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25 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça de São Paulo
há 4 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

2ª Câmara de Direito Público

Publicação

Julgamento

Relator

Renato Delbianco

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-SP_AC_10002681420198260053_8f631.pdf
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Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2020.0000123292

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº XXXXX-14.2019.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, é apelada ZENAIDE SEVERINA DA SILVA.

ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores VERA ANGRISANI (Presidente sem voto), LUCIANA BRESCIANI E CLAUDIO AUGUSTO PEDRASSI.

São Paulo, 20 de fevereiro de 2020.

RENATO DELBIANCO

Relator

Assinatura Eletrônica

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto nº 16.959

Apelação Cível nº XXXXX-14.2019.8.26.0053

Apelante : PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

Apelada : ZENAIDE SEVERINA DA SILVA

Comarca : SÃO PAULO

Juíza de 1º Grau: LUIZA BARROS ROZAS VEROTTI

APELAÇÃO Obrigação de fazer Direito à moradia Auxílioaluguel Pretensão ao restabelecimento do pagamento do benefício Inadmissibilidade Em se tratando de norma programática, não compete ao Poder Judiciário intervir para determinar que se desrespeitem critérios técnicos de disponibilização de unidades habitacionais e de definição de política pública, sob pena de ofensa à separação dos Poderes e isonomia Precedentes Sentença reformada Prejudicada a análise da preliminar Recurso provido, para julgar improcedente a demanda.

Trata-se de apelação interposta nos autos de ação de obrigação de fazer que visava à condenação do Município de São Paulo/SP a promover o restabelecimento do pagamento de auxílio-aluguel à autora, julgada parcialmente procedente pela r. sentença de fls. 209/211.

Apela o réu (fls. 217/241) aduzindo, preliminarmente, perda superveniente do interesse processual em função da reinclusão da autora no programa social de auxílio-aluguel por mais 12 meses, perfazendo o total legalmente permitido de 24 meses. No mérito, aduz ser inviável o controle judicial de políticas públicas, consoante já decidido por esta C. Câmara nos autos do agravo de instrumento n.º XXXXX-52.2019.8.26.0000, pugnando pela improcedência do pedido.

Vieram contrarrazões (fls. 254/259).

Não houve oposição ao julgamento virtual.

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É o relatório.

Cuida-se de ação de obrigação de fazer ajuizada por Zenaide Severina da Silva em face do Município de São Paulo/SP, objetivando compeli-lo ao restabelecimento do “pagamento de auxílio-aluguel à autora até que se promova o atendimento habitacional definitivo”.

O Juízo a quo houve por bem julgar parcialmente procedente a pretensão deduzida “somente para determinar que ao final do prazo de 12 meses o réu deverá efetuar nova avaliação, mediante requerimento da autora, a fim de verificar se a situação de vulnerabilidade ainda persiste”.

Comporta reparo o r. julgado.

Consoante já decidido por esta C. Câmara em sede de agravo de instrumento (cópia do v. acórdão às fls. 203/208), não se olvida de que o direito social à moradia possui uma ampla dimensão, sendo dever do Estado prestá-lo. Contudo, em se tratando de norma programática 1 , não compete ao Poder Judiciário intervir para determinar que se desrespeitem critérios técnicos de disponibilização de unidades habitacionais e de definição de política pública, sob pena de ofensa à separação dos Poderes, consoante já decidido por esta C. Câmara, in verbis:

Apelação cível. Direito a moradia. Pleito de imediata disponibilização de unidade habitacional à autora ou, subsidiariamente, para que seja o Município compelido ao pagamento de benefício auxílio-aluguel até a efetiva entrega. Descabimento. Intervenção judicial que não 1 “Normas programáticas”, segundo o escólio de Jorge Miranda, “são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais do que comandos-regras, explicitam comandos-valores; conferem elasticidade ao ordenamento constitucional; têm como destinatário primacial embora não o único o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionariedade); não consentem que os cidadãos ou quaisquer cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem afirme que os direitos que delas constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjectivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente determinados” (apud MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21.ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 09).

