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16 de Junho de 2024
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    Condenação por entrega de direção a quem não estava habilitado

    Publicado por Espaço Vital
    há 14 anos

    A Turma Recursal Criminal do Estado do RS manteve a condenação de oito meses de detenção a um motorista que entregou o automóvel a uma mulher não habilitada à dirigir, em infração ao art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro.

    O colegiado considerou que o fato de o réu ter se sentido tonto após ter jogado futebol em um ginásio não justificava a entrega da direção. Ratificou também que "a configuração do delito não depende de comprovação de perigo de dano concreto".

    Segundo a ex-companheira do réu, na noite de 30 de março de 2007, o casal estava em um ginásio, onde o réu jogava. Ao final da partida, ele sentiu-se tonto e pediu para que ela dirigisse. Pouco mais de uma quadra adiante, foram parados por uma blitz. Ela relatou que essa foi a primeira vez que pegou o carro e que o seu ex-companheiro sabia que ela não tinha documentação.

    Para a relatora, juíza Cristina Pereira Gonzáles, a alegação de insuficiência de provas não prospera, uma vez que o próprio acusado admitiu ter entregue a direção de seu carro ciente de que a mulher não possuía habilitação.

    A magistrada refutou também a necessidade de presença de perigo de dano concreto. Conforme a juíza, o ato de entregar o veículo é suficiente para configurar delito. Quanto à alegação de que o réu entregou a direção devido a um mal estar, a relatora entende que a conduta não caracteriza estado de necessidade. Para a magistrada, não é crível que não houvesse outro meio de transporte ou outra pessoa habilitada que pudesse conduzir o veículo.

    O acórdão foi unânime. (Proc. nº 71002547495 - com informações do TJRS).

    Íntegra do acórdão

    RECURSO CRIME. DELITO DE TRÂNSITO. ART 310 DO CTB. TIPICIDADE E SUFICIÊNCIA DE PROVAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. PENA READEQUADA. 1- Evidenciado que o réu permitiu que sua companheira, pessoa não habilitada, dirigisse veículo automotor, em via pública, impositiva a condenação. 2- Sendo o delito de perigo abstrato, desnecessária a prova da probabilidade de ocorrência do dano. Assim, basta para tipificar a conduta que o réu permita ou confie a condução de veículo à pessoa não habilitada, o que ficou comprovado na espécie. 3- Afastamento da excludente do estado de necessidade. 4- Pena privativa de liberdade não substituída por restritiva de direitos porque não preenchidos os requisitos subjetivos previstos em lei. RECURSO DESPROVIDO.

    Recurso Crime - Turma Recursal Criminal

    Nº 71002547495 - Comarca de Vacaria

    GILMAR DA SILVA - RECORRENTE

    Ministério Público - RECORRIDO

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos.

    Acordam as Juízas de Direito integrantes da Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do Sul, À UNANIMIDADE, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

    Participaram do julgamento, além da signatária, as eminentes Senhoras Dr.ª Ângela Maria Silveira (Presidente e Revisora) e Dr.ª Laís Ethel Corrêa Pias.

    Porto Alegre, 10 de maio de 2010.

    DR.ª CRISTINA PEREIRA GONZALES,

    Relatora.

    RELATÓRIO

    Versam os autos sobre recurso de apelação interposto pela defesa (fls. 79/81), que se insurge contra a sentença (fls. 48/54) que condenou o réu à pena de oito meses de detenção, por infração ao artigo 310 do CTB.

    A defesa postula a reforma do decreto condenatório, alegando a insuficiência do conjunto probatório e a atipicidade do fato, uma vez que não comprovado o perigo decorrente da condução do veículo. Pede, também, que seja afastada a punibilidade do recorrente, diante da excludente do estado de necessidade. Pede a absolvição do acusado, com fundamento no inciso VII do artigo 386 do CPP.

    O fato ocorreu em 30/03/2007 (fl. 08).

    O Ministério Público ofereceu denúncia (fls. 02/04), recebida em 05/05/2008 (fl. 27). Os benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo não foram oferecidos em razão dos antecedentes do acusado (fls. 04 e 11/14).

    Instruído o feito, com a inquirição de três testemunhas (fls. 27/29) e o interrogatório o réu (fl. 30), seguiram-se os memoriais pelo Ministério Público (fls. 31/34), pela defesa (fls. 42/47) e a sentença condenatória (fls. 48/54), publicada em 06/02/2009 (fl. 58v).

    Houve a apresentação de contrarrazões pelo recorrido (fls. 83/86), no sentido de manutenção da sentença.

    Nesta instância recursal, o Ministério Público manifestou-se, preliminarmente, pela reforma da sentença condenatória, uma vez que o fato, por não ter gerado perigo de dano, não se traduz em crime, e, no mérito, pelo seu desprovimento, devendo, contudo, ser substituída a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos (fls. 88/92).

    VOTOS

    Dr.ª Cristina Pereira Gonzales (RELATORA)

    Conheço do recurso, uma vez que adequado e tempestivo.

