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20 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL: ADPF 1051 DF - Inteiro Teor

Supremo Tribunal Federal
ano passado

Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

ANDRÉ MENDONÇA

Documentos anexos

Inteiro TeorSTF_ADPF_1051_8a24d.pdf
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Inteiro Teor

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 1.051 DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. ANDRÉ MENDONÇA

REQTE.(S) : PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (P-SOL)

REQTE.(S) : SOLIDARIEDADE

REQTE.(S) : PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL

ADV.(A/S) : WALFRIDO JORGE WARDE JUNIOR

ADV.(A/S) : ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

ADV.(A/S) : PEDRO ESTEVAM ALVES PINTO SERRANO

ADV.(A/S) : RAFAEL RAMIRES ARAUJO VALIM

ADV.(A/S) : GEORGES ABBOUD

ADV.(A/S) : GUSTAVO MARINHO DE CARVALHO

ADV.(A/S) : RODRIGO MOLINA RESENDE SILVA

ADV.(A/S) : PAULO MACHADO GUIMARAES

INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA

PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL

PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

INTDO.(A/S) : CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO

PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Distribuição livre. Exame. Arts. 69 e 77-B do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Prevenção. Conexão ou continência. Identidade de partes. Inocorrência. Diversidade dos objetos. Risco de decisões conflitantes ou contraditórias. Ausência. Manutenção da relatoria.

Vistos etc.

1. O Ministro André Mendonça submete a distribuição da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental a exame desta

Presidência, nos seguintes termos:

"DESPACHO

O SENHOR MINISTRO ANDRÉ MENDONÇA:

1. Trata-se de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ajuizada pelos partidos políticos Solidariedade, Partido Socialismo e Liberdade - PSOL e Partido Comunista do Brasil - PC do B, que, de acordo com os termos das próprias agremiações autoras, tem como escopo: ‘(i) suspender, liminarmente, a eficácia das obrigações pecuniárias (indenizações e multas) impostas em todos os acordos de leniência celebrados entre o Estado e empresas investigadas durante a Operação Lava Jato, antes da celebração do ACT, em 06.08.2020; (ii) obter, do Supremo, a fixação de interpretação conforme a Constituição da Lei nº 12.846/2013 e do Decreto nº 11.129/2022, afastando, de uma vez por todas, a hermenêutica punitivista e inconstitucional do lavajatismo, garantindo, nesse particular, a presença, no âmbito federal, da Controladoria- Geral da União ("CGU") como proponente ou órgão de controle, enquanto centro racionalizador do agir estatal, para a celebração de acordos desse gênero; (iii) fazer como que se reconheça, em sede de jurisdição constitucional, que os acordos foram pactuados em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional, mediante situação de coação e, portanto, sob um Estado de Coisas Inconstitucional ("ECI"); e, por fim, (iv) possibilitar a revisão de tais acordos à luz dos critérios a serem fixados pelo Supremo Tribunal Federal mediante julgamento desta ADPF’

2. Argumentam que ‘[d]urante a Operação Lava Jato, diversos órgãos de persecução penal promoveram, comprovadamente, a instalação de um Estado de Coisas Inconstitucional em relação não só aos celebrantes dos acordos de leniência, como à própria sociedade civil, que arcou, em última instância, com o efeito cascata da quebra generalizada de

Companhias estratégicas para a economia brasileira.’ Nesse contexto, enfatiza que ‘[o] que se pede do Supremo, antes de tudo, com esta ADPF, é, do ponto de vista hermenêutico, o revisitar do conceito e da técnica do ECI [Estado de Coisas Inconstitucional] à luz do paradigma da degeneração’.