Apelação Cível n.º XXXXX-14.2019.8.26.0053 C

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pode implicar no desrespeito aos critérios de disponibilização de unidades. Ausência de amparo legal para a concessão do benefício por tempo indeterminado. Poder Judiciário que não pode retirar do Legislativo e do Executivo a primazia na definição e execução da política pública. Recurso da autora desprovido. Estado de São Paulo excluído do polo passivo. Impossibilidade. Competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais. Recurso do Município de São Paulo parcialmente provido para reintegrar o Estado de São Paulo no polo passivo, estendendo-lhe a obrigação de incluir a autora em cadastros de programas habitacionais. Recurso da autora desprovido e recurso do Município parcialmente provido. (TJSP; Apelação XXXXX-97.2014.8.26.0053; Relator (a): Luciana Bresciani; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 1ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 25/11/2016; Data de Registro: 25/11/2016).

E, do corpo do voto proferido pela Eminente

Relatora, se extrai, por esclarecedor:

“(...).

Evidente que o problema do déficit habitacional é uma questão sensível nesta Capital, havendo estimativas de que na Região Metropolitana o número de residências necessárias supere 600 mil unidades. Tampouco se ignora que o direito social à moradia possui uma acepção individual, uma dimensão subjetiva, sendo certo que todos merecem um teto para morar. O problema da intervenção judicial nesse tipo de questão é que não é possível determinar o atendimento da necessidade habitacional de alguém ignorando que, com a outra mão, se está retardando o atendimento de outrem. O enfrentamento atomizado e fragmentário dessa questão jamais oferecerá uma solução para o conjunto da sociedade. Nessa medida, a determinação de imediato atendimento da demanda da autora, que seguramente é pessoa em situação de grande vulnerabilidade, representaria uma intervenção às cegas na gestão da política pública, irradiando consequências imponderáveis. O Judiciário não pode assumir o papel de atalho para obtenção de moradia e deve compreender pragmaticamente as limitações de sua atuação neste tipo de demanda.

(...)”.

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Obviamente que não se está aqui a negar a natureza essencial do direito de moradia que, juntamente com os direitos à vida, à saúde e à educação, compõem, a nosso sentir, o plexo de garantias que se traduzem no chamado “mínimo existencial”. Contudo, por óbvio que as políticas públicas de concessão de moradia estão atreladas a diversos fatores, dentre os quais se destaca a existência de recursos orçamentários frente à crescente demanda de famílias de baixa renda, o que gera um déficit que necessita ser equacionado pelo Poder Público mediante atribuição de critérios que, num primeiro momento, não estão ao alcance do Poder Judiciário dada a discricionariedade que necessariamente deve ser observada pelo administrador ante as vicissitudes de cada caso concreto e a necessidade de se conferir isonomia à distribuição das unidades. Exceto se restar comprovada eventual ilegalidade ou desvio de finalidade, o que não é o caso dos autos, não há margem para que o órgão judicante possa se imiscuir.

Por outro lado, conforme bem apontado pela douta Magistrada sentenciante, os incontroversos

documentos de fls. 379/400 bem demonstram que a autora, ora apelante, foi devidamente incluída em programa de atendimento habitacional provisório, tendo-lhe sido concedido auxílioaluguel a partir de 09.02.2017, não havendo que se falar, ao menos por hora, em prejuízo absoluto, eis que o Poder Público não tem se mostrado inerte.

Nesse sentido, convergem os julgados proferidos por esta C. Corte:

CERCEAMENTO DE DEFESA. Inocorrência. Produção desnecessária de outras provas. Provas dos autos suficientes para formar o convencimento do magistrado. Preliminar rejeitada. OBRIGAÇÃO DE FAZER. Pleito de garantia do direito à moradia definitiva. Inadmissibilidade. Compete ao Poder Executivo tomar as

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medidas cabíveis para solucionar o problema da falta de moradia. Incabível a incursão do Poder Judiciário em esfera de critérios de conveniência e oportunidade para adotar as prioridades da Administração Pública. Atendimento do pleito em detrimento daqueles que se encontram em iguais condições que ofende o princípio da isonomia. Existência de critérios na legislação municipal que foram observados pelo Município, não se cogitando de preterição da autora. OBRIGAÇÃO DE FAZER. Bolsa Aluguel. Concessão alternativa do direito à bolsa aluguel. Inadmissibilidade. Falta de preenchimento dos requisitos legais. Sentença mantida. Recurso improvido. (TJSP; Apelação XXXXX-95.2017.8.26.0477; Relator (a): Claudio Augusto Pedrassi; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Foro de Praia Grande - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 26/03/2018; Data de Registro: 26/03/2018).

