Página 74 do Diário de Justiça do Estado do Paraná (DJPR) de 24 de Setembro de 2020

as escrituras nas respectivas matrículas. É o que se vê, por exemplo, das matrículas acima indicadas porque as áreas foram vendidas, as escrituras outorgadas, mas sem qualquer alteração registrária porque os compradores passaram a formar, a partir de então, uma propriedade condominial. Em que pese a constituição dos condomínios aparentar certa regularidade - já que estariam "em conformidade" com a lei -, as provas pré-constituídas indicam que os coproprietários passaram a ocupar áreas individualizadas e implementarem um verdadeiro loteamento irregular, inclusive porque novas subdivisões estariam sendo feitas de lotes menores ainda, mas tudo sem autorização do poder público e qualquer infraestrutura básica. A partir de então os lotes foram sendo vendidos aos demais réus e estes passaram a edificar em locais previamente demarcados, acarretando, aparente e desordenada ocupação do solo. Trata-se, portanto, de aparente "empreendimento imobiliário" com a intenção de criação de áreas de lazer ou simples "condomínios de chácaras" sem observância dos requisitos estabelecidos no Estatuto da Terra (artigos 60 e ss.). Neste caso específico, é indispensável a autorização do INCRA e atendimento do contido no Decreto-Lei nº 58/37 e Instrução Especial do Incra nº 17-B/1980. Essa Instrução prevê que o loteamento e o desmembramento são formas de parcelamento do solo. Loteamento é a divisão da gleba em lotes, com aberturas de vias de circulação, logradouros públicos ou prolongamento, e modificação das vias existentes. Já o desmembramento é a divisão de gleba em lotes com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não impli-que na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes. Os itens "3" e "4" da Instrução normatizam o parcelamento de imóvel rural para fins urbanos e parcelamento para fins agrícolas: "3 - Parcelamento, para fins urbanos, de imóvel rural localizado fora da zona urbana ou de expansão urbana. 3.1 - O parcelamento, para fins urbanos, de imóvel rural localizado fora de zona urbana ou de expansão urbana, assim definidas por lei municipal, rege-se pelas disposições do art. 96, do Decreto nº 59.428, de 27/l0/66, e do art. 53, da Lei nº 6.766, de 19/12/79. 3.2 - Em tal hipótese de parcelamento, caberá, quanto ao INCRA, unicamente sua prévia audiência. 3.3 - Os parcelamentos com vistas à formação de núcleos urbanos, ou à formação de sítios de recreio, ou à industrialização, somente poderão ser executados em área que: a) por suas características e situação, seja própria para a localização de serviços comunitários das áreas rurais circunvizinhas; b) seja oficialmente declarada zona de turismo ou caracterizada como de estância hidromineral ou balnearia; c) comprovadamente tenha perdido suas características produtivas, tornando antieconômico o seu aproveitamento. 3.4 - A comprovação será feita pelo proprietário, através de declara-ção da Municipalidade e/ou através de circunstanciado laudo as-sinado por técnico habilitado. 3.5 - Verificada uma das condições especificadas no item 33, o IN-CRA, em atendimento a requerimento do interessado, declarará nada ter a opor ao parcelamento. 3.6 - Aprovado o projeto de parcelamento, pela Prefeitura Municipal ou pelo Governo do Distrito Federal, e registrado no Registro de Imóveis, o INCRA, a requerimento do interessado, procederá à atualização cadastral, conforme o disposto no item 2.3. 4 - Parcelamento, para fins agrícolas, de imóvel rural localizado fora de zona urbana ou de expansão urbana 4.1 - O parcelamento, para fins agrícolas, de imóvel rural localizado fora de zona urbana ou de expansão urbana, assim definidas por lei municipal, regese pelas disposições do art. 6l da Lei n.º 4.504, de 30/11/64, do art. 10 da Lei n.º 4.947, de 06/04/66, dos arts. 93 e seguintes do Decreto nº 59.428, de 27/10/66 e do art. 8º da Lei nº 5.868, de 12/12/72. 4.2 - Em tal hipótese de parcelamento, caberá ao INCRA a prévia apro-vação do projeto. 4.3 - A aprovação de projeto de desmembramento sujeita-se, no que couber, às normas seguintes. 