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25 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TRF1 • AÇÃO CIVIL PÚBLICA • DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATRIAS DE DIREITO PÚBLICO (9985) • XXXXX-83.2019.4.01.3400 • Vara Federal Cível do Tribunal Regional Federal da 1ª Região - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Vara Federal Cível

Assuntos

DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATRIAS DE DIREITO PÚBLICO (9985), Contratos Administrativos (10421), Anulação (10423

Partes

Documentos anexos

Inteiro TeorTRF01_def16f305040776c124e40992a87f676031c349d.pdf
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Poder Judiciário

JUSTIÇA FEDERAL

Seção Judiciária do Distrito Federal

8a Vara Federal

Edifício-Sede I - Setor de Autarquias Sul, Quadra 2, Bloco G, Lote 8, CEP: 70070-933 - Fone: (61)

3221-6186

http://portal.trf1.jus.br/sjdf - E-mail: 08vara.df@trf1.jus.br

PROCESSO XXXXX-83.2019.4.01.3400/DF

POLO ATIVO: CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA e SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA - SBD

POLO PASSIVO: CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA

SENTENÇA - A

Objetiva a parte autora a anulação da Resolução CFO 198/2019.

Alegou, em resumo, que:

a) O CFO editou a Resolução n. 198/2019, que reconhece a Harmonização Orofacial como especialidade odontológica, e dá outras providências, extrapolando e contrariando a lei que regulamenta a Odontologia e as decisões do Supremo Tribunal federal - STF, Superior Tribunal de Justiça - STJ, do Tribunal Regional Federal da 1 Região e a Justiça Federal do Distrito Federal, especialmente nos últimos 5 anos (anexas), que são claros quanto aos limites da atividade de dentistas e cirurgiões dentistas;

b) Com a edição da Lei nº 12.842/2013 ( Lei do Ato Medico) toda e qualquer dúvida que existia em relação aos atos que podem ser realizados apenas pelos profissionais médicos foi dirimida, já que, nenhuma outra profissão, seja qual for sua área de atuação, ligada ou não à saúde, possui em sua legislação regulamentadora a autorização expressa de realização do diagnóstico nosológico e/ou a prática de atos invasivos;

c) O caráter privativo da realização de procedimentos invasivos estéticos para os médicos JÁ RESTOU EXPRESSAMENTE DEMONSTRADO NO TEXTO DA LEI.

d) o Réu ao editar a Resolução objurgada contrariou a sua própria legislação de regência, a Lei n.º 5.081/66, porque o profissional dentista

não pode exercer atos privativos de médicos, como os são os procedimentos invasivos estéticos.

e) A resolução atacada tem o enorme potencial de causar lesão grave à saúde da população, porque permite ilegalmente que um profissional não médico (dentista) possa realizar ATOS MÉDICOS, pois demandam perícia profissional e possuem potencial de complicações clínicas.

Pediu a concessão de medida liminar.

Procuração e documentos instruem a petição inicial.

O juízo da 22a Vara Federal/SJDF declinou da competência para esta 8a Vara Federal.

A Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORLCCF) requereu sua intervenção no feito como amicus curiae.

A Associação Brasileira de Harmonização Orofacial - ABRAHOF pediu para assistir o réu, mas houve oposição por parte dos autores.

Este juízo indeferiu o pedido de intervenção da ABORLCCF, determinando a oitiva das autoras sobre o pedido de assistência da ABRAHOF, bem como a manifestação prévia do CFO sobre a liminar (id. XXXXX).

As autoras se opuseram ao pedido de assistência da ABRAHOF à ré.

O CFO manifestou-se, aduzindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa das associações médicas autoras, e propugnando, quanto ao mérito, pelo indeferimento do pedido liminar, ao argumento de que a resolução ora impugnada seria plenamente válida (id.55996095).

A Associação Brasileira de Toxina Botulínica e Implantes Faciais - SBTI também pediu para assistir o CFO, ora réu, requerendo o indeferimento da medida liminar e juntando documentos e fotos e supostos erros médicos (id. XXXXX).

A autora SBD apresentou nova petição, reforçando o pleito liminar e juntando documentação e fotos de supostos erros de cirurgiões-dentistas (id. XXXXX).

Manifestação do CFM e das demais autoras na sequência, pelo indeferimento do pedido de assistência e rejeição das preliminares (id. XXXXX).

