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1 de Junho de 2024
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    Lay Off - Condenação Inédita

    Publicado por Samantha Marques
    há 5 anos

    Das diferenças salariaise da indenização por danos morais - lay off

    A figura do lay off é pela primeira vez debatida em Devonal v Rosser & Sons Ltd, onde se discutia a possibilidade de se dispensar o empregador do pagamento de salários a seus trabalhadores em decorrência de falta de serviços durante um período de depressão no mercado. Em sua decisão, o Lord Alverstone CJ ponderou que o empregador não pode se excusar por não cumprir sua basilar obrigação de fornecer trabalho para os empregados, assentando que a forma pela qual o empresário organiza a prestação de serviços se mantém inteiramente em suas mãos.

    Simon Deakin40 afirma que não existe um direito inerente do empregador de lay off na common law, asseverando que uma vez suspensa a prestação de serviços os trabalhadores, prima facie, são credores de seus vencimentos. Consequentemente, para que emerja o direito do empregador de suspender o contrato de trabalho de seus empregados, deve existir uma razão externa que a justifique. Estas motivações estranhas ao empregador, ou mais especificamente, aquelas que o empregador pode apontar como fatores além de seu controle, passaram a ser admitidas em Minnevitch v Café de Paris (Londres) Ltd, observados parâmetros de razoabilidade em relação ao período de suspensão contratual. Este precedente é apontado como um daqueles que reconheceu o direito contratual ao lay off.

    Deste modo, ainda que se admita o caráter gestionário da medida, esta deve revestir-se de todas as cautelas legais exigidas para sua validade e implantação.

    No Brasil, o artigo 476-A da Consolidação das Leis do Trabalho regulamenta a hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho:

    "Artigo 476-A - O contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, com duração equivalente à suspensão contratual, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, observado o disposto no art. 471 desta Consolidação.

    § 1º. Após a autorização concedida por intermédio de convenção ou acordo coletivo, o empregador deverá notificar o respectivo sindicato, com antecedência mínima de quinze dias da suspensão contratual.

    § 2º. O contrato de trabalho não poderá ser suspenso em conformidade com o disposto no caput deste artigo mais de uma vez no período de dezesseis meses.

    § 3º. O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual nos termos do caput deste artigo, com valor a ser definido em convenção ou acordo coletivo.

    § 4º. Durante o período de suspensão contratual para participação em curso ou programa de qualificação profissional, o empregado fará jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador.

    § 5º. Se ocorrer a dispensa do empregado no transcurso do período de suspensão contratual ou nos três meses subseqüentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará ao empregado, além das parcelas indenizatórias previstas na legislação em vigor, multa a ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo, sendo de, no mínimo, cem por cento sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato.

    § 6º.Se durante a suspensão do contrato não for ministrado o curso ou programa de qualificação profissional, ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, ficará descaracterizada a suspensão, sujeitando o empregador ao pagamento imediato dos salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor, bem como às sanções previstas em convenção ou acordo coletivo.

    § 7º. O prazo limite fixado no caput poderá ser prorrogado mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, desde que o empregador arque com o ônus correspondente ao valor da bolsa de qualificação profissional, no respectivo período".

    Infere-se, portanto, com meridiana clareza que o artigo acima transcrito não admite a suspensão temporária do contrato de trabalho para fins de recuperação econômica do empresário, até porque este assume os riscos da atividade econômica, conforme previsão expressa do artigo da Consolidação das Leis do Trabalho.

    Tramita na Câmara dos Deputados projeto de Lei (Projeto de Lei 62 do Senado Federal, transformado em Projeto de Lei 1.875/2015 da Câmara dos Deputados) que prevê a possibilidade de suspensão temporária dos contratos de trabalho em decorrência de crise econômica, alterando a redação do artigo 476-A da Consolidação das Leis do Trabalho. Todavia, referido projeto não foi ainda votado em caráter final pela Câmara dos Deputados, tampouco sancionado pelo Poder Executivo. Não há, destarte, no ordenamento jurídico brasileiro autorização para a suspensão dos contratos de trabalho nos moldes pretendidos pela reclamada.

