Página 1118 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 3 de Abril de 2024

retificou o subitem 13.7.5 do edital nº 04/2023-DGP/PMDF para diminuir a distância original de 2.600 metros para 2.400 metros. Também, aponta irregularidades na pista de corrida da UCB, na contagem do tempo e na distância percorrida pela candidata. Observe-se que o pedido de tutela de urgência perpassa a compreensão da política pública em questão, de modo que deve ser analisado à luz do princípio da isonomia, até porque não se admite diferenciação apenas a um gênero. Por certo, também deve ser apreciado com base nas normas legais que dispõem sobre o tratamento diferenciado dispensado às mulheres. Cumpre salientar, inicialmente, que todas Constituições do Brasil, de forma expressa, previram acerca do princípio da igualdade, no sentido de estabelecer a Cláusula Geral da Isonomia, ou seja, que todos são iguais perante a lei. Especificadamente à igualdade entre homens e mulheres, sobreveio com a vigência da Constituição de 1934, nos termos de seu artigo 113, nº 1 ? ?Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças religiosas ou ideias política?. A Constituição de 1946 previu a cláusula geral da igualdade (?todos são iguais perante a lei?), mas também acrescentou a proibição de tratamento distinto por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil no exercício de um mesmo trabalho (artigo 157, inciso II). Quanto à igualdade de gênero, adveio com a EC nº 1 de 1969 ? que modificou o artigo 153, § 1º, CF/67 ? estabelecendo a igualdade entre todos perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Não obstante, embora as cláusulas gerais da igualdade previstas em todas as Constituições pretéritas, registre-se que a plena igualdade entre homens e mulheres ainda não tinha sido garantida, persistindo, assim, o tratamento diferenciado entre os sexos (masculino e feminino). Com o advento da Constituição Federal de 1988, o artigo , caput e inciso I, reservou a plena igualdade entre homens e mulheres, de forma expressa, nos seguintes termos: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição. (...) Nesta tangente, ressalto que a previsão expressa na Constituição Federal de 1988 ? quanto à cláusula geral de igualdade (caput) e à igualdade de gênero (inciso I) ? ressalvou, ainda, acerca da possibilidade de adoção de tratamento diferenciado, porém nos termos previstos no ordenamento constitucional. É dizer, as hipóteses de tratamento desigual às mulheres possuem previsão formal na própria Carta Magna, embora se admita, evidentemente, tratamento diferenciado infraconstitucional, desde que razoável, proporcional e harmônico ao espírito da Lei Fundamental. Portanto, a Constituição Federal de 1988 assegurou expressamente a igualdade material entre os sexos, mas, obviamente, desde que respeitadas as desigualdades entre eles, ante as distorções de ordem econômica, social e cultural ocorridas ao longo do tempo. Logo, o tratamento diferenciado às mulheres encontra amparo em nosso sistema jurídico, cuidando-se de política pública compatível com a Constituição Federal, considerando as vulnerabilidades existentes sob este grupo, desde os primórdios da sociedade. Outrossim, o Decreto Federal nº 4.377, de 13/09/2002, promulgou a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher de 1979, revogando o Decreto nº 89.460, de 20/03/1984. Por sua vez, referida Convenção delineou o sentido da expressão ? discriminação contra a mulher ?, bem como assentou que os Estados Partes devem condenar qualquer discriminação sob este grupo vulnerável (mulher), estabelecendo os objetivos a seguir, a saber: Artigo 1º - Para fins da presente Convenção, a expressão ?discriminação contra a mulher? significará toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. Artigo 2º Os Estados Partes condenam a discriminação contra a mulher em todas as suas formas, concordam em seguir, por todos os meios apropriados e sem dilações, uma política destinada a eliminar a discriminação contra a mulher, e com tal objetivo se comprometem a: a) Consagrar, se ainda não o tiverem feito, em suas constituições nacionais ou em outra legislação apropriada o princípio da igualdade do homem e da mulher e assegurar por lei outros meios apropriados a realização prática desse princípio; b) Adotar medidas adequadas, legislativas e de outro caráter, com as sanções cabíveis e que proíbam toda discriminação contra a mulher; c) Estabelecer a proteção jurídica dos direitos da mulher numa base de igualdade com os do homem e garantir, por meio dos tribunais nacionais competentes e de outras instituições públicas, a proteção efetiva da mulher contra todo ato de discriminação; d) Abster-se de incorrer em todo ato ou prática de discriminação contra a mulher e zelar para que as autoridades e instituições públicas atuem em conformidade com esta obrigação; e) Tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher praticada por qualquer pessoa, organização ou empresa; f) Adotar todas as medidas adequadas, inclusive de caráter legislativo, para modificar ou derrogar