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26 de Maio de 2024
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    DESMEMBRAMENTO SINDICAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

    - Amador Paes de Almeida, Doutor em Direito e Professor Titular da Universidade Mackenzie da Faculdade de Direito da UPM - Universidade Presbiteriana Mackenzie, juiz Togado do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (aposentado), autor de várias obras jurídicas nos ensina que, à luz da Constituição de 1988, é possível o DESMEMBRAMENTO SINDICAL.

    A Constituição Federal de 1988, que consagrou a unicidade sindical, assim entendida a existência de um único sindicato representativo de um mesmo grupo de trabalhadores ou de empresários numa mesma região, dispõe no artigo , II, que:

    “é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um município.”

    Tal unicidade, contudo, há de ser interpretada em consonância com o espírito da atual Carta Magna, visivelmente inspirado na liberdade de associação profissional e sindical. Com a autoridade que lhe é, por todos consagrada, preleciona José Afonso da Silva que:

    “A associação sindical foi Constitucionalmente contemplada com uma série de poderes especiais, que lhe demarcam um regime jurídico próprio, com prerrogativas próprias, que são distintas das demais associações, mesmo as chamadas profissionais.” (Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 335).

    Dentro desse prisma a unicidade sindical na Carta Magna de 1988, não tem, por certo, o caráter restrito estabelecido na Constituição autoritária de 1937, sob a égide da qual, o Decreto-Lei n. 1402, de 5 de julho de 1939, disciplinava a constituição e funcionamento dos sindicatos, sob intensa e direta fiscalização e ingerência do Ministério do Trabalho. Tal decreto, manifestamente autoritário, inequivocamente, induzia a interpretação restritiva das disposições relativas à criação e funcionamento dos sindicatos. À luz, porém, das novas disposições constitucionais, outro é o sentido a ser dado às normas jurídicas disciplinadoras do direito sindical. A linguagem do direito, na lição do consagrado mestre Miguel Reale, “não é fixa ou imutável ”.

    Como afirma Amauri Mascaro Nascimento:

    “Há diferença de contexto entre a unicidade de 1937, desejada pelo Estado e fruto da concepção autoritária que se pretendeu infundir no movimento sindical, e a unicidade de 1988, não imposta pelo Estado, meramente uma questão de preferência de relacionamento entre os próprios sindicatos, com o que são distintas sob o prisma histórico.” (Direito do Trabalho na Constituição de 1988, Ed. Saraiva, p 229).

    O princípio da unicidade instituído no artigo , II, da Constituição Federal atual, por certo, repousa na representatividade da categoria profissional, - em conseqüência do que a sindicalização é levada a efeito em razão dos interesses dos trabalhadores.

    Daí observar Mozart Victor Russumano que:

    “A Sindicalização se processa em função dos laços de solidariedade ou semelhança que aproximam certos empregados” (comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, Ed. José Kinfino, Vol. IV, p 1.053).

    Liberto da ingerência do Poder Público, o sindicato, na atual sistemática, decide sobre o seu próprio enquadramento, definido por José Martins Catharino como:

    “O ato que resulta da colação das entidades sindicais em um todo sistemático, classificado e jurídico.” (Tratado Elementar de Direito Sindical, Ed. LTR, 1977 , p. 124).

    Não se diga que, afastada a ingerência do Estado, o enquadramento sindical, agora espontâneo, tenha desaparecido.

    Como preleciona Arion Sayão Romita:

    “O sistema de enquadramento sindical, sob controle do Ministério do Trabalho, foi abolido pela Constituição de 1988, mas subsiste na prática, porquanto a Lei Maior conservou a unicidade sindical e a sindicalização por categoria.” (Revista de Direito do Trabalho, Ed. Revistas dos Tribunais, jan/março de 2000, p. 14).

    Na expressão textual do saudoso Valentim Carrion:

    “O enquadramento oficial desapareceu com a Constituição Federal de 1988 (artigo 8º), tendo sido substituído pelo espontâneo.” (Comentários à Consolidação das Leis de Trabalho, 23ª edição, Saraiva 2000, p. 435).

    O vínculo profissional é, antes de tudo, o suporte fático do enquadramento sindical relativamente aos empregados. Contudo, a organização sindical pode abranger tanto atividade idêntica quanto as similares ou conexas (Catharino, obra citada, p.118). Ressalte-se, ainda, a faculdade da sindicalização por profissão, como ocorre com as denominadas categorias diferenciadas.

    Dentro do quadro mencionado, a aparente rigidez da unicidade sindical admite flexibilidade, dentre as quais se destaca o fenômeno denominado de Desmembramento Sindical.

    Os sindicatos, com relação aos empregadores, constituem-se por categorias econômicas; relativamente aos empregados, por categorias profissionais idênticas, similares ou conexas. Na ocorrência de concentração, quando o sindicato abrange categorias, similares ou conexas, facultada é a dissociação, a teor do que dispõe o artigo 571, caput da CLT:

    “Qualquer das atividades ou profissões concentradas na forma do parágrafo unicodo artigoo anterior poderá dissociar-se do sindicato principal, formando um sindicato específico...”