3. Ao final, formalizam os seguintes pedidos a este Supremo Tribunal Federal:

‘a) a concessão de medida liminar (art. , § 3º, da Lei n. 9.882/1999) para o fim de suspender até o término da presente demanda as obrigações financeiras (pecuniárias) de todos os acordos de leniência firmados antes do ACT, de agosto de 2020. Esta suspensão não traduz suspensão total ou invalidação dos acordos de leniência firmados, senão que apenas das obrigações pecuniárias assumidas pelas empresas. Outrossim, a suspensão se impõe até a repactuação em cada caso concreto dentro dos parâmetros constitucionais a serem determinados por meio desta ADPF;

b) reconhecimento de que os acordos de leniência firmados antes do ACT o foram em situações de anormalidade político-jurídico-institucional e, portanto, em Estado de Coisas Inconstitucional, o que impõe a necessidade de repactuação, pelo Poder Público, em situação de normalidade conforme preceitua a boa-fé objetiva que deve nortear as relações entre particular e agente público

c) no mérito, que seja fixada a interpretação constitucionalmente adequada pela qual os acordos de leniência e a legislação que os fundamenta (Lei nº 12.846/2013 e demais normas infralegais) devem ser interpretados de modo a compatibilizar as obrigações financeiras destes acordos com os preceitos fundamentais apresentados nesta ação, garantindo, sempre, que, além da participação do MPF, a CGU figure como centro racionalizador do agir estatal, unificando, coordenando e fiscalizando a celebração de acordos de leniência em todo o território brasileiro, não importando a natureza dos ilícitos cometidos e os órgãos de controle especializado competentes. A mesma interpretação deverá ser aplicada aos Estados, Municípios e Distrito Federal, nas respectivas esferas de atuação de seus órgãos competentes. Para tanto, deverá ser fixada a seguinte interpretação pelo Plenário do STF na dimensão prospectiva e retrospectiva:

De forma prospectiva: Os acordos de leniência, regulamentados na Lei nº 12.846/2013 e demais normas infralegais, para não violarem os preceitos fundamentais da segurança jurídica, proporcionalidade, razoabilidade, legalidade e função social da empresa, devem ser celebrados sempre com a participação e coordenação da CGU que é, nos termos da Constituição de da legislação, a última instância administrativa/executiva da legalidade dos acordos de leniência, e observar os parâmetros revelados pelo ACT, de setembro de 2020. A mesma disposição deverá ser aplicada aos Estados, Municípios e Distrito Federal, nas respectivas esferas de atuação de seus órgãos competentes.

De forma retrospectiva: Os acordos de leniência, regulamentados na Lei nº 12.846/2013 e celebrados no contexto antes do ACT, de setembro de 2020 devem obrigatoriamente ser repactuados perante a CGU, com a participação do MPF, em observância das diretrizes fixada no ACT. Esta mesma disposição deverá ser aplicada aos Estados, Municípios e Distrito Federal, nas respectivas esferas de atuação de seus órgãos competentes.’ (grifos no original)

4. Feita a apartadíssima síntese da controvérsia, impõe- se análise preambular quanto à suscitada necessidade de distribuição do feito por prevenção ao eminente Ministro Gilmar Mendes, uma vez que, conforme se argumenta, o eminente Decano seria ‘relator de diversas ações em que as mesmas questões foram tratadas tais como os MS XXXXX/DF, MS XXXXX/DF, MS XXXXX/DF, e o MS XXXXX/DF ’.

5. Após a Coordenadoria de Processamento Inicial desta Suprema Corte ter promovido a livre distribuição dos autos, a questão foi reiterada por meio da Petição nº 30.715/2023 (e-doc. 17), reproduzindo-se as alegações já apresentadas na petição inicial.

6. Nas palavras das agremiações autoras, ‘[a] aproximação entre os controles abstrato e concreto de constitucionalidade tornou transformou em expediente comum nesse Tribunal o reconhecimento de prevenção entre remédios constitucionais e ações de controle de constitucionalidade, justamente dada a necessidade de o STF se debruçar sobre questões temáticas que, por vezes, aparecem dispersas em diversas ações’.

7. Aduz que a situação em tela seria semelhante àquela que ensejou a distribuição da ADC nº 85/DF por prevenção à ADI nº 7.334/DF, a qual, por sua vez, já teria sido distribuída por prevenção ao MS nº 38.933/DF. Alega, ainda, similitude com a distribuição da ADI nº 7.212/DF por prevenção ao MS nº 38.659/DF, e do MS nº 38.485/DF, distribuído por prevenção à ADPF nº 850/DF.