    A suspensão temporária do contrato de trabalho por crise econômica, não se confunde com o afastamento do trabalhador para aperfeiçoamento, posto que aquele pressupõe a falta de trabalho a ser fornecido pelo empregador, conforme salientado por Deakin41.

    Ainda que se admita que o artigo 476-A da Consolidação das Leis do Trabalho autorizou a suspensão temporária dos contratos de trabalho por motivos de ordem econômica do empregador, é certo, que, na lição de Antônio Monteiro Fernandes, trata-se de "forma atípica de suspensão do contrato de trabalho por razões ligadas à empresa"42, sendo correto afirmar que para a materialização desta modalidade de suspensão, devem ser observados os requisitos legalmente exigidos, posto que em Portugal existe expressa previsão legal autorizando esta modalidade de suspensão contratual. No Brasil, estes seriam previstos no artigo 476-A da Consolidação das Leis do Trabalho.

    A atipicidade desta forma de suspensão dos contratos de trabalho decorre, segundo o mesmo Autor, de não haver, como seu pressuposto, a impossibilidade material de prestação de serviços, uma vez que a atividade da empresa pode ser desenvolvida, somente se justificando este tipo de providência "para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho". O caráter atípico da suspensão temporária dos contratos de trabalho é sua "feição individualizada e selectiva", aproximando-a do despedimento coletivo, o que, por si só, justifica a preocupação do legislador com a participação do ente sindical para a validade destas negociações.

    No caso dos autos, não se vislumbra a possibilidade de inviabilidade da reclamada, posto que esta se constitui numa das maiores organizações empresariais do planeta e sequer cogitou, até o presente momento, no encerramento de suas atividades no Brasil, somente sendo mencionado o encerramento de algumas plantas industriais determinadas. Da mesma forma, os postos de trabalho não foram mantidos, posto que o próprio acordo coletivo prevê o lançamento de programa de desligamento motivado. Consequentemente, não existia justificativa para a implementação da suspensão temporária dos contratos de trabalho dos trabalhadores ali relacionados.

    Além disso, por se equiparar ao desligamento coletivo, posto que a suspensão nada mais é do que um despedimento com ulterior nova admissão, conforme Deakin43, não se afigura razoável que trabalhadores detentores de garantia de emprego, como a reclamante, fossem incluídas no rol daqueles sujeitos à suspensão.

    Consequentemente, a suspensão temporária do contrato de trabalho da reclamante afigura-se insustentável, devendo-se considerar que o período de afastamento foi de mera interrupção de seu contrato de trabalho.

    Como ensina Maurício Godinho Delgado44, as licenças remuneradas concedidas pelo empregador se constituem em interrupções do contrato de trabalho, sendo certo que "o principal efeito da interrupção contratual é, como visto, a sustação das obrigações contratuais mais relevantes do empregado durante o período interruptivo. Essencialmente sustam-se as obrigações obreiras de prestação laborativa e de disponibilidade perante o empregador. Desse modo, caracteriza a interrupção a continuidade de vigência de todas as obrigações contratuais, excetuadas as principais obrigações obreiras: prestação de serviços e disponibilidade perante o empregador. Mantém-se, pois, em vigência a plenitude das obrigações empresariais".

    Infere-se pela leitura dos documentos juntados aos autos e pelo apontamento efetuado pela parte autora em réplica, que durante o período de suspensão temporária do contrato de trabalho houve o prejuízo mencionado na petição inicial decorrente da incorreta apuração do valor da ajuda compensatória mensal quitada pela ré. Deste modo, procede o pedido inicial de pagamento de diferenças salariais do período de suspensão temporária do contrato de trabalho. Para a apuração do valor devido será observada a média dos doze meses anteriores à suspensão do contrato de trabalho da reclamante, multiplicando-se pelo valor do salário hora normal.