Duas novas petições da SBD - Sociedade Brasileira de Dermatologia, reiterando o pedido liminar e reapresentando documentos alusivos a supostos erros odontológicos, incluindo o caso de um óbito (id. XXXXX e id. XXXXX).

O CFO fez um pedido contraposto de tutela cautelar para que fosse determinada a retirada de uma nota editada pela SBCP noticiando fato inverídico, conexo à presente ACP, e que seria extremamente desairoso à classe dos cirurgiões-dentistas (id. XXXXX).

O MPF ofertou parecer, opinando pela extinção parcial do feito, pelo indeferimento

dos pedidos de assistência e pela rejeição do pedido liminar (id. XXXXX).

Nova petição da SBCP reiterando o pedido de medida liminar (id. XXXXX).

Proferida decisão acolhendo o argumento da ilegitimidade ativa das associações médicas Sociedade Brasileira De Cirurgia Plástica - SBCP, Sociedade Brasileira De Dermatologia - SBD e Associação Médica Brasileira - AMB; indeferindo o pedido de assistência da Associação Brasileira de Harmonização Orofacial - ABRAHOF e da Associação Brasileira de Toxina Botulínica e Implantes Faciais - SBTI; e indeferindo ainda o pedido liminar de tutela provisória (id. XXXXX).

O réu CFO apresentou contestação sustentando a ilegitimidade ativa das associações médicas e, no mérito, a improcedência dos pedidos (id. XXXXX).

A SBD informou a interposição do Agravo de Instrumento XXXXX- 09.2020.4.01.0000 (id. XXXXX), recurso em que o TFR/1a Região deferiu a tutela provisória recursal para reincluí-la no processo (id. XXXXX). Apresentou ainda réplica à contestação (id. XXXXX).

O autor CFM também apresentou réplica (id. XXXXX).

A autora SDB pediu a reconsideração da decisão que indeferiu a medida liminar (id. XXXXX).

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo - CREMESP requereu seu ingresso no feito na qualidade de assistente simples da parte autora (CFO e SBD), deduzindo pedido de tutela de urgência (id. XXXXX).

Os novos pedidos de tutela provisória e de assistência foram indeferidos (ids. XXXXX e XXXXX).

Não foi requerida a produção de provas adicionais.

É o relatório.

A lide comporta julgamento antecipado.

Não há razão para alterar o entendimento manifestado na decisão liminar, cujos fundamentos adoto como razão de decidir para sentenciar o presente feito.

Inicialmente, ressalto que tenho como preclusa a questão da ilegitimidade ativa e exclusão do feito das associações médicas Sociedade Brasileira De Cirurgia Plástica - SBCP e Associação Médica Brasileira - AMB, uma vez que tais litisconsortes não recorreram da decisão.

Quanto à ilegitimidade ativa da Sociedade Brasileira De Dermatologia - SBD, embora o TRF/1a Região tenha decidido em contrário nos autos da AI XXXXX- 09.2020.4.01.0000, permaneço convencido do acerto do entendimento que adotei anteriormente.

Nesse diapasão, preceitua o art. da Lei da Ação Civil Pública:

Art. 5o Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Examinando-se os atos constitutivos da associação autora, vê-se, claramente, que ela não está autorizada a manejar a ação civil pública, eis que não têm por finalidade institucional a defesa de nenhum dos interesses difusos ou coletivos arrolados na alínea b, do inciso V, do retrotranscrito artigo , da LACP.

A associação médica, conforme se pode ver de seu estatuto, tem finalidades exclusivamente associativas, sociais e científicas, em prol dos médicos especialistas que representa, não se destinando à defesa de direitos coletivos ou difusos da sociedade.

A alegação no sentido de que sua finalidade estatutária, na defesa dos médicos e do ato médico, a habilitaria também a promover a defesa e a proteção dos seus pacientes (ou consumidores) parece-me falaciosa.

Conforme já tive oportunidade de asseverar na ACP XXXXX-52.2017.4.01.3400, tal asserção parte da premissa equivocada de que a saúde pública, como um todo, seria o campo de atuação privativo dos médicos, na contramão da tendência hodierna que a considera de natureza interdisciplinar, sob a responsabilidade também de outras ciências, como a Enfermagem, a Biomedicina, a Odontologia, a Fisioterapia, a Psicologia, etc.