8. Em arremate, ‘requer seja o presente feito remetido à Relatoria do Min. Gilmar Mendes, considerando a prevenção gerada pelo MS XXXXX/DF’.

9. Pois bem. Como é de amplo conhecimento, o art. 69 do Regimento Interno deste Supremo Tribunal Federal dispõe que ‘A distribuição da ação ou do recurso gera prevenção para todos os processos a eles vinculados por conexão ou continência". Já o art. 77-B prescreve que: "Na ação direta de inconstitucionalidade, na ação direta de inconstitucionalidade por omissão, na ação declaratória de constitucionalidade e na arguição de descumprimento de preceito fundamental, aplica- se a regra de distribuição por prevenção quando haja coincidência total ou parcial de objetos’ (grifei).

10. Por sua vez, no que pertine ao contexto dos autos, dispõe o Código de Processo Civil que:

‘Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

§ 1º. Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.

(...)

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.’ (grifei)

11. Vê-se, portanto, que para que se excetue a regra geral de livre distribuição em razão dos fenômenos processuais da conexão ou continência deve restar devidamente evidenciada a identidade, ainda que parcial, entre o pedido ou a causa de pedir. Excepcionalmente, admite-se a reunião de processos, ainda que não caracterizada a conexão entre eles, desde que efetivamente demonstrada a existência de um ‘risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente’.

12. In casu , contudo, não reputo presentes quaisquer dessas hipóteses, uma vez que não há qualquer identidade entre o pedido ou a causa de pedir deduzidos no presente feito e aqueles formalizados no bojo do MS nº 36.526/DF, - ou ainda dos Mandados de Segurança nº 35.435/DF, 36.496/DF, e MS XXXXX/DF - de relatoria do eminente Min. Gilmar Mendes. E, diante da distinção que contextualiza uma demanda e outra, não verifico igualmente a presença do risco de decisões conflitantes ou contraditórias.

13. Como já mencionado anteriormente, na presente ação de controle abstrato os autores almejam a suspensão liminar da eficácia das obrigações pecuniárias (indenizações e multas) impostas em ‘todos os acordos de leniência celebrados entre o Estado e empresas investigadas durante a Operação Lava Jato, antes da celebração do ACT, em 06.08.2020’, bem como a fixação de interpretação conforme a Constituição da Lei nº 12.846, de 2013, e do Decreto nº 11.129, de 2022, para garantir ‘a presença, no âmbito federal, da Controladoria-Geral da União ("CGU") como proponente ou órgão de controle , enquanto centro racionalizador do agir estatal, para a celebração de acordos desse gênero’, ressalvando-se, ainda, a possibilidade de ‘revisão de tais acordos à luz dos critérios a serem fixados’ no âmbito dessa demanda.

14. O acolhimento de tais pretensões ancora-se no reconhecimento, ‘em sede de jurisdição constitucional’, de que ‘os acordos foram pactuados em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional, mediante situação de coação e, portanto, sob um Estado de Coisas Inconstitucional’.

15. Já no MS nº 36.526/DF, apontado como causa geradora da alegada prevenção, ‘se pleiteia a suspensão da declaração de idoneidade da impetrante até a conclusão da TC XXXXX/2018-3, na qual se discutem os termos da colaboração com a impetrante, assim como o fim da instrução da TC XXXXX/2015-0, processo principal em que se examinam as irregularidades perpetradas pela impetrante ’1

16. Eis os pedidos elencados ao final daquela peça vestibular, ipsis litteris:

‘e) seja, ao final, concedida a ordem para ratificar a liminar e anular o ato coator, tornando sem efeito a sanção de declaração de inidoneidade da impetrante, reconhecendo-se que as decisões do TCU violaram os inúmeros dispositivos constitucionais e legais acima apontados;

f) seja, ao final, concedida a ordem a fim de que seja confirmada a decisão liminar e anulado o ato coator, suspendendo-se a declaração de inidoneidade da impetrante até a efetiva conclusão do processo apartado de colaboração TC XXXXX/2018-3 e a instrução do processo principal (TC XXXXX/2015-0) sob a égide do amplo respeito ao contraditório, à ampla defesa e aos dispositivos constitucionais e legais acima apontados.’