Direitos sociais Direito à moradia Vulnerabilidade do autor Pedido de entrega de moradia ou de auxílio aluguel ou parceria social Norma programática

Impossibilidade de se obrigar a Administração a entregar uma unidade habitacional ao autor, sob pena de violação dos princípios da separação dos poderes e da isonomia Recurso improvido. (TJSP; Apelação XXXXX-15.2015.8.26.0053; Relator (a): José Luiz Gavião de Almeida; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 7ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 27/02/2018; Data de Registro: 28/02/2018).

Agravo de Instrumento - Ação de obrigação de fazer -Pretensão da Agravante consistente na disponibilização de moradia provisória - Impossibilidade - Não configuração dos requisitos necessários para concessão da medida - Não se nega à importância do direito à moradia, que tem previsão constitucional, mas este deve ser exercido nos termos da lei, sob pena de violação ao princípio da separação de poderes - Decisão mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento XXXXX-73.2017.8.26.0000; Relator (a): Marrey Uint; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 8ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 30/01/2018; Data de Registro: 01/02/2018).

RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO ORDINÁRIA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À MORADIA. 1. PRELIMINAR CERCEAMENTO DE DEFESA Inocorrência de cerceamento de defesa. Regular hipótese de julgamento antecipado, já que as provas se mostram suficientes ao julgamento da lide. Produção de prova testemunhal que, no caso concreto, se mostra inútil. 2. CONCESSÃO DE MORADIA. O

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cadastro nos programas habitacionais não possui natureza subjetiva de direito à moradia, mas sim de instrumento efetivo ao atendimento das políticas públicas habitacionais voltadas a população de baixa renda. Ainda que o Poder Público seja efetivamente responsável pela execução de programas de sociais de moradia, nos termos do art. 80, incisos V, XIII, XX e art. 81, incisos V e VI, do Plano Diretor, Lei Municipal nº 13.430/02, a pretensão de que seja compelido, pela via judicial a conceder moradia não subsiste. A demora de mais de 10 anos para concessão de moradia após o cadastro administrativo na COHAB, por si só não caracteriza omissão do Poder Público. As políticas públicas a serem adotadas para a reinserção urbana de famílias de baixa renda compõem série de ações e medidas complexas. No caso dos autos, verificase que a demora no atendimento de programa social destinado à concessão de moradia está inexoravelmente atrelada à ausência de recursos orçamentários diante da enorme demanda por moradia. Situação de vulnerabilidade específica que, por si só, não caracteriza omissão ou grave violação ao direito de moradia a justificar a atuação do Poder Judiciário a suprir a ausência do Poder Público. 3. AUXÍLIO MORADIA. Concessão de auxílio moradia pela Municipalidade que não se caracteriza como direito subjetivo. Discricionariedade do Poder Público a estabelecer critérios para atendimento de população em situação excepcional, nos termos da Portaria SEHAB nº 323/10. Caso de vulnerabilidade da autora que não se amolda as hipóteses previstas. 4. Sentença Mantida.

Recurso desprovido. (TJSP; Apelação

XXXXX-54.2015.8.26.0053; Relator (a): Marcelo Berthe; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 11ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 06/06/2016; Data de Registro: 10/06/2016).

Razão, portanto, assiste ao apelante,

devendo a r. sentença ser reformada, pelo mérito, para

julgar improcedente a demanda, observado que a inclusão da

autora no programa de aluguel-social se deu, única e

exclusivamente, por discricionariedade do réu, ora apelante,

bem como que a improcedência da demanda não implicará em

título executivo judicial para compelir a apelada à eventual

devolução de valores que lhe foram ou ainda serão pagos.

Prejudicada a análise da preliminar.

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Em função da improcedência total, deverá a autora, ora apelada, arcar com o integral pagamento das custas, despesas processuais e honorários de advogado que ora se arbitram, equitativamente nos termos do art. 85, § 8.º, do Código de Processo Civil, em R$ 1.000,00, já observado o disposto no § 11, bem como a gratuidade concedida (fls. 73/74).

Considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional aventada, observado que é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão tenha sido analisada.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso, para julgar improcedente a demanda.

RENATO DELBIANCO

Relator

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