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15 de Junho de 2024
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    Inconstitucionalidade da Redução da Imputabilidade Penal

    há 9 anos

    Nota Técnica

    É corrente entre doutrina que o art. 228 da Constituição Federal é cláusula pétrea, portanto, não suscetível a alteração de seu texto.

    O entendimento se sustenta na medida em que a opção pela idade penal aos 18 anos constituiu-se em opção política, recomendada pelo art. 1. da Convenção dos Direitos da Criança das Nações Unidas, da qual o Brasil é signatário.

    O art. 227 da Constituição Federal inaugurou uma nova fase na compreensão do direito da criança e do adolescente, ao adotar a doutrina da proteção integral, o Brasil passou a visualizar a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento e por isso destinatárias da “proteção integral” que é dever de todos e única prioridade absoluta no texto constitucional. Nessa linha, é plasmado que toda a pessoa menor de 18 anos de idade merece a proteção do Estado, da família e da sociedade, uma norma inegavelmente garantidora de direitos a todos que possuem de 0 a 18 anos incompletos. Mais, tal norma remete ao Estatuto da Criança e do Adolescente, e, por conseguinte, ao sistema socioeducativo, que também assegura a responsabilidade infracional, mas com a aplicação de medida com conteúdo pedagógico, garantindo o olhar de proteção, sem descuidar da repressão aos atos infracionais.

    Como norma garantidora de direitos e opção política do constituinte lastreada no art. 1. da Convenção de Direitos da Criança, o art. 228 é o que dá o limite a proteção especial, definindo 18 anos como maioridade. Reputa-se de todo evidente que tal norma é também garantidora do direito à liberdade e desdobramento do princípio da dignidade humana. Não é crível imaginar que o legislador constituinte admitisse a retirada de direitos que se constituem em prioridade absoluta por emenda constitucional supressiva ou modificativa, em especial quando à opção política pelos 18 anos se fundamenta em convenção internacional que trata de direitos humanos (art. 5, parágrafos 2. e 3., CRFB). Admitir tal possibilidade equivale a alterar o cerne constitucional, pois violaria também os princípios que fundamentam a carta, vetores de interpretação da Constituição e da legislação infraconstitucional. Significa também uma clara violação a prioridade absoluta definida no art. 227 da Constituição Federal.

    Não bastasse o exposto, o art. 6. da Constituição Federal, que enumera os direitos sociais, também elenca os direitos da infância, de forma que há, igualmente, o entendimento jurisprudencial e doutrinário referente ao princípio da vedação ao retrocesso social, nesse sentido J. J. Gomes Canotilho: ‘O princípio da proibição do retrocesso social pode formularse assim: o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas legislativas deve considerarse constitucionalmente garantido, sendo inconstitucionais quaisquer medidas que, sem a criação de esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam na prática em uma anulação, revogação ou aniquilação pura e simples desse núcleo essencial. A liberdade do legislador tem como limite o núcleo essencial já realizado.’

    Assim, não apenas pelo fato – evidente – que não é possível a supressão de garantias afetas a dignidade humana e a direitos fundamentais, como direito à liberdade – que fundamentam o art. 228 da CRFB – mas o fato de que direitos da infância são também direitos sociais, sujeitos a proteção especial e, portanto, a vedação ao retrocesso. Tal princípio significa que onde a legislação do país avançou, não há possibilidade de retroceder. A idade penal aos 18 anos é avanço, destaca-se que apenas 17% dos países do mundo possuem a idade penal inferior aos 18 anos de idade; destarte, o Brasil não só acompanha a recomendação das Nações Unidas, como também a tendência mundial.

    Importa assinalar, ainda, que a fundamentabilidade material de um direito na Constituição não depende de uma posição topológica (inserção no catálogo – art. 5. da CRFB), pois localizável em qualquer parte do texto constitucional. A sua caracterização depende da relevância que lhe foi atribuída e da sua imbricação com direito ou princípio que integre o núcleo essencial da Carta Magna. A Corte Constitucional assim entendeu no julgamento da ADI 939, ao julgar questão de matéria tributária, definiu que: a) restou inquestionável a possibilidade da existência de direitos fundamentais fora do catálogo; b) a unidade sistêmica da Constituição deve ser preservada, pois os princípios e direitos fundamentais apresentam íntima ligação, não podendo ocorrer uma visão da Constituição que não abranja o seu todo, devendo haver respeito incondicional aos princípios que informam a Carta Magna; c) os limites materiais de reforma não podem ser minimizados pela existência de exceções previstas no próprio texto constitucional; d) todas as exceções feitas pelo Constituinte originário são no exercício de uma competência incondicionada e que não se transfere ao Poder Reformador, pois este é, por natureza, subordinado; e) a abrangência da cláusula de intagibilidade do art. 60, § 4º, IV é ampla, pois vai além dos direitos e garantias estritamente pessoais, açambarcando, pelo menos, os chamados direitos de primeira e segunda gerações ou dimensões; f) a possibilidade de alteração do núcleo essencial de direito fundamental que constitui cláusula pétrea tem de ser vista de forma restritiva, sob pena de esvaziamento do direito por novas e sucessivas reformas; g) toda emenda constitucional, por não emanar de poder originário, é suscetível de controle de constitucionalidade. E se o Supremo Tribunal Federal assim entendeu em uma questão tributária, com maior razão não permitirá a supressão de direitos afetos à dignidade e à liberdade da pessoa humana (COUTO TERRA, E. , A idade penal mínima como cláusula pétrea e a proteção do Estado Democratico de Direito contra o retrocesso social, 2001, Dissertação p. 112; Mestrado – Centro de Ciências Jurídicas e Sociais -, Universidade Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo – RS).

    O artigo 228, ao estabelecer a idade mínima para a imputabilidade penal, assegura a todos os cidadãos menores de dezoito anos uma posição jurídica subjetiva, qual seja, a condição de inimputável diante do sistema penal. E tal posição, por sua vez, gera uma posição jurídica objetiva: a de ter a condição de inimputável respeitada pelo Estado. Assim, tal artigo, constituí-se em típica função de defesa contra o Estado, garantia individual e, portanto, insuscetível de qualquer forma de modificação, é cláusula pétrea. i Apud GARCIA, Sérgio Renato Tejada. O princípio da vedação de retrocesso.

    Anadep - Associação Nacional dos Defensores Públicos

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