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16 de Junho de 2024
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    Os 30 Anos da Constituição Cidadã - entre a constância e a mudança

    Leia abaixo o artigo do desembargador Luis Carlos Gambogi sobre os 30 anos da Constituição brasileira, completada neste 5 de outubro de 2018.

    Celebremos os 30 anos da Constituição da República de 1998, comemoremos com júbilo a data porque nossas constituições não têm tido vida longa. A de 1891, que fora precedida de uma “Constituição provisória”, editada pelo Decreto nº 1, de 15 de Novembro de 1889, regeu o País por 39 anos, isto é, de 1891 até a revolução de 1930; de 1930 a 34, a “Constituição provisória” editada pelo Decreto 19.348. Após a revolução de 32, nos primeiros anos da Era Vargas, foi promulgada a Constituição de 1934, logo substituída pela Constituição de 1937, inaugurando o que ficou conhecido como Estado Novo.

    Com a queda do Presidente Getúlio Vargas, num contexto de democratização do País, foi promulgada a Constituição de 1946, que iria vigorar até 1967; em 1969, a Constituição de 67 foi largamente emendada para absorver atos institucionais, como o peçonhento AI nº 5. Finalmente, em um novo momento de democratização do País, é promulgada a Constituição de 1988, a constituição cidadã.

    Quando me perguntam se nossa atual Constituição demanda aprimoramento, respondo recordando os pontos em que há consenso no diagnóstico, que aponta para o aperfeiçoamento constitucional, mas dissenso no prognóstico. Inicialmente a reforma tributária, a qual, se realizada, também aprimora o modelo federativo, hoje enfraquecido em razão da alta concentração de receitas tributárias na União; em segundo lugar, lembro a reforma política, que deve ter o firme propósito de conquistar a legitimidade, que tem faltado ao regime político (democracia) e à forma de governo (república), eis que é constrangedora a larga distância que vai entre as instâncias políticas e a sociedade brasileira, entre a pauta da sociedade e a pauta do Executivo e do Congresso Nacional, o que só faz aumentar o perigoso descrédito dessas instituições.

    No que tange ao vertiginoso crescimento do número de ações que tramitam no Poder Judiciário, penso que as mudanças preconizadas pelo nosso novo Código de Processo Civil produzirão resultados positivos, no que diz respeito à queda no número de feitos em tramitação, a médio e a longo prazo.

    Recordo, a título de exemplo, a conciliação e a mediação, institutos que podem, e muito, não só diminuir o número de processos, mas também, o que é mais importante, diminuir entre nós a cultura do litígio e, ao mesmo tempo, prestigiar, disseminar e fortalecer a cultura da solução pacífica dos conflitos.

    Só tenho duas críticas ao modelo encampado pelo CPC/15 para desenhar os institutos da mediação/conciliação. É que, a meu inteligir, dois equívocos foram cometidos: o primeiro, vincular desnecessariamente os dois institutos (conciliação/mediação) ao Judiciário, ao invés de deixá-los nas mãos da sociedade civil (universidades, OAB, associações de bairro, escritórios de advocacia, sindicatos e órgão representativos do segmento empresarial); o segundo, não fixar em lei que o Judiciário somente apreciará eventual ação após as partes terem tentado resolver o conflito por meio da conciliação/mediação, exatamente como fazem muitos países, com sucesso.

    Outra iniciativa do novo CPC/15, que pode diminuir o número de processos de feitos em tramitação, ou imprimir celeridade às chamadas demandas de massa e a criação dos seguintes institutos: Incidente de Assunção de Competência (art. 947/CPC); o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR – art. 976/CPC); e, finalmente, a possibilidade que passa a ter o Superior Tribunal de Justiça para valer-se do IAC, dos recursos especiais repetitivos e dos enunciados de súmula.

    Esses novos institutos, ao tempo em que farão com que as decisões judiciais, mediante o desenvolvimento da integridade epistemológica do Direito, assegurem à sociedade um horizonte de estabilidade jurisprudencial, de segurança jurídica e de tratamento isonômico.

    Outra iniciativa, que sequer exige emenda constitucional ou norma infraconstitucional, mas que reputo importantíssima, está em convencer o Supremo Tribunal Federal a não mais examinar matéria sem nenhuma relevância constitucional e social, tampouco afetá-las à sistemática da repercussão geral. Trata-se de uma iniciativa que, se não for adotada, fará com que o Colendo STF permaneça sinalizando à sociedade que “opera como uma quarta instância”, segundo palavras de Eros Grau, o que só faz diminuir a dignidade institucional e funcional do Supremo Tribunal Federal, além de sobrecarregar nossa mais alta Corte com recursos despiciendos.

    Quanto ao Superior Tribunal de Justiça, cuja atribuição é conferir unidade interpretativa à legislação federal, penso que pode reduzir o número de casos que examina, ampliando o número de casos em que cabível a adoção do IAC, dos recursos especiais repetitivos e dos enunciados de súmula.

    No mais, o Poder Judiciário deve ter como meta, como um ideal, a sua autonomia financeira, sob pena de sacrificar sua independência. Não tem sentido, é humilhante, a cada final de mês, que o Judiciário precise suplicar ao Executivo que repasse o duodécimo que lhe é devido. Pode ser difícil conquistar a autonomia financeira, não nego, mas este deve ser o objetivo maior da instituição, o grande compromisso da magistratura com ela mesma. Não há outro caminho, se se quiser preservar a altivez e a independência do Poder.

    Minas Gerais já deu alguns passos nessa direção ao acolher a criação do Fundo Especial do Poder Judiciário- FEPJ (Lei estadual nº 20.802/13, regulamentada pela Resolução nº 739/13). Poder-se-ia fortalecer o FEPJ/MG com algumas iniciativas, a saber: 1) estabelecer um critério objetivo para a concessão da justiça gratuita; 2) prestigiar a primeira instância duplicando o valor das custas despendidas, em primeiro grau de jurisdição, na hipótese de recurso à segunda instância; 3) fixar em lei que o imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidentes na fonte, e tendo, com base de cálculo, os subsídios pagos a magistrados e os vencimentos pagos aos servidores do Judiciário, seja destinado ao FEPJ, na forma do art. 157, I, da CR; 4) promover estudos com vistas a que a Fazenda Pública (União, Estados e Municípios) e as concessionárias de serviços públicos, que demandam exageradamente o serviço jurisdicional, responsáveis que são por 51,5% dos processos em andamento, passem a pagar as custas e taxas judiciárias, que, evidentemente, iriam para o FEPJ.

    Por último, é de se repelir qualquer proposta que defenda a convocação de uma assembleia constituinte. Somente aquele que quer desestabilizar nossas instituições ou aquele que ingenuamente acredita que constituições novas criam nova realidade econômica a uma nação, podem abraçar ideia tão equivocada, energúmena e intempestiva. Constituições são como árvores, só retribuem com sua sombra aos que a plantaram, com o tempo. Cortar uma árvore que começa a sombrear os que a plantaram para, em seu lugar, plantar outra, é expor-se ao sol desnecessariamente, por anos e anos, até que se possa outra vez desfrutar da sombra, desde que a nova árvore seja mesmo frondosa, eis que pode não ser.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/os-30-anos-da-constituicao-cidada-entre-a-constancia-e-a-mudanca/634506446

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