Página 2228 do Diário de Justiça do Estado do Pará (DJPA) de 3 de Setembro de 2020

Gildemer Moura de Carvalho e José Carlos da Silva . PRELIMINARMENTE DA ILICITUDE DAS PROVAS Após a colheita de depoimento das testemunhas de acusação, todas policiais militares, restou ausente a demonstração acerca das razões que levaram a abordagem do denunciado. Sabe-se que o art. 240, § 2 e 244 do CPP preveem a realização de busca pessoal, desde que legitimada no manto da ¿fundada suspeita¿. Como bem coloca Aury Lopes Jr (Direito Processual Penal, 2020) o dispositivo em si, em virtude da sua amplitude, abre um amplo espaço para a configuração de abusos, em virtude de tratar-se de clausula genérica, de conteúdo vago, impreciso e indeterminado, Diante, portanto, da problemática existente no dispositivo, o STJ trouxe o entendimento da 6ª Turma no provimento do HC 561.329 no sentido de declarar ilegais as provas obtidas em situações que não são de evidente flagrância. Assim, a atitude considerada suspeita e nervosismo ao avistar a viatura não são motivos suficientes para autorizar uma revista pessoal (Danilo Vital, CONJUR, 2020). Vejamos a ementa do julgado: HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. PRISÃO EM FLAGRANTE. PROVA ILÍCITA. REVISTA PESSOAL REALIZADA POR GUARDA MUNICIPAL. ATIVIDADE DE INVESTIGAÇÃO. AUSÊNCIA DE ATRIBUIÇÃO. SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. JUSTA CAUSA NÃO VERIFICADA. ILEGALIDADE. OCORRÊNCIA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. 1. Considera-se ilícita a revista pessoal executada por guardas municipais, sem a existência da necessária justa causa para a efetivação da medida invasiva, nos termos do art. § 2º do art. 240 do CPP, bem como a prova derivada da busca pessoal. 2. Tendo a busca pessoal ocorrido sem estar o paciente em situação de flagrância, após dias da prática do crime, por guardas municipais que o abordaram sem fundadas razões, apenas por reconhecer sua foto em postagens na rede social comunitária, realizando verdadeira atividade de investigação, deve ser reconhecida a ilegalidade por ilicitude da prova. 3. Habeas corpus concedido para declarar ilegal a apreensão e, consequentemente, absolver o paciente, nos termos do art. 386, II, do CPP. (STJ - HC: 561329 SP 2020/0033756-1, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 16/06/2020, T6 -SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2020) Como bem nos esclarece Luís Carlos Valois (O direito penal das guerras às drogas, 2019), o termo fundado significa algo firmado em motivos fortes, seguro, fundamentado, portanto, não é alguma dedução subjetiva, mas depende da exposição dos fatos com os motivos pelos quais considerou o cidadão detido como em situação de flagrância. Assim, há a necessidade de elementos concretos para legitimar a atuação policial, devendo este trabalho ser realizado através de investigações prévias ou que demonstrem impreterivelmente a situação de flagrância que autorizou a busca, a manutenção de um ranço inquisitório pautado apenas na seletividade com critérios preconceituosos o que não pode prosperar dentro de um Estado Democrático de Direito. Vejamos inclusive o entendimento de outros tribunais acerca do tema: APELAÇÃO-CRIME. PORTE ILEGAL DE ARMA DE USO PERMITIDO COM NUMERAÇÃO RASPADA. ART. 16, § ÚNICO, IV, DA LEI Nº 10.826/03. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO VERIFICADA. AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. ILEGALIDADE DA PROVA. ABSOLVIÇÃO DECRETADA. A quebra da inviolabilidade domiciliar, no nosso sistema processual penal constitucional, somente pode ocorrer, sem consentimento do morador, em caso de flagrante delito ou, durante o dia, por determinação judicial (além das demais exceções previstas no art. , XI da Constituição Federal). A hipótese não era de flagrante delito, pois os policiais não sabiam que estava sendo cometido algum crime no interior da casa. Segundo relataram, entraram nela, porque viram o réu nela entrar rapidamente, tão logo avistou a viatura. Salientaram que o local seria ponto de tráfico e um deles disse que havia informações de que o réu estaria traficando.O relato policial procura dar a impressão equivocada de ter havido uma fundada suspeita que justificasse a ação, o que não ocorreu. A fundada suspeita deve ser um comportamento objetivo, claro e bem definido, voltado para a ilicitude, que faça o agente público detectar as hipóteses autorizadoras da abordagem para busca pessoal, ou seja, aquelas do art. 244 do CPP.A situação desvela a ausência da fundada suspeita exigida como requisito pelo art. 244 do CPP para a ação policial, notadamente porque não pode ser tida como tal a atitude de quem não se encontrava em nenhuma das situações referidas no aludido dispositivo legal, tornando ilegal a ação policial, bem como a prova que dela resultou, (por violação do art. , XI e LVI da Constituição Federal) acarretando a absolvição do réu. APELO PROVIDO. (TJ-RS - ACR: 70072484256 RS, Relator: Mauro Evely Vieira de Borba, Data de Julgamento: 28/09/2017, Quarta Câmara Criminal, Data de Publicação: 22/11/2017) Diante do exposto, nota-se que o próprio órgão ministerial entendeu que, pelos depoimentos prestados pelos policiais, não houve qualquer motivo para a realização da busca no denunciado. Não foram apresentadas provas consistentes, desde o Inquérito Policial que apenas tratou de repetir os elementos constantes no procedimento de flagrante, e, especialmente, na instrução processual, que possam se coadunar com o determinado legalmente e, agora, detalhado pelas Cortes superiores. Como bem menciona Gustavo Henrique Badaró (Epistemologia judiciária e prova pena, 2019), cabe ao Ministério Público não somente a prova da existência do fato constitutivo do direito de punir, mas também a inexistência dos fatos impeditivos de tal direito. Não há, portanto, outro caminho que não o

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