4.4 - Para a aprovação de projeto de loteamento, o interessado deverá apresentar requerimento, instruído com os documentos seguin-tes: a) título de propriedade; b) cadeia dominial; c) quitação fiscal; d) memorial descritivo de todo o imóvel e do loteamento; e) planta de todo o imóvel; f) planta do loteamento; g) planilha de cálculos; h) plano de aproveitamento". Desse modo, não há irregularidade que porção de determinado imóvel seja alienada a várias pessoas porque a constituição de condomínio pro indiviso não é vedada pela Lei. Contudo, desde que se evidencie que os coproprietários, eventualmente para burlar essas regras, estejam transformando faticamente as áreas rurais loteamentos rurais (parcelamento do solo rural) ou em "empreendimentos rurais", com abertura de vias, ligação de água e energia elétrica, delimitação das áreas internas, construção de benfeitorias etc., etc., é possível concluir-se, nesta fase de cognição sumária, pela ilegalidade do empreendimento, a justificar, assim, o deferimento dos pedidos liminares. Mas a liminar não deve ser deferida na abrangência que se requer. Para que não pairem dúvidas a respeito, ainda estão em vigor as normas previstas no item 4.1 da Instrução Normativa 17-B/1980 (INCRA), o art. 65 do Estatuto da Terra, artigo 8.º da Lei n.º 5.868, de 12/12/1972 (que criou o Sistema Nacional de Cadastro Rural) e as atinentes ao Código de Normas do Foro Extrajudicial, mas que não se aplicam às exceções legais e, assim, dispensa-se a prévia oitiva do INCRA e do IAP. Uma das principais exceções do parcelamento se refere à agricultura familiar e foi disciplinada pela Lei n.º 11.446/2007, que alterou o art. 65 da Lei n 4.504, de 30 de novembro de 1964 (ESTATUTO DA TERRA o), acrescentando os §§ 5 e 6 : o o "§ 5o Não se aplica o disposto no caput deste artigo aos parcelamentos de imóveis rurais em dimensão inferior à do módulo, fixada pelo órgão fundiário federal, quando promovidos pelo Poder Público, em programas oficiais de apoio à atividade agrícola familiar, cujos beneficiários sejam agricultores que não possuam outro imóvel rural ou urbano. § 6 Nenhum imóvel o rural adquirido na forma do § 5 deste artigo poderá ser o desmembrado ou dividido". De igual modo se verifica na Lei n.º 5.868/1972, § 4.º: "I - aos casos em que a alienação da área destine-se comprovadamente a sua anexação ao prédio rústico, confrontante, desde que o imóvel do qual se desmembre permaneça com área igual ou superior à fração mínima do parcelamento; II - à emissão de concessão de direito real de uso ou título de domínio em programas de regularização fundiária de interesse social em áreas rurais, incluindo-se as situadas na Amazônia Legal; III - aos imóveis rurais cujos proprietários sejam enquadrados como agricultor familiar nos termos da Lei no 11.326, de 24 de julho de 2006; ou (Incluído pela Lei nº 13.001, de 2014); IV - ao imóvel rural que tenha sido incorporado à zona urbana do Município. § 5º - O disposto neste artigo aplica-se também às transações celebradas até esta data e ainda não registradas em Cartório, desde que se enquadrem nas condições e requisitos ora estabelecidos". Por sua vez, sobre o conceito de agricultor familiar e seus requisitos, a Lei n.º 11.326/2006, no art. 3 prevê que o, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. § 2 São também beneficiários desta Lei: I - o silvicultores que atendam simultaneamente a todos os requisitos de que trata o caput deste artigo, cultivem florestas nativas ou exóticas e que promovam o manejo sustentável daqueles ambientes; II - aquicultores que atendam simultaneamente a todos os requisitos de que trata o caput deste artigo e explorem reservatórios hídricos com superfície total de até 2ha (dois hectares) ou ocupem até 500m³ (quinhentos metros cúbicos) de água, quando a exploração se efetivar em tanques-rede; III - extrativistas que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos II, III e IV do caput deste artigo e exerçam essa atividade artesanalmente no meio rural, excluídos os garimpeiros e faiscadores; IV - pescadores que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo e exerçam a atividade pesqueira artesanalmente. V - povos indígenas que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos II, III e IV do caput do art. 3º; VI - integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e demais povos e comunidades tradicionais que atendam simultaneamente aos incisos II, III e IV do caput do art. . Por fim, destaque-se, mais uma vez, que a Lei n.