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24 de Maio de 2024
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    O impasse na interpretação do artigo 369 do CPP

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 16 anos

    O impasse na interpretação do artigo 369 do CPP

    É difícil dizer qual é o principal problema da mini-reforma do Código de Processo Penal . De todo modo, uma coisa é certa: para os que são contra e para os que são a favor, o mercado editorial tem sido generoso, com dezenas de publicações, todas buscando separar o joio do trigo (com muitos deles ficando com o joio). Umas das partes mais conturbadas — que, paradoxalmente, não tem recebido a necessária crítica — reside na insistência do legislador em apostar “todas as suas fichas” no protagonismo judicial.

    Mesmo aquelas críticas mais contundentes ao sistema inquisitório não se apercebem da ligação umbilical entre “sistema inquisitório, positivismo jurídico e discricionariedade judicial” (no direito processual penal, Jacinto Coutinho vem travando uma luta sem fronteiras contra esse “solipsismo processualístico”, porque atinge o cerne do problema: o paradigma representacional).

    Por tudo isso, sempre é bom lembrar — na esteira do que também vem trabalhando essa nova e sofisticada safra de estudiosos da ciência processual, como Flaviane Barros, Dierle Nunes, André Cordeiro Leal e Marcelo Cattoni — que desde Oskar von Büllow — questão que também pode ser vista em Anton Menger e Franz Klein —, a relação publicística vem sendo lastreada na figura do juiz, “porta-voz avançado do sentimento jurídico do povo”, com poderes para criar direito mesmo contra legem, tese que viabilizou, na seqüência, a Escola do Direito Livre.

    Essa aposta solipsista está sustentada no paradigma representacional, que atravessa dois séculos, podendo facilmente ser percebida em Chiovenda, para quem a vontade concreta da lei é aquilo que o juiz afirma ser a vontade concreta da lei; em Carnelutti, de cuja obra se depreende que a jurisdição é “prover”, “fazer o que seja necessário”; também emCouture, para o qual, a partir de sua visão intuitiva e subjetivista, chega a dizer que “o problema da escolha do juiz é, em definitivo, o problema da justiça”; em Liebman, para quem o juiz, no exercício da jurisdição, é livre de vínculos enquanto intérprete qualificado da lei; já no Brasil, afora a doutrina que atravessou o século XX (v.g., de Carlos Maximiliano a Paulo Dourado de Gusmão), tais questões estão presentes na concepção instrumentalista do processo, cujos defensores admitem a existência de escopos metajurídicos, estando permitido ao juiz realizar determinações jurídicas, mesmo que não contidas no direito legislado, com o que o aperfeiçoamento do sistema jurídico dependerá da “boa escolha dos juízes” e, conseqüentemente, de seu (“sadio”) protagonismo.

    Sob outra perspectiva, esse fenômeno se repete no direito civil, a partir da defesa, por parte da maioria da doutrina, do poder interpretativo dos juízes nas cláusulas gerais, que devem ser preenchidas com amplo “subjetivismo” e “ideologicamente”; no processo penal, não passa despercebida a continuidade da força do “princípio” da verdade real e do livre convencimento; já no direito constitucional, essa perspectiva é perceptível pela utilização descriteriosa dos princípios, transformados em “álibis persuasivos”; com isso, cinde-se a interpretação: para os casos fáceis, aplicam-se as regras mediante a subsunção (sic); já os casos difíceis abrem espaço para o uso da ponderação de princípios (como se pondera, afinal?), circunstância que, uma vez mais, fortalece o protagonismo judicial. Portanto, é impossível discutir as (mini) reformas — tanto processual penal como processual civil — sem um ataque ao núcleo do problema.

    Na especificidade, uma das partes da aludida mini-reforma que mais chamou a atenção da comunidade jurídica foi a alteração produzida no artigo 396, a partir da qual, a pretexto de atender as antigas demandas em relação à “formação do processo”, criou-se uma “duplicidade” de momentos para o recebimento da denúncia ou queixa. Vem, então, a questão: como (con) viver com esse proto bis in idem?

    Algumas soluções já foram propostas, por considerarem incompatíveis as disposições previstas nos artigos 396 e 399 do Código de Processo Penal . Para explicar: o art. 396 determina o recebimento da denúncia e a citação (sic) do acusado (sic) para oferecimento de defesa; só então haverá o “definitivo” recebimento da peça acusatória (agora já estamos falando do art. 399).

    Criado o problema, põe-se o debate. De um lado, Geraldo Prado assevera que ou a inicial será recebida em seguida ao seu oferecimento ou será recebida após a citação e, conseqüentemente, também após a apresentação de resposta/defesa prévia. Como solução, Prado propõe o “sacrifício parcial” da primeira norma — propondo uma saída nitidamente pragmatista —, visto que indispensável ao recebimento da denúncia o contraditório representado pela defesa prévia.

    De outro lado, Antônio Scarance Fernandes critica a técnica legislativa, mas concorda com a finalidade prevista na nova Lei. Nesta linha, observa que, pela reforma do art. 396, em sua combinação com o artigo 399 , há dois atos distintos, ambos com a finalidade de análise da possibilidade de ser aceita a acusação. Haveria, assim, para ele, um recebimento preliminar ou provisório, do qual decorreria a citação para apresentação de resposta (artigo 396) e um recebimento definitivo quando da análise efetiva da admissibilidade da acusação. Destaca, pois, a existência de dois juízos de admissibilidade.

    Tais soluções, contudo — embora Geraldo Prado esteja mais próximo da solução — não adentram o cerne da questão, qual seja, o problema ocasionado pela redação do novo dispositivo, que trata da possibilidade de se iniciar o processo, após o recebimento da denúncia ou queixa e da citação (art. 396), antes da apresentação de resposta ou defesa prévia. Não pode haver o “sacrifício parcial” da primeira norma (fase) e também não pode ocorrer a concomitância de dois juízos de admissibilidade. Veja-se: o artigo 396 diz que, oferecida a denúncia (ou queixa), o juiz, não a rejeitando in limine, deve recebê-la, ordenando, em seguida, a citação do acusado para o oferecimento da resposta.

    De pronto, dois problemas: o processo somente se completa com a citação válida; logo, já haverá processo desde a “saída”? É um “processo provisório”? Repetindo: se há ordenação de citação e ela sendo efetivada, em seguida, há formação do processo; mais ainda, a lei já chama o suposto criminoso de “acusado”. Consequentemente, há um “limbo” entre “duas admissibilidades acusatórias” Ora, se já há processo, em face da existência de uma citação e já se chama o indigitado de acusado, então esta é uma primeira fase, que Scarance chama, ao meu sentir, indevidamente, de “provisória”.

    A questão é saber por que razão e sob qual fundamento deve existir uma fase anterior em que se recebe “parcialmente” a denúncia (ou queixa) para, depois, existir uma fase em que a denúncia (ou a queixa) é “totalmente” recebida.

    Perceba-se, desde logo, outro problema que surge a partir da atecnia legislativa que diz respeito ao momento em que será interrompida a prescrição. Com efeito, consoante estabelece o artigo 117 do Código...

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