Tal alegação revela, no meu sentir, que o interesse aqui em discussão é de natureza nitidamente corporativista, em mais um dos multifários embates judiciais entre corporações profissionais pelo estabelecimento ou manutenção de uma espécie de "reserva de mercado".

A impertinência temática é evidente!

Os interesses coletivos dos médicos especialistas que estão sendo contrapostos aos interesses coletivos dos cirurgiões-dentistas, na disputa pela privatividade de procedimentos supostamente invasivos e do uso da toxina botulínica, para fins estéticos na chamada região orofacial, não têm a menor conexão ou ligação com a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, do consumidor, da ordem econômica, da livre concorrência, dos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou do patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Patente, portanto, a ilegitimidade ativa da autora SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA - SBD, mantendo-se no polo ativo apenas a autarquia profissional plenamente legitimada a mover a presente ACP, nos termos da legislação de regência.

No mérito, entendo não caber razão à parte autora.

Dispõe o ato ora impugnado:

RESOLUÇÃO CFO-198/2019

Reconhece a Harmonização Orofacial como especialidade odontológica, e dá outras providências.

O Presidente do Conselho Federal de Odontologia, no uso de suas atribuições legais e regimentais, "ad referendum" do Plenário,

Considerando o que dispõe o art. , caput e incisos I e VI da Lei nº 5081, de 24 de agosto de 1966, que regula o exercício da Odontologia, bem como o art. , § 6º da Lei nº 12.842 de 10 de julho de 2013, que regula o exercício da medicina;

Considerando que o Código de Ética Odontológica dispõe que a Odontologia é uma profissão que se exerce em benefício da saúde do ser humano e da coletividade sem discriminação de qualquer forma ou pretexto e que é dever do cirurgião-dentista manter atualizados os conhecimentos profissionais técnicos, científicos e culturais necessários ao pleno desempenho do exercício profissional; e,

Considerando, ainda, a necessidade de regulamentar essa especialidade, em virtude da já existência de cursos de pós-graduação autorizados pelo MEC, em instituições de ensino superior, com o objetivo formar cirurgiões- dentistas especialistas em harmonização orofacial:

RESOLVE:

Art. 1º. Reconhecer a Harmonização Orofacial como especialidade odontológica.

Art. 2º. Definir a Harmonização Orofacial como sendo um conjunto de procedimentos realizados pelo cirurgião-dentista em sua área de atuação, responsáveis pelo equilíbrio estético e funcional da face.

Art. 3º. As áreas de competência do cirurgião-dentista especialista em Harmonização Orofacial, incluem:

a) praticar todos os atos pertinentes à Odontologia, decorrentes de

conhecimentos adquiridos em curso regular ou em cursos de pós- graduação de acordo com a Lei 5.081, art. 6, inciso I;

b) fazer uso da toxina botulínica, preenchedores faciais e agregados leucoplaquetários autólogos na região orofacial e em estruturas anexas e afins;

c) ter domínio em anatomia aplicada e histofisiologia das áreas de atuação do cirurgião-dentista, bem como da farmacologia e farmacocinética dos materiais relacionados aos procedimentos realizados na Harmonização Orofacial;

d) fazer a intradermoterapia e o uso de biomateriais indutores percutâneos de colágeno com o objetivo de harmonizar os terços superior, médio e inferior da face, na região orofacial e estruturas relacionadas anexas e afins;

e) realizar procedimentos biofotônicos e/ou laserterapia, na sua área de atuação e em estruturas anexas e afins; e,

f) realizar tratamento de lipoplastia facial, através de técnicas químicas, físicas ou mecânicas na região orofacial, técnica cirúrgica de remoção do corpo adiposo de Bichat (técnica de Bichectomia) e técnicas cirúrgicas para a correção dos lábios (liplifting) na sua área de atuação e em estruturas relacionadas anexas e afins.

Art. 4º. Será considerado especialista em Harmonização Orofacial com direito a inscrição e ao registro nos Conselhos de Odontologia, o cirurgião- dentista que atender ao disposto nesta Resolução.

Art. 5º. Serão reconhecidos como cursos de especialização em Harmonização Orofacial os que contenham carga horária mínima de 500 (quinhentas) horas, divididas, no mínimo, 400 (quatrocentas) horas na área de concentração, 50 (cinquenta) horas na área conexa e 50 (cinquenta) horas para disciplinas obrigatórias.

