Ecad poderá cobrar direitos autorais de rádio gaúcha
"Inócua eventual renúncia de artistas regionais quanto aos direitos autorais a que fariam jus em troca da difusão de suas composições pela rádio demandada"
A ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou seguimento a um recurso que pretendia contestar cobrança do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). A Empresa Radiofônica Ouro Branco, proprietária da Rádio Popular de Teotônia (RS), alegou que compositores regionais renunciaram aos direitos autorais, o que impediria a exigência do pagamento por parte da entidade.
No Brasil, o Ecad é responsável por questões relativas a cobranças de direitos autorais. Instituído pela Lei Federal nº 5.988 /73, foi criado pelas associações de titulares de direitos autorais e conexos e mantida pela atual Lei de Direitos Autorais brasileira (9.610/98). Em 2004, o Ecad arrecadou mais de R$ 227 milhões.
O Ecad ingressou com uma ação de cobrança contra a empresa Ouro Branco. Em primeira instância, o pedido foi acolhido. A rádio não se conformou e apelou ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS), mas não teve sucesso.
Apresentou, então, recurso ao STJ, que acabou determinando ao Tribunal estadual o recálculo do valor a ser cobrado pelo Ecad. Ocorre que, ao apreciar novamente a questão, os desembargadores entenderam que era "inócua a renúncia de artistas regionais quanto aos direitos autorais a que fariam jus", porque o critério utilizado para cálculos mensais devidos pela rádio tomou por base a região sócio-econômica da transmissora, o nível populacional local e a potência da antena emissora.
A empresa Ouro Branco recorreu novamente no STJ, insistindo que a renúncia pelos compositores dos direitos autorais impediria a cobrança. Para sustentar a argumentação, citou o precedente do recurso especial julgado anteriormente (REsp 221.621) , segundo o qual o fato de a rádio também transmitir músicas de outros compositores que não haviam renunciado a seus direitos autorais não era justificativa para a cobrança do direito autoral relativo aos compositores que renunciaram a ele.
A ministra Nancy Andrighi constatou que os fundamentos utilizados na decisao do TJ/RS para justificar a manutenção da procedência do pedido do Ecad não foram discutidos na decisão do recurso especial invocado (Resp 221.621) , o que impede o reconhecimento de dissídio jurisprudencial. Para caracterizar-se o dissídio jurisprudencial é necessário que a decisão tida por paradigma (aquela que se invoca) trate de fatos semelhantes aos da decisão que se pretende reformar. A ministra Nancy também não concordou com as alegações de violações da lei que instituiu o Ecad.
Processo: REsp 777854
Leia, abaixo, a íntegra da decisão:
"Superior Tribunal de JustiçaRECURSO ESPECIAL Nº 777.854 - RS (2005/0144454-5) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHIRECORRENTE : EMPRESA RADIOFÔNICA OURO BRANCO LTDAADVOGADO : PEDRO ROBERTO MULLER E OUTROSRECORRIDO : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO- ECADADVOGADO : EDUARDO PEREIRA GUEDES E OUTROEMENTARecurso especial. Cobrança de direitos autorais. Renúncia. Dissídio nãodemonstrado. Ausência de impugnação específica.- Não se reconhece o dissídio jurisprudencial quando o acórdão paradigma não tratou da questão controvertida discutida no acórdão recorrido.- Inviável o recurso especial se o recorrente deixa de impugnar, de forma específica, os fundamentos apresentados no acórdão recorrido.Negado seguimento ao recurso especial.DECISÃORecurso especial interposto por EMPRESA RADIOFÔNICA OUROBRANCO LTDA, com fundamento nas alíneas a ec do permissivo constitucional.Ação: cobrança proposta pelo ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD em desfavor da empresa recorrente.Sentença: julgou procedente o pedido.Acórdão: negou provimento ao recurso de apelação interposto pela recorrente (fls. 606).Embargos de declaração: rejeitados.Recurso especial: provido, sendo determinada a remessa dos autos ao Tribunal de origem para que fosse suprida a omissão constatada no julgamento.Novo acórdão: acolheu parcialmente os embargos de declaração interpostos pela recorrente, nos termos da ementa que se segue:
