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7 de Maio de 2024

Inovações na contagem de prazos no projeto do novo CPC

há 9 anos

Por Luiz R. Wambier

Inovaes na contagem de prazos no projeto do novo CPC

A questão relativa aos prazos é um verdadeiro problema para todos os que trabalham com o processo civil. Prazos impróprios para o juiz; prazos próprios (e fatais, portanto) para as partes. Trata-se de tema que desafia a criatividade do legislador.

O Projeto do Novo Código de Processo Civil contém várias interessantes propostas inovadoras a respeito.

Vou tecer algumas considerações a respeito de três dessas propostas, registrando, evidentemente, que, como em quase todos os temas da vida, aqui também a unanimidade no aplauso à iniciativa do legislador está distante de acontecer.

A primeira das propostas a ser analisada é a que de certo modo uniformiza os prazos para a interposição das mais variadas modalidades de recursos.

Prevê o art. 1.007, § 1º, do Projeto de CPC, que à exceção dos embargos de declaração, todos os demais recursos estão sujeitos a prazo de quinze dias, tanto para sua interposição quanto para a resposta.

É um avanço em favor da melhor gestão dos prazos, na medida em que elimina o excessivo número de prazos díspares, para diferentes modalidades de recursos. Além desse fator, há outro, relevantíssimo, porque ligado ao princípio da isonomia. É que há decisões agraváveis (hoje, 10 dias), apesar de se constituírem em decisões que, na sua essência, são sentenças. Exemplo disso é a decisão que resolve a liquidação de sentença, que é agravável, embora tenha conteúdo de sentença.

Os efeitos dessa mudança certamente serão benéficos, na medida em que prestigiada estará a igualdade de tratamento das partes, quanto aos prazos, inclusive, quando de diferentes espécies de decisão jurisdicional se tratar (decisões interlocutórias ou sentença), mas que, por opção legislativa, contenham, ambas, conteúdo decisório de igual intensidade.

A segunda proposta que, sei, tem despertado muita polêmica, e justamente em razão disso é que a ela dedicarei mais espaço, é a que está contida no art. 219. De acordo com esse dispositivo, quando a contagem do prazo se der em dias, previsto na lei ou fixado pelo juiz, “computar-se-ão somente os úteis”.

Há três principais argumentos contrários: o primeiro é o de que haveria muita confusão na contagem desses prazos, o que dificultaria o controle por parte dos órgãos judiciários. Reconheço que, a viger essa norma, ao menos no início poderia ocorrer algum tipo de confusão. É assim que ocorre, via de regra, com qualquer novidade que nos faça sair da zona de conforto. Acredito, todavia, que as vantagens advindas do novo método compensaria, com sobras, os eventuais problemas.

Ademais, a contagem em dias úteis não seria dirigida, se aprovada, apenas para aqueles que têm sido apontados como os seus grandes beneficiários, ou seja, os advogados. Juízes, peritos judiciais e todos quantos estejam sujeitos ao cumprimento de prazos, ainda que de prazos impróprios se trate, também serão beneficiados pela “folga” nos fins de semana.

O segundo argumento contrário, que entendo constituir a grande virtude dessa proposta, é a de que tratar-se-ia de alteração destinada a beneficiar apenas uma das classes profissionais envolvidas no processo, isto é, a classe dos advogados. Não é verdade. Todos aqueles que estejam sujeitos ao cumprimento de prazos dessa prerrogativa poderão fazer uso. Assim, a norma atingirá a advogados, membros do Ministério Público, Procuradores públicos e autárquicos, Defensores públicos e todos os que estejam sujeitos aos prazos impróprios estarão sujeitos à contagem de acordo com esse novo método, que exclui do cômputo do prazo os dias feriados e finais de semana.

Trata-se de medida que tem forte caráter de prestígio às classes profissionais sujeitas ao cumprimento de prazos impróprios e, ao meu ver, nada há de ilegítimo na proposta. Ao contrário, preservar-se-ão, quando vigente, os dias de descanso de enorme gama de profissionais, em respeito, até mesmo, à dignidade e incolumidade desses profissionais. Penso no caso dos advogados que exercem solitariamente sua atividade, ou que a exercem em pequenas sociedades, inclusive em sociedades familiares. Penso, também, nos Promotores de Justiça e Defensores Públicos que exerçam suas funções em Comarcas que não disponham de outros profissionais com os quais possa haver divisão de encargos.