§ 1º Na área de concentração deverão constar, no mínimo, disciplinas de preenchedores faciais e toxina botulínica, fios orofaciais, lipoplastia facial, agregados leuco-plaquetários autólogos, mesoterapia e indutores percutâneos de colágeno e fototerapia facial.

§ 2º Na área conexa deverão constar, no mínimo, disciplinas de anatomia de cabeça e pescoço, histofisiologia, anatomia da pele (epiderme, derme e tecido subcutâneo), farmacologia e farmacoterapia.

§ 3º Na área obrigatória deverão constar, no mínimo, as disciplinas de ética e legislação odontológicas, metodologia científica e bioética.

Art. 6º. O Coordenador do curso de especialização em Harmonização Orofacial deve ser, no mínimo, pós-graduado (stricto sensu) em

Odontologia.

Art. 7º. O corpo docente da área de concentração deverá ser composto, exclusivamente, por especialistas em Harmonização Orofacial registrados no Conselho Federal de Odontologia.

Art. 8º. O Conselho Federal de Odontologia registrará o título de especialista em Harmonização Orofacial exclusivamente obtido por instituições credenciadas pelo Sistema Conselho ou de ensino regulamentadas pelo MEC.

Art. 9º. Também terá direito ao registro como especialista em Harmonização Orofacial o cirurgião-dentista que:

a) apresente, a qualquer tempo, o certificado de conclusão ou comprove a efetiva coordenação de curso de especialização nesta área iniciado antes da vigência desta norma e regulamentado pelo MEC;

b) possuindo especialidade registrada em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, comprove, em até 180 (cento e oitenta) dias, atuação efetiva em harmonização orofacial nos últimos 5 (cinco) anos;

c) possuindo qualquer outra especialidade registrada, comprove, em até 180 (cento e oitenta) dias, atuação efetiva nos últimos 5 (cinco) anos e a realização de cursos, que totalizem no mínimo 360 (trezentas e sessenta) horas, e que contenham conteúdos práticos com pacientes na área de preenchedores faciais e toxina botulínica, fios faciais, lipoplastia facial, agregados leuco-plaquetários autólogo, mesoterapia e indutores percutâneos de colágeno e fototerapia facial.

Art. 10º. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação na Imprensa Oficial, revogadas as disposições em contrário.

Nos termos do art. , XIII, da Constituição, é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas, apenas e tão somente, as qualificações profissionais que a lei, em sentido formal, estabelecer.

À míngua de exigências legais específicas, pela regra constitucional retrorreferida, é evidente que não se pode restringir licitamente o âmbito de atuação de uma determinada profissão.

A Lei 5.081/1966, que regula o exercício da Odontologia, estabelece em seu artigo , inciso I, que compete ao cirurgião-dentista PRATICAR TODOS OS ATOS PERTINENTES A ODONTOLOGIA, DECORRENTES DE CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS EM CURSO REGULAR OU EM CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO.

Por outro lado, a Lei 12.842/2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina, ao regular as atividades que são privativas dos médicos, dispôs em seu art. , inciso III, a INDICAÇÃO DA EXECUÇÃO DE PROCEDIMENTOS INVASIVOS, SEJAM DIAGNÓSTICOS, TERAPÊUTICOS OU ESTÉTICOS.

Tal asserção, num primeiro momento, passa a impressão de que todo e qualquer procedimento invasivo seria ato privativo do médico.

Ocorre que prosseguindo no exame do dispositivo legal em questão, nos deparamos com a definição do que se deve entender como procedimento invasivo, qual seja: aquele caracterizado pela INVASÃO DOS ORIFÍCIOS NATURAIS DO CORPO ATINGINDO ÓRGÃOS INTERNOS (art. 4º, § 4º).

E mais adiante, dispõe o § 6º do multicitado artigo da Lei do Ato Medico: O DISPOSTO NESTE ARTIGO NÃO SE APLICA AO EXERCÍCIO DA ODONTOLOGIA, NO ÂMBITO DE SUA ATUAÇÃO.

Pois bem.