"EMBARGOS DECLARATÓRIOS. ECAD. COBRANÇA DASCONTRIBUIÇÕES RELATIVAS A DIREITOS AUTORAIS. RENÚNCIA DEMÚSICOS REGIONAIS. CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO. CRITÉRIO DEFREQÜÊNCIA DA TRANSMISSÃO SONORA.1. Desacolhidos inicialmente os embargos declaratórios, mas admitido e provido recurso especial, retorna a matéria discutida à Câmara, para ser reapreciada sob nova relatoria, ante omissão.2. O critério utilizado no caso concreto para cálculo das contribuições mensais devidas pela ré, empresa de radiodifusão, tomou por base a região sócio-econômico da transmissora, o nível populacional local e a potência da antena emissora. Dessa forma, inócua eventual renúncia deartistas regionais quanto aos direitos autorais a que fariam jus em troca da difusão de suas composições pela rádio demandada.Procedência da demanda que se impõe, nos termos do pedido inicial.Embargos declaratórios acolhidos em parte"(fls. 666).Recurso especial: alega a recorrente dissídio jurisprudencial e violação aos arts. 73 e 104 da Lei 5.988 /73, sustentando que a renúncia pelos compositores dos direitos autorais impede a cobrança pelo ECAD.Às fls. 694 e 695 , decisão admitindo o especial.Relatado o processo, decide-se.- Da cobrança dos direitos autorais - arts. 73 e 104 da Lei 5.988 /73 e dissídio jurisprudencialA recorrente alçou a paradigma acórdão deste Tribunal proferido no Resp 221621 , da relatoria do e. Min. Eduardo Ribeiro, pub. no DJ de 16.08.99.Entretanto, constata-se que os fundamentos utilizados no acórdão recorrido para justificar a manutenção da procedência do pedido não foram discutidos no acórdão paradigma, que apresentou argumento diverso.
No acórdão paradigma entendeu-se que o fato de a empresa radiofônica também transmitir músicas de outros compositores, que não haviam renunciado a seus direitos autorais, não era justificativa para a cobrança do direito autoral relativo aos compositores que o renunciaram. Confira-se trecho do referido acórdão:
"O acórdão admitiu, incorporando a sentença, que parte dos autores das obras musicais abrira mãos de seus direitos autorais, em favor da ré. Não acolheu a defesa, entretanto, porque essa transmitia também músicas de autores de outras regiões. Ademais, o pagamento dos direitos seria imposto por lei. Desse modo, havendo aquele acordo com o autor da obra, dessehaveria de ser exigido o reembolso.
Com a devida vênia, não me parece correta essa fundamentação. Lícito ao compositor ou executante da obra dispor de seu direito. O ECAD age em seu nome. Se o titular do direito renuncia, não pode haver cobrança. É o que se depreende dos dispositivos invocados".Contudo, no acórdão recorrido, o Tribunal de origem sustentou que a renúncia dos direitos autorais por alguns compositores não interferia na cobrança promovida pelo ECAD, pois o valor cobrado era calculado em função de percentual incidente sobre a receita bruta, e levava em conta os seguintes parâmetros: região sócio-econômica da transmissora, nível populacional e potência da antena emissora.Constata-se, assim, ser inviável reconhecer o apontado dissídio jurisprudencial,considerando que o acórdão paradigma não discutiu a questão controvertida tratada noacórdão recorrido.Por fim, quanto à alegada violação aos arts. 73 e 104 da Lei 5.988 /73, também não merece prosperar o recurso especial, pois o recorrente deixou de refutar, de formaespecífica, os fundamentos do acórdão recorrido, o que atrai a incidência da Súmula 283 /STJ.Forte em tais razões, nos termos do art. 557 do CPC , nego seguimento aorecurso especial.
Publique-se e intimem-se.Brasília (DF), 03 de fevereiro de 2006.MINISTRA NANCY ANDRIGHIRelatora"
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