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16 de Junho de 2024

Porta dos Fundos, o crime sem vítima e ataque à liberdade de expressão

há 4 anos

8 de janeiro de 2020. O desembargador Benedicto Abcair, do TJ-RJ, acabou “abcaindo” de seu conhecimento jurídico e decidiu em liminar que a Netflix retirasse do ar o especial “A Primeira Tentação de Cristo”, da produtora Porta dos Fundos, após solicitação do Centro Cultural Dom Bosco de Fé e Cultura. O agravo de instrumento nº 0083896-72.2019.8.19.0000 pode ser visto na íntegra clicando AQUI.

O curtametragem faz uma sátira a um “Jesus gay” mas também de outras figuras religiosas, o que causou grande revolta em boa parte da população brasileira, que é majoritariamente cristã. Muitos pediam que o vídeo fosse retirado do ar. Um pessoal pedindo CENSURA a outrem mesmo em tempos de democracia.

Também havia os mais sensatos. Que criticaram o filme e recomendaram não ver, divulgando um boicote, o que é plenamente livre e legal de se fazer. Aos defensores da censura disfarçados de lutadores da liberdade de crença começaram a utilizar como sanção o disposto no art. 208 do Código Penal, que versa, dentre outras coisas, sobre vilipendiar ato ou objeto de culto religioso. Culminando pena de detenção de um mês a um ano, e multa.

De forma surpreendente, o renomado jurista e escritor William Douglas, comprou essa ideia, alegando que há fato típico neste filme do Porta dos Fundos e que a decisao do TJ/RJ é justa. A questão é, primeiramente se há mesmo um vilipêndio ao culto alheio e se atinge de forma objetiva a honra de alguém ou de uma coletividade, o que é totalmente subjetivo, sendo necessário provar o dolo dos produtores no tipo penal em questão, pois não prevê-se a modalidade de culpa no art. 208. Há crime sem vítima?

Supostamente confirmando o dolo e punição penal dos responsáveis, é cabível tirar do ar o vídeo? A Lei Maior, a Constituição Federal de 1988 é categórica :

“Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;”.

A sorte é que se tem no Brasil advogados que não estudam Direito por mera sacanagem, e que estão dispostos a mostrar até para os mais fanáticos cidadãos e aos mais vaidosos juízes que a liberdade de expressão é algo tão sagrado quanto à religião. Porque se não for, parece que a censura virou algo institucional então, como uma tirania que se aproxima, e que estaríamos vivendo uma ditadura. Tempos difíceis.

Paulo Monteiro Jr.

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