leis, regulamentos, usos e práticas que constituam discriminação contra a mulher; g) Derrogar todas as disposições penais nacionais que constituam discriminação contra a mulher. Artigo 3o Os Estados Partes tomarão, em todas as esferas e, em particular, nas esferas política, social, econômica e cultural, todas as medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para assegurar o pleno desenvolvimento e progresso da mulher, com o objetivo de garantir-lhe o exercício e gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais em igualdade de condições com o homem. (...) Note-se, portanto, embora a Carta Maior da República Federativa do Brasil tenha adotado a vedação ao tratamento diferenciado às mulheres, sendo signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, fato é que as disposições constitucionais, convencionais ou infralegais ressalvam a possibilidade de tratamentos diferenciados do gênero feminino, na medida de sua desigualdade, ou seja, se legítimos, proporcionais e não arbitrários ou prejudiciais ao sexo masculino. Exemplifico o tratamento diferenciado às mulheres: (I) os direitos consagrados em lei especial às trabalhadoras domésticas; (II) a licença maternidade com prazo superior à licença paternidade; (III) tempo menor para obter a aposentadoria por tempo de serviço e contribuição (art. 40, inciso III e art. 201, § 7º, CF); (IV) a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) estabelecendo uma série de proteções especiais às mulheres vítimas de violência doméstica. Por tais razões, obviamente, em etapa de concurso público, às candidatas do sexo feminino, precisamente para os testes de aptidão física, devem ser concedidos tratamento diferenciado, desde que necessário e adequado no caso concreto. Por tais razões, obviamente, em etapa de concurso público, às candidatas do sexo feminino, precisamente para os testes de aptidão física, devem ser concedidos tratamento diferenciado, considerada a discrepância entre a estrutura biológica de homens e mulheres. Na espécie, analisando detidamente o edital n. 04/2023-DGP/PMDF ? para provimento de vagas ao cargo de Polícia Militar do Distrito Federal ?, verifica-se, ao menos em juízo de cognição sumária, própria para o momento processual, aparente ilegalidade na retificação editalícia, na medida em que a Administração Pública, ao mesmo tempo em que elevou a distância mínima exigida para o teste de corrida para as candidatas do gênero feminino (de 2.100 metros para 2.200 metros), reduziu a distância mínima exigida para o teste de corrida para os candidatos do gênero masculino (de 2.600 metros para 2.400 metros), em pernicioso prejuízo ao postulado da isonomia substancial, que demanda especial atenção às particularidades dos grupos em cotejo, como visto. Tal postura não parece se coadunar, ainda, com o princípio da razoabilidade. Com efeito, a razoabilidade é mecanismo para controlar a discricionariedade legislativa e administrativa, tratando-se de um parâmetro de avaliação dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça. Conforme escrevemos em obra doutrinária (Curso de Direito Constitucional, 2a edição, Ed. D'Plácido), a razoabilidade ostenta diversas acepções. Pode-se falar, a título ilustrativo, que são irrazoáveis os atos do Estado destituídos de causa ou fundamento, ou os que se amparam em razões irrelevantes ou não racionais. A razoabilidade também é encarada como uma exigência de não contradição. Um ato irrazoável pode ser contraditório em si mesmo (em seus diversos elementos) ou em face do ordenamento jurídico - fala-se, respectivamente, em coerência interna e coerência externa. Ainda, a razoabilidade pode ser interpretada como sinônimo de equidade, da necessidade de se chegar à justiça do caso concreto. A aplicação pura e simples da norma sem a consideração das peculiaridades do caso concreto pode levar à injustiça. Qualquer dessas acepções é suficiente para apontar, in casu, a irrazoabilidade do ato do poder público de elevar a distância do teste de corrida para as candidatas do sexo feminino ao mesmo tempo em que se diminui a distância para os candidatos homens. Ademais, no caso individualizado, depreende-se do boletim de desempenho da prova de aptidão física (ID 191507824) que a parte autora atingiu 2.100 metros em 12 minutos, atendendo, portanto, à exigência estabelecida antes da retificação editalícia, a qual se reputa inválida. As razões expendidas indicam a probabilidade do direito vindicado, ao passo em que a urgência restou evidenciada pela própria situação fática controvertida, haja vista que o certame se encontra em andamento e a demora em conceder a prestação jurisdicional requerida ostenta o potencial de gerar prejuízos irreparáveis à parte autora e ao próprio concurso público, que futuramente teria que lidar com novas reclassificações. Ressalte-se, por fim, que, em caso similar, a 2ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal deferiu a tutela provisória de urgência vindicada na ação de procedimento comum n. 070XXXX-85.2024.8.07.0018, o que, apesar

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