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20 de Junho de 2024
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    Sexto painel do Congresso contrapõe os conceitos de dano social e funcionalismo radical ao princípio da preservação da empresa

    Publicado por JurisWay
    há 9 anos
    O sexto e último painel do 15º Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho do TRT da 15ª pôs em debate o princípio da preservação da empresa, tema da professora Ana Frazão, e os conceitos de dano social e funcionalismo radical, defendidos, respectivamente, pelos juízes Jorge Luiz Souto Maior e Guilherme Guimarães Feliciano. São temas diferentes, é verdade, mas que estão interligados, antecipou o diretor da Escola Judicial do TRT e presidente da Comissão Organizadora do Congresso, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, que apresentou o painel.

    Conselheira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça e que tem como missão zelar pela livre concorrência no País, Ana Frazão é professora adjunta de direito civil, empresarial e econômico na Universidade de Brasília (UnB) desde 2005. Mestre em direito e Estado pela própria UnB e doutora em direito comercial pela PUC de São Paulo, foi professora visitante de direito civil - Topics of Brazilian Civil Law - na Faculdade de Direito da Universidade de Ottawa, Canadá. Desde abril de 2012 é relatora da comissão de juristas constituída para assessorar o Congresso Nacional na discussão e votação do projeto de lei sobre o novo Código Comercial (PL 1.572/2011), em trâmite na Câmara dos Deputados.

    Alguns até diriam que o princípio da preservação da empresa é uma consequência necessária ou mesmo um subprincípio da função social da empresa, ponderou a professora, argumentando em favor do conceito de que não há, necessariamente, oposição entre os dois princípios. É preciso, no entanto, uma visão integrada da empresa e do ordenamento jurídico como um todo, a fim de se chegar a soluções coerentes e que evitem uma excessiva funcionalização, defendeu a palestrante. A discussão principal aqui é como equilibrar a autonomia privada, ou seja, a livre iniciativa e a função social da empresa. A empresa privada não é uma empresa pública. Ela tem função social, mas não é apenas uma função social. O segredo, preconiza a jurista, é encontrar o equilíbrio entre o contratualismo e o institucionalismo. Se o interesse social não pode ser redutível apenas ao interesse dos sócios e acionistas, há de se admitir a consideração de interesses de stakeholders, como é o caso dos trabalhadores. O problema é a medida e o como, frisou.

    A conclusão básica desse debate, sublinhou Ana, é que o interesse da empresa é maior do que o de qualquer grupo envolvido - acionistas, sócios, credores sociais, trabalhadores, consumidores, governo etc - e, ponderou ela, em qualquer situação, nenhum interesse pode ser considerado absoluto em detrimento dos demais. Partindo desse princípio, ela preconizou a conciliação entre o interesse de credores e a manutenção da empresa, com, por exemplo, limitações à penhora de faturamento, de forma que o percentual a ser fixado seja alto o bastante para a satisfação do crédito, sem ultrapassar, contudo, o limite que poria em risco a própria continuidade do funcionamento da empresa executada. A regra geral é a preservação da empresa. A extinção só pode ser admitida em caráter excepcionalíssimo.

    Quanto ao chamado dano social, a palestrante advogou no sentido de que sua identificação não pode prescindir de critérios consistentes, e a indenização eventualmente fixada deve ser a mais equilibrada possível. Se, por um lado, valores mínimos podem gerar o estímulo à prática ilícita, admitiu a professora, por outro, advertiu ela, valores excessivos, além de incompatíveis com os pressupostos da indenização, podem comprometer a preservação da empresa.

    Ana não contesta a necessidade de se tratar com rigor os casos de reincidência, dolo - violação calculada - e culpa grave, mas defende que sejam levados em conta a capacidade econômica e patrimonial da empresa e o montante da vantagem ilicitamente obtida. Já no que diz respeito ao dano social configurar dumping o entendimento é outro. Violação de regras trabalhistas é algo muito diverso de dumping, preços predatórios ou concorrência desleal, afirmou ela, que preconizou também a necessidade de haver rigor técnico na mensuração de eventuais danos concorrenciais. O dano social pode gerar vantagens competitivas, que, por sua vez, podem levar a algumas distorções do mercado, mas tais conclusões não podem ser presumidas. Análises concorrenciais envolvem exame abrangente e sofisticado dos mercados, com base em dados empíricos. Além disso, arrematou a professora, os danos sociais devem ter como foco prioritário os danos causados ao trabalhador ou ao trabalho, e não à concorrência.



    Funcionalismo radical

    Titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté, no Vale do Paraíba, o juiz Guilherme Guimarães Feliciano foi o segundo a palestrar no painel. Doutor em direito processual pela Universidade de Lisboa e em direito penal pela USP, instituição pela qual é livre-docente em direito do trabalho, Feliciano é coordenador da pós-graduação em direito do trabalho e processo do trabalho da Universidade de Taubaté e vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).

    Expondo sobre o tema Funcionalismo radical, o juiz argumentou que a legislação brasileira, a começar pela própria Constituição Federal, assegura o direito de propriedade e a livre concorrência, bem como o livre exercício da atividade econômica, independentemente de autorização dos órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. A Carta Magna brasileira garante também, acrescentou Feliciano, o direito ao contraditório e à ampla defesa. Pilar de qualquer bom Estado Democrático de Direito, esse último princípio nem sempre é posto em prática com a necessária parcimônia, demonstrou o magistrado. O Superior Tribunal de Justiça registra um caso classificado como reconsideração de despacho nos embargos de declaração no recurso extraordinário no agravo regimental nos embargos de declaração no agravo em recurso extraordinário no recurso extraordinário nos embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no agravo de instrumento, e há também uma ocorrência de embargos de declaração nos embargos de declaração nos embargos de declaração nos embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário nos embargos de declaração nos embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial, exemplificou o professor, arrancando gargalhadas do público.

