Página 515 do Diário de Justiça do Estado do Pará (DJPA) de 24 de Novembro de 2017

ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Ressalto mais uma vez que a obrigatoriedade de entregar a arma não apreendida para ser submetida à perícia forçaria o réu a admitir a prática do crime, violando frontalmente a garantia de natureza fundamental de não produzir prova contra si mesmo insculpida no princípio ¿nemo tenetur se detegere¿. Este princípio é expresso no art. 8º, § 2º, g, Pacto de San Jose da Costa Rica: "Pacto de S¿o José da Costa Rica, Artigo 8º: 1. (...) 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (...) g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada." No presente caso, a vítima relata que o acusado estava armado, porém não há prova alguma de que tal ¿arma¿ possuísse potencial lesivo, o que não teria ocorrido, por exemplo, se o objeto usado tiver sido uma arma de brinquedo. Para não restar dúvida de que, caso o instrumento utilizado tenha sido uma arma de brinquedo, não se aplicaria a causa de aumento, reproduzo jurisprudência já consolidada do Superior Tribunal de Justiça: ¿(...) 2. Com o cancelamento da Súmula n.º 174 do Superior Tribunal de Justiça, ficou assentado o entendimento segundo o qual a simples atemorização da vítima pelo emprego de simulacro de arma de fogo, tal como a arma de brinquedo, não mais se mostra suficiente para configurar a causa especial de aumento de pena, dada a ausência de incremento no risco ao bem jurídico, servindo, apenas, para caracterizar a grave ameaça já inerente ao crime de roubo. Precedentes. (...) (STJ - HC 183166 / SP, HABEAS CORPUS 2010/0156887-1, Relator (a) Ministra LAURITA VAZ (1120), Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 19/02/2013, Data da Publicação/Fonte DJe 28/02/2013). Assim, diante da dúvida, afasto a incidência da causa de aumento de pena relativa ao uso de arma. DA TENTATIVA Entendo, ainda, que ficou claro durante o curso da instrução processual, não apenas mediante o depoimento judicial do acusado como da própria vítima, que o crime não se consumou. Veja-se que o denunciado foi detido às proximidades do local do delito por populares que o presenciaram, não tendo conseguido consumar a subtração dos pertences da vítima. Volto a assinalar que a versão do denunciado sobre a res furtiva deve prevalecer, pois o contexto fático relatado pela vítima, pela testemunha de acusação e por ele próprio conduzem à conclusão de que não foi ele que consumou a efetiva subtração, já que foi detido às proximidades do local do delito, apenas do outro lado da rua, logo após ter se afastado da vítima para tentar empreender fuga, não sendo com ele encontrado nada mais do que a bolsa subtraída. Assim, como ele foi detido ainda às proximidades do local onde abordou a vítima, sendo detido por populares logo do outro lado da pista, depois de atravessá-la sob constante vigilância daqueles, não é possível vislumbrar qualquer possibilidade de ele ter dado destinação diversa à res, consumando o delito. Não se desconhece a recente Súmula 582 do STJ, aprovada em 14/09/2016, cuja tese foi inicialmente definida no julgamento do REsp 1.499.050, sob o rito dos repetitivos, que consolidou entendimento já majoritário naquela Corte, referente à adoção da teoria da apprehensio ou amotio, segundo a qual o crime de furto ou roubo consuma-se no momento em que o objeto subtraído passa para a esfera de domínio do agente, havendo a inversão da posse ainda que por um período de tempo breve, não sendo necessário que ele conquiste a posse mansa e pacífica. Estabelece a Súmula 582 do STJ, in verbis: ¿Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.¿ O julgamento do Recurso Especial nº 1.499.050 consolidou a premissa de que para a consumação do crime de roubo basta a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que haja perseguição e prisão do agente, sendo prescindível que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima, seguindo orientação já estabilizada do Supremo Tribunal Federal. O relator discorre que desde a década de 1980 observava-se duas correntes sobre o tema na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: a corrente com orientação tradicional, exigindo apenas a subtração da coisa mediante violência ou grave ameaça para a consumação do roubo, dispensando outros requisitos e explicitando, inclusive, ser desnecessário o locupletamento do agente (RE nº 102.389-9/SP, 2ª T., Rel. Ministro Moreira Alves, DJ 17/08/1984), e a corrente segundo a qual a consumação do crime se dá apenas com a saída da coisa subtraída da esfera de vigilância da vítima ou com a posse pacífica da res pelo agente, explicando, ainda, que para a última sua perseguição imediata e prisão, recuperado o produto do roubo, afasta a consumação do crime. Acrescenta, contudo, que a estabilização da jurisprudência daquela Corte se deu com o julgamento do RE 102.490-0/SP, em 17/9/1987, consolidando o entendimento que o crime de roubo se consuma no momento em que o agente obtém a posse da coisa, mediante violência ou grave ameaça, mesmo que não seja