    Com relação aos descontos legais de imposto de renda e contribuições previdenciárias, estes ocorreriam mesmo na hipótese de não inclusão da obreira no lay off implantado pela reclamada, o mesmo ocorrendo em relação aos descontos por adiantamento salarial (este que acarretaria insustentável enriquecimento sem causa da reclamante), seguro saúde e seguro de vida não havendo que se falar em diferenças salariais decorrentes destes descontos.

    Deverá, ainda, a reclamada comprovar os recolhimentos de FGTS do período de suspensão dos contratos de trabalho da reclamante, cinco dias após o trânsito em julgado da presente decisão, sendo devidamente intimada, sob pena de execução e remessa dos valores ao órgão gestor do FGTS.

    Também caberá à ré o recolhimento das contribuições previdenciárias do período.

    São pressupostos da responsabilidade subjetiva ou clássica: 1) ação ou omissão do agente; 2) culpa ou dolo do agente; 3) relação de causalidade e 4) dano experimentado pela vítima.

    Vincula-se a reparação do dano a um comportamento humano positivo ou negativo ilícito, ou seja, um ato violador de dever contratual, legal ou social.

    Emerge o segundo pressuposto da responsabilidade civil, na lição do Magistrado Rogério Marrone de Castro Sampaio45: "do dever imposto a todo homem que vive em sociedade de conduzir-se de modo a não lesar bens jurídicos alheios. Deve, portanto, não só agir com fins lícitos, mas também tomar as cautelas necessárias para evitar danos a terceiros. E, ao desviar desse comportamento cauteloso, conduzindo-se de maneira imprudente, negligente ou imperita, dá causa ao resultado danos, revestindo seu comportamento de ilicitude e contraindo, por consequência, o dever de indenizar a vítima.".

    Sílvio Rodrigues46 ensina que "o segundo elemento, diria, o segundo pressuposto para caracterizar a responsabilidade pela reparação do dano é a culpa ou dolo do agente que causou o prejuízo", esclarecendo que "em rigor, na ideia de negligência se inclui a de imprudência, bem como a de imperícia. Pois aquele que age com imprudência, negligencia em tomar as medidas de precaução aconselhadas para a situação em foco; como, também, a pessoa que se propõe a realizar uma tarefa que requer conhecimentos especializados ou alguma habilitação e a executa sem ter aqueles ou esta, obviamente negligenciou em obedecer às regras de sua profissão e arte; todos agiram culposamente".

    Prossegue o Tratadista: "ordinariamente, para que a vítima obtenha a indenização, deverá provar entre outras coisas que o agente causador do dano agiu culposamente".

    O terceiro requisito ou pressuposto para o nascimento da obrigação decorrente de ato ilícito é a existência do nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo ofendido e a alegada ação do ofensor. Neste sentido a lição de Sílvio Rodrigues47: "para que surja a obrigação de reparar, mister se faz a prova da existência de uma relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano experimentado pela vítima. Se a vítima experimentar um dano, mas não se evidenciar que o mesmo resultou do comportamento ou da atitude do réu, o pedido de indenização, formulado por aquela, deverá ser julgado improcedente".

    Portanto, para o deferimento de indenização por ato ilícito, necessário que o prejudicado demonstre ao Juízo a existência de dolo ou culpa do agressor, assim como a existência de nexo de causalidade entre a ação ou omissão do agente e o prejuízo sofrido pela vítima. Cumpria, destarte, à reclamante o ônus de comprovar que a reclamada se desviou de um comportamento cauteloso exigido para não causar prejuízos a terceiros, assim como que desse comportamento decorreu o dano mencionado exordialmente.

    No caso dos autos, aduz a reclamante que a implementação de Lay Off pela reclamada decorre de ato discriminatório em relação aos empregados selecionados, em sua maioria com restrições médicas, ou seja, que já perceberam ou que percebem benefício previdenciário (B94, B91 e B31).