    Sobre a funcionalidade do direito, Feliciano preconizou que o agir do juiz não deve ser pura pulsão emotivo-ideológica. Por outro lado, acrescentou ele, o magistrado não pode ser guiado por um tecnicismo autista. O papel do direito, afirmou o palestrante, no final das contas, é o de generalizar e estabilizar expectativas de comportamento. Se não for capaz de realizar este desiderato, não terá razão de ser. Será meramente simbólico.

    Recorrendo ao filósofo alemão Günther Jakobs, Feliciano expôs o conceito de direito penal do inimigo, destinado àqueles que, de modo grave, reiterado e organizado, agridem os valores jurídicos em vigor na sociedade organizada. Em contextos assim, esclareceu o juiz, são admitidas medidas como o agravamento das penas e a relativização de direitos e garantias nos planos material e processual, como, por exemplo, a interceptação telefônica. Se essa relativização se dá até mesmo no direito penal, por que razão o direito do trabalho deveria se ater estritamente aos institutos jurídicos?, questionou.

    O sistema jurídico tem de ter utilidade, sentenciou Feliciano. Jurisdição apenas para dizer resolvi o seu problema? O problema continua ali, e a máquina foi movimentada absolutamente sem função, insistiu ele, preconizando a prevalência de um judiciário cujos resultados extrapolem o papel. Buscar o fato e procurar na lei onde ele se encaixa é uma visão antiga. O juiz também faz o direito, não é só um repetidor da lei, e a aplicação do direito deve ser a afirmação dos valores jurídicos em vigor. Que a dogmática jurídica não seja, para o juiz, a morte do homem por baixo da toga.

    Dano social

    Diretor do Fórum Trabalhista de Jundiaí, o juiz Jorge Luiz Souto Maior concluiu o painel. Professor livre-docente do Departamento de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da USP, instituição pela qual também é mestre e doutor em direito do trabalho, Souto Maior fez de sua palestra, em primeiro lugar, uma homenagem ao colega Saint-Clair Lima e Silva, falecido em abril deste ano, e a Machado de Assis, não raramente qualificado como o maior nome da literatura brasileira. Do fundador da Academia Brasileira de Letras, além do clássico Memórias Póstumas de Brás Cubas, talvez a obra-prima de Machado, o juiz citou os contos A Igreja do Diabo, Pai Contra Mãe e O Enfermeiro, à guisa de ilustrar sua exposição.

    O magistrado reafirmou o conceito de dano social ou dumping social. O nome do autor da pergunta Souto Maior já não se lembra, mas, conforme revelou em sua palestra, ele começou a refletir sobre o conceito ao ser confrontado com a seguinte indagação: Em todos os ramos do direito a reincidência gera efeitos jurídicos, menos no direito do trabalho. Percebi que, de fato, as reclamadas reincidentes não eram tratadas como tal, e, sim, numa grande ironia, até como uma espécie de parceiras da Justiça, lembrou o palestrante. Fui ficando cada vez mais incomodado com aquilo, sublinhou ele, que passou a buscar um instrumento que pudesse coibir a prática, até que chegou à ideia de dano social. Nas condenações em que aplica o instituto, Souto Maior não dispensa uma fundamentação de mais de trinta páginas sobre a questão. O que embasa essa ideia é a reincidência, esse é o critério. É fácil perceber. Não é inadimplemento contratual. É ilícito.

    As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois, com tal prática, desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista, com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido dumping social, motivando a necessária reação do Judiciário Trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, insistiu Souto Maior. É evidente que a prática gera vantagem sobre as demais empresas do setor, ratificou.

    Para o professor, o capitalismo socialmente responsável deve se pautar por um sentido ético, na medida em que o desrespeito às normas de caráter social traz para o agressor uma vantagem econômica frente aos seus concorrentes, mas que, ao final, conduz todos ao grande risco da instabilidade social. Ele lecionou que, conforme a Lei 12.529/2011, constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa, e aumentar arbitrariamente os lucros. Assim, conclui o juiz, o desrespeito aos direitos trabalhistas representa, consequentemente, uma infração à ordem econômica.

    Na hora de receitar o remédio a esse mal, por mais amarga que a medida possa parecer a alguns, Souto Maior não tergiversa. Nas ações trabalhistas em que tais condutas forem constatadas - agressões reincidentes ou ação deliberada, consciente e economicamente inescusável de não respeitar a ordem jurídica trabalhista -, tais como salários em atraso, pagamento de salários por fora, trabalho em horas extras de forma habitual, sem anotação de cartão de ponto de forma fidedigna e sem o pagamento do adicional correspondente, não recolhimento de FGTS, não pagamento das verbas rescisórias, ausência de anotação da CTPS, muitas vezes com utilização fraudulenta de terceirização, cooperativas de trabalho, estagiários, temporários etc., não concessão de férias, não concessão de intervalo para refeição e descanso, trabalho em condições insalubres ou perigosas, sem eliminação concreta dos riscos à saúde etc., deve-se proferir condenação que vise à reparação específica pertinente ao dano social perpetrado, fixada ex officio pelo juiz da causa, pois a perspectiva não é a da mera proteção do patrimônio individual.







































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