17. Da consulta ao respectivo andamento processual, verifica-se outrossim que já houve o julgamento de mérito do writ em questão. O acórdão restou assim ementado:

‘DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). TOMADAS DE CONTAS ESPECIAIS. INVESTIGAÇÕES RELACIONADAS A FRAUDES NA CONSTRUÇÃO DA USINA TERMONUCLEAR DE ANGRA III. MÚLTIPLAS ESFERAS DE RESPONSABILIZAÇÃO ADMINISTRATIVA. NECESSIDADE DE COORDENAÇÃO INSTITUCIONAL ENTRE AS ENTIDADES E HARMONIZAÇÃO DAS SANÇÕES PREMIAIS. TENTATIVA DE COLABORAÇÃO TRAVADA DIRETAMENTE COM O TCU. PARECER FAVORÁVEL DA ÁREA TÉCNICA DO TRIBUNAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AO TCU. REJEIÇÃO DA COLABORAÇÃO PELO PLENÁRIO DO TRIBUNAL POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. BOAFÉ OBJETIVA E PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. SEGURANÇA CONCEDIDA.

1. O ordenamento jurídico pátrio assistiu a um espraiamento da figura dos acordos de Leniência Administrativa, em paralelo ao uso de institutos análogos na seara criminal. Esse movimento foi influenciado pelo esforço internacional de convergência na adoção de políticas judiciais e legislativas de combate à corrupção.

2. A coexistência de múltiplos regimes de leniência requer um esforço normativo de alinhamento dos incentivos premiais dos sistemas e de criação de mecanismos de cooperação entre as agências responsáveis pelo enforcement das legislações. Dentre os importantes fatores de incongruência dos regimes que podem comprometer os incentivos dos agentes econômicos em colaborar com as autoridades públicas no desvendamento de ilícios ressaltam-se: (i) a ausência ou a imprecisão de previsões legais sobre a extensão dos benefícios da leniência à esfera penal e (ii) a pluralidade de metodologias de cálculo da reparação dos danos.

3. A empresa Queiroz Galvão realizou requerimento para colaborar com as investigações perante o TCU, tendo obtido parecer favorável à obtenção do título de marker pela SeinfraOperações. O Ministério Público junto ao TCU manifestou-se pela conveniência e oportunidade da colaboração. A despeito dessas manifestações técnicas, o Plenário do TCU determinou sumariamente o encerramento dos autos de colaboração sem ter valorado de forma mínima a instrução do processo de colaboração e os pareceres favoráveis, sob o argumento de que não haveria cabimento legal da colaboração com o Tribunal.

5. Ainda que não se cogite de direito líquido e certo à obtenção dos benefícios de colaboração, a estruturação de qualquer estratégia de consensualidade da Administração Pública deve se pautar em regras transparentes, que possibilitem ao administrado ter ciência acerca dos parâmetros que orientarão a análise da sua proposta.

6. No caso, houve a adoção de comportamentos contraditórios na sinalização de possibilidade de acordo com a impetrante, na medida em que as manifestações técnicas geraram confiança legítima de que não havia óbices legais à colaboração.

7. A simples divergência dos órgãos internos do

TCU quanto à possibilidade jurídica em tese de colaboração em controle externo, por si só, não configura fundamentação idônea para que sejam sumariamente desconsiderados os esforços colaborativos e as informações prestadas pela impetrante sobre os ilícitos apurados.

8. Devem ser minimamente estabilizadas as possíveis repercussões de uma eventual desistência ou insucesso da colaboração, fixando-se limites à própria utilização de documentos e provas apresentados nas tratativas em uma eventual atuação repressiva.