    Para o deslinde da questão, e como prova do Juízo, determinou-se à reclamada que em dez dias apresentasse o número de PIS dos trabalhadores incluídos no programa, tomando-se por amostragem a relação de fls. 71, sob pena de confissão em relação à alegada discriminação (fls. 773), determinação reiterada no despacho de fls. 826, com autorização de sigilo. A ré quedou-se silente pelo que é considerada confessa, restando o Juízo convencido da veracidade da alegação de que a maioria dos empregados em Lay Off eram portadores de restrições médicas, com percebimento de benefício previdenciário, como o caso da autora.

    Diante disso, é notória a atitude discriminatória da empresa ao estabelecer para o afastamentocritério que leva em conta condição pessoal incapacitante como no caso da laboreira, portadora de doença profissional, que, inclusive, foi gerada pela atividade desempenhada em seu favor. A situação se agrava ao se considerar que não se trata de empregada em risco de perda de posto de trabalho.

    Da ação da ré emergiu o alegado dano moral sofrido pela autora, restando patente o nexo de causalidade.

    A moderna doutrina tem admitido a existência de dano moral naqueles casos em que há afronta a direito personalíssimo do ofendido, podendo o mesmo ser configurado nas seguintes espécies: dano estético; dano à intimidade; dano à vida de relação (honra, dignidade, honestidade, imagem, nome); dano biológico; dano psíquico.

    No caso dos autos, restou demonstrada a atitude discriminatória da empresa em relação à reclamante, que em razão de sua condição de portadora de doença profissional foi incluída no Lay Off, gerando à trabalhadora estigma relativo à sua condição incapacitante, ferindo, deste modo, sua dignidade. Houve, portanto, mácula à honra da autora, de forma que é devida a reparação moral, conforme artigo 5o, X, da Constituição Federal, vez que presentes os requisitos da responsabilidade civil.

    Não há nos autos prova da existência de qualquer das excludentes de responsabilidade, quais sejam: culpa exclusiva da vítima; fato de terceiro; caso fortuito ou força maior; cláusula de não indenizar; estado de necessidade ou legítima defesa.

    Para a apuração do montante devido a título de danos morais, devem ser observados o grau de culpa do agente bem sua capacidade econômica, sendo certo que esta é importante no sentido de se evitar que o autor do ato ilícito volte a causar o mesmo prejuízo para outras pessoas, trata-se, portanto, de penalidade com cunho pedagógico. Por outro lado, a indenização deve ser suficiente para minimizar o sofrimento da vítima, arbitrável de acordo com a prudente estimativa do julgador48.

    No caso dos autos, como já afirmado, a reclamada é uma das maiores corporações do planeta, de forma que a indenização a ser arbitrada não pode ser reduzida a ponto de encorajar futuras atitudes semelhantes à presente.

    A fixação do dano extrapatrimonial, destarte não pode se pautar em um referencial meramente econômico, como os vencimentos do trabalhador, posto que admitir-se esta forma de estipulação criaria um paradoxal sistema ressarcitório49, onde seria possível que os herdeiros de um diretor de uma empresa, viúvo, idoso e sem filhos, morto num mesmo acidente de um jovem motorista, casado e pai de dois filhos, recebessem uma indenização por danos morais, decorrentes deste acidente, substancialmente superior àquela dos herdeiros deste último, afrontando a diretriz do artigo , V, da Constituição Federal, uma vez que não haveria proporcionalidade entre as ofensas e as compensações porventura fixadas. Este, aliás, foi o entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 130/DF que declarou a não recepção da Lei 5.250/67, que estabelecia critérios tarifados de estipulação das indenizações por danos morais50.

    Deste modo, fixo em R$30.000,00 (trinta mil reais) a indenização por danos morais devida.

    Os juros de mora e a correção monetária serão computados a partir da data da fixação dos danos (Súmula 362 do STJ).

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/lay-off-condenacao-inedita/784801263

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