    A parte final do dispositivo legal nominado, vazada nos seguintes termos:

    “...desde que o novo sindicato a juízo da Comissão de Enquadramento Sindical ofereça possibilidade de vida associativa regular e de ação sindical eficiente”, foi inequivocamente revogada pelo inciso I, do art. , da Constituição Federal, que assim dispõe:

    “A lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical.”

    De todo conveniente lembrar que o Registro, das entidades sindicais no Ministério do trabalho, a ser levado a efeito segundo as regras dispostas na Portaria GM/TEM n. 343, de 4 de maio de 2000, não representa qualquer ingerência do Poder Público, constituindo-se, antes de tudo, na “verificação dos pressupostos legais”, como afirma Eduardo Gabriel Saad (Suplemento Trabalhista da LTr 092/00) e como, proclamou o Supremo Tribunal Federal (MI-144-SP, Tribunal Pleno - ADIMC 1121/RS) e, igualmente o Tribunal Superior do trabalho (SDC - RO - DC 80.163/93.4).

    Assim, a dissociação ou desmembramento, no sistema estabelecido após promulgação da Constituição de 1988, independe de prévia anuência do Ministério do Trabalho, bastando que os interessados, em assembléia geral, deliberem favoravelmente ao desmembramento, e conseqüente criação de sindicato novo. A dissociação não se cerca, na atual sistemática do rigorismo formal do sistema celetista.

    Como adverte Wilson de Souza Campos Batalha:

    “O sindicato é constituído por categorias definidas em seus estatutos. As categorias profissionais e econômicas não são estanques ou imutáveis, como ao tempo de vigência da CLT e da Comissão de Enquadramento Sindical. O Estado não define as categorias, não impõe cláusulas estatuárias, não condiciona a existência dos Sindicatos, o registro a que alude o artigo , I, da Constituição, não tem natureza constitutiva, mas meramente declaratória”. (Sindicato/Sindicalismo, LTr, p.55, 1952).”

    Lembra Wilson Ramos Filho, com manifesta propriedade, que:

    “Na prática, as forças sociais estão em movimento e desse movimento é que devem ser extraídos os conteúdos jurídicos, interpretando a norma não em sua literalidade, mas no conjunto de normas que a Constituição, dirigente, concebeu para a organização social do País.” (LTr, 56-10/1203).

    Ora, se dúvida não pode subsistir quanto à legalidade de desmembramento de sindicatos que representem categorias profissionais similares ou conexas, de todo conveniente por em relevo outras situações em que a dissociação é absolutamente legítima, a saber:

    a) sindicatos que representem a categoria em mais de um município;

    b) atividades específicas que propiciem a formação de sindicato próprio.

    Na primeira hipótese, é de se ressaltar que, em conformidade com o artigo , II, da Constituição Federal, o sindicato deve ter, necessariamente, como base, a área de um município. Na eventualidade do sindicato estender sua representação a outros municípios, manifestamente legítimo o desmembramento, com a criação de sindicatos novos em municípios que extravasarem o limite da sede do primeiro, afirmando categoricamente Wilson Ramos Filho que:

    “Todos os sindicatos que representam a categoria em mais de um município podem sofrer desmembramento, respeitado o limite óbvio do município sede do sindicato anterior.” (Obra citada, LTr, 56-10/2006).

    Na segunda hipótese, o desmembramento dá-se em razão da própria representatividade, afirmando Wilson Ramos Filho que:

    “Sempre que determinada atividade se torne de tal forma específica que propicie aos trabalhadores o desejo de se constituir em sindicato específico, pode haver desmembramento de tal atividade, mesmo no âmbito do município sede do sindicato anterior. (LTr 56-10/1.206).

    E, numa advertência por demais significativa, conclui o eminente jus-laborista:

    “O sindicato antigo não tem o direito adquirido à sua base (territorial ou de representação), anterior, com fundamento único na sua Carta Sindical.”

    É aliás, o que decidiu o Tribunal Superior do Trabalho, em caso de todo análogo:

    “A formação de Sindicato por desmembramento, inspirada no princípio fundamental de liberdade, inserido na esteira do artigo , da Constituição da República, não encontra óbice na existência de sindicato da mesma categoria profissional ou econômica com base intermunicipal ou interestadual, mesmo fundado anteriormente, pois a secessão de empresários ou de trabalhadores localizados em um ou mais de um município que integravam a base territorial anterior, não ofende o princípio constitucional da unicidade, exatamente por atender ao princípio superior de liberdade, consagrado universalmente e adotado pela convenção n. 87 da OIT.” (TST - RO - DC 57.414/92 - Ac. SDC 493/94).

    CONCLUSÃO

    Dúvida não pode haver de que as regras celetistas, concernentes à organização sindical, hão de ser interpretadas em consonância com as atuais disposições constitucionais, manifestamente inspiradas na liberdade de associação sindical, admitindo, nas hipóteses mencionadas, a dissociação, com a criação de novas entidades, observado, no primeiro caso, (sindicatos intermunicipais ou interestaduais), o limite do município do sindicato anterior e, na segunda hipótese, (atividades específicas), com a criação de sindicatos efetivamente representativos da respectiva atividade, ainda na mesma localidade do antigo sindicato.

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