmail.com

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Artigo excelente e completo Dr.
Nos ajuda a ter um parâmetro de como agir daqui pra frente!
Meus parabéns e muito obrigado pelo conteúdo! continuar lendo