    O delito imputado ao réu é o previsto no artigo 310 da Lei 9.503/97, uma vez que ele permitiu a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada.

    A existência do crime de trânsito ficou evidenciada pelo boletim de ocorrência (fls. 08/09), bem como, pelos depoimentos colhidos em juízo.

    Rúbia Veridiana Gomes de Lima, ex-companheira do acusado, narrou que na noite do fato, estava no Ginásio onde o réu estava jogando e, no término do jogo, ele se sentiu tonto, pedindo, assim, para que a depoente dirigisse. Logo que tomou a direção do veículo, após ter transitado por uma quadra, ela foi parada em uma blitz. A informante referiu que o réu sabia que ela não tinha habilitação e que foi a primeira vez que ela pegou o carro (fl. 27).

    O policial militar Valdir Pereira Gin relatou que estava participando de uma blitz, quando foi abordado um veículo Fiat Tipo, que era conduzido por Rúbia, e que não possuía carteira de habilitação, sendo que o réu também estava no veículo (fl. 28).

    Antônio Celso Pereira, também policial militar, disse não se recordar de ter atendido a ocorrência em questão, que foi apenas digitada por ele (fl. 29).

    O acusado, por sua vez, confirmou que entregou a direção do veículo a Rubia, mesmo sabendo que ela não tinha habilitação, tudo porque ficou tonto após a saída de um jogo. Eles foram abordados pelos policiais cerca de 200 metros depois (fl. 30).

    Ora, a prova carreada aos autos demonstra perfeitamente a conduta ilícita do réu, que permitiu e confiou a sua companheira, pessoa não habilitada, a condução do veículo de sua propriedade.

    Não há que se falar em insuficiência de provas, uma vez que o próprio acusado admitiu em seu depoimento, que entregou a direção de seu veículo à sua companheira, mesmo sabendo que ela não possuía habilitação.

    De outra banda, ressalto que o delito em tela não exige a presença de perigo de dano concreto para sua configuração, sendo suficiente para caracterizá-lo a entrega do veículo a quem não é permitido conduzi-lo, como bem explicitado no próprio artigo, verbis:

    Art. 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física, ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo em segurança: Pena-detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, ou multa.

    Trata o referido artigo, portanto, de crime formal não se exige resultado naturalístico consistente na existência de lesão efetiva a alguém e de perigo abstrato não se exige prova da probabilidade de ocorrência do dano.

    Neste sentido a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, em Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.1122.

    No mesmo diapasão é a jurisprudência deste Colegiado:

    ENTREGAR VEÍCULO AUTOMOTOR À PESSOA NÃO HABILITADA (ART. 310, DO CTB). CRIME DE MERA CONDUTA, NÃO IMPORTANDO SE HOUVE OU NÃO, NO CASO CONCRETO, PERIGO. INTERPRETAÇÃO VINCULADA AO MOMENTO HISTÓRICO-REAL. A PROVA DOS AUTOS É CLARA NO SENTIDO DE QUE O RÉU PERMITIU QUE PESSOA, SABENDO NÃO HABILITADA, CONDUZISSE VEÍCULO AUTOMOTOR EM VIA PÚBLICA. NEGARAM PROVIMENTO. (Recurso Crime Nº 71001539998, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Clademir José Ceolin Missaggia, Julgado em 21/01/2008).

    A alegação do estado de necessidade também não impressiona porque certa a possibilidade de utilização de outro meio de transporte para o deslocamento do réu, não se justificando sua conduta pelo simples fato de não ter se sentido bem. Ademais, não era crível que não houvesse, no local, outra pessoa habilitada para dirigir o veículo automotor do réu.

    Tal matéria já foi corretamente enfrentada e afastada pela magistrada na sentença, cujos fundamentos também adoto como razão de decidir, haja vista que efetivamente ausentes os requisitos necessários para a configuração da excludente do estado de necessidade, previstos no art. 24 do Código Penal.

    Encontrando-se, pois, devidamente comprovada a ocorrência do fato delituoso imputado ao denunciado e não havendo qualquer circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena, impõe-se a confirmação da sentença condenatória lavrada pela Dra. Anelise Boeira Varaschin, inclusive no tocante à pena aplicada, haja vista que o réu não preenchia os requisitos subjetivos para a substituição da pena, ostentando duas condenações e encontrando-se cumprindo pena de cinco anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado.

    É o VOTO, pois, no sentido de NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a sentença condenatória por seus próprios e jurídicos fundamentos.

    Dr.ª Ângela Maria Silveira (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo com o (a) Relator (a).

    Dr.ª Laís Ethel Corrêa Pias - De acordo com o (a) Relator (a).

    DR.ª ÂNGELA MARIA SILVEIRA - Presidente - Recurso Crime nº 71002547495, Comarca de Vacaria: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."

    Juízo de Origem: 2. VARA CRIMINAL VACARIA - Comarca de Vacaria.

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