8. Segurança concedida.’

(MS nº 36.526/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 30/03/2021, p. 02-07-2021; grifei)

18. O simples cotejo analítico entre os pedidos deduzidos numa demanda e noutra já aponta para a distinção entre uns e outros. Enquanto no presente caso se busca, ‘em sede de jurisdição constitucional’, a suspensão das obrigações pecuniárias e posterior revisão de todos os acordos de leniência celebrados durante a Operação Lava Jato até determinado marco temporal, sob alegação de que tais compromissos teriam sido firmados no bojo de um ‘estado de coisas inconstitucional’; no Mandado de Segurança nº 36.256/DF se requer a suspensão da aplicação de uma penalidade não pecuniária imposta pelo Tribunal de Contas da União até que aquela Corte de Constas promova análise adequada acerca da possibilidade de celebração de acordo de colaboração em determinado caso concreto.

19. De modo sintético, numa demanda se pleiteia o estabelecimento de balizas futuras para estabelecimento de novos acordos de leniência, bem como a revisão daqueles ajustes já celebrados antes de determinado marco temporal. Na outra, o objetivo é de salvaguardar um eventual direito à apreciação adequada quanto à possibilidade de vir a ser celebrado acordo de leniência em determinado caso concreto, garantindo-se a suspensão de específica sanção de natureza não pecuniária enquanto não encerrada aquela avaliação.

20. Distintas, igualmente, as causas de pedir apresentadas num caso e noutro. Neste, defende-se uma conjuntura apta a ensejar o reconhecimento de um ‘Estado de Coisas Inconstitucional’. Naquele, alega-se a existência de vícios procedimentais específicos, que violaram as garantias processuais dos impetrantes, em dado caso concreto.

21. Em enfoque complementar, especificamente quanto ao risco de decisões conflitantes, é mister realçar a informação já tangenciada anteriormente, acerca do avançado estágio do MS nº 36.526/DF. Isso porque, de acordo com o posicionamento adotado em situações semelhantes pela Presidência desta Corte, tal fator afasta a incidência do art. 55, § 3º, do CPC à espécie [v.g. TPA nº 31/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, decisão proferida pela Min. Rosa Weber (Presidente), j. 31/01/2022, p. 04/02/2022].

22. Nesse cenário, por não vislumbrar a caracterização dos fenômenos processuais da conexão ou da continência, bem como o risco de decisões conflitantes, entendo plenamente hígido o critério de distribuição adotado pela Coordenadoria de Processamento Inicial desta Suprema Corte.

23. Em reforço, verifico ainda que o presente caso é substancialmente distinto daquelas situações que ensejaram a distribuição (i) da ADC nº 85/DF por prevenção à ADI nº 7.334/DF, a qual, por sua vez, já teria sido distribuída por prevenção ao MS nº 38.933/DF; (ii) da ADI nº 7.212/DF por prevenção ao MS nº 38.659/DF; e (iii) do MS nº 38.485/DF, por prevenção à ADPF nº 850/DF.

24. Nas três situações indicadas pelas suscitantes, reconheceu-se a prevenção entre as ações de cunho objetivo e as respectivas demandas de natureza subjetiva porque que ambos os feitos tinham como pedido principal a própria declaração de inconstitucionalidade do ato normativo questionado. Portanto, tinham o mesmo - ou parcialmente o mesmo - objeto.

25. Primeiro, tome-se como exemplo a distribuição da

ADC nº 85/DF e da ADI nº 7.334/DF por prevenção ao MS nº 38.933/DF. Na mesma esteira dos pedidos deduzidos nas ações abstratas, no referido Mandado de Segurança requereu-se a essa Suprema Corte ‘julgar procedente esta ação, tornando definitiva a liminar, julgando ilegais e inconstitucionais os dispositivos acima indicados do Decreto nº 11.366, de 1º de janeiro de 2.023, o art. , o art. 11 e o art. 30, não só em relação ao impetrante, mas também quanto a todos os CAC ́s’.