A última das três grandes críticas, que me permito combater vigorosamente, é a que diz tratar-se de “regalia” dos profissionais em detrimento da celeridade do processo.

Não concordo, e isso já sustentei em inúmeros textos, com a visão cínica segundo a qual aos prazos ou à quantidade de recursos se devam debitar as mazelas do processo, notadamente aquelas que dizem respeito à sua possível morosidade. Há inúmeras causas culturais e estruturais que levam o processo à situação de prestação de serviço público feita, às vezes, a destempo. Cito algumas dessas questões, que são arrigadas na nossa cultura: a principal delas, a meu ver, é burocracia e seus múltiplos e nefastos efeitos.

A burocracia gera uma série de comportamos que em nada contribuem para o bom desempenho de qualquer tipo de procedimento, seja no plano do processo judicial ou no do administrativo, inclusive no plano privado.

Temos exemplos históricos disso. Há algumas décadas, o candidato à obtenção de algum benefício previdenciário devia provar a insólita condição de estar vivo, mediante a apresentação do velho e felizmente afastado “atestado de vida”.

A ausência da boa-fé, como regra motriz dos relacionamentos pessoais, institucionais, negociais e de qualquer espécie, também parece contribuir decididamente para que nos cerquemos de mais e mais “garantias” quanto à conduta do outro. Partimos, na generalidade dos casos, da desconfiança. Logo em seguida a mentalidade burocrática nos sugere inúmeros mecanismos que nos fazem exigir prova antecipada da boa-fé, mediante certificação pública (certidões e mais certidões).

A falta de mecanismos eficientes de controle e de gestão do processo certamente é outra causa da demora em sua tramitação. Não somos versados nesses temas e não nos servimos, como regra, de experts que, certamente, muito poderiam contribuir com sua carga de conhecimentos nos planos da organização de procedimentos, logística etc, para que ao processo se pudesse imprimir maior velocidade. E a questão logística (para usar uma palavra que, ao meu ver, engloba, expressivamente, muitas questões) não está ligada apenas ao processo em papel, mas também ao processo virtual, na medida em que, aparelhados com informações originadas e testadas em outras áreas do saber, possamos dele extrair melhores resultados, em termos de eficiência e produtividade.

Há, portanto, uma série de causas que estão entranhadas em nossa cultura, determinantes da paralisia ou, quando pouco, da morosidade dos procedimentos em muitas instituições.

Uma pequena quantidade de fins de semana que se excluam da contagem dos prazos não será determinante para a tão propalada morosidade.

A terceira proposta resolve um problema que tem-se repetido ultimamente, na jurisprudência: me refiro à que institui a regra constante do § 4º do art. 218. De acordo com esse dispositivo, o ato processual que venha a ser praticado antes do início da contagem do prazo respectivo, será considerado tempestivo.

Tem sido intensa a discussão a respeito da possível precocidade dos atos processuais, notadamente no que diz respeito à interposição dos recursos. A parte diligente, que se adianta à intimação que dará início à contagem do prazo, costuma ser penalizada porque estaria agindo extemporaneamente.

Todo recurso interposto depois do final do prazo é, por óbvio, intempestivo.

O problema está no equívoco consistente em se entender como intempestivo também o recurso interposto antes do início do prazo.

Como afirmamos (eu e Teresa Wambier, no Tratado Jurisprudencial e Doutrinário, vol. III, RT, 2013, p. 30, “a vigilância da parte deve ser valorizada, até mesmo em atenção ao princípio da economia processual, eis que, interpondo o recurso antes da intimação, nenhum prejuízo acarreta para a parte contrária ou para a administração da justiça”.

De fato, desde que a decisão seja conhecida pela parte e se estiverem presentes os requisitos gerais e específicos de recorribilidade (sucumbência etc), nada justifica que a parte seja impedida (ou penalizada) de interpor o recurso antes mesmo do início do prazo a que corresponda o recurso cabível à espécie.

Trouxe, neste pequeno ensaio, algumas considerações que espero sejam úteis para a compreensão de algumas das propostas contidas no Projeto do Novo Código de Processo Civil.

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Muito esclarecedor. continuar lendo