mansa e pacífica a posse e/ou haja perseguição policial ao agente, dispensando a saída do objeto subtraído da esfera de vigilância da vítima. Concluiu o relator que o caso ali em exame, no qual o recorrido fora perseguido por breve intervalo de tempo até sua prisão, configura roubo consumado justamente por ter havido a inversão, ainda que efêmera, da posse da coisa subtraída, fixando, então, a tese jurídica para os fins previstos no art. 543-C do Código de Processo Civil (Lei nº 5.869/1973). Leia-se sua Ementa: RECURSO ESPECIAL Nº 1.499.050 - RJ (2014/0319516-0) EMENTA RECURSO ESPECIAL. PROCESSAMENTO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ROUBO. MOMENTO CONSUMATIVO. POSSE MANSA E PACÍFICA DA RES FURTIVA . DESNECESSIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Recurso Especial processado sob o regime previsto no art. 543-C, § 2º, do CPC, c/c o art. do CPP, e na Resolução n. 8/2008 do STJ. TESE: Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem, mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida a perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. 2. A jurisprudência pacífica desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal é de que o crime de roubo se consuma no momento em que o agente se torna possuidor da coisa subtraída, mediante violência ou grave ameaça, ainda que haja imediata perseguição e prisão, sendo prescindível que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima. Jurisprudência do STF (evolução). 3. Recurso especial representativo de controvérsia provido para, reconhecendo que a consumação do crime de roubo independe da posse mansa e pacífica da res furtiva , restabelecer a pena e o regime prisional fixados na sentença. Com a devida vênia, não sigo o mesmo entendimento. A súmula em questão agride não apenas a teoria do delito como o que se conhece como iter criminis, que condiciona a consumação à conclusão dos atos de execução, isso porque, dispensando a saída do objeto da esfera de vigilância da vítima e/ou a posse mansa, pacífica ou desvigiada do bem subtraído pelo agente, permite a punição pelo crime de roubo consumado com a fase de execução ainda não concluída, comprometendo a noção de crime tentado - ¿quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente¿ (art. 14, inciso II, do CPB), e culminando, por conseguinte, em um conflito de normas exatamente em razão da supressão da figura tentada do delito de roubo. A pergunta que eu tenho que fazer é: então quando haverá o roubo tentado? Acabou? Sempre considerei que a perseguição imediata ao acusado, após a inversão da posse dos bens subtraídos, impedindo a retirada destes da esfera de vigilância da vítima, por óbvio não tornava o crime consumado - Artigo 14, II, do Código Penal: Crime Tentado: quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Essa súmula 582 do STJ desmantela a Teoria do Delito e o que chamamos de iter criminis. Por quê? Ora, iter Criminis é o processo que se verifica desde o momento em que surge para o autor o desígnio íntimo de praticar o crime até o fim da infração penal. Resumindo, o caminho do crime é o conjunto de etapas que se sucedem, cronologicamente, no desenvolvimento do delito: cogitação (não punível), atos preparatórios (não punível), execução (se, ao menos, iniciada é possível falar-se em tentativa - art. 14, II, CP), consumação (art. 14, I, CP). Com a nova súmula, fica-se satisfeito com a execução do crime para considera-lo consumado, esquecendo e deixando de lado a necessidade de consumação que passa a não ter mais importância na teoria do iter criminis. Esqueça-se a consumação e fiquemos alertas para verificar se qualquer dia os Atos Preparatórios não comecem a ser punidos como a tentativa do roubo. Se é permitido julgar consumado um roubo quando a execução do crime não foi concluída em razão da reação da vítima logo após a inversão da posse ou a perseguição policial imediata com recuperação da res, logo por circunstâncias alheias à vontade do agente, não há dúvidas de que a figura do roubo tentado foi deturpada, pois não basta mais para sua configuração que a subtração mediante violência ou grave ameaça não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, como estabelecido pela combinação dos arts. 157, 14, inciso II, do CPB. Demais disso, parece-me incontestável que a consumação do crime de roubo depende de que o agente subtraia, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, coisa alheia móvel para si ou para outrem, o que entendo não ocorrer quando ele apenas possui de forma efêmera a res, uma vez que a subtração não fora de fato concluída, não se podendo dizer que o agente, nesses casos, subtraiu a res para si ou para outrem, mas que ainda está ¿tentando¿ fazê-lo. Nesse diapasão, entendo que no caso sub examine não é possível concluir pela consumação do crime de roubo exatamente porque o acusado foi impedido de finalizar os atos executórios pela vítima, não conseguindo em momento algum subtrair a res para si ou para outrem, logo por circunstâncias alheias à sua

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