Os procedimentos odontológicos referidos na RESOLUÇÃO CFO-198/2019 são os seguintes: aplicação da toxina botulínica, de preenchedores faciais e de agregados leucoplaquetários autólogos na região orofacial e em estruturas anexas e afins; intradermoterapia e aplicação de biomateriais indutores percutâneos de colágeno com o objetivo de harmonizar os terços superior, médio e inferior da face, na região orofacial e estruturas relacionadas anexas e afins; procedimentos biofotônicos e/ou laserterapia, na sua área de atuação e em estruturas anexas e afins; e lipoplastia facial, mediante técnicas químicas, físicas ou mecânicas na região orofacial, técnica cirúrgica de remoção do corpo adiposo de Bichat (técnica de Bichectomia) e técnicas cirúrgicas para a correção dos lábios (liplifting) na sua área de atuação e em estruturas relacionadas anexas e afins.

A Harmonização Orofacial, portanto, embora possa ser invasiva - um conceito extremamente vago e relativo - restringe-se à região anatômica, grosso modo, da boca, do pescoço e da face (cabeça).

A região orofacial corresponde anatomicamente à região bucomaxilofacial que, desde a edição da Portaria CFO-54, de 2 de novembro de 1975, está inserida numa das searas de especialização da Odontologia, qual seja, a Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial.

Malgrado sejam especialidades distintas, ambas as especialidades da Odontologia, tanto a antiga Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial, quanto a novel Harmonização Orofacial, atuam aparentemente sobre a mesma região anatômica, área que parece ser comum também às especialidades médicas da Cirurgia Plástica, da Dermatologia, da Otorrinolaringologia, da Neurocirurgia e da Cirurgia de Cabeça e Pescoço.

Não há dúvida, portanto, de que a Harmonização Orofacial é uma legítima especialidade odontológica, muito embora incida sobre uma região anatômica comum também a diversas outras especialidades médicas, razão por que não vislumbro a aventada privatividade da Medicina in casu, não havendo que se falar, portanto, em ilegalidade.

No mais, calha à fiveleta transcrever o muito bem lançado parecer ministerial, da lavra do Procurador da República Felipe Fritz Braga (id. :

"III- DO PEDIDO LIMINAR.

As autoras pugnam pela concessão de tutela provisória de urgência antecipada, para o fim de suspender a eficácia da Resolução CFO nº 198/2019, sob o fundamento de que a prática de atos de harmonização facial por profissional não médico traz riscos à saúde pública e constituiu atuação profissional não autorizada por lei.

Da análise dos fatos é possível aferir com clareza que o assunto objeto da demanda envolve diretamente a saúde pública e os direitos do consumidor, por ser o cidadão o destinatário direto dos serviços prestados pelo conjunto de profissionais envolvidos, médicos e odontólogos.

Não se desconhece que a reserva de mercado possa ser a motivação direta dos conselhos em demandar em juízo pela ampliação ou exclusão de certos procedimentos do campo de atuação do profissional. Contudo, não se pode negligenciar o que de fato está diretamente envolvido, que é a prestações de serviços de saúde ao cidadão.

Outro aspecto preliminar relevante é que a questão judicializada não diz respeito apenas a controle de legalidade, mas sim à pretensão da autora de obrigar/impor ao Conselho de Odontologia e aos odontólogos que se abstenham de praticar os atos que a autora entende como de exclusividade médica, de caráter estético.

Sob esse prisma, tem-se que é perfeitamente cabível a veiculação da controvérsia através de ação civil pública, que tem como finalidade primordial defender os interesses difusos ou coletivos.

É importante consignar que nenhuma das partes possui na lei (em sentido estrito) que as instituiu ou regulamentou a profissão, previsão expressa e exclusiva para a realização de procedimentos estéticos na face, sendo a lei do ato medico clara em excluir a odontologia da vedação concernente a prática de atos privativos aos médicos (§ 6º do art. 4º).

Ou seja, ad primum aspectum não se verifica que tenha ocorrido invasão das atribuições dos profissionais médicos pelos odontólogos.

Aliado a isso, tem-se que o ato normativo questionado não autoriza ou reconhece todo e qualquer profissional da odontologia como apto a realizar o procedimento de harmonização facial, mas, unicamente, aqueles que se formarem em curso de pós-graduação direcionada a tal prática ou aos profissionais que tenham experiência de no mínimo 05 anos referido campo de atuação.

Referidas exigências demonstram, ainda que minimamente, que o Conselho Federal de Odontologia agiu com certa cautela ao autorizar somente os profissionais qualificados a realizarem os procedimentos de harmonização facial.

Aliás, como ramo de especialização, a dermatologia e a cirurgia plástica são especialidades da Medicina, assim como foi reconhecida a harmonização facial como especialidade dos odontólogos.