26. Segundo, tanto na ADPF nº 850/DF, quanto no MS nº 38.485/DF, requereu-se a suspensão da ‘execução das verbas orçamentárias constantes do indicador de resultado primário (RP) nº 09’. Em terceiro lugar, idêntica situação ocorreu entre a ADI nº 7.212/DF e o MS nº 38.659/DF, no bojo dos quais se busca a declaração de inconstitucionalidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 15, de 2022, que ensejou a edição da Emenda Constitucional nº 123, de 2022.

27. Em tais situações, havia, de fato, identidade total ou parcial de objetos, a atrair não apenas a incidência do art. 69 do RISTF e do art. 55 do CPC, mas, sobretudo, do art. 77-B, do Regimento Interno deste Tribunal. No presente caso, contudo, as próprias entidades autoras suscitam apenas que os feitos em cotejo versam sobre as ‘mesmas questões’, pontuando que prevalece o ‘reconhecimento de prevenção entre remédios constitucionais e ações de controle de constitucionalidade, justamente dada a necessidade de o Supremo Tribunal Federal se debruçar sobre questões temáticas que, por vezes, aparecem dispersas em diversas ações’.

28. Ocorre que a simples pertinência temática ou identidade de matérias, tal como alegado pelas suscitantes, não é suficiente para afastar a regra geral que norteia a distribuição processual, de forma aleatória e impessoal, de modo randomizado. Nesse sentido, a título exemplificativo, cito os entendimentos firmados no bojo (i) do MS nº 37.354/DF, Rel. Min. Edson Fachin, decisão proferida pelo Min. Luiz Fux (Presidente), j. 13.10.2020, p. 16/10/2020; e, (ii) do MS nº

31.322/DF, Rel. Min. Rosa Weber, decisão proferida pelo Min. Ayres Britto (Presidente), j. 26/04/2012, p. 30/04/2012.

29. Nada obstante tal compreensão, cioso da integral observância às normas regimentais que deve nortear a atuação dos integrantes desta Excelsa Corte, promovo a submissão do presente feito à elevada apreciação da Excelentíssima Senhora Presidente, na forma do art. 7º da Resolução STF nº 706/2020, para apreciação." (destaquei)

É o relatório.

Decido.

2. A distribuição comum ou livre, levada a efeito no presente caso, consubstancia regra geral, cumprindo adotar a distribuição por parâmetro tão somente nas hipóteses em que haja a incidência dos preceitos regimentais e legais específicos.

3. Sobre ações próprias ao controle concentrado, preconiza o art. 77-B do Regimento Interno desta Casa seja aplicada a "regra de distribuição por prevenção quando haja coincidência total ou parcial de objetos", verbis: "Art. 77-B. Na ação direta de inconstitucionalidade, na ação direta de inconstitucionalidade por omissão, na ação declaratória de constitucionalidade e na arguição de descumprimento de preceito fundamental, aplica-se a regra de distribuição por prevenção quando haja coincidência total ou parcial de objetos."

4. A teor do art. 69, caput, do RISTF "A distribuição da ação ou do recurso gera prevenção para todos os processos a eles vinculados por conexão ou continência".

5. O Código de Processo Civil assenta "conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir", bem como presente a "continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo, abrange o das demais".

Ressalva, ainda, o diploma processual civil que, "mesmo sem conexão", devem os processos ser "reunidos para julgamento conjunto", a fim de evitar a "prolação de decisões conflitantes ou contraditórias". Transcrevo os dispositivos legais:

"Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

...

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.

Art. 56. Dá-se a continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo, abrange o das demais."

6. In casu , ausente a identidade de partes, bem como diversos os objetos do writ mandamental ( MS 36.526) e da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental, inocorrem a ventilada hipótese da conexão ou da continência, bem como o risco de decisões conflitantes ou contraditórias, a merecer seja mantida a livre distribuição do feito.

À Secretaria Judiciária, para fins de conclusão dos autos ao Ministro André Mendonça - Relator.

Publique-se. Cumpra-se.

Brasília, 14 de abril de 2023.

Ministra ROSA WEBER

Presidente

Documento assinado digitalmente

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stf/1814655538/inteiro-teor-1814655539