º 4.504, de 30 de novembro de 1964 (ESTATUTO DA TERRA), sofreu alterações dessas normas e permitiu o parcelamento do solo rural nos precisos termos do art. 65, §§ 5 e 6 : o o Não se aplica o disposto no caput deste artigo aos parcelamentos de imóveis rurais em dimensão inferior à do módulo, fixada pelo órgão fundiário federal, quando promovidos pelo Poder Público, em programas oficiais de apoio à atividade agrícola familiar, cujos beneficiários sejam agricultores que não possuam outro imóvel rural ou urbano. Então, a criação fática de condomínio entre esses coproprietários poderá ser considerada ilegal se houver transformação das características dos imóveis, como delimitação das frações ideais, abertura de ruas, construção de cisternas, ligação de água e energia elétrica etc., conquanto, repise-se, não haver qualquer ilegalidade na transferência imobiliária e manutenção de condomínio pro indiviso e não se tratar de agricultura familiar. Por outro lado, como foi amplamente destacado acima, não há ilegalidade no parcelamento ou desmembramento dos lotes em áreas menores de 20.000 m2 quando comprovadamente for para exploração de agricultura familiar. Ainda, antes de deliberar sobre as liminares propriamente ditas, é importante salientar que não existem provas que a maior parte dos réus (à exceção dos primitivos proprietários - aqui denominados de "fornecedores") tenha agido de má-fé, ainda mais quando essas vendas foram feitas em grandes volumes sem que os poderes constituídos tomassem providências concretas para impedir sua disseminação, circunstâncias que poderiam levá-los a acreditarem que o parcelamento seria permitido, sem se contar o grande emaranhado legislativo que, inclusive, pode até mesmo levar os aplicadores do direito a divergirem sobre sua interpretação. Note-se, ainda, que não há evidências que as benfeitorias tenham sido edificadas de má-fé e não existem provas mais concretas de danos consideráveis ao meio ambiente. Por oportuno, salienta-se que essas ações retratam um preocupante problema social (inúmeras ações e muitos réus) porque, tirando os adquirentes que compraram com o objetivo de lazer, possivelmente existem inúmeras famílias de produtores rurais que talvez tenham investidos todas suas economias na aquisição dos pequenos lotes e que momentaneamente se veem impedidos de os explorarem, sendo, por isso, merecedores de especial atenção dos órgãos públicos e da sociedade por estarem amparados na lei e terem direito à devida e correta regularização fundiária, enfim, atingindo-se o bem maior, que é a função social da terra. Portanto, as consequências das medidas acautelatórias devem ser sopesadas e ficarem restritas às áreas envolvidas nos litígios e não abrangerem outros bens, à exceção dos "fornecedores" porque, estes, sim, poderão sofrer as consequências patrimoniais pelos prejuízos causados aos adquirentes. Nessa diretriz, como a constituição do condomínio pro indiviso não é vedada legalmente, significa que o Ministério Público não teria interesse de agir quanto às rescisões dos compromissos de compra e venda entre os compradores das cota-partes. Explica-se. Sentença que aqui venha a ser procedente poderá determinar a demolição das cercas, tapumes e construções a fim de que o imóvel retorne à sua situação de originalidade. Mas isso não implica que todos os adquirentes percam o direito à formação do condomínio, desde que, evidentemente, mantenha-se inalterada a matrícula, abstenham-se de quaisquer subdivisões legais ou fáticas e, o mais importante, é que cada condomínio exerça, indistintamente, seu direto sobre toda a propriedade e não sobre sua cota-parte, que neste caso não poderá ser identificada no "papel". Assim, DEFIRO em parte a liminar para determinar que os réus se abstenham de edificar ou levantarem novas benfeitorias, devendo, pelo menos por enquanto, manterem as já existentes e sem quaisquer acréscimos, fixando multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em desfavor de cada réu que descumprir a ordem judicial. Defiro a liminar de indisponibilidade (sequestro) somente dos lotes objetos da ação e não alcançando outros bens e direitos dos envolvidos, à exceção do primeiro proprietário que deu cabo às subdivisões e que eventualmente venha a responder pelos prejuízos causados. Relativamente à extensão do sequestro com base numa possível indenização de danos coletivos, por ora não se justifica que seja ampliada porque não há provas mais evidentes que os

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