Os casos isolados apontados nas notícias veiculadas na lide, bem como o argumento de que os cursos e especializações da medicina são mais exigentes e têm maior tempo de preparo, por si sós, não são aptos a demonstrar que os profissionais da odontologia não possam adquiri-los em menor tempo de estudo.

Não se vislumbra, portanto, presentes os requisitos do fumus boni iuris e o periculum in mora que justifiquem a suspensão da Resolução CFO 198/2019, razão pela qual o MPF se manifesta contrário por ora ao seu deferimento do pedido liminar.

IV- MÉRITO.

Na petição inicial, o Conselho Federal de Medicina sustenta que a controvérsia versa sobre questão de direito, consistente, no caso, na inconstitucionalidade e infração da Resolução n. 198/2019 - CFO ao disposto nas leis que regulamentam as profissões de médico e odontologia, em especial a Lei do Ato Medico.

Alega que controvérsias análogas têm ocorrido entre o CFM e outros conselhos reguladores de profissões da saúde que procuram"alargar indevidamente seu campo de atuação, via resoluções administrativas".

Ocorre que o desenvolvimento do conhecimento e de novas técnicas no âmbito da saúde leva ao surgimento de novos tratamentos de saúde e de especializações profissionais da odontologia e da medicina que até há pouco eram absolutamente insuspeitas. Tais inovações em diversas situações dificultam a classificação dessas novas especializações e tratamentos no âmbito dos conceitos explicitados nas leis regulamentadores das profissões de saúde.

As principais leis que definiram a atividade do médico e do odontologista - citadas pela autora - são respectivamente de 1957 (Lei nº 3.268) e de 1966 (Lei nº 5.081). O esforço argumentativo da inicial do CFO em enquadrar a controvérsia no que definiram leis cuja publicação se deu há mais de meio século atrás é, portanto, insuficiente para resolvê-la.

A autora CFO procura ainda demonstrar que o rol de atividades exclusivas do médico contido na Lei do Ato Medico abrangeria a Harmonização Orofacial, regida pela Resolução CFO n. 198/2019. Utiliza-se inclusive de dispositivos vetados pelo Presidente da República (com veto mantido pelo Congresso), utilizando-se de argumentação hermenêutica para demonstrar que estariam vigentes não obstante o veto presidencial.

Como já lembrado acima, o esforço empregado pela autora contra o CFO, entretanto, é posto em dúvida pelo teor dos §§ 6º e do art. da mesma Lei do Ato Medico, que dispõem que a exclusividade do ato médico não se aplica aos atos compreendidos no exercício da Odontologia:

Art. 4º São atividades privativas do médico:

§ 6º O disposto neste artigo não se aplica ao exercício da Odontologia, no âmbito de sua área de atuação.

§ 7º O disposto neste artigo será aplicado de forma que sejam resguardadas as competências próprias das profissões de assistente social, biólogo, biomédico, enfermeiro, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, nutricionista, profissional de educação física, psicólogo, terapeuta ocupacional e técnico e tecnólogo de radiologia.

Por outro lado, cumpre considerarem-se dentre aspectos contemporâneos dos procedimentos bucomaxifaciais, os quais compreendem a Harmonização Facial, especificamente qual o profissional que no restante do mundo realiza esses procedimentos - especialmente naqueles países de práticas de saúde mais modernas e creditadas.

Uma pesquisa inicial na internet leva a crer que em diversos países de medicina avançada procedimentos bucomaxifaciais de harmonização facial vêm sendo realizados tanto por profissionais médicos quanto odontologistas, desde que possuam a formação adequada."

À exceção das referências do douto procurador ao direito comparado, as quais não entendo invocáveis para o deslinde da presente demanda, acolho integralmente a manifestação ministerial para reforçar ainda mais minha convicção acerca da legalidade da resolução ora impugnada.

Ante o exposto, DECLARO a ilegitimidade da autora SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA - SBD e, no mérito, JULGO IMPROCEDENTE o pedido.

Sem custas nem honorários (art. 18 da Lei da ACP).

Intimem-se.

Comunique-se ao relator do AI XXXXX-09.2020.4.01.0000.

Em caso de interposição de apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões. Após, subam os autos ao TRF/1a Região.

Transitado em julgado o feito, arquive-se.

Em Brasília - Distrito Federal.

(datado e assinado digitalmente)

Juiz Federal FRANCISCO ALEXANDRE RIBEIRO

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